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terça-feira, 12 de abril de 2011

09 de abril de 2011 - CORREIO BRAZILIENSE


EXECUTIVO
Prejuízos na área espacial
Grupo binacional responsável por gerir o programa brasileiro registra perdas acumuladas de R$ 40,4 milhões desde 2008

Tiago Pariz

A empresa binacional Alcântara Cyclone Space (ACS), responsável por fazer avançar o programa espacial brasileiro, registrou em 2010 prejuízo acumulado recorde de R$ 40,4 milhões, duas vezes e meia maior do que o saldo negativo fixado em dezembro de 2009. Esse valor representa a situação financeira da empresa desde 2008 e vem acompanhado de um crescimento expressivo de gastos para a manutenção da máquina e não de investimento.
A despesa com pessoal cresceu 20% em 2010 e atingiu R$ 13 milhões, contra R$ 10,8 milhões no período anterior. O mesmo ocorreu com serviços terceirizados. A cifra mais que duplicou no ano passado e atingiu R$ 700,5 mil, contra R$ 340,3 mil. Essas duas cifras foram as principais responsáveis pelo aumento do prejuízo líquido da empresa de R$ 24,2 milhões. A despesa com viagens permaneceu basicamente inalterada, em R$ 1 milhão.
A Alcântara Cyclone Space, que até 25 de março era presidida pelo ex-ministro de Ciência e Tecnologia Roberto Amaral, também investiu na compra de veículos, móveis e utensílios. No fim de 2010, a empresa informou ter R$ 224,2 mil em automóveis, R$ 90 mil a mais que 2009. Com mobília, o ativo está registrado em quase R$ 270 mil, valor que era de R$ 211 mil no ano anterior.
Fontes ligadas à ACS dizem que a empresa não tem receita, já que o capital existente vem do acordo de cooperação Brasil-Ucrânia e, contabilmente, não pode ser tratado como receita. Ou seja, os R$ 40,4 milhões apresentado no balanço contábil representam o total de gastos desde 2008.
No ano passado, a ACS fechou contrato sem licitação de R$ 546 milhões para a construção de um novo centro de lançamentos de foguetes em Alcântara (MA). Esse montante deve ser investido até o ano que vem e busca o sucesso do veículo lançador de satélites Cyclone 4, de origem ucraniana. Até agora sem sucesso, a empresa binacional espera ter o veículo no espaço até o fim do próximo ano.
Em 2003, o Brasil teve um baque em seu programa espacial com a explosão do Veículo Lançador de Satélites em Alcântara. O foguete iria colocar em órbita um satélite meteorológico. A explosão, que matou 21 pessoas, teria sido causada por energia estática acumulada no local. O VLS, diferentemente do produto de cooperação entre Brasil e Ucrânia, é de construção da Força Aérea. Procurada, a assessoria de imprensa da Alcântara Cyclone Space (ACS) não deu resposta até o fechamento desta edição. O ex-presidente da empresa Roberto Amaral não atendeu aos telefonemas do Correio.


TOLERÂNCIA ZERO ÀS ARMAS ILEGAIS
Autoridades do Rio e do Congresso propõem rediscutir o Estatuto do Desarmamento

