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quarta-feira, 1 de junho de 2011

01 de junho 2011 - O GLOBO


Governo não protegerá nem 30 de 165 ameaçados de morte

O governo federal admitiu não ter condições de garantir a segurança de todos os líderes indígenas, quilombolas, sem-terra e ambientalistas que correm risco de vida no país. Nem os 30 nomes considerados mais vulneráveis pela Comissão Pastoral da Terra têm garantia de proteção. A ministra dos direitos Humanos, Maria do Rosário, afirmou: “Seria errôneo e uma ilusão dizer que temos condições para atender a esta lista. Vamos fazer uma avaliação.” A Pastoral entregou ao governo uma lista com 207 nomes que, entre 2000 e 2011, sofreram mais de uma ameaça – 42 foram assassinados. Restam 165. Uma semana após a execução de ambientalistas no Pará, o clima na região é de medo. Sem proteção, parte dos moradores abandonou suas casas.


IMPASSE NO CAMPO
Um governo de cobertor curto
Ministra admite que não consegue proteger nem 30 dos 165 ameaçados de morte

Evandro Éboli

Na semana seguinte a quatro assassinatos de ativistas na Amazônia, o governo reconheceu, ontem, não ter instrumentos e condições para garantir a segurança de todos os líderes que correm risco de serem assassinados no campo e que constam da lista de ameaçados feita pela Comissão Pastoral da Terra (CPT). A ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, afirmou ser necessário fazer uma triagem na relação da entidade e escolher quais são os prioritários entre os mais ameaçados.
- Seria errôneo e uma ilusão dizer que temos condições para atender a esta lista. Vamos analisar a listagem da CPT e fazer uma avaliação. Vamos buscar os casos mais graves, sobre os quais nos debruçaremos - disse Maria do Rosário, após encontro com líderes da CPT em seu gabinete.
Anteontem, porém, em reunião do presidente da República interino, Michel Temer, com ministros da área, o governo anunciara que daria prioridade máxima à proteção de pessoas marcadas para morrer.
A CPT entregou ao governo uma lista com 207 nomes de líderes rurais, indígenas, quilombolas, sem-terra e ambientalistas que, entre 2000 e 2011, sofreram mais de uma ameaça ou foram vítimas de tentativas de assassinato. Mas, desse total, 42 foram assassinados. Dos 165 ameaçados ainda vivos, a CPT destacou 30 líderes, cujos casos são considerados mais vulneráveis.
A ministra não garantiu quantos dos relacionados poderão contar com a proteção do governo. Essa análise ainda será feita e não há data prevista para encerrar esse trabalho. Questionada após admitir que o governo não assegura a proteção da totalidade dos ameaçados, a ministra tentou se justificar.
- O que quero dizer é que é errôneo garantir escolta para os 1.850 (número total da lista da CPT). Não poderia prometer ao Brasil oito ou nove policiais para cada um desses ameaçados. Mas nunca houve uma articulação desse nível.

Rainha entre os que podem ter proteção
Na relação dos 30 camponeses mais ameaçados da CPT estão os nomes de dois líderes expressivos do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST): José Rainha, em São Paulo, e Jaime Amorim, em Recife. Entre os ameaçados também estão religiosos e agentes da Pastoral.
O secretário-executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto, que participou da reunião, afirmou que a garantia da segurança a esses camponeses necessariamente não se dá com a escolta policial, mas pode ser feita com outro tipo de ação.
- O propósito não é só punir os homicídios, mas também as ameaças. Faremos uma análise mais detalhada da relação e destacar quais casos necessitam da vigilância presencial, se a ameaça de fato é consistente ou não, se o ameaçado está no centro do conflito. É preciso levar em conta fatores pessoais e circunstanciais - disse Luiz Paulo Barreto.
Os dirigentes da CPT participaram da entrevista coletiva e, em algumas vezes, Maria do Rosário demonstrou irritação com suas declarações, em especial com as cobranças que faziam ao governo. Um desses momentos se deu quando José Batista Afonso, advogado da CPT em Marabá (PA), afirmou que, entre as causas das quatro mortes de líderes na semana passada estão a discussão e a aprovação do Código Florestal, no Congresso Nacional. A ministra reagiu na hora, interrompendo a fala de Batista.
-- Não é esse o entendimento do governo. Podemos divergir - disse Maria do Rosário.
Batista ainda foi cortado pela ministra quando dizia que proteção aos ameaçados não resolve o problema e que é necessário haver políticas públicas efetivas, segundo ele, como priorizar a reforma agrária. Ao afirmar que, no Pará, dos 20 defensores dos direitos humanos ameaçados, apenas seis são protegidos, Rosário reagiu novamente:
- E o Pará é o que tem o maior número de protegidos. O Brasil é o único país do mundo com programa de proteção aos defensores dos direitos humanos.

