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segunda-feira, 20 de junho de 2011

20 de junho 2011 - ESTADO DE SÃO PAULO


Início do conteúdo Mangueira é ocupada sem resistência
Operação para instalar UPP na favela carioca foi feita sem disparos; defensores públicos acompanharam subida para impedir abusos

Clarissa Thomé - O Estado de S.Paulo

Sem tiros, sem baixas. O Morro da Mangueira, na zona norte do Rio, foi tomado em cinco horas por cerca de 750 homens das Polícias Civil e Militar, além de fuzileiros navais. Parte deles subiu a favela protegida em 14 veículos blindados, seis deles da Marinha. Não houve reação do tráfico. A favela, berço da Estação Primeira de Mangueira, é a 18.ª a receber uma Unidade de Polícia Pacificadora (UPP).
O Morro da Mangueira foi classificado pelo secretário de Segurança, José Mariano Beltrame, como um "local complexo, histórico". "Dificilmente as instituições policiais entravam numa área dessas sem haver troca de tiros. Hoje se conseguiu isso sem disparar um tiro, sem ferir ninguém", afirmou. Ele defendeu a estratégia de "guerra anunciada", em que a ocupação tem hora marcada para começar. "Hoje foi devolvido um território para 20 mil pessoas."
A ocupação começou às 6h, antes de o dia amanhecer. Quatro helicópteros - dois deles blindados - sobrevoaram o morro e transmitiram imagens da favela para o centro de comando. Em seguida, os blindados subiram por diferentes acessos da Mangueira. Na entrada do Buraco Quente, onde funcionava a principal boca de fumo, moradores estenderam um pano branco com a palavra "paz".
Pela primeira vez, policiais levaram radiotransmissores com GPS. O aparelho, ainda em teste, dava a localização exata da tropa. O dispositivo permite deslocar as equipes com mais precisão e também facilita a apuração de possíveis desvios de conduta, como os ocorridos na tomada do Complexo do Alemão, quando policiais saquearam casas.

Inovações. Outra novidade foi a ocupação de redutos do Comando Vermelho em outros pontos da cidade e até em Macaé, no interior do Estado. A estratégia visou a evitar possíveis reações pela operação na Mangueira.
Esta também foi a primeira vez em que defensores públicos acompanharam a abordagem do Batalhão de Operações Especiais (Bope), a fim de garantir os direitos dos moradores. Até mesmo a revista das casas teve de ser autorizada. "A abordagem foi feita com respeito. A entrada nas casas também foi feita com observância de requisitos legais", afirmou o defensor Luís Felipe Drummond.
Às 11 horas, sem grande comemoração, as bandeiras do Brasil e do Estado do Rio foram hasteadas no alto da Caixa D"Água, no Morro dos Telégrafos, uma das favelas que compõem o Complexo da Mangueira. Os moradores assistiram à cena sem esboçar reação. Dois helicópteros sobrevoaram o local e lançaram milhares de panfletos, em uma "ação psicológica", pedindo a ajuda da população para localizar criminosos foragidos e o paiol do tráfico. Até o início da noite, a polícia havia recuperado 32 veículos roubados, apreendido 35 quilos de maconha e um fuzil. Três pessoas, incluindo dois adolescentes, foram presas com drogas.


Tomada completa 'cinturão' para Copa e Olimpíada

Pedro Dantas - O Estado de S.Paulo

A ocupação do Morro da Mangueira, localizado a 2 km do Estádio do Maracanã, fechou o cinturão de segurança na região onde serão realizadas as principais atividades da Copa do Mundo de 2014 e da Olimpíada de 2016. Desde maio, quando o governo anunciou a nova UPP, moradores relataram que as lideranças do tráfico fugiram da favela.
O morro é apontado como um dos principais entrepostos da facção criminosa Comando Vermelho para distribuição de entorpecentes. O líder do tráfico na favela seria Alexander Mendes da Silva, o Polegar, de 35 anos, que continua foragido.
Em setembro de 2009, mesmo acusado de quatro homicídios na prisão, ele progrediu para o regime aberto "por bom comportamento" e nunca voltou para dormir na cadeia.


Vitoriosa, escola de samba dá fama à comunidade

Fernando Paulino Neto - O Estado de S.Paulo

Na tarde de 28 de abril de 1928, Saturnino Gonçalves era esperado em casa para o aniversário de 5 anos de sua filha Cecéia. O tempo passava e ele não chegava, deixando a família preocupada. Às 23h, abriu a porta de seu barraco, no Morro da Mangueira, e anunciou: "Minha filha, cheguei atrasado no seu aniversário, mas te trouxe de presente uma escola de samba, a Estação Primeira de Mangueira."
Saturnino vinha da reunião de fundação da escola de samba da Mangueira, da qual foi seu primeiro presidente. Nesta mesma reunião, Angenor de Oliveira, o Cartola, deu à agremiação as tradicionais cores verde e rosa, em homenagem ao bloco dos Arrepiados, de Laranjeiras, na zona sul do Rio, onde morava antes de se mudar para lá.
A fundação da escola foi a coroação de um movimento de união dos muitos blocos do morro. Sucesso imediato. No primeiro desfile oficial do Rio, de 1932, a Mangueira sagrou-se campeã. Hoje, são 18 títulos.
Além dos desfiles memoráveis, saíram da Mangueira alguns dos grandes compositores do samba e da música popular brasileira: Cartola, Carlos Cachaça, Nelson Cavaquinho, Geraldo Pereira, Padeirinho, Nelson Sargento, Xangô e Tantinho, por exemplo. A lista é imensa e os versos de Cartola em Fiz por você o que pude resumem a proficuidade desta árvore frondosa: "Continuam nossas lutas/Podam-se os galhos colhem-se as frutas/E outra vez se semeia/E no fim deste labor/Surge outro compositor/Com o mesmo sangue nas veias".


