DESTAQUE DE CAPA
Voo 447: achados corpos; faltam as caixas-pretas
Quase dois anos após o desastre com o voo AF 447 que matou 228 pessoas na costa do Brasil robôs submarinos detectaram corpos dentro de partes inteiras do Airbus da Air France que caiu no Atlântico em 12 de junho de 2009. Num achado inédito na história da aviação, que pode revolucionar as investigações a cargo do Escritório de Investigação e Análises francês (BEA), dois trens de aterrissagem, dois motores e uma das asas do avião estão quase intactos, a 3.900 metros de profundidade. As caixas-pretas, no entanto, chave para elucidar o acidente, ainda não foram encontradas. As autoridades francesas não revelaram detalhes sobre o estado dos corpos, conservados graças às baixas temperaturas. Também está sob sigilo o lugar exato do avião, próximo do Arquipélago de São Pedro e São Paulo, ainda em águas brasileiras. O trabalho de resgate, que requer submarinos automáticos com câmeras de alta definição, deve levar três semanas para começar.
Em vez de caixas-pretas, corpos
Descoberta inédita nos destroços do voo 447 aumenta expectativa para solução do mistério
Deborah Berlinck
Quase dois anos depois do acidente do voo 447 da Air France, que matou 228 pessoas ao cair no oceano Atlântico no caminho do Rio para Paris, em 31 de maio de 2009, autoridades francesas anunciaram ontem que foram localizados corpos dentro da fuselagem do Airbus A330, a 3.900 metros de profundidade. O Escritório de Investigação e Analises (BEA, na sigla em francês) - órgão que investiga acidentes aéreos - informou ontem, em Paris, que, em respeito às famílias, não seriam divulgadas informações sobre o estado ou a posição dos corpos.
- As famílias ainda não foram notificadas. Não vamos falar sobre os corpos - disse a ministra dos Transportes, Natalhie Kosciusco-Morizet.
De acordo com as autoridades, é impossível dizer, no momento, o número exato de corpos. Segundo especialistas, temperaturas baixas a quatro mil metros de profundidade explicariam a conservação dos cadáveres.
Fotos dos destroços, feitas por submarinos e exibidas ontem à imprensa, mostram dois trens de pouso, duas turbinas e uma das asas bem preservados. O lugar exato onde está o avião também foi mantido em segredo, para, segundo as autoridades francesas, preservar o local. Sabe-se apenas que fica a cerca de 80 quilômetros do ponto onde foram encontrados os primeiros destroços, no último sábado. O trabalho de resgate deve começar em três semanas ou um mês. Considerada delicada, a operação requer submarinos automáticos com câmeras de alta definição. Três empresas - duas francesas e uma americana - que têm esse equipamento estão participando de uma concorrência lançada ontem para a realização do serviço. O resultado deve ser divulgado até quinta-feira.
Jean Paul Troadec, diretor do BEA, disse que a prioridade é a busca das caixas-pretas, mas a ministra garantiu que os corpos serão resgatados para identificação.
Resgate deve custar até 6 milhões de euros
Por volta da meia-noite de sábado (19h no Brasil), um submarino automático Remus, operado a partir de um navio americano que fazia buscas na região, detectou possíveis sinais de destroços. Uma investigação mais detalhada permitiu que fossem feitas as primeiras imagens de partes do avião. Até ontem foram tiradas cerca de 13 mil fotos, que estão sendo analisadas pelo BEA.
A descoberta dos destroços num espaço relativamente concentrado - 600 por 200 metros -- levantou a esperança entre os investigadores de encontrar as caixas-pretas, onde ficam registradas as conversas dos pilotos e os parâmetros do voo.
- Se não foram destruídas pelo choque, há chances de que ainda possam ser exploradas - disse Alain Bouillard, chefe das investigações, que vai comandar o resgate dos destroços.
De acordo com Bouillard, a concentração dos restos também confirma a tese segundo a qual a aeronave caiu no mar em linha de voo, ou seja, na horizontal. A operação de resgate será paga pelo governo francês, a um custo estimado entre cinco e seis milhões de euros, segundo o jornal "Le Figaro". Até agora, as buscas custaram 21,6 milhões de euros.
Inicialmente, especulou-se que uma explosão teria causado o acidente, acontecido durante uma tempestade. Mas a tese foi abandonada por não ter havido despressurização da cabine, explicou o chefe da investigação. Outra tese que ganhou força foi a de falhas em sondas que medem a velocidade do avião, mas o BEA acha que somente esse problema não explicaria a catástrofe.
