Pesquisar

sexta-feira, 15 de abril de 2011

15 de abril de 2011 - VALOR ECONÔMICO


BRASIL
Nova queda do dólar terá pouco impacto na inflação

O impacto da nova rodada de valorização do câmbio sobre os preços deve ser modesto, mas pode ser o suficiente para que a inflação não supere o teto da meta perseguida pelo Banco Central neste ano, de 6,5%. A expectativa de um dólar mais próximo de R$ 1,50 no fim do ano pode tirar algo como 0,2 a 0,4 ponto percentual do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a depender da evolução da taxa ao longo dos próximos meses. Nas últimas semanas, especialistas passaram a apostar num câmbio mais apreciado em 2011, depois que a moeda caiu abaixo de R$ 1,65, sem que isso provocasse uma reação mais enérgica do BC.
O economista Fábio Ramos, da Quest Investimentos, lembra que o dólar barato ajuda a segurar a inflação dos bens comercializáveis internacionalmente. As já comportadas cotações dos bens duráveis (como automóveis e eletroeletrônicos) poderiam ter um comportamento ainda mais favorável - em 12 meses até fevereiro, estão em alta de apenas 0,53%, segundo o IPCA. Os alimentos podem ter algum alívio, uma vez que, com um câmbio mais apreciado, as cotações em reais das commodities tendem a recuar, diz Ramos. No caso de produtos têxteis e de vestuário, o dólar barato pode ao menos impedir repasses adicionais da escalada do algodão.