No final, Rosário afirmou que a proteção com escolta policial é também uma forma de violação de direitos humanos.
- Não é bom viver permanentemente num programa desses. É para ser uma excepcionalidade. Viver sob escolta na missa, na escola, no supermercado é também uma violação dos direitos humanos. É uma violação da privacidade - disse Rosário.
Passados oito dias da morte de José Cláudio e sua mulher, Maria do Espírito Santo, a direção nacional do PT divulgou nota ontem para manifestar indignação com os assassinatos ocorridos na Região Amazônica. A nota é assinada pelo presidente do partido, Rui Falcão, e por secretários petistas. O PT afirma que apoia a iniciativa do governo federal "de dar prioridade máxima ao assunto". "É preciso estancar a violência, dar proteção às lideranças locais e investigar a fundo os crimes cometidos", diz a nota.


EDITORIAL
Causas antigas da violência no campo

Do chamado massacre de Carajás, em 1996, até agora, foram 212 pessoas assassinadas na região de Marabá (PA) devido a conflitos agrários, pelos dados da Comissão Pastoral da Terra (CPT). Mesmo que haja alguma superestimativa nos números, por motivos políticos, fica comprovada a gravidade da violência naquela região do Pará.
A morte há dias do casal José Cláudio e Maria do Espírito Santo, tudo indica por denunciarem desmatamentos ilegais, é a mais recente contribuição a esta estatística macabra. Na manhã de ontem, a ministra da Secretaria de Direitos Humanos, Maria do Rosário, recebeu da direção da CPT a relação de 1.855 pessoas sob a mira de madeireiras, desmatadores, etc. Como ocorre nessas situações, o assassinato do casal levou a uma grande mobilização de ministros e autoridades em geral, para conter a escalada da violência. Mas Rosário foi direta, na reunião de ontem: não há como o governo garantir a segurança de todos. Compromete-se a cuidar dos casos mais graves. Mas como garantir que alguém que recebeu apenas uma ameaça não será alvejado antes de outros mais visados?
O Estado não pode proteger todos, como não atendeu aos pedidos sucessivos de ajuda do casal José e Maria. Muitos sabiam, inclusive agentes públicos, que o casal estava marcado para morrer. Temos aqui mais uma demonstração cabal de que o Estado brasileiro é débil onde deveria ser forte - na segurança, no caso - e opressivo onde não é necessário - por exemplo, na expropriação tributária.
A coreografia encenada em Brasília é conhecida. É a mesma de vezes anteriores. Foi assim na morte de Chico Mendes, em 1988, em Xapuri (AC). Também na da freira missionária americana Dorothy Stang, em 2005, em Anapu (PA). A Polícia Federal e a Força Nacional são acionadas, promotores e procuradores se agitam, mas o tempo passa, o aparato é desmobilizado, até voltar a vigorar a lei do gatilho.
É de fato difícil montar um sistema amplo de segurança pública em regiões tão distantes das capitais e tão extensas, embora seja imperdoável o imobilismo do poder público em casos como o do casal assassinado há pouco. Agrava, ainda, o quadro de violência ela se alimentar de distorções que vêm de longe.
Há a questão da titularidade da terra, mas existem também erros crassos na colonização da Amazônia, cometidos desde a ditadura militar. Um dos resultados é que assentamentos de reforma agrária, do Incra, tornam-se vetores da destruição da floresta, por mais que o governo do PT, por razões políticas, queira omitir o fato. Sem alternativa de sobrevivência, só resta a assentados derrubar árvores.
Reportagem publicada domingo no GLOBO, feita na dinâmica fronteira de desmatamento de Mato Grosso, é didática: enquanto não se tornar a floresta mais rentável em pé do que transformada em toras, carvão e espaço para pasto, conter a derrubada será luta inglória ou quase isso. Claro que muito falta a ser feito na repressão e vigilância. Mas é crucial haver um sistema de exploração racional da floresta que gere renda e emprego para quem vive naquelas imensidões, sem precisar da motosserra.
E há conhecimento técnico disponível para tal.