Especialista em análise de acidentes e controles de emergência da Coppe-UFRJ, Moacyr Duarte acredita que apenas com a descoberta das caixas-pretas da aeronave será possível definir as causas do acidente:
- A ação de agentes externos, como a água salgada, correntes marítimas e outros fatores, deve ter causado danos que vão impedir um diagnóstico a partir da análise da fuselagem do avião. Com isso, é fundamental que sejam recuperadas as caixas-pretas - acredita.
Para o professor da Coppe, os valores investidos pela Air France e pela Airbus na busca das caixas-pretas não é tão grande quanto o custo de não conseguir uma resposta para o acidente:
- É importante ressaltar vários aspectos envolvidos nesse acidente, além do ponto de vista humano, afinal de contas, 228 pessoas morreram. O piloto era experiente, o avião praticamente novo e, muito importante, a frota da Air France é composta unicamente por aeronaves fabricadas pela Airbus. Por isso é tão importante definir o que derrubou o avião - disse Duarte.
O anúncio da localização dos destroços e a existência de corpos na fuselagem foi um choque para Robert Soulas, vice-presidente da Associação das Famílias de Vítimas, que viu as imagens do avião na apresentação dos investigadores à imprensa. Ele considerou a notícia excelente, pois recompensa dois anos de luta das famílias para saber a verdade sobre o acidente. Mas alerta para o risco de um novo trauma para muitos parentes que vão se confrontar com corpos.
- O problema dos corpos é espinhoso. Haverá problemas de identificação. Não sabemos em que estados eles estão. E há o risco de suscitar um debate entre famílias que vão querer deixar os corpos no fundo do Atlântico e as que vão querer recuperá-los - disse Soulas, que perdeu a filha e o genro no acidente.
Passageiros de 32 nacionalidades - sendo 72 franceses e 59 brasileiros - morreram no acidente do voo 447. O BEA anunciou que, até o final da semana, uma pessoa será indicada para fazer a comunicação com todas as famílias.
AVIAÇÃO
Pane em radar interrompe voo da Delta Airlines
O voo 60 da Delta Airlines, que saiu do Rio às 21h36m de domingo com destino a Atlanta, nos Estados Unidos, teve que voltar ao Aeroporto Tom Jobim, de onde havia decolado, devido a problemas num dos radares. O avião pousou de volta às 0h44m de ontem. Segundo passageiros, eles já estavam próximos de Brasília quando o comandante anunciou o retorno e explicou que o defeito no equipamento impediria o sobrevoo na região da Amazônia. Antes de pousar, a aeronave teria despejado combustível no mar. Os 132 passageiros foram encaminhados de táxi para um hotel no Centro do Rio e embarcaram novamente para Atlanta às 12h30m de ontem.
O designer gráfico Ricardo Moraes, de 34 anos, que viajava de férias com a mulher, a jornalista Taísa Fortes, de 33, disse ter ficado surpreso com o aviso do piloto, após mais uma hora de voo:
— Em maio do ano passado tivemos problemas com um avião da Delta. Por causa de uma pane elétrica na aeronave, ficamos em Atlanta esperando por mais de cinco horas no aeroporto.
Em nota, a Delta confirmou que o Boeing 767-300ER voltou ao Rio devido à pane num radar meteorológico, fundamental para essa rota. Sobre o combustível descartado no mar, a Delta informa que é um protocolo de segurança padrão quando a aeronave de um voo longo retorna pouco depois de ter decolado.
Agência americana recomenda inspeção em aeronaves da Boeing
Fabricante também deve emitir boletim orientando que modelos 737 antigos sejam checados
A Administração Federal de Aviação (FAA), nos Estados Unidos, lançou um boletim recomendando que sejam inspecionadas as cerca de 175 aeronaves Boeing, modelo 737-300, as mais antigas que ainda estão em funcionamento. A decisão ocorreu depois do rompimento da fuselagem de um avião da empresa Southwest Airlines, na última sexta-feira, no estado do Arizona, nos EUA.
Por sua vez, a Boeing também prepara um boletim, no qual fará recomendação semelhante, mas estendendo aos modelos de aeronaves 737-400 e 737-500 as inspeções eletromagnéticas, com a finalidade de se verificar danos ocorridos durante o uso.
