DESTAQUE DE CAPA - NACIONAL
Dilma diz que País ''corrigiu'' caminho após regime militar
Em evento com as Forças Armadas, presidente enaltece democracia; por mudança no protocolo, militares não batem continência
Leonencio Nossa / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo
Em uma quebra de tradição militar, a presidente Dilma Rousseff não recebeu ontem continências durante solenidade de promoção de oficiais das Forças Armadas. Na cerimônia, no Salão Nobre do Planalto, os oficiais seguiram à risca pedido do próprio cerimonial do governo de não usar a continência como forma de deferência a Dilma, limitando-se ao aperto de mãos.
A norma do cerimonial que dispensa a continência a oficiais promovidos foi publicada em dezembro do ano passado, pouco após a eleição de Dilma.
Num discurso lido e calculado, a presidente ignorou o debate sobre violações dos direitos humanos nos anos do regime militar (1964-1985) e não permitiu imagens do momento em que recebeu as insígnias da Ordem da Defesa, maior comenda da área.
Dilma, porém, em frases endereçadas aos oficiais-generais, fez referências sobre o período militar, ressaltando que o País "corrigiu seus próprios caminhos". "Um país que conta, como o Brasil, com Forças Armadas caracterizadas por um estrito apego a suas obrigações constitucionais é um país que corrigiu seus próprios caminhos e alcançou elevado nível de maturidade institucional", disse.
Generais promovidos ontem disseram ao Estado que o fim da tradição da continência não significou nenhum tipo desrespeito à presidente, descartando qualquer atitude de provocação à ex-presa política e adversária da ditadura. Para ressaltar que a relação de Dilma com os militares está tranquila, a assessoria de imprensa do Planalto mostrou um folheto, de 20 de dezembro passado, destacando que a continência já não é recomendada aos oficiais promovidos. Na cerimônia daquele dia, o então presidente Lula recebeu continências de oficiais. Diz a nova norma: "Durante a apresentação, os oficiais generais não prestam continência individual".
O folheto é só uma orientação aos promovidos, não tendo poder de substituir a atual legislação sobre continência e honrarias. O decreto 2.243, de 3 de junho de 1997, estabelece que a continência é uma das formas de demonstração de respeito ao presidente da República por parte dos militares. A norma destaca que há "outras demonstrações" de deferência, como a simples observância à hierarquia, algo visto ontem na solenidade.
Mudanças. O fim da tradição da continência ao presidente faz parte de uma série de mudanças no cerimonial do Planalto feitas no final do governo Lula para ajustar a casa ao estilo de Dilma. Uma dessas mudanças foi o fim da obrigatoriedade de hasteamento da bandeira nacional nos palácios durante despacho ou permanência da presidente.
Na cerimônia, a presidente fez um afago aos militares rebatendo as críticas aos gastos com defesa. A presidente, porém, não comentou a decisão de cortar recursos da área militar e adiar a compra de caças para a FAB.
"Em um país socialmente desigual como o Brasil poderia parecer tentadora a noção de que a modernização e dimensionamento das Forças Armadas constituiriam esforço ocioso e prejudicial ao investimento em outros setores prioritários. Isso é um grande engano", disse. "O certo é que a defesa não pode ser considerada um elemento menor na agenda nacional." No evento em que promoveu 70 oficiais, Dilma ressaltou ainda o "profissionalismo" e "dedicação" dos militares.
SINAIS DE UMA RELAÇÃO DELICADA
Beijo na bandeira
Ao tomar posse, em 1º de janeiro, a presidente Dilma Rousseff quebrou o protocolo passar as tropas militares em revista, um dos momentos mais solenes da cerimônia. Ela caminhou diante da guarda de honra e, próxima às tropas perfiladas, beijou uma bandeira do Brasil. Em relação a seu passado de torturada política, Dilma frisou que não guarda rancor e deixou isso claro a militares.
Desaparecidos e vergonha
Também em sua posse, o chefe do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência, general José Elito Siqueira, afirmou que a existência de desaparecidos políticos na ditadura (1964-85) não deve ser motivo de vergonha, mas um "fato histórico". "Nós temos que ver o 31 de março de 1964 como dado histórico de nação, seja com prós e contras", afirmou. O caso provocou desconforto no Palácio do Planalto e levou a presidente a chamar o general para conversa reservada.