Real mais forte pode impedir estouro da meta

Sergio Lamucci | De São Paulo

O impacto da nova rodada de valorização do câmbio sobre os preços deve ser modesto, mas pode ser o suficiente para que a inflação não supere o teto da meta perseguida pelo Banco Central neste ano, de 6,5%. A expectativa de um dólar mais próximo de R$ 1,50 no fim do ano pode tirar algo como 0,2 a 0,4 ponto percentual do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), a depender da evolução da taxa ao longo dos próximos meses. Nas últimas semanas, vários analistas passaram a apostar num câmbio mais apreciado em 2011, depois que a moeda caiu abaixo de R$ 1,65 sem que isso provocasse uma reação mais enérgica do BC.
O economista Fábio Ramos, da Quest Investimentos, que esperava um dólar de R$ 1,65 no fim do ano, trabalha hoje com R$ 1,50. Para ele, isso deve trazer um alívio de 0,2 ponto para o IPCA. "Não é a salvação da lavoura, mas pode ser a diferença entre a inflação estourar ou não o teto da meta", resume ele, que espera um IPCA de 6,4% neste ano. "O câmbio mais valorizado tende a evitar novas revisões para cima da inflação." Pelas estimativas de Ramos, o câmbio médio em 2011 ficará em R$ 1,60, 8,6% abaixo do R$ 1,75 do ano passado.
O dólar barato ajuda conter a inflação dos bens comercializáveis internacionalmente (os tradables), diz Ramos. As já comportadas cotações dos bens duráveis (como automóveis e eletroeletrônicos) poderiam ter um resultado ainda mais favorável - em 12 meses até fevereiro, estão em alta de 0,53%, segundo o IPCA. Os alimentos também devem ter algum alívio, uma vez que um câmbio mais apreciado atenua eventuais altas - ou acentua quedas - das commodities, quando convertidas em reais. No caso de produtos têxteis, o dólar barato pode impedir novos repasses da disparada do algodão.
A Tendências Consultoria também acredita num câmbio mais valorizado neste ano. Segundo estimativas preliminares, o dólar deve terminar o ano em R$ 1,62, e não mais em R$ 1,70. O câmbio médio, por sua vez, deverá ser de R$ 1,60, e não mais de R$ 1,68. Esse quadro implica um IPCA 0,15 ponto percentual menor, diz o economista Thiago Curado, que estima um IPCA de 6,3% em 2011. No cenário anterior para o câmbio, aumentaria a possibilidade de o indicador se aproximar ou superar os 6,5% do teto da meta, acredita Curado. "A expectativa é que o dólar ficará em R$ 1,55 no segundo e no terceiro trimestres, subindo um pouco no fim do ano." Ele espera alguma redução da liquidez internacional no quarto trimestre, o que tenderia a diminuir os fluxos de recursos para o Brasil.
Curado também estimou qual seria o impacto sobre o IPCA de um dólar que a partir do terceiro trimestre ficasse em R$ 1,50, terminando 2011 nesse patamar. A média do ano seria próxima de R$ 1,55. Nesse caso, o alívio sobre o IPCA poderia ser de até 0,39 ponto.
No mais recente relatório de inflação, o BC fez uma decomposição da inflação nos últimos oito anos. Em 2010, quando o dólar médio recuou 12,5% em relação a 2009, o câmbio tirou 0,22 ponto percentual do IPCA.
O impacto do câmbio valorizado sobre a inflação tende a ser moderado neste ano porque há fontes importantes de pressão sobre os preços que não respondem à oscilação do real, pelo menos no curto prazo. É o caso dos serviços (como aluguel, condomínio e empregado doméstico) e preços administrados (como tarifas públicas), diz a economista Ariadne Vitoriano, da Rosenberg & Associados.
Em 12 meses até março, os serviços no IPCA sobem 8,53%, impulsionados pela combinação de demanda forte, indexação de alguns itens à inflação passada, como aluguel, ou influenciados pelo salário mínimo, como empregado doméstico. Os preços administrados, que encerraram 2010 em 3,13%, já estão em alta de 4,53% nos 12 meses até março.
Segundo Curado e Ramos, o dólar mais barato pode produzir algum efeito mais relevante - e indireto - em serviços e em preços administrados para a inflação de 2012, ao segurar as cotações ao produtor no Índice Geral de Preços de Mercado (IGP-M). O indicador corrige a maior parte dos alugueis no país e é uma das referências para o reajuste de tarifas públicas, como as de telefonia.
O economista-chefe da Máxima Asset Management, Elson Teles, diz que um real mais forte tende de fato a propiciar algum alívio sobre a inflação, mas destaca que é necessário que o novo nível das cotações seja duradouro, para que se consolide a percepção dos agentes econômicos sobre a nova cotação. Segundo ele, o coeficiente de repasse do câmbio para os preços costuma ser de 5%: uma valorização de 10% do real tende a produzir um alívio de 0,5 ponto no IPCA.


Os Brics sob o domínio da China

Após anos de exortações dos EUA e seus aliados para que a China desempenhe um papel mais "responsável" nos assuntos do mundo, Pequim está começando a cumprir isso, mas não exatamente como se esperava. O grupo dos Brics - com a África do Sul desta vez - está se tornando um fórum dominado pela China, em que Pequim pode pressionar por sua agenda, sem a presença dominante dos EUA. Ao final da reunião anual dos líderes dos Brics ficou claro que Pequim está no controle. A "Declaração de Sanya" está repleta de termos que Pequim gosta de usar domesticamente e um porta-voz chinês disse que os países chegaram ao consenso de que "o Século XXI deve ser de paz, harmonia, cooperação e desenvolvimento científico" - expressões que são slogans do Partido Comunista da China.