A Southwest também começou um trabalho de checagem nas aeronaves de sua frota depois do incidente. Durante o voo no Arizona, a fuselagem sofreu um rombo no teto. A bordo havia 118 passageiros e cinco tripulantes. Relatórios iniciais feitos pela empresa apontam que a aeronave teria perdido pressão, liberando automaticamente as máscaras de oxigênio da cabine. Por causa do episódio, a Southwest optou pelo cancelamento de 600 voos programados para o fim de semana e de 70 da escala de ontem.
No último domingo, outro voo da Southwest, que transportava 142 passageiros, foi desviado para o aeroporto internacional de Los Angeles porque as pessoas a bordo começaram a sentir cheiro de queimado, que parecia vir do sistema elétrico. A aeronave, modelo 737-300, voava de Oakland para San Diego.
OCUPAÇÕES EM ABRIL
Exército bloqueia marcha do MST temendo invasão de hidrelétrica
Ação na Bahia integra jornada dos sem-terra que prevê cem ocupações em abril
Silvia Amorim
SÃO PAULO E SALVADOR. O Exército bloqueou ontem uma marcha organizada pelo Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) na região da Companhia Hidrelétrica do São Francisco (Chesf), na Bahia. Havia a preocupação de que o grupo, de cerca de 400 pessoas, invadisse a área da usina. Não houve confronto, mas, até que fossem liberados, os sem-terra interditaram por cerca de duas horas a BR-110, na região de Paulo Afonso.
Em 2008, uma usina da Chesf em Canindé de São Francisco, em Sergipe, foi invadida pelo MST. Os sem-terra só deixaram a área após a Justiça determinar a reintegração de posse.
A marcha foi mais uma ação do MST para o "Abril Vermelho", a jornada de luta pela reforma agrária realizada todo ano pela entidade para lembrar o massacre de sem-terra em Eldorado dos Carajás, no Pará. Como forma de pressionar o governo Dilma Rousseff, o movimento ameaça invadir neste mês cerca de cem propriedades em todo o país. Eles também reivindicam reunião com o governo.
Destino da marcha era escritório da Chesf
A assessoria de imprensa do Exército informou ontem que estava sendo feito próximo à Chesf um treinamento da Companhia de Infantaria de Paulo Afonso e que, diante da aproximação dos sem-terra da área da usina, o Exército atuou preventivamente, interrompendo a marcha e orientando o MST a alterar o percurso da caminhada.
Um dos organizadores da marcha do MST, Luís Carlos Ferreira, confirmou que não houve embate. Ele disse que o objetivo da caminhada era chegar ao escritório da usina no centro de Paulo Afonso.
- Como estávamos passando perto de uma área da usina, eles fizeram o bloqueio e tivemos que negociar um caminho alternativo para chegar ao nosso objetivo, que era a sede administrativa da Chesf. Queríamos uma reunião para discutir a situação das áreas excedentes da usina - afirmou.
Os sem-terra chegaram ainda pela manhã ao escritório da Chesf, onde foram recebidos pelo chefe de gabinete da direção administrativa da Chesf, Carlos Aguiar, que viajou de Recife ao município baiano para a reunião. O MST reivindica que a usina libere para desapropriação áreas excedentes da usina.
O GLOBO tentou contato com Aguiar, mas ele não foi localizado. Por meio da assessoria de imprensa, a Chesf informou que a reunião havia sido positiva.
Por enquanto, as ações do "Abril Vermelho" estão concentradas na Bahia, onde, na madrugada de ontem, mais quatro fazendas foram invadidas. Uma delas seria de propriedade do traficante colombiano Juan Carlos Abadia. Outras três, segundo o MST, pertencem a Augusto César Requião, preso em 2010 numa operação da Polícia Federal de combate à exploração de caça-níqueis e jogos de azar. Ao todo, cerca de 800 famílias estão acampadas nas quatro propriedades.
O MST afirma já ter invadido 30 fazendas no estado desde o dia 1º. A meta, segundo um coordenador do MST na Bahia, Marcio Matos, é ocupar 50 até o dia 17. As invasões às fazendas de Abadia e Requião não foram por acaso.
- Essas foram áreas utilizadas pelo crime organizado. Queremos chamar a atenção e denunciar esse tipo de prática no Brasil. A propriedade não pode estar a serviço dessas coisas - afirmou Matos.
O Ministério do Desenvolvimento Agrário divulgou ontem nota sobre as ações do MST no "Abril Vermelho". Sobre a declaração do movimento de que até hoje não conseguiu reunião com o governo, a pasta afirmou que "o governo federal sempre esteve aberto ao diálogo com todos os movimentos sociais. Tanto que, no dia 30 de março, o ministro Afonso Florence recebeu o Fórum Nacional pela Reforma Agrária e Justiça no Campo, do qual o MST faz parte".