A necessidade por maior controle na posse de armas e por medidas de prevenção a novas tragédias pontuou o discurso dos políticos que homenagearam as 13 crianças mortas na Escola Municipal Tasso da Silveira. O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), defendeu a revisão do Estatuto do Desarmamento (Lei nº 10.826/2003) e a criação de leis mais rigorosas. “O Congresso deve lutar pela proibição da venda de armas no Brasil. Quero dizer: tolerância zero em relação a armas.”
“Não é que desapareçam os fanáticos, os desequilibrados de qualquer espécie, mas, na realidade, nós temos a obrigação de tirar os instrumentos que eles podem utilizar nessas circunstâncias”, continuou. A lei previa a realização de um referendo para que os brasileiros decidissem sobre a proibição ou a continuidade do comércio de armas de fogo e munições no país. A segunda opção foi a preferida pelos eleitores, com 63,94% dos votos válidos. Ainda assim, o presidente do Senado sustentou: “A realidade hoje é inteiramente diferente daquela época.”
A questão da posse de armas deve ser discutida por outra casa legislativa — a Assembleia do Estado do Rio de Janeiro —, segundo o deputado estadual Marcelo Freixo (PSol), presidente de Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) sobre o tema. “A CPI das Armas já tem trabalhado com essa lógica antes do ocorrido. Esse acontecimento só reforça que estamos na linha certa da discussão”, disse.
“É inadmissível em um país como o nosso que um sujeito (Wellington Menezes de Oliveira) como esse perfil tenha conseguido essas armas”, protestou ele, referindo-se à procedência dos revólveres usados pelo atirador. Ambos eram de origem nacional. Freixo ainda destacou “a facilidade para haver o tráfico de armas”, fruto da falta de comunicação entre setores do Exército, da Polícia Federal e das empresas privadas.
Durante o enterro dos corpos de Mariana Rocha de Souza e Larissa Silva Martins, no Cemitério do Murundu, em Padre Miguel, o secretário de Segurança Pública do Rio de Janeiro, José Mariano Beltrame, argumentou que o massacre na Escola Municipal Tasso da Silveira foi um ato isolado — segundo ele, as investigações, os depoimentos e a perícia provam isso. “Foi a ação de uma pessoa doente, que infelizmente cometeu essa monstruosidade.”
Beltrame, assim como José Sarney, defendeu novos debates a respeito do Estatuto do Desarmamento. “Qualquer campanha, rediscussão e legislação que seja séria e mostre resultado será bem-vinda.” Mas frisou: as ações do estado nem sempre bastam para evitar novas tragédias. “Dizer que isso nunca vai acontecer é leviano. Em segurança pública, nós acompanhamos e monitoramos para antecipar ações”, explicou.

Limites
Caso a proibição fosse aprovada por maioria simples do eleitorado, a aquisição de armas e de munição ficaria restrita às Forças Armadas, às polícias estaduais e federal, aos guardas municipais, às penitenciárias, às guardas portuárias, às empresas particulares de segurança e transporte de valores e às entidades desportivas de tiro legalmente constituídas.


País cheio de ameaças

Relatório divulgado ontem pelo Departamento de Estado Americano relata a ocorrência de abusos de direitos humanos, corrupção e homicídios cometidos por policiais no Brasil em 2010. O documento, publicado anualmente, compara o país com a Argentina e o Paraguai no que se refere a abusos, torturas e maus-tratos a presos.
De acordo com o relatório, “execuções extrajudiciais cometidas pelas polícias estaduais foram frequentes, particularmente nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro”. As péssimas condições dos presídios brasileiros também estão destacadas nas páginas do relatório, que, apesar de criticar o sistema carcerário, ressalta os esforços de alguns estados na busca pela melhoria de seus centros penais.
O Brasil também é citado pela violência e discriminação de mulheres, tráfico de pessoas, discriminação de povos indígenas e minorias, e por casos de trabalho forçado e infantil no setor informal. Segundo o relatório, o Brasil ainda sofre com ameaças à liberdade de imprensa.
Em um dos poucos pontos positivos do documento, as Unidades de Polícia Pacificadoras (UPPs) nas favelas são elogiadas. O departamento ressalta a significativa redução da “violência em dezenas de comunidades”.
As críticas dirigidas ao Brasil são semelhantes às que constavam em relatórios apresentados em anos anteriores. Alguns trechos, inclusive, são cópias de capítulos do relatório do ano passado.
Em nota, o Ministério das Ralações Exteriores avisa que não se pronunciará sobre documentos “elaborados unilateralmente por países, com base em legislações e critérios domésticos, pelos quais tais países se atribuem posição de avaliadores da situação dos direitos humanos no mundo”. No comunicado, o MRE reitera seu comprometimento com os sistemas internacionais de direitos humanos e alerta que os Estados Unidos não incluem no relatório a situação no próprio território norte-americano.
"Execuções extrajudiciais cometidas pelas polícias estaduais foram frequentes, particularmente nos estados de São Paulo e Rio de Janeiro”
Trecho do relatório do Departamento de Estado Americano