De um jeito diferente, China consolida papel de liderança no grupo dos Brics

Jamil Anderlini | Financial Times, de Sanya, China

Após anos de exortações dos Estados Unidos e seus aliados para que a China desempenhe um papel mais "responsável" nos assuntos do mundo, Pequim está começando a cumprir, embora não exatamente da maneira que ansiavam, ou pela qual esperavam.
O grupo Brics de grandes economias emergentes - composto por Brasil, Rússia, Índia, China e, pela primeira vez neste ano, pela África do Sul - está se tornando um fórum dominado pela China, em que Pequim pode pressionar por sua agenda mundial em evolução, sem a presença dominante dos EUA.
No encerramento da terceira reunião anual dos líderes do Brics, na pantanosa e semiconstruída cidade turística de Sanya, na ilha meridional chinesa de Hainan, ficou claro que Pequim está totalmente no controle.
A "Declaração de Sanya" está repleta do tipo de termos que Pequim gosta de usar domesticamente e, numa apresentação a jornalistas, um porta-voz chinês disse que os países chegaram ao consenso de que "o século XXI deve ser de paz, harmonia, cooperação e desenvolvimento científico".
Acontece que "harmonia" e "desenvolvimento científico" são os slogans políticos básicos usados pelo Partido Comunista da China no plano doméstico. Assim, essa declaração dará ao público interno a impressão de que Pequim está começando a disseminar sua mensagem no exterior e a exercer influência sobre outros mercados emergentes.
A presença da África do Sul como mais novo membro do Brics muito se deve à China, que defendeu sua inclusão apesar de ser apenas a 12ª maior economia emergente, atrás do México, Coreia do Sul, Turquia, Indonésia, Polônia, Arábia Saudita e Taiwan.
Pequim argumentou que a África do Sul deve ser incluída como representante de toda a África e, em vista de seus grandes interesses em rápida expansão no continente, isso faz sentido geopolítico para a China.
Do ponto de vista econômico, a única coisa que os outros membros do grupo têm em comum é a China. "Esse não é um bloco econômico em rápida integração, unificado", disse Jonathan Anderson, economista-chefe para a região Ásia-Pacífico na divisão de serviços financeiros do UBS. "É um grupo de quatro países, geográfica e comercialmente diversificado, cada um deles com crescente relacionamento bilateral com o quinto."
A China já responde por cerca de 12% do comércio no restante dos países do Brics, valor seis vezes maior do que no início de 2000 e que continua a crescer rapidamente, disse Anderson. Por outro lado, África do Sul, Brasil, Índia e Rússia empenham apenas cerca de 3% de seus recursos ao comércio entre si e essa parcela pouco mudou durante a década passada.
Um tema firmemente fora da agenda da cúpula é a questão controversa do controle cambial chinês: um problema para a maioria dos parceiros comerciais, convencidos que Pequim mantém o yuan desvalorizado para dar a seus exportadores uma vantagem injusta.
Reservadamente, numerosos delegados de outros países do Brics admitiram que as reuniões bilaterais com a China foram a principal motivação para a participação na cúpula do Brics, e que Pequim foi a força motriz por trás das tentativas de institucionalizar e formalizar o grupo.
Provavelmente, o maior fator de unificação de outros membros do Brics é a preocupação com que seu comércio fique muito desequilibrado em favor dos chineses, sendo as exportações para a China compostas em grande parte de recursos naturais, e as importações provenientes da China, em sua maioria, compostas de produtos industrializados acabados.
Pequim apresentou uma resposta tipicamente pragmática a essas preocupações. "O importante é construir um consenso e minimizar as diferenças, simultaneamente enfatizando as áreas onde podemos cooperar", disse Wu Hailong, ministro-adjunto do Exterior chinês, a jornalistas no encerramento da cúpula.
À medida que a China implementa seu papel mais assertivo no mundo, é provável que essa postura se torne familiar. (Tradução de Sergio Blum)