O ministério acrescentou que, "assim que houver solicitação de audiência para tratar da pauta do MST, o Ministério do Desenvolvimento Agrário vai encaminhar a discussão sobre as demandas apresentadas, mantendo o compromisso de realização da reforma agrária, na forma da lei, com diálogo permanente com todos os movimentos sociais".
Diante da queixa do MST sobre uma redução dos recursos para desapropriações neste ano, o ministério informou que, "no contexto das medidas orçamentárias, que têm o objetivo de contribuir para a estabilidade macroeconômica e a continuidade do desenvolvimento com inclusão social, os recursos para obtenção de terras para fins de reforma agrária estão preservados".
ENERGIA NUCLEAR
Licenças de Angra 3 criam polêmica
Ministra diz que compensação ambiental foi mantida, mas especialistas discordam
Carla Rocha e Marcelle Ribeiro
RIO e SÃO PAULO. A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, negou ontem que tenha sido retirada da licença de instalação da usina nuclear de Angra 3 a obrigação de a Eletronuclear arcar com o custeio do Parque Nacional da Bocaina e da Estação Ecológica Tamoios. A alteração foi revelada ontem pelo GLOBO. A ministra alegou que a exigência continua a ser contemplada em outro item do documento sobre as compensações ambientais da Lei 9.985/2000.
- A exigência da licença de Angra 3 permanece. Ela nunca deixou de existir - afirmou.
Segundo a ministra, de acordo com o Ibama, o item 2.43 já abrange as despesas com as unidades, previstas na licença prévia e que desapareceram. Mas especialistas em direito ambiental discordam. Segundo eles, o novo item é diferente e nem precisaria constar da licença porque prevê um repasse obrigatório por lei para todo empreendimento com impacto ambiental. Para eles, ao retirar a menção ao parque e à estação, o Ibama impediu que mais recursos fossem destinados ao meio ambiente.
DEVOLUÇÃO
Filhos de Lula têm de devolver passaporte especial
MPF analisou 328 documentos diplomáticos e só os sete de parentes do ex-presidente eram irregulares
Carolina Brígido
BRASÍLIA. Após analisar 328 passaportes diplomáticos emitidos pelo Itamaraty em caráter excepcional, o Ministério Público chegou à conclusão de que apenas sete foram concedidos de forma irregular - justamente os concedidos a parentes do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva. O MPF pediu ao Itamaraty a devolução dos passaportes.
No último dia 30, o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, encaminhou ao ministro das Relações Exteriores, Antônio Patriota, ofício perguntando se os sete documentos foram devolvidos ou recolhidos. Se eles ainda estiverem com os parentes de Lula, Gurgel pede a devolução em 30 dias. Caso contrário, o Ministério Público deve entrar com ação judicial cobrando a medida.
Durante o governo Lula, receberam o documento três netos menores de idade e quatro filhos do presidente. Segundo procuradores, não havia justificativa para a emissão dos passaportes. Viajantes com passaporte diplomático conseguem vistos com maior facilidade e não entram em filas na alfândega.
O Decreto 5.798, de 2006, permite a concessão de passaportes diplomáticos a agentes políticos e pessoas que exercem funções essenciais ao Estado. Há três grupos autorizados: cônjuge, companheiro ou companheira e dependentes; funcionários públicos em missão permanente no exterior; e em função do interesse do país.
O MPF analisou os passaportes diplomáticos concedidos em caráter excepcional no período de 2006 a 2010. Os demais passaportes concedidos foram considerados regulares. Os beneficiados foram autoridades religiosas, governadores, prefeitos, ex-ministros de tribunais, diretores de organizações internacionais e servidores públicos em missão oficial.
Segundo o Itamaraty, 22 passaportes diplomáticos foram concedidos a líderes religiosos entre 2006 e 2010. Entre os beneficiados estão membros da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e autoridades religiosas de outras igrejas. O senador Marcelo Crivella (PRB-RJ) disse que pediu ao Ministério das Relações Exteriores um passaporte diplomático para o chefe da Igreja Internacional da Graça de Deus, pastor Romildo Ribeiro Soares. O passaporte foi concedido. O pastor é tio do senador, casado com sua tia, e cunhado do Bispo Edir Macedo, líder da Igreja Universal.