DOS LEITORES

Violência agrária
Imagino os europeus analisando os 143.000 km de desmatamento em apenas um ano e compararem essa área ao tamanho de seus países: devem questionar por que a ONU e seus parceiros não referendam o que muitos pretendem: tomar  a nossa Amazônia e  preservar o  que  resta, eis  que o Brasil  não demonstra  (na prática)  cuidados e  atitudes desejáveis. Temos, agora, a esperança de que a missão de controle do desmatamento seja efetivamente exercida pelas Forças Armadas, estas sim, com todas as ferramentas adequadas e, sobretudo, com conhecimento próprio e interesses estratégicos e vitais à nossa soberania.
JESSE RIBEIRO DA SILVA - Rio


PRIVATIZAÇÃO DE AEROPORTOS
Privatização de Guarulhos e Viracopos será total
Aeroporto de Brasília também ficará com iniciativa privada, tanto as operações aeroportuárias como comerciais

Chico de Gois e Luiza Damé

BRASÍLIA. O governo decidiu privatizar integralmente - operações aeroportuárias e exploração das áreas comerciais - os terminais internacionais de Guarulhos (SP), Viracopos (SP) e Brasília (DF). As concessões serão feitas por meio de Sociedades de Propósito Específico (SPEs), a serem constituídas por investidores privados nacionais e estrangeiros. A Infraero, que administra hoje todos os principais aeroportos, participará das SPEs com 49% do capital. Os vencedores terão que seguir metas de qualidade, expansão e investimentos, ainda a serem decididas na modelagem dos editais, que devem sair a partir de dezembro. A forma de concessão para os aeroportos do Galeão e de Confins (BH) ainda não foi definida. O martelo para Guarulhos, Viracopos e Brasília foi batido ontem cedo, em reunião das autoridades do setor com a presidente Dilma Rousseff, e anunciado na reunião, à tarde, com os governadores e prefeitos das 12 cidades que sediarão a Copa do Mundo de 2014.
As SPEs serão empresas privadas e ficarão responsáveis tanto pela ampliação e as novas construções dos aeroportos quanto pela gestão desses terminais. Pelo modelo, a Infraero participará das principais decisões da companhia, mas perde as rédeas administrativas. Hoje, o ministro da Secretaria de Aviação Civil, Wagner Bittencourt, deverá apresentar detalhes de como será a concessão dos três terminais.

Dilma quer atrair investidor externo e valorizar Infraero
O governo estava estudando a concessão apenas da exploração comercial dos três aeroportos, mas percebeu que esse modelo não era viável. Ou seja, a previsão de receita com lojas, estacionamentos e espaços publicitários não cobriria os investimentos no prazo dos contratos. Por isso, decidiu incluir no modelo a exploração de todo o sistema, o que prevê a arrecadação também das tarifas pagas por consumidores e empresas aéreas. Também significa tirar a histórica exclusividade de gestão da Infraero. Na reunião, Dilma disse que o objetivo da concessão é atrair investidores privados nacionais e internacionais, além da trazer para o país grandes operadores aeroportuários globais. A participação de 49% da Infraero se deve à avaliação de que os resultados dos aeroportos dão dividendos. A estatal, hoje deficitária, poderá usar esses recursos na operação de terminais menos rentáveis. O modelo poderá ser estendido a outros aeroportos.
Além disso, segundo a presidente, a participação da Infraero na SPE valorizará a empresa, tornando-a mais atraente para uma futura abertura de capital. Para Dilma, com a presença da Infraero o Estado terá acesso a dados seguros do setor aeroportuário, evitando a "assimetria de informações" que ocorre em outros setores.
- É mais fácil abrir o capital da Infraero depois de ela tomar um choque de competitividade - afirmou a presidente, segundo assessores.
Em contrapartida, a gestão privada dará mais eficiência a esses terminais, gargalos mais urgentes do setor aéreo. Por exemplo, a SPE terá mais agilidade, ao não ter de se submeter à Lei de Licitações (8.666).
- Esse convívio com a iniciativa privada vai ter um impacto positivo na Infraero - disse o ministro do Esporte, Orlando Silva, escalado para falar em nome do governo.
Além dele, estavam na reunião outros nove ministros. Não compareceram os governadores do Rio, Sérgio Cabral - que estava em Paris -; do Rio Grande do Sul, Tarso Genro; e do Ceará, Cid Gomes; além do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab. Eles mandaram representantes.