Primeiro chip brasileiro sai em 2012

Sérgio Bueno | De Porto Alegre

Contratado em agosto de 2010 para presidir o Centro Nacional de Tecnologia Eletrônica Avançada (Ceitec), o físico Cylon Gonçalves da Silva começa a destravar a implantação do embrião da indústria nacional de semicondutores. Conhecedor dos meandros da administração pública, o executivo impôs uma nova dinâmica ao trabalho da estatal e adotou uma visão estratégica mais aberta à interação com o mercado. Agora, ele prepara para 2012 a entrada do primeiro chip brasileiro em linha de produção, algo que pelos planos originais deveria ter ocorrido em agosto de 2007.
O projeto do Ceitec completa dez anos desde a doação dos primeiros equipamentos pela Motorola. Nesse período recebeu investimentos de R$ 500 milhões, a maior parte do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT). A instituição havia sido constituída como associação civil sem fins lucrativos e em 2008 foi transformada em estatal vinculada ao MCT para receber um fluxo estável de recursos, mas ainda assim continuou sofrendo com sucessivos atrasos no cronograma.
"Encerramos a novela da construção da fábrica", diz Cylon. Pelo calendário original, as instalações deveriam estar concluídas em abril de 2007 e com os atrasos o início da produção foi adiado duas vezes em 2008, uma em 2009 e agora passou para 2012.
As obras terminaram dia 29 de fevereiro e até 15 de junho será concluído o processo de "aceitação": a verificação da conformidade entre o prédio e o projeto. Até 31 de maio será encerrada a reforma dos equipamentos doados pela Motorola e até 30 de setembro, o comissionamento das ferramentas para o início da transferência de tecnologia de fabricação pela alemã XFab, em 1º de outubro. Essa etapa será concluída em 18 meses e a produção começará neste ano, em caráter experimental.
A precisão do calendário não é gratuita. Desde que assumiu o cargo, Cylon passou a estabelecer "datas fatais" para cada etapa de trabalho, para melhorar o planejamento das compras que precisam de licitação pública. Para os casos mais simples, adotou o pregão eletrônico, que reduz de 90 para nove dias, em média, o processo de aquisição, além de garantir uma economia de cerca de 20% em relação aos preços de mercado.
"A burocracia atrapalha, mas existem formas de atenuar os problemas com gestão, planejamento e antecipação das necessidades", afirma o físico, que passou a se valer do mecanismo de "adesão" a outras concorrências quando aparece uma demanda de última hora. O dispositivo legal permite que o Ceitec compre, pelo mesmo preço, produtos ou serviços licitados por órgãos federais em qualquer parte do país.
Cylon foi contratado não só por sua experiência científica, mas também por ter passado pelo setor público, onde acumulou conhecimento. Ele sucedeu o alemão Eduard Weichselbaumer, que havia assumido em 2009 e deixou o cargo em função dos entraves burocráticos que encontrou.
Cylon adotou a estratégia de desenvolver, fazer protótipos e fabricar chips apenas para clientes corporativos, e não mais produtos acabados com circuitos integrados, como estava previsto no projeto do chip para um brinco de rastreabilidade bovina: "Vamos reduzir o risco comercial e tecnológico da empresa. Se fôssemos fazer produtos completos, teríamos que abrir canais de distribuição e perderíamos o foco."
A tecnologia da XFab permite a fabricação de circuitos com 600 nanômetros de dimensão. É o caso do "chip do boi", que opera em baixa frequência de 134,2 quilohertz e será o primeiro a entrar em linha de produção em versão aprimorada, que permite a regravação de dados. "É uma tecnologia usada em todo o mundo, mas há certas demandas para as quais seguiremos contratando fabricantes no exterior", diz.
Segundo o executivo, o plano é que o Ceitec se especialize no segmento de identificação por radiofrequência (RFID na sigla em inglês), mas pode trabalhar com outras aplicações, como o chip que desenvolve para comunicação em banda larga sem fio WiMax. Ontem, o centro anunciou a conclusão do projeto de mais dois circuitos, um para identificação eletrônica de produtos e outro para o programa de identificação veicular do Departamento Nacional de Trânsito (Denatran).
Esses chips usam a tecnologia de 180 nanômetros, operam em ultra-alta frequência (UHF) de 915 megahertz (MHz) e foram enviados ao exterior para que seja feito o protótipo. Até o fim maio, será concluído o desenvolvimento de um circuito para rastreamento de produtos perecíveis, com tecnologia de 350 nanômetros e operação em alta frequência (13,56 MHz).
A partir de agora, segundo Cylon, até o trabalho de pesquisa, desenvolvimento e projeto poderá, em alguns casos, ser feito em parceria com universidades, instituições de pesquisas e empresas. O executivo conta com uma equipe de 129 pessoas e deverá contratar mais 112 até o fim de 2012.