Comissão da Verdade
A criação da comissão para apurar fatos ocorridos na ditadura ainda provoca estranhamentos entre governo e militares. Dilma defende abertamente a criação da Comissão da Verdade. Os militares insistem que não é preciso reviver o passado.
Oficiais evitam bater continência, e Dilma destaca maturidade do Brasil
Em evento das Forças Armadas, a presidente e ex-presa política, ao receber as insígnias da Ordem da Defesa, evitou polêmicas e destacou a importância dos militares para a defesa do País
05 de abril de 2011 | 13h 22
Leonêncio Nossa, da Agência Estado
BRASÍLIA - Em sua primeira solenidade de promoção de oficiais das Forças Armadas, a presidente Dilma Rousseff ignorou nesta manhã o debate sobre violações aos direitos humanos nos anos do regime militar (1964-1985) e não permitiu imagens do momento em que recebeu as insígnias da Ordem da Defesa, maior comenda da área.
Durante o evento, realizado no Salão Nobre do Palácio do Planalto, que contemplou 70 oficiais da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, os promovidos evitaram bater continência à presidente e ex-presa política, limitando-se a apertar as mãos dos oficiais. A prática da continência ao chefe supremo das Forças Armadas era comum nas solenidades organizadas pelo cerimonial do palácio.
Na solenidade desta manhã, Dilma repetiu discursos de outros presidentes do período pós-ditadura ao ressaltar, de forma genérica, a "evolução democrática" das Forças Armadas e do País. Ela disse que o Brasil "corrigiu seus próprios caminhos" e alcançou uma "maturidade institucional". No discurso, ela também ressaltou o "profissionalismo" e a "dedicação" dos militares, destacando ainda a "importância" das Forças Armadas para garantia da defesa dos campos de exploração do pré-sal.
Dilma fez um afago aos militares rebatendo as críticas aos gastos com defesa. A presidente, porém, não comentou a sua decisão de cortar recursos da área militar e adiar a compra de caças para a Força Aérea Brasileira (FAB). "Em um País socialmente desigual como o Brasil, poderia parecer tentadora a noção de que a modernização e dimensionamento das Forças Armadas constituiriam esforço ocioso e prejudicial ao investimento em outros setores prioritários", afirmou. "Isso é um grande engano", completou. "O certo é que a defesa não pode ser considerada um elemento menor na agenda nacional".
Ao final da solenidade, a presidente evitou falar com jornalistas, que estavam numa área afastada do palco da cerimônia. A uma pergunta sobre os arquivos da repressão mantidos em sigilo pelas Forças Armadas, Dilma respondeu: "Parabéns pra você".
http://www.estadao.com.br/noticias/nacional,oficiais-evitam-bater-continencia-e-dilma-destaca-maturidade-do-brasil,702030,0.htm
Proteger pré-sal e fronteiras é prioridade da Defesa, diz Dilma
05 de abril de 2011 | 12h 55
REUTERS
A presidente Dilma Rousseff disse nesta terça-feira que a proteção das reservas de petróleo do pré-sal e das fronteiras da Amazônia é prioridade na estratégia de defesa nacional.
"As riquezas do pré-sal, descobertas nas profundezas do Atlântico, que impõem um novo estágio para as forças de defesa, a garantia efetiva da soberania nacional pela proteção das nossas fronteiras, tanto no oceano como também na Amazônia, se transformaram na prioridade da nossa estratégia de defesa", afirmou Dilma durante condecoração de militares no Palácio do Planalto, em Brasília.
A presidente defendeu o investimento em modernização das Forças Armadas e considerou um "grande engano" a "tentação" de classificar tais gastos como "esforço ocioso".
"Um Brasil plenamente desenvolvido precisará de Forças Armadas equipadas, treinadas, modernas para o cumprimento de suas funções", declarou no primeiro evento desde sua posse em que discursou diretamente a militares.
"A defesa não pode ser considerada elemento menor da agenda nacional", afirmou.
O governo anunciou um corte 50 bilhões de reais no Orçamento de 2011 em fevereiro, e o Ministério da Defesa foi um dos mais afetados pelo contingenciamento. A pasta perdeu 4,4 bilhões de reais, 26,5 por cento do Orçamento total.