Investimentos de R$5 bi serão mantidos, diz ministro
A metodologia e os demais critérios do edital - preço mínimo, metas etc. - serão elaborados por empresas especializadas. Segundo Dilma, as companhias terão de ampliar a capacidade dos aeroportos e melhorar a qualidade dos serviços:
- Esse novo marco segue, em linhas gerais, o que já fizemos em vários setores, como eletricidade, rodovias e ferrovias. Vamos começar um novo modelo de funcionamento dos aeroportos, que vai além da Copa.
Dilma disse ainda que as obras já licitadas nos aeroportos estão mantidas, ou seja, continua o plano de investimentos de mais de R$5 bilhões da Infraero em 16 aeroportos. Orlando Silva defendeu o regime diferenciado de licitações para a estatal. Ele disse que no triênio 2011-2014 a demanda no sistema aeroportuário deverá crescer 10%:
- Não vamos esperar a concessão de investimentos para melhorar os aeroportos.
A presidente disse que o Aeroporto de Viracopos terá um papel estratégico, porque São Paulo precisa de um terminal com três pistas:
- Viracopos é o futuro, é um dos grandes centros aeroportuários do país.
COLABOROU Geralda Doca


ANCELMO GOIS

Se beber, não voe
A Anac publica hoje no DO um regulamento para prevenção do uso indevido de substâncias psicoativas a bordo.
Quer evitar o consumo inadequado de álcool e outras drogas por profissionais da aviação.


QUESTÃO NUCLEAR
Brasil na contramão
País deve manter programa que dobra fatia da energia nuclear na geração de eletricidade

Danielle Nogueira, Eliane Oliveira e Mônica Tavares

No momento em que vários países decidem rever seus programas nucleares - anteontem, a Alemanha anunciou que vai desativar suas usinas até 2022 -, o Brasil toma a direção contrária e decide usar benefícios fiscais para estimular a ampliação de seu programa atômico. Depois do acidente em Fukushima, no Japão, em março último, países como Suíça, Bélgica e China cancelaram ou suspenderam novas licenças para a construção de usinas. Enquanto isso, o Brasil está construindo Angra 3 e a Câmara dos Deputados aprovou, semana passada, medida provisória que concede incentivos fiscais para compra de equipamentos a serem usados na geração nuclear.
A MP 517 ainda será votada no Senado. Além disso, o governo Dilma Rousseff deve manter a estratégia de mais quatro usinas até 2030, como previsto no Plano Nacional de Energia (PNE) 2030, hoje em revisão. Ao lado de Angra 1, 2 e 3, as novas unidades dobrariam a fatia da fonte nuclear na geração de eletricidade, para 5%. O avanço da participação nuclear na matriz elétrica, bem como a expansão do gás natural (de 2,6% em 2009 para 8%), se daria ao custo da retração da fatia da hidreletricidade, fonte limpa e barata (de 85% para 78%). A energia vinda da biomassa e dos ventos também sofreriam uma leve redução. Juntas, elas respondiam por 5,7% em 2009 e cairão a 5% em 2030. É justamente nestas duas fontes que o Brasil deveria investir para conter o avanço nuclear, diz José Goldemberg, do Instituto de Eletrotécnica e Energia da USP.
- A energia da biomassa e dos ventos deve ser mais bem aproveitada. Além disso, programas de eficiência energética devem ser implementados. Após o acidente da usina nuclear japonesa de Fukushima, os países discutem se mantêm ou não seus programas nucleares. Não é o momento de expandi-lo.