Gastos privados com Educação

Naercio Menezes Filho

Diante da péssima qualidade da educação pública brasileira, muitas famílias acabam gastando uma parcela significativa da sua renda com educação privada. Uma pesquisa recente do Centro de Políticas Públicas (CPP) do Insper calculou pela primeira vez o total de gastos privados com educação como proporção do Produto Interno Bruto (PIB), utilizando dados das pesquisas de orçamentos familiares (POF) do IBGE. O valor gasto pelas famílias brasileiras com educação atingiu 1,3% do PIB em 2009. Isso é muito ou pouco?
O gráfico compara os gastos públicos e privados com educação em vários países do mundo. Podemos verificar que os gastos do Brasil (tanto públicos como privados) estão um pouco acima da média da OCDE. Em termos de gastos públicos, o Brasil gasta mais do que Chile, Alemanha e Coreia e menos do que os Estados Unidos e a Islândia. Vale notar que as estatísticas brasileiras não incluem os gastos com aposentadoria dos professores das redes públicas de ensino, ao contrário do que ocorre na maioria dos países da OCDE. Em termos privados, o Brasil gasta mais do que México e Portugal, mas menos do que Coreia do Sul e os Estados Unidos.
O total gasto pelas famílias com educação em cada país depende de uma série de fatores. O primeiro deles é a qualidade da educação pública. Quanto maior é o aprendizado dos alunos nas escolas públicas, menor é a probabilidade de que as famílias queiram gastar sua renda com educação privada. Além disso, o montante gasto depende da importância do aprendizado para o acesso às melhores faculdades de cada país. No Brasil, por exemplo, o acesso ocorre por meio de vestibulares concorridos. Assim, muitas famílias prefeririam colocar seus filhos nas melhores escolas privadas, mesmo que as escolas públicas fossem boas, para aumentar a chance de ingresso. Comparam custo e benefício. O mesmo ocorre na Coreia, na China e no Vietnam, onde a educação é verdadeira obsessão nacional.
País gastou em 2009 cerca R$ 15 mil por aluno do ensino superior, e só R$ 3 mil por aluno no ensino básico
Além disso, o estágio de desenvolvimento do país conta muito. Nos países mais ricos, como os Estados Unidos, as famílias já dispõem de renda suficiente para gastar com educação, sem que isso prejudique outros gastos essenciais com saúde, habitação e alimentação. No Brasil, apenas uma parte das famílias está nessa situação, embora 33% delas tenham gasto algum montante com educação em 2009. Nesse caso, é a falta de alternativas que conta. Por fim, devemos levar em conta as diferenças institucionais entre os países. No Chile, por exemplo, há um sistema de "vouchers" em que as famílias podem matricular seus filhos em escolas privadas sem gastar recursos próprios, pois quem paga é o governo. No Brasil, gastos de até R$ 2.710,00 por ano são dedutíveis do Imposto de Renda.
Os dados nos permitem analisar também como são aplicados os gastos das famílias. Como esperado, a maior parte dos recursos é gasta com mensalidades de cursos regulares do ensino básico (30%) e superior (35%). Além disso, entre 2003 e 2009 os gastos com pós-graduação dobraram (de 3% para 6% dos gastos totais), acompanhando a valorização do mestrado pelo mercado. Os gastos com cursinhos para vestibular são significativos, enquanto os gastos com professores particulares ainda são pequenos. Os brasileiros gastaram quase R$ 2 bilhões com livros didáticos em 2009, ou seja, quase R$ 10 por habitante por ano. O gasto com o aprendizado de línguas estrangeiras, para complementar o que é oferecido nas escolas, foi de cerca de R$ 1,8 bilhão.
Vale notar que o gasto público, atualmente em 5,1% do PIB, é muito mal distribuído. Gastamos em 2009 cerca R$ 15 mil por ano por aluno do ensino superior, mas apenas R$ 3 mil por aluno no ensino básico. Dessa forma, o país teria muito a ganhar se os gastos públicos fossem redirecionados do ensino superior para o ensino básico, especialmente para o infantil. Na verdade, isso já vem ocorrendo, pois a razão entre os gastos públicos por aluno do ensino superior e básico, que era 11 em 2000, declinou para 5,2 em 2009. Política educacional na direção correta.
Em suma, para a classe média voltar para a escola pública, é preciso melhorar dramaticamente a qualidade do ensino nessa rede. Para que isso aconteça, antes de aumentar ainda mais os gastos públicos, é necessário melhorar a gestão do sistema público de ensino e distribuir melhor os recursos existentes.
Naercio Menezes Filho, professor titular - Cátedra IFB e coordenador do Centro de Políticas Públicas do Insper, é professor associado da FEA-USP e escreve mensalmente às sextas-feiras