Devido ao corte, a compra dos 36 caças para a Força Aérea Brasileira (FAB), um dos principais pontos da agenda da defesa brasileira, não deverá ocorrer neste ano. O custo estimado do projeto é de 12 bilhões de reais.
(Reportagem de Hugo Bachega)
http://www.estadao.com.br/noticias/geral,proteger-pre-sal-e-fronteiras-e-prioridade-da-defesa-diz-dilma,702020,0.htm
Por 2012, prefeitos fazem lobby para evitar cortes e Planalto estuda ceder
Reunidos em Brasília, administradores municipais pressionam Planalto para adiar decreto assinado por Lula no último dia de sua gestão, validando convênios pendentes (restos a pagar) até 30 de abril
João Domingos e Marta Salomon / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo
A presidente Dilma Rousseff já cogita ceder ao lobby dos prefeitos e prorrogar a validade de obras e serviços contratados por convênios feitos na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva. Para fazer valer o ajuste fiscal anunciado em fevereiro e não paralisar novos investimentos, o atual governo havia anunciado a intenção de cancelar parte das despesas contratadas pelo governo Lula e deixadas sem pagamento (os chamados restos a pagar). Porém, a pressão dos prefeitos, no ano que antecede a disputa eleitoral em que muitos tentarão a reeleição, pesou para o Palácio reavaliar o corte.
O Planalto deve manter os repasses de convênios feitos em 2009. Em relação a 2007 e 2008, deverá ser feito um estudo sobre obras licitadas e iniciadas, que também poderão ter seus contratos prorrogados. Somente obras não iniciadas serão cortadas. O cancelamento dos restos a pagar com as prefeituras poderá ultrapassar R$ 30 bilhões - o custo do polêmico projeto do trem-bala, calcula o governo.
Segundo o prefeito de Vitória, João Coser (PT), reeleito ontem presidente da Frente Nacional dos Prefeitos (CNJ), os cortes podem alcançar R$ 50 bilhões. Dados do Tesouro Nacional mostram que, no primeiro trimestre, o governo Dilma quitou R$ 7,9 bilhões de contas pendentes de investimentos contratados na administração Lula. Com isso, o pagamento de novos investimentos autorizados pela lei orçamentária de 2011 ficou limitado a R$ 306 milhões. E ainda restam R$ 47,7 bilhões por pagar só em investimentos.
Pânico. Coser afirmou que os prefeitos estão em pânico com a possibilidade de cortes dos convênios. Por isso, decidiram aproveitar a concentração que fizeram ontem, em Brasília, para a eleição da nova diretoria, e fazer um documento endereçado à presidente Dilma e à ministra do Planejamento, Miriam Belchior, no qual reivindicam a prorrogação dos contratos. A chapa eleita foi recebida pela presidente no final da tarde de ontem.
Golpe eleitoral. No documento, os prefeitos afirmam que se houver os cortes dos restos a pagar de 2007 a 2009 sofrerão um dos mais duros golpes às vésperas da eleição. Afinal, argumentaram durante as reuniões realizadas, se tiverem de abandonar obras não terminadas, ou já licitadas e não iniciadas, darão aos adversários nas eleições argumentos para os ataques durante a campanha do ano que vem.
Sem ter pago ainda convênios assinados em 2007, 2008 e 2009, Lula assinou no último dia de sua gestão ato que adiou a validade dos contratos do governo federal com as prefeituras não quitados para o dia 30 de abril.
De acordo com informações obtidas pelo Estado com interlocutores da presidente, os convênios assinados em 2009 não devem ser cortados porque se referem a um tempo muito curto, "quase um ontem". Quanto a 2007 e 2008, obras que não obtiveram, por exemplo, licença ambiental, ou que nem tiveram os projetos básicos aprovados, serão todas cortadas. Calcula-se que sejam entre 20% e 30%.
Como as verbas de quase todos os convênios tiveram a garantia das emendas de parlamentares ao Orçamento, o Congresso apoia a reivindicação dos prefeitos. "Claro que estamos do lado dos prefeitos. É justo que se adie o prazo de entrada dos cortes de verbas", disse o presidente interino do PMDB, senador Valdir Raupp (RO).
Os prefeitos ganharam o apoio também do vice-presidente Michel Temer, que na cerimônia de posse da diretoria da FNP disse que o governo é municipalista. "Podem contar com o governo", afirmou.