ENTREVISTA - TANTINHO, cantor e sambista do Morro da Mangueira
''Ninguém quer viver no meio do fogo cruzado'', diz partideiro

Fernando Paulino Neto - O Estado de S.Paulo

Devani Ferreira tem 64 anos e mora em Jacarepaguá. Cada vez que bota os pés na Mangueira, começa o zum-zum-zum, "hoje tem samba no morro, Tantinho está na área". A fama não é à toa. O mais talentoso cantor e "partideiro" - especialista no improviso do partido-alto, um tipo de samba - atual da Mangueira espera a volta da tranquilidade de tempos atrás, quando os bambas da Estação Primeira cantavam samba nas incontáveis tendinhas e biroscas do Morro.

Como era a Mangueira quando você morava lá?
Lá no morro sempre teve malandros, mas naquela época romântica era muito mais tranquilo. Agora é mais agitado.

O que fez você sair de lá?
Naquela época (início da década de 80) começaram a chegar uns caras estranhos. O malandro de fora não tem compromisso. Os caras eram agressivos e isso acabou com o clima.

Com a pacificação, o clima das tendinhas de rodas de samba pode voltar?
Vai trazer tranquilidade para os mais velhos e para as crianças brincarem. Ninguém quer viver em meio a fogo cruzado. Acho que vai melhorar.

ESPAÇO ABERTO
A hora e a vez das energias renováveis

*José Goldemberg

O desastre nuclear de Fukushima abriu caminho para uma reavaliação do papel da energia nuclear no mundo e de outras opções para produção de energia que poderão substituí-la. Essas opções não serão as mesmas em todos os países.
O Japão decidiu dar ênfase maior à eficiência energética, apesar de o país ser muito eficiente; a Alemanha, à energia dos ventos (eólica); e a Suécia, à biomassa. Gás natural será também usado como fonte de energia num período de transição, até que outras energias renováveis - como a captação direta de energia solar - se tornem competitivas.
Nesse contexto, o Brasil encontra-se em posição privilegiada, com boa parte do seu potencial hidrelétrico ainda inexplorado e, sobretudo, com o uso da biomassa, que em nosso país significa etanol da cana-de-açúcar na Região Sudeste e produção de eletricidade.
No que se refere à hidreletricidade, quer em pequenas centrais hidrelétricas ou em grandes empreendimentos, o que tem impedido a sua expansão é uma combinação de projetos mal formulados pelos empreendedores e um comportamento passivo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A Empresa de Pesquisa Energética (EPE) fez, com grande atraso, o levantamento de pelo menos 20 empreendimentos hidrelétricos em várias regiões do País, incluindo a Amazônia, com potencia total de 32 milhões de quilowatts. Há cerca de 16 milhões de quilowatts disponíveis na Amazônia, além de Belo Monte. São locais onde é possível construir hidrelétricas de porte médio, de 500 a 1.000 megawatts, que não causarão grandes impactos ambientais.
Seria importante analisar se nesses locais não se poderiam também prever reservatórios que regularizassem o curso dos rios e armazenassem água para os períodos secos. Um dos grandes problemas do setor elétrico brasileiro - a principal causa do desastroso racionamento de 2001 - se deve ao fato de que, desde 1986, as usinas hidrelétricas construídas no País não têm reservatórios para evitar o alagamento de áreas ribeirinhas.
No que se refere às pequenas centrais hidrelétricas - existem centenas no País que deveriam ser aproveitadas -, é indispensável que o Ibama adote um método de licenciamento simplificado e deixe de tratá-las como se fossem grandes empreendimentos. Mais ainda, os órgãos licenciadores deveriam ser mais proativos, ajudando os empreendedores a melhorar os seus projetos, já que esses órgãos (nos Estados e em Brasília) são os que têm melhores técnicos. Uma maior cooperação do Ministério Público também ajudaria, o que significa mais diálogo entre os diversos atores envolvidos.
Na área de cana-de-açúcar, grandes progressos podem ser feitos para manter na matriz energética uma grande parcela de renováveis, tanto na produção de álcool como na produção de eletricidade.
Atualmente, metade da gasolina que se consumiria no País, se o programa do álcool não existisse, já foi substituída por etanol, mas é preciso progredir mais nesse sentido. Graças à introdução dos automóveis "flexfuel", em 2003, mais de 90% dos carros novos são desse tipo e, a prosseguir essa tendência, o álcool substituirá 80% ou 90% da gasolina até o ano 2020. Isso ajudará muito para que o governo do Estado atinja as metas que adotou com a finalidade de reduzir as emissões de gases que causam o aquecimento global em 20% até 2020, em comparação com o ano de 2005. A vantagem adicional, nesse caso, é que a substituição de gasolina e óleo diesel por etanol melhora também a qualidade do ar nas grandes metrópoles, porque o etanol da cana-de-açúcar não contém as impurezas que se encontram nos derivados de petróleo.
No que se refere a São Paulo, vale lembrar que boa parte da frota de automóveis que circula na cidade é antiga. O que caberia, aqui, são medidas da Prefeitura para "aposentar" os carros mais antigos e encorajar a sua substituição por automóveis "flexfuel". Essa estratégia tem sido usada em outros países onde se usa gasolina para modernizar a frota circulante: os carros mais modernos são mais eficientes e consomem menos combustível por quilômetro rodado.
"Modernizar" a frota com carros "flexfuel" tem uma vantagem adicional: o etanol é um combustível renovável, de modo que o resultado que se deseja, que é o de reduzir as emissões de gases de efeito estufa, é alcançado mais rapidamente. A modernização pode ser encorajada reduzindo o Imposto sobre a Propriedade de Veículos Automotores (IPVA) dos carros "flexfuel" e auxiliando proprietários de veículos antigos a trocá-los por novos com financiamentos atraentes. Em alguns países o governo compra os veículos antigos para sucateá-los.
Acelerar o aumento da frota "flexfuel" de automóveis teria a vantagem adicional de fazer crescer o consumo de álcool e ajudar o setor produtivo a superar as dificuldades que tem atravessado nos últimos anos. Com o aumento da produção de etanol, aumentaria também a quantidade de bagaço disponível para gerar eletricidade, o que complementaria a geração hidrelétrica.
Finalmente, no que se refere à utilização de energia eólica para a produção de eletricidade, os leilões realizados para esse tipo de energia têm levado a uma redução dos preços da energia produzida. Com isso a participação da energia eólica deve aumentar muito até 2020. Como reconhece agora a EPE no seu novo Plano Decenal de Expansão de Energia. A intermitência dos ventos, que era considerada um problema, foi totalmente superada pelas tecnologias modernas. Só para dar um exemplo, o sistema elétrico da Espanha tem cerca de 20 mil fontes de energia (a maioria proveniente de pequenos grupos de energia eólica) e funciona muito satisfatoriamente.
Não é por falta de opções que poderia ocorrer uma crise de energia no País.