DEFESA
Iveco investirá R75 mi em veículos de defesa no Brasil
Carolina Marcondes
SÃO PAULO (Reuters) - A Iveco, empresa da Fiat Industrial, anunciou nesta segunda-feira que vai investir 23 milhões de euros (cerca de 75 milhões de reais) em uma unidade de veículos de defesa no Brasil.
A decisão ocorre após um contrato assinado em 18 de dezembro pela companhia e o Exército brasileiro para o fornecimento de veículos anfíbios blindados VBTP-MR, segundo comunicado publicado no site da empresa. A unidade deverá ser construída no complexo industrial de Sete Lagoas (MG) e o início da produção dos veículos está previsto para o segundo semestre de 2012.
A nova unidade deverá empregar cerca de 350 pessoas, disse a Iveco em comunicado, "muitos deles treinados para tarefas especializadas não disponíveis no mercado, como a soldagem de aços balísticos". A previsão é de que sejam produzidos 2,044 mil veículos do modelo VBTP-MR até 2030, por um valor previsto em contrato de 2 bilhões de euros.
PANORAMA POLÍTICO
Ilimar Franco
“O Brasil precisa se preparar do ponto de vista militar. Com o petróleo do pré-sal, o país vai ser um alvo do terrorismo” — Nelson Jobim, ministro da Defesa
PROPOSTA NEGOCIADA
Greve na Usina de Santo Antônio chega ao fim
Operários de Jirau também poderão retornar ao trabalho
Geralda Doca
BRASÍLIA. Os trabalhadores da Usina de Santo Antônio, em Rondônia, retomaram ontem as atividades, após 17 dias de greve. Pela manhã, cerca de cinco mil operários aprovaram, em uma assembleia, uma proposta negociada entre sindicatos e a construtora Odebrecht na quinta-feira passada, em Brasília. Hoje, representantes de operários de outra obra do PAC no estado, a Usina de Jirau, também palco de uma greve, terão uma reunião com diretores da Camargo Corrêa para discutir um acordo. No encontro, a empresa deverá aceitar a pauta de reivindicações recebida na sexta-feira.
A proposta aprovada pelos empregados de Santo Antônio prevê antecipação, de maio para abril, de um reajuste salarial de 5%, aumento da cesta básica de R$110 para R$132 e licença de cinco dias a cada três meses de trabalho, com direito a passagens aéreas de ida e volta. A pauta de reivindicações dos operários de Jirau é semelhante.
- Temos o indicativo de que a Camargo Corrêa vai aceitar a pauta - disse Vagner Freitas, secretário da Central Única dos Trabalhadores (CUT).
Caso a proposta seja mesmo aprovada pela empresa, os operários de Jirau farão assembleias para discutir a volta ao trabalho. O retorno deverá ser gradual, pois a construtora terá de providenciar a reconstrução de alojamentos e refeitórios destruídos durante protestos.
Segundo a CUT, independentemente de acordos, negociações por melhores salários para os operários vão continuar.
- Queremos manter os trabalhadores mobilizados e vamos negociar melhores condições com a volta ao trabalho - afirmou Freitas.
MENSALÃO
Oposição cobra agilidade do Supremo
BRASÍLIA. Com a divulgação do relatório final da PF sobre o mensalão, os partidos de oposição se uniram para pedir agilidade no julgamento dos acusados pelo Supremo Tribunal Federal e, ao mesmo tempo, cobrar explicações da presidente Dilma Rousseff pela manutenção de alguns dos suspeitos em seu governo. Uma das preocupações da oposição é com a possibilidade de prescrição dos crimes antes do julgamento. Do outro lado, no Palácio do Planalto, a ordem é tentar descolar o mensalão do governo Dilma, tratando-o como coisa do passado.
No Senado, o líder do PSDB, Álvaro Dias (PR), disse que o importante é evitar que o STF demore a julgar os crimes, já que alguns prescrevem em agosto. PSDB e DEM pressionarão pela aprovação, na Câmara, de projeto do senador Demóstenes Torres (DEM-GO) que amplia as penas e os prazos de prescrição de crimes para até 30 anos. Hoje, o máximo é de 20 anos.
- Os fatos eram conhecidos, mas agora estão comprovados oficialmente - disse Dias.
- A bola toda está com o Supremo e com o Ministério Público - acrescentou Demóstenes Torres.