Prejuízo
O prefeito de Porto Alegre, José Fortunatti (PDT), lembrou que obras de asfalto em bairros populares foram licitadas, mas não iniciadas. "Se o ato do governo não for mudado vamos perder tudo".
De olho no eleitor
JOÃO COSER - PRESIDENTE DA FNP
"O governo decide pelos cortes, esquecendo-se de que lá no município quem cobra do prefeito é a comunidade"
VALDIR RAUPP - SENADOR (PMDB-RO)
"É justo que se adie o prazo"
ESPAÇO ABERTO
Regionalização e globalização
Mario Cesar Flores - O Estado de S.Paulo
Setores brasileiros relutantes à globalização vêm manifestando mais simpatia pela integração regional, em que é naturalmente maior a presença relativa do Brasil. Além de vista como útil ao comércio regional (em tese, é), no qual o Brasil se destaca, a alternativa é entendida também como reforço da região nas negociações em foros globais (como a OMC).
Os fatos não têm sido assim positivos no Mercosul: a Tarifa Externa Comum e o livre-comércio intrabloco estão longe do idealizado e nas negociações globais não tem havido segurança de convergência regional. Nosso trôpego Mercosul vem funcionando precariamente e funcionará pior se a Venezuela bolivariana nele ingressar de pleno, com suas idiossincrasias e seu antagonismo aos EUA - que não impede ser para os EUA mais da metade de sua exportação de petróleo... Para o comércio regional o ingresso tem potencial positivo, mas a prudência sugere-o inseguro, em razão do poder que a Venezuela terá para tumultuar arranjos extrarregionais, com os EUA e a União Europeia (UE), por exemplo.
A explicação dos tropeços do Mercosul é simples: uniões econômicas tendem à inconsistência quando são menos produto da conveniência econômica e mais da vontade política visionária. Se os interesses econômicos não se ajustam (quesito do sucesso da visão política, ao menos quando inexiste ameaça estratégica que a justifique) porque as economias são demasiado assimétricas e não complementares, se não competidoras, a inconsistência acaba avançando (para a infraestrutura a proximidade geográfica também é exigida). No Mercosul os quesitos estão atendidos na geografia (o que sugere potencial na infraestrutura, sobretudo na energia) e limitadamente na economia, na qual existem conflitos.
Nascido geoeconômico nos anos 1980, desde 2003 para o governo brasileiro o Mercosul tem sido mais geopolítico. O que o vem mantendo vivo tem sido menos a lógica econômica e mais a vontade política, sobretudo brasileira. Na política internacional ampla o Mercosul geopolítico faz sentido, mas um sentido até agora frágil na realidade; a esse respeito, uma dúvida instigante: nossos "companheiros" regionais apoiam a pretensão brasileira ao assento permanente no Conselho de Segurança da ONU...? De qualquer forma, porque visto como portador de potencial, seu preço vem sendo pago pelo Brasil, que está longe da opulência dos EUA do Plano Marshall, útil à recuperação da Europa pós-guerra e à defesa contra a URSS.
Há dificuldades em vários setores, a exemplo do gás boliviano e da energia de Itaipu, mas sobretudo no comércio, em que a Argentina é parceira saliente e difícil, os percalços da interação econômica agravados pela insegurança da vontade política argentina, positiva na infância "Sarney-Alfonsín" do acordo, regular com Menem (com o violento desabafo anti-Brasil do ministro da Economia Domingo Cavallo quando da desvalorização do real em 1999) e negativa com os Kirchner. Em suma, um contexto complexo, em que o Brasil vem sistematicamente cedendo vantagens.
A Argentina, país com potencial relevante, pode até estar certa no seu protecionismo anti-Brasil. Mas nesse caso vale a pena insistir no Mercosul geopolítico, sob turbulência econômica que inibe sua efetiva realização? Devemos continuar indefinidamente com nosso débil Plano Marshall caboclo, para o qual nos falta fôlego econômico e motivação estratégica? A ideia Mercosul é, portanto, positiva em tese, mas sua tumultuada realidade, hoje sustentada na vontade política, mais a brasileira, não tem correspondido ao ideal de sua criação. E a superação do déficit depende da vontade política também de nossos vizinhos, sujeita a injunções políticas internas e à visão que eles têm do Brasil, como parceiro merecedor de cuidados.