Rejeitos ainda não têm destino final
O diretor da Coppe/UFRJ e ex-presidente da Eletronuclear, Luiz Pinguelli Rosa, engrossa o coro dos contrários à expansão do programa nuclear brasileiro. Para ele, não é apenas uma questão de segurança, mas também de preço. Nos seus cálculos, o custo da energia hidráulica está em cerca de R$78 o Megawatt-hora (Mw/h), considerando os projetos de Belo Monte (PA) e o complexo do Rio Madeira (RO). A tarifa da energia eólica e da gerada a partir do gás natural está em torno de R$150 o Mw/h e a da energia nuclear giraria em torno de R$250 o Mw/h, considerando o investimento em Angra 3, de R$9,9 bilhões.
- A energia nuclear não emite gases de efeito estufa, mas é cara no Brasil. Além disso, após Fukushima, outras diretrizes de segurança podem ser tomadas - diz Pinguelli.
A subsecretária de Economia Verde do Estado do Rio e vice-presidente do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), Suzana Kahn, lembra a incerteza quanto ao destino dos rejeitos radioativos.
- Em estudos recentes, o IPCC indica que as fontes renováveis dão conta do aumento da demanda mundial de energia até 2050. Não concordo que a nuclear seja uma opção para já. E tem uma questão que não está equacionada: o lixo radioativo.
Não há no mundo depósitos definitivos para abrigar os resíduos de alta radioatividade.
Os partidários da energia nuclear dizem que o potencial hidrelétrico no Brasil estará esgotado em 2025 e que essa opção será necessária para a segurança energética. Lembram o caráter político da decisão alemã, uma vez que a coalizão verde e social-democrata já aprovara, há 11 anos, proposta que encerraria a era nuclear. A chanceler Angela Merkel resistia em seguir a determinação, mas voltou atrás para obter simpatia dos verdes.
- Não adianta o Brasil tomar uma decisão com viés emocional. O problema com Fukushima não foi a tecnologia nuclear, e sim um erro de projeto - diz o presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben), Edson Kuramoto.
Das quatro usinas que constam do PNE 2030, duas seriam no Nordeste e outras duas no Sudeste. A Eletronuclear já identificou 40 áreas onde as elas poderiam ser erguidas. Apenas quatro estados (AC, MS, RN e PR) ficaram de fora, segundo o assessor da presidência da estatal, Leonam Guimarães:
- A decisão alemã não muda a necessidade energética brasileira. Mas vamos esperar a revisão do PNE para saber em que áreas faremos estudos mais aprofundados.
Tudo indica que não haverá mudanças nas diretrizes na política energética brasileira. A área técnica do governo, porém, não descarta a possibilidade de haver algum impacto da decisão no Brasil, devido ao aumento de exigências em termos de custos com segurança daqui em diante. Em avaliação preliminar, o governo considera que a Alemanha está sendo movida por pressões políticas e que a decisão não será seguida por atores importantes, como os franceses, muito dependentes de energia nuclear.
- O mundo não vai acabar - disse um alto funcionário.

Congresso: cautela com novas usinas
O secretário de Planejamento e Desenvolvimento Energético do Ministério de Minas e Energia, Altino Ventura Filho considera que não haverá impacto nas usinas brasileiras. Ele explicou que a tecnologia de Angra 3 é a mais utilizada no mundo, a mesma de Angra 2, e lembrou que a decisão alemã era esperada. De fato, em almoço com o presidente da Alemanha, Christian Wulff mês passado, Dilma foi alertada para tal. Ela teria feito um apelo a Wulff para que seja mantido o crédito de exportação conferido pelo governo alemão à empresa francesa Areva, responsável por fornecer à Eletronuclear os equipamentos de Angra 3.
Deputados e senadores dos maiores partidos consideram que as obras de Angra 3 devem continuar. Mas defendem que novas usinas devem ser analisadas no Congresso e na academia. O vice-líder do PPS, deputado Arnaldo Jardim (SP), classificou a atitude da Alemanha de "demagógica". Já o líder do PSDB na Câmara, Duarte Nogueira (SP), defendeu a criação de uma comissão especial para tratar das atuais usinas. E o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), considera que o país tem que avaliar a necessidade das usinas nucleares:
- A MP 517 é para a conclusão de Angra 3, não interfere em outras usinas - disse ele, relator da MP no Senado.
O PV, que é contra programas nucleares, está colhendo assinaturas para aprovar um plebiscito sobre a instalação de novas usinas no país.
COLABORARAM Emanuel Alencar e Isabel Braga


CORPO-A-CORPO - SYLVIA KOTTING-UHL
"Não é bom para a Alemanha, não é bom para o Brasil"

BERLIM. A deputada alemã do Partido Verde diz que a decisão do governo de Berlim de fechar as usinas atômicas pode ter efeito também na exportação de tecnologia e de equipamento nuclear para o Brasil. Sylvia Kotting-Uhl prevê um longo debate parlamentar na Alemanha, em junho, sobre a politica de exportação. "A consequência poderá ser a suspensão da garantia estatal Hermes para um crédito de exportação" ( 1,4 bilhão), disse. Sem a garantia do governo alemão, o negócio deve se tornar menos atraente para a francesa Areva-Siemens (antiga Siemens-KWU), que constrói Angra 3.