POLÍTICA
Gerdau adere à frente que tenta derrubar encargo sobre conta de energia

Caio Junqueira | De Brasília

O empresário Jorge Gerdau, presidente do conselho de administração do Grupo Gerdau, iniciou esta semana na Câmara dos Deputados articulação com a Frente Parlamentar da Infraestrutura para derrubar o artigo 16 da Medida Provisória 517, que prorroga a Reserva Global de Reversão (RGR).
O encargo existe desde 1957 e incide sobre a conta de energia elétrica. A previsão legal era de que acabasse este ano, mas a MP editada no último dia de governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva a prorrogou até 2035. A estimativa é que o custo anual ao consumidor seja de R$ 2,5 bilhões.
A prorrogação fez com que 16 entidades ligadas ao setor, como a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a Associação Brasileira de Grandes Consumidores Industriais de Energia e de Consumidores Livres (Abrace), a Associação Brasileira de Companhias de Energia Elétrica (ABCE) e a Associação Brasileira do Alumínio (Abal) fizessem um manifesto na internet "pelo fim da RGR e pela competitividade da energia".
Não demorou para o movimento chegar no Congresso. "Há uma preocupação quanto ao crescente custo da energia elétrica. Temos no país uma contradição de ter uma das fontes de energia mais baratas do mundo, a água, e uma das energias mais caras do mundo também", afirmou o presidente da Frente Parlamentar, deputado Arnaldo Jardim (PPS-SP). Segundo ele, mais da metade do custo da energia decorre de impostos e a RGR é responsável por algo entre 1% e 1,5% do preço final da conta.
A estratégia desenhada pela Frente e por Gerdau esta semana envolve a realização, em maio, de audiência pública na Comissão de Minas e Energia, à qual deverão comparecer o próprio Gerdau e representantes da Eletrobras e da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). A linha que o empresário adotará será a de defesa da redução de custos para o setor produtivo, além de dizer que o governo não utiliza os recursos para a finalidade determinada pelo decreto, que é cobrir possíveis perdas dos concessionários de energia com as tarifas.
O governo, porém, é contra a alteração da MP. Afirma que os recursos da RGR são importantes porque se destinam à universalização do acesso á energia elétrica e financiam programas do governo nessa direção, como o Luz para Todos, uma das vitrines do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva e menina dos olhos da então ministra das Minas Energia, Dilma Rousseff.