Além de insatisfatório no desempenho econômico interno, o Mercosul cerceia o Brasil no mundo porque impede acordos bilaterais (Brasil-UE, por exemplo) e a bilateralidade tendo o próprio Mercosul como uma ponta do bilateral (o que seria ótimo) é difícil em razão da dificuldade de conciliar interesses intrabloco. Quão mais difícil será com a Venezuela membro pleno...?
No mundo contemporâneo não há estanqueidade: acordos regionais, ainda que bem-sucedidos, não dispensam a interação globalizada, haja vista a UE, que procura ampliar seu comércio com o mundo porque precisa de produtos de fora (sobretudo commodities) e também porque o mercado global amplia o dinamismo de sua economia. Os EUA já investem mais na China que no México porque o retorno da China é maior, a despeito da moldura da Nafta e da proximidade do México! Enfim, nenhum país (ou região) pode menoscabar o comércio global, por vezes no pressuposto de que o mercado interno prescindiria do internacional - uma fantasia ou meia-verdade, variável de país para país: os EUA dependem mais do interno, o Japão, do externo. O Brasil, mais do interno, mas o externo já pesa.
A afirmação do então presidente Lula de que a "onda" da crise de 2008-2009 teria sido uma "marola" aqui porque o mercado interno compensou a retração do externo expressa um caso de meia-verdade: o mercado interno ajudou, mas não seria solução. Além de limitado o poder aquisitivo de parcela ponderável de nossa população, o consumo interno não poderia mesmo compensar a queda da exportação: o que fazer com dezenas de milhões de toneladas de soja se a UE e a China não as importassem? A queda da demanda de aviões, que atingiu a Embraer, teria compensação interna? Nossos parceiros regionais resolveriam isso...? A repercussão teria sido maior com mercado interno menor, mas ocorreria - e nosso PIB caiu 0,3% em 2009.
Priorizar a regionalização (ou a concepção Sul-Sul, lato sensu) é optar pelo natural destaque no Terceiro Mundo, engajar-se na globalização é optar pelo desejável caminho para o Primeiro Mundo. Nosso desafio é compatibilizar o Mercosul com o imperativo da globalização.
ALMIRANTE DE ESQUADRA - (REFORMADO)
NOTAS & INFORMAÇÕES
O que a China busca no Brasil
Com base em estudo recente do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), aquele país seria o que mais investiu no Brasil em 2010. Segundo o documento, os investimentos chineses no País foram de US$ 12,9 bilhões no ano passado, o que representaria 26,6% do total de investimentos estrangeiros diretos no País em 2010 (US$ 48,46 bilhões). O levantamento, porém, deve ser examinado com cuidado, uma vez que muitos dos investimentos mencionados como feitos no Brasil não passam, na realidade, de compra de participação em companhias internacionais aqui instaladas. Não há melhor exemplo desse tipo de investimento do que os US$ 7,1 bilhões gastos pela estatal chinesa da área petrolífera, a Sinopec Corp, na aquisição de 40% da Repsol Brasil, controlada pelo capital hispano-argentino. A operação pode permitir aumento do capital da subsidiária brasileira para financiar sua atuação na camada do pré-sal, mas não se trata de um investimento estrangeiro direto, com entrada de capital. Houve outros negócios desse gênero, mas, mesmo não computando tais operações, a China, a partir do ano passado, vem se credenciando como um dos maiores investidores no País, o que pode ser útil ao desenvolvimento econômico nacional, desde que as leis em vigor sejam cumpridas e as autoridades brasileiras não se deixem levar pela ingenuidade.
"A China vem consolidando há alguns anos uma base internacional de matérias-primas e o Brasil passou a fazer parte desta base de fornecedores", diz o estudo. De fato, o maior volume de investimentos provenientes da China tem sido voltado para as áreas de petróleo, mineração e produção agrícola. Estatais chinesas já adquiriram reservas de minério de ferro de milhões de toneladas, em Minas Gerais e na Bahia, associadas ou não ao capital nacional. O níquel e a cadeia de produção do alumínio estão também na mira das gigantes estatais da China.