Graça Magalhães-Ruether

A senhora apresentou recentemente, no Parlamento, uma moção contra o plano do governo alemão de oferecer o seguro estatal Hermes para créditos de exportação nuclear para o Brasil. A garantia estatal foi suspensa?
SYLVIA KOTTING-UHL: Não. A minha moção foi recusada. Mas isso foi pouco antes de Fukushima. Depois disso, houve uma guinada de 360 graus na politica nuclear do governo (de Angela Merkel), que culminou com a decisão de fechar todas as usinas do país. Uma série de mudanças na politica nuclear acompanhará essa mudança. Teremos um longo debate no Parlamento em junho. De antemão, já antecipo que o governo alemão vai ter que cancelar a garantia de crédito de exportação nuclear para Angra 3, de 1,4 bilhão porque não vai ter meios de manter a sua credibilidade fomentando uma tecnologia de alto risco em uma região de risco que é Angra. O que não é bom para a Alemanha não pode ser bom também para o Brasil.

Mas o governo alemão pode apenas suspender o seguro de crédito, porque a exportação propriamente dita é feita pela empresa Siemens-Areva...
SYLVIA KOTTING-UHL: É isso mesmo. Se a empresa vai continuar ou não com o projeto no Brasil vai depender dos seus interesses econômicos. A suspensão do seguro vai com certeza dificultar o negócio. O projeto de Angra 2 foi interessante para a Siemens (o consórcio com a Areva ocorreu em 2005) porque o crédito foi garantido pelo governo alemão.

A Siemens, antigamente a maior produtora de centrais nucleares da Europa, acaba de anunciar seu plano de retirada do consórcio nuclear. O negócio da tecnologia nuclear não tem futuro na Alemanha?
SYLVIA KOTTING-UHL: Sim. Já quando os verdes fizeram parte do governo federal alemão (de 1998 a 2005) tomamos a decisão de fechar as usinas. Depois, quando Merkel assumiu, resolveu prolongar o tempo de funcionamento das centrais, uma forma de aumentar a sua rentabilidade e agradar ao lobby atômico. Mas a nossa decisão de não construir novas usinas ela não mudou. Sem um mercado interno, as empresas começaram a ter problemas. A exportação é uma saída, mas a competição aí é enorme.

A senhora espera que a decisão pioneira da Alemanha influencie outros países a fazer o mesmo?
SYLVIA KOTTING-UHL: Espero que sim. Mas se vamos ser um exemplo a ser seguido, vai depender de como vamos conseguir desenvolver a energia renovável. Os planos do governo são de um aumento das fontes renováveis (sobretudo energia solar e eólica) de 17% para 35%. Devemos mostrar aos outros países que a nossa indústria não sofre com a renúncia à energia atômica, mas, pelo contrário, ela vai é lucrar com o desenvolvimento de novas tecnologias. A catástrofe de Fukushima mostrou que o risco é grande em qualquer país do mundo.