CONEXÃO DIPLOMÁTICA

Silvio Queiroz

O preço de ser levado a sério
Paris/Bruxelas — Em uma das semanas mais atribuladas dos últimos anos para a diplomacia francesa, o Ministério das Relações Exteriores, no elegante Quai D"Orsay, encontrou tempo e energia para cultivar uma relação que define como “única” no universo das novas potências emergentes. Em conversas reservadas com jornalistas brasileiros, diplomatas que acompanham de perto o país não hesitaram em defini-lo como “eixo prioritário” no contexto latino-americano e, mais que isso, a aliança de maior profundidade, de uma perspectiva histórica e até “amorosa”, entre as que a França vem costurando no novo cenário global multipolar. E, por isso mesmo, Paris se reserva direito a algumas cobranças sutis.
Uma dessas fontes atribuiu a Jacques Chirac, o antecessor imediato do presidente Nicolas Sarkozy, de enxergar essa nova ordem mundial em formação, que “se movimenta como as placas tectônicas da Terra”. E é nesse contexto que o Quai D"Orsay digere a abstenção brasileira na votação pela qual o Conselho de Segurança, por proposta da França e do Reino Unido, autorizou a intervenção militar na Líbia. “Estaríamos decepcionados se o voto fosse contrário”, explicou o diplomata. “O Brasil, enfim, se alinhou com os outros Brics e com a Alemanha.”
Ainda assim, a relutância do Planalto e do Itamaray em dar aval ao que Paris vê como uma operação humanitária e inadiável merece uma discreta censura. “É preciso correr riscos para ser um ator na cena internacional”, raciocina outro funcionário. Justamente por isso, mas não apenas por isso,
Sarkozy justifica a aposta no componente militar da parceria estratégica com o Brasil. “Não se trata apenas de vender submarinos, mas de construir junto”, ressaltou outro diplomata. “Para assumir as responsabilidades que correspondem ao status de uma potência global, é preciso ter os meios para isso, inclusive do ponto de vista militar. Mas é preciso também tomar decisões e fazer escolhas que não são fáceis.”

Charme
Nos escalões mais altos do Quay D"Orsay, é consenso que, entre as alianças estratégicas firmadas pela França — com China, Rússsia, África do Sul e outros —, a que mais avança é a brasileira. “Temos afinidades incomparáveis, seja na história, na cultura, na relação direta entre os povos e as sociedades. Vocês trazem na mala uma bagagem de simpatia que é irresistível.” A expectativa, agora, é para saber como ficarão as coisas no governo Dilma. “É preciso manter o animal vivo”, compara um diplomata. Até porque Sarkozy enfrenta as urnas daqui a um ano, e por ora o cenário é no mínimo difícil para os planos de reeleição.

Mon ami
Não por acaso, o ex-presidente Lula é objeto de indisfarçado interesse no Quai D"Orsay. Os diplomatas que se ocupam do Brasil — único país da região a ter uma diretoria a seu cargo — andam ávidos por saber o que anda fazendo e o que anda dizendo o “mon ami” de Sarkozy. Um funcionário com anos no ministério, inclusive em posto no Brasil, confidenciou que, “sem dúvida, Lula é o governante com quem o presidente se entendia melhor, pessoalmente”.

O bife ou o telefone
Dentro de aproximadamente um mês, quando delegações da União Europeia (UE) e do Mercosul iniciarem, em Assunção, a quinta rodada de conversações desde o relançamento das negociações para o primeiro acordo de associação comercial bloco a bloco, o lado de cá terá na manga uma carta que o outro jogador costumava monopolizar. Quando o processo foi interrompido, em 2004, e até a retomada, em maio de 2010, eram os europeus que apontavam as divisões no Mercosul como obstáculo ao progresso. A crise de 2008-2009, porém, atingiu o Velho Continente como torpedo a meia-nau: a urgência de conseguir mercados e contratos para suas áreas de excelência —produtos industriais e serviços — torna os exportadores europeus mais ávidos por um acordo que lhes abra as portas de uma região que aporta milhões de novos consumidores todos os anos. Eles dão sinais de que não mais cerrarão fileiras com os vizinhos agricultores, zelosos de proteger os próprios mercados das importações sul-americanas, se for esse o preço a pagar por contratos de que eles precisam para ontem.
A divergência não é nova, mas jamais tinha sido tão claramente exposta no QG da UE, em Bruxelas, no âmbito das diferentes áreas do executivo comunitário, a Comissão Europeia (CE). Em conversas reservadas com um grupo de jornalistas brasileiros, ao longo da semana, eurocratas que acompanham de perto as conversações prévias à reunião de Assunção deram a entender que “a área de comércio” da CE enxerga uma “oportunidade real” de avançar para um acerto e, com isso, abrir os portos sul-americanos para setores como a indústria automobilística e a telefonia. Evidentemente, ponderou um desses funcionários, tudo dependerá da contrapartida, “do quanto será possível abrir o mercado agrícola europeu”. Pelo lado dos que zelam pela economia rural europeia, é claro, a sensação é de que pagarão o pato os fazendeiros, em especial os produtores irlandeses de carne.
Nos imponentes edifícios da capital belga, desenha-se nos corredores uma queda de braço silenciosa entre o telefone e o bife.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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