Para o PPS, o crime de formação de quadrilha prescreverá na última semana de agosto, livrando 22 dos 38 réus da acusação. A oposição cobrou explicações do governo Dilma. A senadora Marisa Serrano (PSDB-MS) lembrou que José Genoino - presidente do PT na época - foi nomeado assessor do ministro da Defesa, Nelson Jobim, e que João Paulo Cunha (PT-SP), réu do mensalão, agora é presidente da Comissão de Constituição e Justiça.
- Senhora presidente, a mensagem subliminar que está sendo levada à sociedade é que todos os crimes podem ser cometidos contra o interesse público porque nunca haverá punição - disse Marisa Serrano.
O senador Wellington Dias (PT-PI) reagiu:
- Tenho a convicção, conhecendo a presidente Dilma, de que ela não hesitará em adotar as medidas necessárias para coibir qualquer ato criminoso.
No Planalto, auxiliares da presidente reconhecem que o relatório da PF tem credibilidade, mas que o alvo não é o governo. A aposta é que a alta popularidade de Dilma ajuda a criar um escudo em torno dela.
- O governo não tem nada com isso. Espera que o julgamento técnico seja feito pelo Supremo. Para o governo, é página virada em termos de debate. Esse é um assunto da oposição - disse o líder do governo na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT).
O deputado Vicentinho (PT-SP) criticou a inclusão de seu nome no relatório da PF:
- Considero um erro grave da Polícia Federal ter ouvido este senhor Nélio e em nenhum momento, durante sete anos, ter procurado a mim e à minha assessoria para nos ouvir - disse Vicentinho, confirmando que, em 2003, procurou Delúbio Soares para pedir ajuda para sua campanha e que recebeu a visita de Marcos Valério: - Ele foi uma vez a São Bernardo, uma conversa muito rápida, perguntou se estava correndo tudo bem.
ELEIÇÕES PRESIDENCIAIS
Haiti terá presidente-cantor estreante na política
PORTO PRÍNCIPE. O cantor Michel Martelly venceu o segundo turno das eleições presidenciais do Haiti por quase 68% dos votos, derrotando a ex-primeira-dama e professora universitária Mirlande Manigat, que obteve apenas 31%, segundo mostram os resultados preliminares anunciados ontem pela Comissão Eleitoral do país. O resultado representa uma reviravolta no cenário político Haitiano, já que Martelly, de início, não havia nem se classificado para disputar o segundo turno, depois de um controverso primeiro turno realizado em novembro.
O novo presidente irá substituir René Préval, que havia conseguido uma prorrogação de seu mandato para não deixar um vácuo de poder devido ao atraso na realização do processo eleitoral. Apesar da informação divulgada ontem, o resultado final oficial da eleição só será conhecido em 16 de abril. Até lá, ele pode ser contestado na Justiça por simpatizantes de Manigat.
Teoricamente, seria difícil conseguir reverter a diferença entre os dois candidatos. Mas o próprio exemplo de Martelly, que conseguiu contestar os resultados do primeiro turno e eliminar o candidato governista Jude Célestin - então classificado em segundo - mostra que nada é definitivo no país até o anúncio do resultado oficial.
Aos 50 anos, Martelly nunca ocupou um cargo público. O que poderia ser visto como um problema em muitos países foi considerado uma vantagem no Haiti - nação mais pobre do continente - onde muitos eleitores se queixam da corrupção do governo. A oposição, no entanto, alega que o cantor é despreparado para assumir o país - que ainda sofre com os efeitos do terremoto devastador do ano passado, com centenas de milhares de pessoas ainda desabrigadas e um surto de cólera que já fez mais de quatro mil vítimas desde outubro.
O anúncio foi imediatamente celebrado em Porto Príncipe, onde uma multidão comemorou nas ruas o resultado.
- Hoje é um grande dia para mim - disse Jeanor Destine, de 22 anos, enquanto fogos de artifício iluminavam o céu da capital. - Acabamos com o antigo governo, e queremos inaugurar um novo. Passamos por tanta miséria. É por isso que estamos apoiando Martelly.
A campanha do cantor postou no Twitter: "Obrigado pela confiança. Vamos trabalhar com todos os Haitianos. Juntos nós podemos".
Promessa de educação e falta de apoio no Parlamento
A campanha de Martelly ganhou força no segundo turno, quando sua inexperiência política parece ter conquistado boa parte dos Haitianos. O cantor prometeu mudanças profundas no Haiti, afirmando que vai garantir educação pública e gratuita a todos, num país onde mais da metade das famílias não consegue pagar o ensino de seus filhos. O candidato prometeu, ainda, melhores condições econômicas e mais emprego.