No setor do agronegócio, ainda há pouco foi anunciado um investimento de US$ 4 bilhões pela Chongqing Grain Group, na instalação de um polo de esmagamento de soja em Barreiras (BA), possibilitando a exportação de maior volume de óleo de soja. O risco é que complexos industriais desse tipo adquiram áreas de cultivo em território nacional além do que a lei permite.
O recente parecer da Advocacia-Geral da União, reafirmando a validade da Lei 5.709/71, que estabelece limites para a posse de terras por estrangeiros, tem caráter geral, mas certamente levou em conta o crescente interesse chinês pela aquisição de reservas minerais e de áreas agricultáveis no País.
Os setores de energia elétrica e de telecomunicações exercem forte atração sobre as companhias chinesas, não havendo barreiras à sua entrada no País. É uma situação muito diferente daquela com a que se deparam empresas brasileiras dispostas a investir em setores considerados estratégicos por Pequim. Como o boicote à Embraer na China deixa patente, não há reciprocidade de tratamento nesses casos.
O estudo destaca que a preferência das companhias chinesas é por fusões e aquisições, que correspondem a 83% dos investimentos que têm feito no Brasil. A participação no capital pode ser feita no exterior ou no próprio país. Não há números que permitam avaliar se os chineses se contentam com uma participação minoritária, que deveria facilitar, segundo ainda a CEBC, a superação de "diferenças culturais". Pelo que a prática tem mostrado, nem sempre essa forma de operar prevalece.
Como consta do estudo, somente 11,5% dos investimentos chineses no Brasil são "joint ventures", aliando o capital de fora ao nacional. Uma terceira modalidade é denominada "greenfield" (construção de uma unidade em território estrangeiro), sendo exemplo o aporte de US$ 400 milhões pela montadora Cherry, que vai produzir automóveis no País. Esse segmento representa 5,2% do total de investimentos da China no País e, evidentemente, a Cherry veio para o País para disputar o mercado interno, já superabastecido de veículos, não para montar aqui uma plataforma de exportação.
NACIONAL
Temer é alvo de investigação por suspeita de corrupção
Vice-presidente afirma que acusações já foram analisadas e arquivadas pela Procuradoria-Geral da República em 2002
O ministro Marco Aurélio Mello, do Supremo Tribunal Federal (STF), tornou público um inquérito enviado ao órgão que tramitava em sigilo e investiga suposto envolvimento do vice-presidente da República, Michel Temer, num esquema de corrupção no Porto de Santos. "A tônica na administração pública é a publicidade. Os dados devem ser explícitos", disse o ministro.
Aberto em 2006, o inquérito teve origem em notícias envolvendo uma ação de reconhecimento de dissolução de união estável movida por uma ex-companheira do ex-presidente da Companhia Docas do Estado de São Paulo (Codesp), Marcelo de Azeredo. Na ação foi imputado a Azeredo, Temer e a uma terceira pessoa - identificada apenas como Lima - fraudes em licitações em troca de propinas dos vencedores das concorrências.
Por entender que havia indícios de participação de Temer em crimes, a Justiça Federal em Santos encaminhou o inquérito ao STF. Ontem, o jornal Folha de S.Paulo revelou que o processo fora deslocado recentemente da Justiça comum para o Supremo.
No STF, o inquérito recebeu o número 3105 e Temer foi identificado com as iniciais de seu nome. "Nada justifica, em face do procedimento revelado nestes autos, a adoção de iniciais", discordou o ministro. "Restrinjo o sigilo aos apensos, que, assim, precisam ficar envelopados e lacrados para acesso restrito."
O inquérito foi encaminhado ao procurador-geral da República, Roberto Gurgel. Procurado ontem, o chefe do Ministério Público não se manifestou. Caberá a ele decidir se a investigação deve continuar ou ser arquivada.
Ontem, em Brasília, Temer disse que o assunto já foi superado. "É um caso velho. É mais do que velho, é antiquíssimo. Já foi decidido pelo procurador-geral da República", disse, referindo-se às acusações arquivadas em 2002. "Você sabe que quando há uma decisão já proferida pela procuradoria, não se pode retomar o mesmo fato, a não ser que haja provas novas. Digo mais. Não há conexão nenhuma entre os fatos lá descritos e a realidade." Mais cedo, em nota, Temer destacou que as acusações foram arquivadas, na época, por "absoluta ausência de provas e inconsistência da denúncia".