*PROFESSOR DA UNIVERSIDADE - DE SÃO PAULO (USP)


Resgate da memória

*Denis Lerrer Rosenfield - O Estado de S.Paulo

A polêmica sobre tornar públicos documentos do Estado brasileiro considerados ultrassecretos envolve questões fundamentais que dizem respeito ao resgate da memória do País. A questão do sigilo desses documentos não poderia nem deveria ser objeto de barganhas partidárias ou outras, porque compromete a compreensão da nossa própria História. A História do Brasil deveria situar-se para além de qualquer disputa política.
O projeto de lei que tramita no Senado, depois de ter sido aprovado na Câmara dos Deputados, estipula em 25 anos, com uma única renovação possível, o período máximo do sigilo, o que já é até um tempo abusivo, pois significa meio século de desconhecimento de um período relevante do País. Agora, a alegação de que mesmo esse período seria curto, exigindo uma espécie de segredo eterno, foge a qualquer regra de razoabilidade. O País tem o direito de conhecer sua própria História, qualquer que seja, mesmo que escape aos cânones atuais do politicamente correto. Arquivos históricos não deveriam estar submetidos às intempéries da política.
A História das nações não é a história do politicamente correto. Nações não são anjos, nem os homens estão voltados necessariamente para o bem, tendo, igualmente, propensão para o mal. Hegel já dizia que a História não é o lugar da felicidade. Pretender impor retroativamente critérios atuais do certo e do errado significa desconhecer a própria natureza humana.
Argumentos têm sido veiculados de que a divulgação desses documentos comprometeria nossas relações com Estados vizinhos, em particular com o Paraguai, em razão da guerra travada com esse país no século 19, e com a Bolívia, a propósito das ações do barão de Rio Branco na demarcação do Estado do Acre. Ora, o traçado de fronteiras, em toda a História da humanidade, envolveu guerras e os mais diferentes tipos de contratos e tratados. São fatos que deveriam ser reconhecidos como tal. Pensar diferentemente é como se apenas o Brasil devesse "envergonhar-se" do seu passado.
Mais importante ainda, deixamos de conhecer uma parte importante da nossa História que só a abertura desses arquivos poderia propiciar. Países aprendem com seus erros e acertos, assim como as pessoas. Quem esconde algo é porque nada quer aprender. A ignorância não é uma lição de aprendizagem.
Aliás, o que poderia acontecer nas relações atuais com o Paraguai e a Bolívia, se eles tivessem acesso a tais documentos, se é que já não os possuem? Reivindicariam territórios e ameaçariam militarmente o Brasil? Invadiriam o País em nome de sua "causa"? Essa hipótese não tem o menor cabimento. Nada aconteceria. As fronteiras brasileiras permaneceriam como estão, não havendo nenhuma modificação.
Os EUA travaram uma longa guerra com o México que mudou as fronteiras desses países. O México perdeu vários territórios. Os documentos do que aconteceu são públicos e as fronteiras atuais dos dois países nem por isso foram alteradas. Os EUA, ademais, compraram o Alasca do czar da Rússia no século 19, tendo esse território se tornado um Estado americano. O episódio é conhecido e, no entanto, não haverá nenhuma modificação de fronteiras. Alguns podem mesmo considerar o preço pago barato demais!
A Europa, em passado recente, posterior à 2.ª Guerra Mundial, foi objeto de um redesenho de suas fronteiras entre os vencedores e os vencidos. Um mapa do século 19 é muito diferente de um mapa do início do século 20. Alguns Estados podem estar descontentes, porém nada disso alterará o atual traçado. A Lorena e a Alsácia sempre foram objeto de litígio entre a Alemanha e a França. As atuais fronteiras, contudo, não são objeto de contestação, ainda que tenham sido fruto de um fato de guerra.
O mesmo vale para a discussão quanto a tornar públicos os documentos relativos ao regime militar no nosso país. Todos os documentos deveriam estar à disposição do público, em particular dos historiadores, que poderiam trabalhar com fontes de primeira mão. O problema não diz respeito a torturadores nem aos que pegaram em armas para instalar um regime comunista no Brasil. Embora de um ponto de vista ideológico a questão seja frequentemente posta dessa maneira, o problema é muito mais abrangente, porque diz respeito ao conhecimento das gerações atuais em relação à própria História nacional.
Se o País tem o direito de conhecer a tortura que ocorreu num determinado período, tem igualmente o direito de saber sobre os assassinatos e justiçamentos cometidos pelos que pretendiam impor aqui um regime totalitário. Se se fala da Comissão da Verdade, ela não pode omitir nenhum fato, sob pena de se tornar uma Comissão da Mentira.
Ressalte-se que se trata da História, da memória e do conhecimento. Não está aqui em questão uma suposta revisão da Lei da Anistia, assunto já pacificado do ponto de vista do Supremo Tribunal Federal e novamente confirmado pela Advocacia-Geral da União. O País pode se relançar sobre nossas bases, que perduram até hoje, tendo propiciado o mais longo período de democracia nacional. Um país só pode recomeçar se fizer uso do perdão - algo central, aliás, da doutrina cristã. Um país que não sabe repactuar-se consigo é um país imerso em revanches e vinganças de ambos os lados, que por isso mesmo se tornam intermináveis.
Eis por que o Brasil tem o direito de conhecer integralmente a sua própria História, algo que não diz respeito a pseudodenominações de "esquerda" e "direita", nem a questões de política externa baseadas no segredo e na ignorância nacional. Somente pelo resgate da própria memória um país pode trilhar um outro caminho, diferente em muitos aspectos de outros do seu passado. O futuro só se esboça verdadeiramente diferente graças ao pleno conhecimento do passado.