Além de problemas como os desalojados, o cólera e as condições socioeconômicas dos Haitianos, o novo presidente terá ainda de lidar com outros dois desafios: um Parlamento dominado pelo partido de René Préval, e a insatisfação geral no país em relação à lentidão com que os trabalhos de recuperação do Haiti têm sido conduzidos.
- Ele não tem nenhum apoio no Parlamento - adverte o professor Yves Colon, que ensina Jornalismo na Universidade de Miami. - As leis propostas podem ser bloqueadas. Os próximos cinco anos podem ser um impasse total entre a Presidência e o Parlamento.
PERU
Nacionalista avança na reta final
Janaína Figueiredo
BUENOS AIRES. Depois de ter sido derrotado pelo presidente peruano, Alan García, no segundo turno das eleições presidenciais de 2006, o militar reformado e candidato nacionalista Ollanta Humala se consolidou como o grande favorito para o primeiro turno de uma nova disputa pela Presidência do país no próximo domingo. O crescimento de Humala na reta final da campanha transformou-o no principal alvo de ataques dos adversários, dentro e fora do Peru.
Reforçando a estratégia de moderar um discurso que ainda provoca certo temor nos setores mais conservadores da sociedade peruana e entre autoridades e investidores internacionais, nos últimos dias, o líder da aliança Ganha Peru reiterou o compromisso com a liberdade de imprensa, o respeito à propriedade privada e desmentiu, mais uma vez, um suposto vínculo com o presidente da Venezuela, Hugo Chávez.
Justiça social e voto étnico podem ser trunfos
Humala, que em 2000 protagonizou um levante militar contra o governo de Alberto Fujimori, também pediu ao presidente do Chile, Sebastián Piñera, que não opine sobre assuntos internos peruanos. Dias antes, o presidente chileno assegurara que uma vitória do candidato nacionalista poderia modificar de forma radical o relacionamento entre os dois países.
- Peço ao governo do Chile, com todo respeito, que não se intrometa em nossas eleições - declarou Humala, domingo passado.
De acordo com as últimas quatro pesquisas divulgadas em Lima antes da eleição, o militar reformado, de 48 anos, já tem lugar garantido no segundo turno. A grande incógnita é saber quem será seu rival: existe um tríplice empate técnico entre o ex-presidente Alejandro Toledo (2001-2006), Keiko Fujimori (filha do ex-presidente Alberto Fujimori) e o ex-ministro da Economia Pedro Pablo Kuczynski (PPK).
Segundo a CPI, Humala tem 28,7% das intenções de voto e Toledo está em segundo lugar, com 19,6%. Já outra pesquisa da Idice apontou uma liderança de Humala com 24,4%, seguido por PPK, com 17,3%. A Ipsos Apoyo confirmou o primeiro lugar do candidato nacionalista, com 27,2%, e em segundo a filha de Fujimori (a candidata mais votada nas legislativas de 2006), com 18,5%. Uma quarta pesquisa, da Imasen, antecipou uma queda-de-braço entre Humala (25,1%) e Toledo (20,4%), no próximo mês de junho.
No último debate realizado no domingo passado, Humala mostrou-se cauteloso, como durante toda a campanha. Segundo seus assessores (a equipe de Ganha Peru inclui dois estrategistas brasileiros e um argentino), qualquer declaração polêmica poderia reduzir a vantagem conquistada nas últimas semanas. Na visão do jornalista Mirko Lauer, analista do jornal "La República", Humala captou o voto dos eleitores que estão profundamente insatisfeitos com a vida no Peru.
- Muitas pessoas questionam a injustiça social. Por outro lado, Humala tem um voto étnico muito forte - explicou Lauer ao GLOBO, por telefone.
Interesse na experiência argentina com a mídia
O analista peruano lembrou que o pai do candidato, Isaac Humala, foi um dos fundadores do "etnocacerismo", uma corrente que defende "a nacionalidade peruana e o poder e identidade inca". O voto étnico também favorece Toledo e é uma das grandes pedras no sapato de Keiko e PPK, ambos acusados de terem outras nacionalidades (japonesa e americana, respectivamente). De fato, para Lauer e muitos analistas peruanos, Toledo é o único candidato que derrotaria Humala no segundo turno, sem grandes dificuldades.
Desde que iniciou sua campanha, em janeiro passado, o candidato nacionalista conseguiu ampliar sua presença nos setores de classe média. Humala assegurou, até o cansaço, não ser de esquerda nem chavista. O candidato da aliança Ganha Peru prometeu um Estado mais justo, com empresas nacionais em setores como telecomunicações e aviação, mas sem afetar os interesses do setor privado.