EDITORIAL
Alemanha deu um passo atrás

O governo alemão decidiu dar um passo atrás em relação ao uso da energia nuclear. A vida útil de suas usinas, que respondem por cerca de um quarto da eletricidade consumida no país, não mais será prorrogada, de modo que até 2022 as centrais em funcionamento terão de ser desligadas.
Trata-se de uma decisão política, sem embasamento técnico, que o governo de coalizão liderado pela chanceler Angela Merkel resolveu tomar em função dos resultados das recentes eleições regionais, marcadas por um expressivo avanço do Partido Verde.
A decisão significa, sem dúvida, um tremendo revés para a indústria nuclear no mundo. A Alemanha contribuiu consideravelmente para o avanço tecnológico do setor, especialmente no que se refere à segurança das usinas.
O Brasil se tornou parceiro dos alemães na década de 70 com um acordo envolvendo transferência de tecnologia para construção e operação de centrais nucleares. O acordo também envolvia investimento em um processo de enriquecimento de urânio (que somente havia sido testado em escala laboratorial), que acabou abandonado, pois se mostrou antieconômico. Paralelamente, a Marinha brasileira desenvolveu tecnologia própria para enriquecimento de urânio, posta em prática pelas Indústrias Nucleares do Brasil, em suas unidades de Resende.
O ótimo funcionamento de Angra 2, considerada uma das usinas mais eficientes do planeta, atesta que o acordo com os alemães foi bem-sucedido. Os franceses adquiriram o controle acionário das companhias que detinham a tecnologia alemã, e os contratos tiveram uma sucessão natural, garantindo a retomada das obras de Angra 3, prevista para funcionar em 2015.
O trágico acidente em Fukushima, no Japão - causado por erros técnicos e imprevidência -, certamente abalou a imagem da indústria nuclear e fortaleceu os críticos do setor na Alemanha, em um momento que toda a Europa vinha reativando projetos de novas usinas, dentro do esforço de redução das emissões de gases que contribuem para o efeito-estufa. A Suécia, por exemplo, que depende em 50% da energia nuclear, e que resolvera anos atrás desligar suas usinas, voltou atrás e prorrogou a vida útil das centrais, baseada em rigorosos critérios técnicos. Os alemães caminhavam nessa direção, quando o acidente de Fukushima levou o governo Merkel a congelar a iniciativa. Não há tempo hábil para os alemães substituírem toda essa energia nuclear por fontes alternativas. O mais provável é que passem a depender de energia térmica, de fontes como carvão, óleo combustível e gás natural. A Alemanha, que reconhecidamente se esforçava para reduzir a emissão de gases que aceleram o aquecimento global, agora trocará de sinal. Teria sido preferível que usassem sua eficiência tecnológica para investir na segurança dessas usinas, o que beneficiaria o planeta inteiro.
Até 2022 é possível que essa discussão amadureça e, sem a pressão dos acontecimentos, os alemães reflitam mais sobre a decisão que tomaram.


NEGÓCIOS & CIA
Flávia Oliveira

Só filé
Os três aeroportos que o governo decidiu privatizar estão entre os mais rentáveis do país. Com Galeão e Congonhas, os terminais de Cumbica, Viracopos e Brasília formam os top five do setor. Um especialista diz que, ao repassá-los à iniciativa privada, o governo se livra da Lei das Licitações e destrava investimentos que a Infraero não fez. As seguradoras do BB seguem o modelo.

Reação nuclear 1
Edson Kuramoto, da Aben, não crê em debandada de investimentos na área nuclear após a decisão da Alemanha de desligar 17 usinas. "O petróleo não parou após o acidente da BP no Golfo do México. Toda a tecnologia nuclear não vai para o lixo por Fukushima", diz.

Reação nuclear 2
À frente da associação da energia nuclear no país, Kuramoto diz que, até agora, essa parece ser a posição do governo Dilma: "Se mantiver o programa nuclear, o Brasil, como EUA e Rússia, poderá dominar todo o ciclo: da mineração à geração. As reservas de urânio podem chegar a 900 mil toneladas. Em potencial energético, é comparável ao pré-sal".

Reação nuclear 3
O presidente da Aben só vê política na atitude do governo alemão. "A Alemanha abriga mais de uma dezena de bombas do arsenal nuclear americano. Nada foi dito sobre isso", provoca.


ORÇAMENTO
Câmara aprova criação de 90 cargos comissionados
Impacto anual estimado é de R$7,6 milhões; se não houver recurso, proposta vai ao Senado