*PROFESSOR DE FILOSOFIA NA UFRGS. - E-MAIL: DENISROSENFIELD@TERRA.COM.BR



ACIDENTE
Piloto de helicóptero que caiu na Bahia estaria irregular

Eliana Lima - O Estado de S.Paulo

O empresário Marcelo Mattoso de Almeida, de 48 anos, que pilotava o helicóptero que caiu na noite de sexta-feira em Porto Seguro, na Bahia, com sete pessoas a bordo, teria situação irregular, segundo o site da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac). Quatro pessoas morreram no acidente e três continuavam desaparecidas na noite de ontem - incluindo o piloto e Mariana Noleto, namorada de um dos filhos do governador do Rio, Sérgio Cabral.
Hoje a Anac deve dar informações mais precisas sobre supostas irregularidades na habilitação do piloto. Mas a consulta do número de matrícula de Almeida no site da agência aponta vários problemas no cadastro do empresário.
Segundo o site, a licença médica de Almeida está vencida desde agosto de 2006. Pelas normas da aviação, pilotos com mais de 40 anos devem realizar exames todos os anos; com menos de 40, uma vez a cada dois anos. Para pilotar um Esquilo - modelo de helicóptero do acidente - Almeida deveria ter habilitação AS 350 ou 355, o que não consta da sua licença.
O empresário seria habilitado para conduzir quatro tipos diferentes de helicópteros, mas todas as licenças estariam vencidas há pelo menos cinco anos. Segundo o site, ele também não teria outra habilitação importante, a de IFR (regras de voos por instrumento, na sigla em inglês), que permite a realização de voos noturnos.
O perito em aviação Roberto Peterka afirma que, se as informações do site da Anac estiverem atualizadas, Almeida não deveria comandar o helicóptero em hipótese alguma. Ele destacou que, se os dados estiverem corretos, o empresário colocou em risco a vida dos passageiros.
Segundo o perito, um piloto sem os conhecimentos de orientação por instrumentos também não poderia ter decolado à noite e sob chuva. "Nos casos de visibilidade fechada, a chance de sofrer uma desorientação espacial é de 95% ou mais. Ele não sabe a posição da máquina, se está de lado ou de ponta-cabeça", explicou Peterka.

Buscas. Na noite de ontem, voluntários que usavam uma lancha para fazer buscas na região encontraram a cabine do helicóptero. Às 20h30, mergulhadores da Marinha confirmaram a localização do compartimento, a 250 metros da costa e a 10 metros de profundidade. Segundo o capitão Jorge Cordeiro, no comando das operações, a água estava muito turva para que as equipes confirmassem a presença de vítimas no equipamento, que estava bastante danificado.
Duas embarcações - o navio patrulha Gravataí e o navio varredor Albardão -, que já estavam acionados para continuar as buscas durante a madrugada, ficariam no local até o nascer do sol. Com o clarear do dia, os mergulhadores fariam novas buscas nas proximidades e no interior da aeronave. / COLABOROU WILLIAM CARDOSO



Helicóptero que caiu na Bahia é localizado pela Marinha
Aeronave, que caiu em Trancoso, no sul da Bahia, está a 250 metros da costa e a cerca de 10 metros de profundidade