ESPECIAL
Salário e perda de poder inflamam delegados

Compartilhamento de bancos de dados, trabalho conjunto no registro de boletins de ocorrência e até a possibilidade de construção de prédios para abrigar membros das duas corporações. O plano de integração entre as polícias Civil e Militar de São Paulo, tocado com cautela pelo governador, Geraldo Alckmin (PSDB), esbarra na insatisfação crescente da Polícia Civil. Ou, nas palavras da presidente da Associação dos delegados do Estado (Adpesp), Marilda Pansonato, "com a situação de desespero da categoria, já que ninguém quer permanecer na carreira".
Com o terceiro pior salário do país - menor apenas que no Pará e em Minas Gerais - e insatisfeitos com o tratamento a eles oferecido pelo secretário Antonio Ferreira Pinto, por 16 anos oficial da PM, os setores sindicalizados da instituição, cuja data-base para reajuste foi em 1º de março, assistem a debandada para outros Estados de colegas que ingressaram recentemente. Dos 180 novos delegados que entraram em 2009, 34 foram embora, um a cada cinco novatos. Os que ficaram não descartam a possibilidade de uma greve como a de 2008, que culminou no enfrentamento entre policiais civis e militares a 200 metros da sede do governo paulista.
A situação limite de confronto entre policiais e o Executivo contrasta com o declínio dos indicadores de violência. A taxa de homicídios é a menor da história recente no Estado. Para o analista criminal Guaracy Mingardi, do Fórum Brasileiro de Segurança, são diversos os fatores que, relacionados, produzem a queda nos índices de criminalidade. Desde o crescimento econômico do país, a médio prazo, até o recolhimento de armas via campanhas de conscientização: "No mais, taxa de homicídio cai quando melhora o trabalho preventivo, que inibe o sujeito de ir ao bar armado. Essa atribuição é da Polícia Militar". Que, diga-se, está satisfeita com o trabalho do secretário, segundo seus sindicatos.
Durante cerca de um ano, o aspirante à carreira de delegado de polícia em São Paulo, se aprovado em concurso, passa por um curso de formação na Academia de Polícia Dr. Coriolano Nogueira Cobra, a prestigiada Acadepol. Cada candidato custa, em média, R$ 100 mil ao Estado. "Quando entrei na polícia, em 1993, ganhava 21 salários mínimos. Hoje, ganho pouco mais de 14 salários", diz George Melão, presidente do Sindicato dos Delegados de São Paulo (Sindpesp). A categoria reivindica salários compatíveis com os da Polícia Federal, em torno de R$ 14 mil para delegado de polícia e R$ 7,5 mil para os demais policiais civis. Hoje, um delegado em São Paulo inicia a carreira com vencimentos de R$ 5, 4 mil em cidades com menos de 500 mil habitantes e R$ 5,8 nas cidades maiores.
Há um mês, o Sindpesp enviou ofício ao governador Geraldo Alckmin (PSDB), pedindo a demissão do secretário por tecer, publicamente, "exageradas críticas à Polícia Civil, dando a impressão de que seu intuito é desqualificá-la, menosprezá-la e que nutre certo rancor por esta instituição", afirma o documento. Em 2010, 223 policiais civis foram demitidos. Em 2009, ano em que Ferreira Pinto tomou posse, foram 67 demissões.
A insatisfação ganhou tons de revolta com a subordinação da corregedoria da Polícia Civil, que investiga infrações cometidas por seus policiais, ao gabinete do secretário: "Enquanto isso, o secretário acaricia e acalanta a PM. Não se pode entregar o controle das corporações a alguém com tamanho revanchismo", diz Melão. Ferreira Pinto defende a mudança: "Concluímos inquéritos que estavam parados. A mudança deu independência e agilidade à corregedoria na investigação."
Casos como dos traficantes colombianos Juan Carlos Ramirez Abadía e Ramón Manoel Yepes Penagos (El Negro), que pagavam propina a policiais, foram resolvidos depois da mudança e os policiais envolvidos foram exonerados. O delegado-geral Marcos Carneiro Lima, ao contrário da base sindicalizada da polícia Civil, foi favorável, mas faz uma ressalva: "Foi uma mensagem clara à sociedade de que não se tolera mais a corrupção. Agora, quando se fala que 900 policiais estão sendo investigados, essa informação está deturpada. A maioria dos registros é de infração administrativa [pequenas ocorrências, como o policial bater o carro ou esquecer o distintivo]. Não existe banda podre na Civil."