BRASÍLIA. A Comissão de Constituição e Justiça da Câmara aprovou ontem a criação de 90 cargos comissionados (cargos de Direção e Assessoramento, DAS) e oito funções gratificadas para órgãos da Presidência da República. Dos 90 cargos, 19 são para o gabinete pessoal da Presidência, 18 para a Casa Civil e 24 para o Gabinete de Segurança Institucional (GSI). Segundo o projeto do governo, enviado em 2008, o impacto orçamentário anual estimado era de R$7,6 milhões. A proposta foi aprovada em caráter conclusivo e, se não houver recurso para votação pelo plenário da Casa, segue para o Senado.
Na justificativa do projeto, o então ministro do Planejamento, Paulo Bernardo, diz que os cargos da Casa Civil tinham como objetivo reforçar e otimizar ações do Programa de Aceleração do Crescimento. Em relação a outros órgãos, a justificativa é a necessidade de fortalecimento das estruturas. Mesmo depois de aprovação final do projeto de criação dos cargos, eles não são necessariamente preenchidos. O governo dispõe de um grande estoque de cargos já aprovados, mas não preenchidos.
O projeto já tinha sido aprovado em 2009 na Comissão do Trabalho e, no ano passado, na Comissão de Finanças e Tributação.
Também ontem a CCJ aprovou a admissibilidade de emenda constitucional que altera a data de posse do presidente da República e de governadores e prefeitos. Pelo projeto, que ainda precisa ser apreciado em comissão especial de mérito, os presidentes tomariam posse no dia 4 de janeiro, e prefeitos e governadores, no dia 3 de janeiro. Atualmente, as posses ocorrem no dia primeiro de janeiro. Proposta semelhante já foi aprovada pela Comissão de Reforma Política do Senado.


PANORAMA POLÍTICO
Ilimar Franco

O PRESIDENTE da Ucrânia, Viktor Yanukovich, adiou para outubro sua visita ao Brasil. Até lá, espera obter recursos internacionais para colocar, pelo menos, US$80 milhões na Binacional Cyclone Space.


VIOLAÇÃO DE SIGILO DE INVESTIGAÇÕES
'Mordaça' é aprovada em comissão da Câmara
Projeto torna crime vazamento e publicação de dados de investigações criminais sob sigilo. Jornalistas podem ser punidos

BRASÍLIA. A Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara aprovou ontem projeto que tipifica como crime vazamento de informação de investigação criminal sob sigilo. O projeto, que agora vai à votação no plenário, também proíbe a divulgação dessas informações. Ou seja, caso jornalistas divulguem alguma informação também poderão ser enquadrados no crime, que prevê pena de dois a quatro anos de prisão, além de multa.
De autoria do deputado Sandro Mabel (PR-GO), o texto foi modificado pelo relator na CCJ, Maurício Quintella Lessa (PR-AL). A proposta original classificava como crime a divulgação e o vazamento de qualquer tipo de informação que fosse objeto de investigação oficial.
Maurício Quintella restringiu o crime às apurações criminais, mas deixou claro que a nova tipificação será aplicada não só ao servidor que vazar a informação, mas também a quem divulgá-la na imprensa.
O relator alegou que a legislação brasileira não tem um mecanismo para punir e desencorajar a violação de sigilo de investigações. "O sigilo legal tem sua razão de ser pela própria natureza das investigações, no sentido de dar eficácia às ações investigativas até que se forme o convencimento da autoridade, que então levantará as medidas cabíveis. Não há espaço, portanto, para que tais informações sejam veiculadas, até porque não haveria necessidade nem mesmo utilidade para tal divulgação", sustentou o relator em seu voto. O relator reclama ainda do que chamou de "perigosa relação" entre autoridades e meios de comunicação de massa. "Muitas vezes, os danos são irreparáveis à honra e à intimidade, e, quando a pessoa investigada é absolvida, estranhamente, este fato não desperta o mesmo interesse midiático", disse em seu voto.


NOTAS

Bolívia desconvida iraniano
Diante dos protestos da Argentina, o governo de Evo Morales pediu ontem que o ministro da Defesa do Irã, Ahmad Vahidi, deixasse a Bolívia. Vahidi é acusado de planejar um ataque a bomba contra uma comunidade judaica em Buenos Aires, que matou 85 pessoas em 1994. Em carta à Chancelaria argentina, La Paz pediu desculpas pela presença de Vahidi no país.

Exército apreende 117 bananas de dinamite
Uma operação do Exército apreendeu ontem 117 bananas de dinamite e um rolo de cordel usado na detonação de pedreiras na tarde de ontem, no interior de Frederico Westphalen. A Operação Fronteira Sul está fiscalizando cidades distantes até 200 quilômetros da fronteira. O responsável pelos produtos, que não tinha autorização para armazenar dinamites, foi preso.

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