Pedro da Rocha, do estadão.com.br


SÃO PAULO - A Marinha do Brasil confirmou, na noite de domingo, 19, ter encontrado os destroços do helicóptero que caiu em Trancoso, no sul da Bahia. Segundo comunicado, mergulhadores verificaram que "a aeronave encontra-se a 250 metros da costa e a cerca de 10 metros de profundidade".
A aeronave está bastante danificada, impossibilitando, em um primeiro momento, identificar se há vítimas em seu interior. A Marinha afirmou ainda que "o período noturno e a baixa visibilidade da água dificultam bastante a ação dos mergulhadores".
Navios permanecerão no local dos destroços durante a noite. Os mergulhadores retornarão as buscas no nascer do sol. Até o momento, dos sete ocupantes do helicóptero, quatro foram resgatados sem vida.



Vítimas são enterradas na zona sul do Rio


Daniela Amorim - O Estado de S.Paulo


O vocalista da banda Biquini Cavadão, Bruno Gouveia, acompanhou o sepultamento da ex-mulher Fernanda Kfuri, de 35 anos, e do filho Gabriel Kfuri Gouveia, de 2 anos e 10 meses, ontem à tarde no Rio. Fernanda e Gabriel estavam entre os quatro mortos no acidente de helicóptero em Porto Seguro, na Bahia. O enterro ocorreu por volta das 15h30 no Cemitério São João Batista, na zona sul, após um velório restrito a parentes e amigos.
O cantor só recebeu a notícia sobre a morte do filho e da ex-mulher em sua chegada ao Brasil, ontem de manhã. Bruno estava em viagem com a banda aos Estados Unidos, onde preparavam um CD, e a família preferiu contar sobre o acidente pessoalmente, chegando a pedir aos fãs e amigos que não postassem mensagens no Facebook ou no Twitter da banda.
"É certamente um dos dias mais tristes da vida dele", disse Carlos Coelho, guitarrista do Biquini Cavadão. "Ele perdeu duas das pessoas mais importantes da vida. Ele está sofrendo muito", contou Miguel Flores da Cunha, tecladista da banda.
O corpo de Luca Kfuri de Magalhães Lins, de 3 anos - primo de Gabriel e filho de Jordana, ainda desaparecida -, foi enterrado no mesmo cemitério, na noite de anteontem.



PANORÂMICA
Melina Costa e Patrícia Cançado - O Estado de S.Paulo


AVIAÇÃO
TAM prepara o lançamento de nova empresa
A TAM pretende transformar seu centro de manutenção de aviões em uma empresa independente da companhia aérea. O grupo já procura no mercado um executivo que possa assumir o comando da operação e, até o ano que vem, a novata receberá um CNPJ próprio. Depois disso, a ideia é buscar um sócio entre outros operadores de centros de manutenção espalhados pelo mundo. Hoje, o principal cliente do centro localizado em São Carlos (interior de São Paulo) é a própria TAM, que tem perto de 150 aviões. Se a fusão com a LAN for aprovada, serão 100 novas aeronaves. O movimento faz parte da estratégia de criação de filhotes da TAM. O primeiro foi a Multiplus, empresa que administra o programa de fidelidade da companhia e que já vale quase tanto quanto a TAM na bolsa.


INTERNACIONAL/AFEGANISTÃO
EUA admitem negociar com Taleban para acelerar saída do Afeganistão
Às vésperas de Washington definir dimensão de retirada de tropas do país, secretário da Defesa americano confirma - pela 1ª vez - informação dada por presidente afegão; no entanto, resultados das conversas, se confirmadas por grupo, podem demorar meses

Gustavo Chacra - O Estado de S.Paulo

Às vésperas de o governo de Barack Obama definir a dimensão da retirada das tropas do Afeganistão, o secretário da Defesa dos Estados Unidos, Robert Gates, admitiu ontem que diplomatas americanos iniciaram negociações preliminares com integrantes do Taleban nas últimas semanas. Na véspera, o presidente afegão, Hamid Karzai, já tinha dado declaração indicando a existência desse diálogo.
Até este fim de semana, os EUA jamais haviam confirmado especulações sobre negociações com a milícia afegã. As tratativas também sempre foram negadas pelo Taleban.
Mesmo depois das afirmações de Gates e do presidente do Afeganistão, a milícia aliada da rede terrorista Al-Qaeda não assumiu que participa deste diálogo.
Os resultados dessas conversas podem demorar meses, segundo o chefe do Pentágono, e tampouco existem garantias de que os interlocutores seriam legítimos representantes do mulá Mohamed Omar, líder da organização.
"Minha opinião é a de que uma reconciliação real não ocorrerá antes do inverno (no Hemisfério Norte, verão no Brasil)", disse Gates, que deixará o posto de secretário no fim do mês, depois de servir tanto na administração de George W. Bush como na de Obama.
"Antes de ter uma conversa séria, eu acredito que o Taleban precisa se sentir sob pressão militar para perceberem que não podem vencer", acrescentou Gates em entrevista para a rede de TV CNN ontem, citando os avanços das forças americanas e aliadas nas Províncias de Kandahar e de Helmand, antigos redutos da milícia.
Karzai, no sábado, disse que "as negociações com o Taleban haviam começado" e "forças americanas" também estavam participando.
Segundo o secretário da Defesa dos EUA, "o Taleban precisará respeitar determinadas condições para a reconciliação, incluindo o fim da aliança com a Al-Qaeda e o apoio à Constituição do Afeganistão".
O grupo, aliado da rede terrorista, foi derrubado do poder depois do 11 de Setembro na ofensiva liderada pelos americanos por dar guarida à organização de Osama bin Laden.
Nos próximos dias, o presidente dos EUA precisará decidir qual será o tamanho da retirada americana do Afeganistão, onde há mais de 100 mil militares americanos, sem falar nas dezenas de milhares de contratados de empresas terceirizadas.
Desde que assumiu o poder, Obama já enviou 65 mil tropas adicionais ao país da Ásia Central para lutar contra a Al-Qaeda e o Taleban.
Depois da bem sucedida operação para matar Bin Laden, em maio, e diante dos gastos bilionários com o conflito que já dura quase dez anos, cresceu, nos últimos meses, a pressão para uma retirada maior do contingente americano, indicando claramente que as operações americanas estejam próximas do fim. No entanto, membros das Forças Armadas acham prematura uma redução brusca neste momento, uma vez que ela poderia colocar em risco os avanços conquistados pelo aumento das tropas.
"Nós apresentaremos opções ao presidente com diferentes riscos associados a cada uma delas e ele decidirá qual a melhor delas", disse Gates.
Na avaliação do secretário da Defesa, o conflito no Afeganistão deve terminar de uma forma semelhante ao do Iraque, com os americanos assumindo "o papel de montar as forças de segurança e de reduzir a capacidade operacional do Taleban para que as forças afegãs tenham condições de lutar sozinhas".