É nesse clima que o governo estadual prepara uma série de mudanças estruturais para a segurança pública de São Paulo. A primeira delas foi anunciada pelo governador antes mesmo de assumir o cargo, quando da formação de seu secretariado: o Departamento Estadual de Trânsito (Detran) deixa de ser responsabilidade da Pasta de Segurança e passa para a tutela da Secretaria de Gestão. O objetivo, além de oferecer um serviço mais eficiente, que será feito por funcionários públicos e terceirizados e liberar 1.349 policiais (incluindo delegados e investigadores) até então dedicados exclusiva ou parcialmente às atividades de trânsito, é desmontar os esquemas de corrupção que tomaram conta do órgão. No mais volumoso deles, o envolvimento de 162 policiais em fraudes nos contratos de emplacamentos e lacrações de veículos feitos pelo Detran, causando um rombo estimado em R$ 40 milhões. Todos os policiais envolvidos foram demitidos.
A integração entre as duas polícias, desejada pelo governo, se baseia nos resultados obtidos no Curso Superior de Polícia Integrado. Além de habilitar os oficiais ao posto de coronel PM e os delegados para a classe especial, o curso já foi reconhecido por lei como Doutorado em Ciências Policiais. Um de seus maiores entusiastas é Ferreira Pinto: "Durante um ano, há o contato entre eles, aprendem sobre a filosofia de cada um, trocam experiências. Essa mentalidade é refletida para seus comandados". Outra medida é o compartilhamento do arquivos de imagens da PM, o Fotocrim, agora disponível também para a Civil. O Fotocrim armazena 400 mil registros e 1,4 milhão de fotografias de criminosos, além de informações como local de ação, apelido e tatuagens. A aproximação, no entanto, não se atrela a pretensões de uma possível unificação das polícias. Para o comandante-geral da Polícia Militar, coronel Álvaro Batista Camilo, "passamos por um momento histórico com os esforços de integração. Mas cada um na sua competência. PM faz patrulhamento. Civil, investigação".
Nos próximos cinco meses, a Polícia Militar passará a registrar boletins de ocorrência (BO) em todo o Estado. Antes atribuição exclusiva da Polícia Civil, a decisão contou mais um ponto na insatisfação da Civil, que vê na mudança mais um carimbo de desprestígio ao seu trabalho, já que, em nenhum momento, se falou em dar melhores condições à Polícia Civil para fazer os registros com mais eficiência. "Por conta do sucateamento da instituição, já tinhamos virado "fazedores" de BO. Agora, nem isso", avalia Marilda. O governo alega que apenas pequenas ocorrências como furto ou extravio de documentos, que já podiam ser registradas via internet, poderão ser feitas pela PM. Além disso, com a mudança, o tempo médio para registro de BO cairá para oito minutos e sua investigação continuará a cargo da olícia Civil.

No interior do Estado, 279 municípios deixarão de ter um delegado de plantão. Os escrivães e os investigadores continuarão atendendo a população, mas sua chefia será aglutinada. Um delegado passará a cuidar de mais de uma cidade, no caso daquelas com menos de 10 mil habitantes.
Depois da veiculação pela imprensa, há pouco mais de um mês, de que o sociólogo Túlio Kahn, então chefe da Coordenadoria de Análise e Planejamento da Secretaria da Segurança, vendia serviços de consultoria para empresas com dados sigilosos sobre a violência no Estado, o governo resolveu torná-los públicos. Serão agora publicados mensalmente e por distrito policial. Até então, as estatísticas eram trimestrais e divulgadas por cidades. "Foi uma demanda da imprensa. Tivemos bom senso, até porque nem tenho um argumento válido para dizer que não deveria tornar público", observa Ferreira Pinto. A primeira leva de dados está prometida para hoje.

FONTE: VALOR ECONÔMICO

Nenhum comentário:

Postar um comentário