Em algumas entrevistas, Humala mostrou-se interessado na experiência argentina em matéria de meios de comunicação, mas sempre deixou claro que qualquer iniciativa deverá passar pelo Congresso (a mesma estratégia seguida pelo governo Kirchner, que em 2009, conseguiu aprovar a polêmica lei sobre serviços audiovisuais).
- Hoje podemos dizer que Humala assusta um pouco menos e essa foi sua principal vitória em relação a 2006 - assegurou o analista peruano, que aposta numa disputa entre o candidato nacionalista e Toledo, no segundo turno.
ECOS DA REVOLUÇÃO DO NILO
ONU e França atacam Costa do Marfim
Sob bombardeio de helicópteros, tropas do presidente eleito tomam casa de Gbagbo
ABIDJÃ. Helicópteros da ONU e da França abriram fogo ontem contra as forças do presidente Laurent Gbagbo em Abidjã, numa escalada dos esforços para removê-lo do poder e pôr fim à crise política e aos conflitos que assolam o país desde as eleições de novembro. Os helicópteros lançaram mísseis perto da residência oficial de Gbagbo e contra dois campos militares.
Ao mesmo tempo, uma coluna de dezenas de veículos munidos de metralhadoras e guiados por soldados leais ao presidente eleito, Alassane Ouattara, entrou na capital econômica da Costa do Marfim e tomou a residência presidencial, anunciando uma “ofensiva final” contra as forças de Gbagbo — que se recusa a deixar o poder apesar da vitória reconhecida internacionalmente de seu rival.
Diante do recrudescimento da ofensiva de Gbagbo contra civis e simpatizantes de Ouattara na última semana — ferindo inclusive 11 capacetes azuis — cresceu a pressão para que a força de nove mil homens da ONU cumprisse seu mandato no país conforme autorizada uma resolução aprovada na semana passada pelo Conselho de Segurança, com a “ajuda urgente” da França, que mantém 1.650 soldados na ex-colônia.
Quatro mísseis foram lançados contra um campo militar pró-Gbagbo em Abidjã, enquanto as forças francesas atacaram um grupo de blindados equipados com armas pesadas e lançafoguetes, e outro campo militar.
— Não podemos mais perdoar os ataques imprudentes e insensatos contra civis e capacetes azuis. De certa forma, estamos sitiados, não podemos andar livremente, eles (as forças de Gbagbo) estão nos alvejando com francoatiradores. É um ataque deliberado contra as Nações Unidas — afirmou o principal funcionário da ONU no país, Choi Young-jin.
Com o apoio da ofensiva aérea, entre quatro mil e cinco mil soldados leais a Ouattara entraram na cidade por terra em dezenas de carros de combate para tomar as regiões do centro e do norte da cidade.
— A ofensiva deve ser acelerada em breve. Estamos avançando tranquilamente — disse Guillaume Soro, o primeiro-ministro de Ouattara.
No fim do dia, as tropas de Ouattara finalmente tomaram a residência oficial de Gbagbo, mas não informaram se ele estava no local. Os aliados do presidente eleito consideram essa ofensiva “a ofensiva final” ao atual governo.
Ouattara promete investigar massacre no oeste do país Por sua vez, Ouattara assegurou que os autores da matança de civis no oeste do país, denunciada na véspera pela ONU, não ficarão impunes. Segundo a entidade, ao menos 330 civis foram assassinados em Duékué quando os homens de Ouattara tomaram a cidade, mas a Cruz Vermelha fala em até 800 mortos.
Acredita-se que a maioria tenha sido morta pelas forças do presidente eleito.
— A posição do governo é clara e limpa: não haverá impunidade.
Vamos realizar uma investigação e os responsáveis serão castigados. Queremos um Estado de Direito — Soro.
Em Londres, o chanceler William Hague disse já ter uma equipe pronta para ajudar na retirada de europeus se a situação na Costa do Marfim se deteriorar. Na véspera, o presidente Nicolas Sarkozy já havia pedido o reagrupamento urgente dos franceses que moram no país — cerca de 12 mil — em Abidjã, para uma eventual retirada.
Cerca de 1.700 estrangeiros — dos quais, 800 franceses — estão refugiados numa base militar francesa, por medo de se tornarem vítimas de grupos de saqueadores que ameaçam os bairros mais ricos de Abidjã.
FONTE: JORNAL O GLOBO
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