Fundamentalismo. Formado no fim dos anos 90 com o apoio velado do serviço secreto do vizinho Paquistão, o Taleban ("estudantes", em árabe) saiu das madrassas (escolas corânicas) paquistanesas e, pelas armas, tomou o poder no Afeganistão. A milícia adotou a sharia - código penal islâmico - e impôs no país a interpretação literal do Alcorão, proibindo TVs e filmes e forçando mulheres ao uso da burca, vestimenta que cobre o corpo todo.


3 RAZÕES PARA...
Crer na retirada das tropas

1. Restrição da Al-Qaeda. Ações militares com o uso de aviões não tripulados e pressão diplomática sobre o vizinho Paquistão vem erodindo o apoio que a rede terrorista encontrava nas áreas tribais paquistanesas.

2. Cooptação de "senhores da guerra" afegãos. O governo de Hamid Karzai manteve contatos com vários líderes locais, que, na prática, formam a base de apoio do Taleban. Alguns foram incluídos no gabinete.

3. Crise americana. Em momento de crise econômica, a opinião pública americana mostra-se cada vez mais irritada com o alto custo da guerra, estimado em mais de US$ 65 bi anuais só no Afeganistão.

INTERVENÇÃOAMERICANA
AÇÕESNOAFEGANISTÃO ABRIRAMCAMINHOPARA CONTATOCOMREBELDES

1. O início da ação
Em outubro de 2001, coalizão lança ataque por recusa do Taleban de entregar Bin Laden.

2. A ocupação
Apoiada pelo Ocidente, milícias depõem governo Taleban em novembro.

3. O novo regime
Hamid Karzai é escolhido para liderar governo afegão; caçada a Al-Qaeda se intensifica.

4. Os combates
Guerra mata mais de 4mil americanos e custa bilhões de dólares para Pentágono.

5. O grande trunfo
Operação mata Bin Laden no Paquistão e abre caminho para negociação com rebeldes.


Ato no Rio pede fim de assédio a bahais no Irã

Cerca de 800 pessoas, segundo os organizadores, participaram ontem de uma manifestação contra a perseguição sofrida no Irã pelos adeptos da religião Bahai.Durante o ato, na Praia de Copacabana, foram fincadas na areia 7.747 máscaras com fotos do rosto de 7 líderes bahais iranianos, cujo período em detenção pelas autoridades do Irã soma 7.747 dias.
Segundo Iradj Eghrari, secretário nacional da Comunidade Bahai no Brasil, a manifestação teve como objetivo revelar aos brasileiros a dramática situação vivida pelos baha"is no Irã.
A religião bahai surgiu no Irã (antiga Pérsia) no século 19 e desde então seus seguidores sofrem grave perseguição no país. Há cerca de 300 mil bahais no Irã e 65 mil no Brasil. "Nos últimos 30 anos, mais de 200 baha"is foram mortos e centenas de outros aprisionados", afirmou Eghari.


VISÃO GLOBAL
O possível início do fim da Otan
Se europeus não aprimorarem capacidade militar, aliança pode tornar-se irrelevante

*Judy Dempsey, do The International Herald Tribune - O Estado de S.Paulo

O secretário americano da Defesa, Robert Gates, sabe como expor seus pensamentos. Em discurso feito na sexta-feira em Bruxelas, seu último na Europa antes de deixar o cargo, Gates criticou duramente a Otan.
O secretário alertou os europeus para o fato de que, se eles não aprimorarem suas capacidades militares, gastarem mais com a defesa e reunirem seus recursos, a Otan enfrenta "uma possibilidade bastante concreta de cair numa irrelevância militar coletiva".
Os europeus estão acostumados às críticas de Washington. Os Estados Unidos faziam comentários deste tipo mesmo durante a Guerra Fria, quando o continente estava dividido entre os soldados da Otan defendendo a Europa Ocidental e as forças do Pacto de Varsóvia de prontidão na Europa Oriental.
Naquela época, os europeus em geral aceitavam resignados as críticas americanas. Eles sabiam que a ameaça era real e precisavam dos soldados americanos para protegê-los. Ainda em 1999, depois de ficarem com os ouvidos quentes, os europeus ajudaram a bombardear a Sérvia na tentativa de encerrar quase uma década de guerra civil e limpeza étnica na ex-Iugoslávia, atrocidades que ocorriam no próprio quintal da Europa.
Mas agora, com exceção da Grã-Bretanha e da França, a maioria dos países europeus não vê a necessidade do poderio militar. Eles parecem não acreditar que a força militar seja capaz de solucionar conflitos. E apesar dos ataques terroristas de 11 de setembro de 2001 contra os EUA, os europeus não se sentem tão ameaçados quanto os americanos. De acordo com os analistas, é isto que está prejudicando o relacionamento transatlântico.
"Os EUA são uma potência global, ao passo que a Europa pensa em moldes regionais e acredita estar cercada de aliados", disse Markus Kaim, especialista em defesa do Instituto Alemão para Assuntos Internacionais e de Segurança, em Berlim. "Os EUA percebem como esta desmilitarização está prejudicando a Otan."
Apenas 5 dos 28 membros da Otan - EUA, Grã-Bretanha, França, Grécia e Albânia - gastam na defesa os 2% de seu PIB conforme o estipulado por acordo. Desde o colapso do Muro de Berlim em 1989, "a parcela dos gastos americanos defensivos com a Otan aumentou 75%, num momento em que cortes orçamentários politicamente dolorosos e reduções nos benefícios sociais são debatidos no país", disse Gates.
"Se esta tendência se mantiver, ou seja, se os europeus não se mostrarem dispostos a arcar com uma parcela maior deste fardo, então o relacionamento transatlântico se verá diante de uma grave ameaça. Pode até ser que, nos próximos anos, o mundo deixe de falar na Otan", disse Andrew A. Michta, diretor do gabinete do Fundo Marshall Alemão dos Estados Unidos em Varsóvia.

Conflito. Os EUA não foram capazes de mobilizar o apoio da Otan quando invadiram o Iraque em 2003. Em vez disso, o país deve de contar com uma "coalizão dos dispostos", prejudicando a coesão da aliança. As fissuras foram maquiadas conforme os europeus continuaram a ajudar os EUA no Afeganistão, ainda que relutantemente.
De fato, Gates disse ter ficado surpreso com a persistência da Otan no Afeganistão, uma guerra muito impopular nas capitais europeias. "Quatro anos atrás, eu nunca teria esperado que a aliança mantivesse a operação neste nível por tanto tempo, e muito menos que houvesse em 2010 um aumento significativo nos efetivos empregados", disse ele na reunião em Bruxelas.
O contraste com a atual campanha aérea contra a Líbia não poderia ser mais gritante.
"Apesar de todos os membros da aliança terem votado a favor da intervenção na Líbia, menos da metade deles de fato participou da missão, e menos de um terço se dispôs a se envolver nos voos e bombardeios", disse Gates, referindo-se ao Conselho da Otan para o Atlântico Norte, e não às Nações Unidas, foro em que a Alemanha se absteve da votação. Ele atribuiu a responsabilidade por isto à falta de capacidades militares.
E a vontade política é outra que se faz ausente. Com efeito, a Líbia é o mais claro exemplo disto, mostrando por que os EUA não podem mais contar com os europeus para dar conta de parte do trabalho - e também o motivo pelo qual os europeus não estão dispostos a recorrer à força militar como ferramenta capaz de provocar uma mudança de regime.
"A Líbia é para a Otan sua primeira missão pós-Afeganistão", disse Kaim. "Os europeus aprenderam as lições do conflito anterior. Estão relutando cada vez mais em se envolver em esforços de construção nacional apoiados no uso da força." Gates compreende esta divergência e também o esfriamento das relações transatlânticas. Ele nem mesmo sabe se os EUA continuarão a acreditar na Otan e a investir nela. De fato, Gates representa uma geração que cresceu com a Guerra Fria. Em ambos os lados do Atlântico, esta geração, que exerceu considerável influência, está cedendo lugar a elites mais jovens que valorizam muito menos a aliança transatlântica.
"A Otan e o relacionamento transatlântico sempre foram um grande interesse na vida profissional de Gates", disse Stephen J. Flanagan, vice-presidente sênior do Centro de Estudos Estratégicos e Internacionais em Washington.
"Mas a nova geração de líderes políticos nos EUA não partilha da vivência dele na luta comum durante a Guerra Fria ao lado de nossos aliados europeus", disse ele. "São mais inclinados a enxergar os recursos americanos dedicados à defesa transatlântica sob um prisma muito mais calculista, questionando se o investimento vale mesmo o dinheiro gasto." É provável que a Otan sobreviva. A aliança continuará a ser útil para os EUA quando o país precisar construir coalizões de dispostos. Pode também se mostrar útil no momento de conferir legitimidade a missões militares futuras. Mas seu papel enquanto principal organização transatlântica dotada de um propósito verdadeiramente unificado e de ampla solidariedade entre seus membros está sendo questionado.
Mas pode haver um lado positivo em tudo isto.
Os EUA há muito encorajam a União Europeia a desenvolver uma política de segurança que possibilite aos europeus cuidar do seu próprio quintal: países e regiões como Bósnia, Moldávia, o sul do Mediterrâneo, Bielo-Rússia, Ucrânia e o Cáucaso. Até o momento, a União deu poucas amostras de um pensamento estratégico, e menos ainda de uma coordenação dos seus esforços de defesa.
É por isso que, no último mês de novembro, Grã-Bretanha e França chegaram a um acordo amplo de cooperação militar. "O acordo questionou a sustentabilidade e a relevância das políticas de segurança e defesa da UE", disse Clara Marina O"Donnell, especialista em defesa do Centro para a Reforma Europeia, em Londres.
Outros países europeus praticamente ignoraram o acordo. Talvez seja necessária uma gradual retirada dos EUA para convencer os europeus de que eles precisam de uma estratégia de segurança para o longo prazo que seja digna deste nome. / TRADUÇÃO DE AUGUSTO CALIL

*É CORRESPONDENTE NA ALEMANHA


Encerrem a guerra global às drogas
Precisamos de novos caminhos para pensar globalmente o desafio dos entorpecentes

*Jimmy Carter, do The New York Times - O Estado de S.Paulo

Em uma nova iniciativa extraordinária anunciada no início deste mês, a Comissão Global de Políticas sobre Drogas fez algumas recomendações corajosas e profundamente importantes num relatório sobre como exercer um controle mais eficaz sobre o comércio de drogas ilícitas. A comissão inclui os ex-presidentes ou primeiros-ministros de cinco países, um ex-secretário-geral da Organização das Nações Unidas, líderes de direitos humanos, e líderes governamentais e empresariais. O relatório descreve o fracasso total do esforço antidrogas global presente, e, em particular, a "guerra às drogas" da América, que foi declarada há 40 anos hoje. Ele observa que o consumo global de opiáceos aumentou 34,5%, o de cocaína 27% e o de maconha 8,5% de 1998 a 2008.
Suas recomendações principais são substituir a prisão de pessoas que usam drogas, mas não prejudicam outras, por tratamento, e concentrar mais esforços internacionais coordenados no combate a organizações criminosas violentas e não nos delinquentes de baixo nível não violentos.
Essas recomendações são compatíveis com a política americana sobre drogas de três décadas atrás. Em uma mensagem ao Congresso em 1977, eu disse que o país devia descriminalizar a posse de menos de uma onça (28 gramas) de maconha, com um programa completo de tratamento para viciados. Também preveni contra encher nossas prisões com jovens que não eram uma ameaça à sociedade, e resumi dizendo: "As penalidades contra a posse de uma droga não devem ser mais nocivas a um indivíduo que o uso da própria droga."
Essas ideias foram amplamente aceitas na época. Nos anos 80, porém, o presidente Ronald Reagan e o Congresso começaram a se afastar de políticas de drogas equilibradas, incluindo o tratamento e reabilitação de viciados, para esforços fúteis para controlar a importação de drogas de países estrangeiros.
Essa abordagem acarretou um enorme dispêndio de recursos e a dependência de forças policias e militares . Um resultado foi uma terrível escalada de violência, corrupção e violações brutas de direitos humanos associadas às drogas em um número crescente de países latino-americanos.
Os fatos e argumentos da comissão são persuasivos. Ela recomenda que os governos sejam encorajados a experimentar "modelos de regulamentação legal das drogas... destinados a reduzir o poder do crime organizado e salvaguardar a saúde e segurança de seus cidadãos". Para exemplos efetivos, eles podem observar as políticas que apresentaram resultados promissores na Europa, Austrália, e outros lugares.
Mas eles provavelmente não pedirão conselhos aos Estados Unidos. As políticas sobre drogas aqui são mais punitivas e contraproducentes que em outras democracias, e acarretaram uma explosão nas populações prisionais. No fim de 1980, pouco antes de eu deixar a presidência, 500 mil pessoas estavam encarceradas nos Estados Unidos; no fim de 2009, o número era de quase 2,3 milhões. Há 743 pessoas na prisão para cada 100 mil americanos, uma proporção mais alta do que em qualquer outro país e sete vezes maior que na Europa. Cerca de 7,2 milhões de pessoas estão, ou na prisão, ou em livramento condicional, ou sob sursis - mais de 3% de todos os adultos americanos!
Parte desse aumento foi causada por uma condenação mínima compulsória e leis "three strikes you`re out" (leis que exigem penas de prisão para infratores reincidentes). Mas cerca de três quartos das novas admissões em prisões estaduais são por crimes não violentos. E a maior causa isolada de crescimento da população prisional tem sido a guerra às drogas.
Essa punição excessiva não só destruiu as vidas de milhões de jovens e de suas famílias (desproporcionalmente de minorias), como está devastando os orçamentos estaduais e locais. O ex-governador da Califórnia, Arnold Schwarzenegger, comentou que, em 1980, 10% do orçamento de seu estado foram para educação superior e 3% para prisões; em 2010, quase 11% foram para prisões e somente 7,5% para educação superior.
Para ajudar esses homens a continuarem membros valiosos da sociedade, e tornar as políticas de drogas mais humanas e eficazes, o governo americano devia apoiar e estabelecer as reformas sugeridas pela Comissão Global de Políticas sobre Drogas. /TRADUÇÃO DE CELSO PACIORNIK

*É EX-PRESIDENTE DOS ESTADOS UNIDOS

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