AVIAÇÃO
Diretor do BNDES vai assumir a Secretaria de Aviação Civil
Edna Simão / BRASÍLIA e Alexandre Rodrigues / RIO - O Estado de S.Paulo
Dezoito dias depois da publicação da medida provisória que criou a Secretaria de aviação Civil, a presidente Dilma Rousseff anunciou ontem o nome do atual diretor de Infraestrutura, Insumos Básicos e Estruturação de Projetos do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), Wagner Bittencourt de Oliveira, para comandar a nova pasta. Ele é engenheiro e funcionário de carreira do BNDES desde 1975.
A saída de Oliveira do BNDES não deve ser a única na diretoria da instituição. No mercado é dado como certa a substituição de pelo menos dois outros diretores do banco nos próximos dias.
Um dos que também estariam de saída é o diretor de Mercado de Capitais, Eduardo Rath Fingerl. Executivos de empresas que têm como sócio o BNDES já relataram a expectativa de saída dele, que é funcionário de carreira do banco com tempo suficiente para se aposentar e que já teria comentado o interesse de se dedicar à carreira acadêmica.
Outra provável vaga na diretoria do BNDES deverá ser a do vice-presidente do banco, Armando Mariante. Desde janeiro, o mercado financeiro especula sobre sua transferência para a direção das operações no Brasil de um banco estrangeiro baseado em São Paulo.
Se, além de Bittencourt, a saída dos outros dois executivos for confirmada e as vagas não forem definidas por critérios políticos, o presidente do BNDES, Luciano Coutinho, poderá finalmente ter a chance de formar uma diretoria mais afinada com seu estilo. Quando assumiu o BNDES, em 2007, no lugar de Demian Fiocca, Coutinho manteve praticamente toda a diretoria deixada pelo antecessor.
Mitsubishi começa a fabricar avião que concorrerá com a Embraer
O MRJ, com capacidade para 70 a 90 passageiros, será o primeiro jato comercial fabricado no Japão
A Mitsubishi Heavy Industries e a Mitsubishi Aircraft Corp. começaram ontem a fabricar o Jato Regional Mitsubishi (MRJ), projetado para transportar de 70 a 90 passageiros.
Em cerimônia marcando o início da atividade da unidade da Mitsubishi Heavy em Tobishima, na região administrativa de Aichi, o presidente da Mitsubishi Aircraft, Hideo Egawa, disse que o MRJ é "o símbolo da esperança de que nosso país vai reviver e se reerguer depois da tragédia de 11 de março" - referindo-se ao terremoto e ao tsunami que devastaram parte do país -, segundo o jornal Nikkei.
Egawa afirmou que o terremoto não afetou os planos de produção do MRJ. O primeiro voo da nova aeronave está previsto para 2012 e as primeiras entregas para as companhias aéreas All Nippon Airways e para a norte-americana Trans States Holdings estão previstas para 2014.
A expectativa é de que o MRJ consuma 20% menos combustível do que outros aviões de tamanho comparável. Depois da montagem da fuselagem em Tobishima, a montagem das asas e o término da construção deverão ser feitos em uma fábrica da Mistubishi Heavy em Komaki Minami.
Retomada. O projeto do MRJ foi anunciado no início de 2008, e previa investimentos de US$ 1 bilhão no desenvolvimento. É o primeiro avião comercial construído no Japão desde o YS11, movido a hélice, cuja produção foi interrompida em 1973.
Com sua capacidade, vai concorrer diretamente com jatos fabricados pela Embraer e pela canadense Bombardier. À época do anúncio do projeto, o presidente da Embraer, Frederico Curado, disse que os planos da Mitsubishi não representavam uma ameaça imediata à empresa. "Não é ameaça hoje, ou nos próximos 5 a 10 anos. Daqui a 20, 25 anos, pode ser uma tremenda ameaça e os chineses também poderão ser, dependendo da obstinação deles", disse Curado à agência Reuters. / DOW JONES NEWSWIRES
Investimento
US$ 1 bi era a previsão de investimentos no desenvolvimento do MRJ quando o projeto foi anunciado pela Mitsubishi, em 2008
70 a 90 passageiros será a capacidade dos jatos, que devem concorrer diretamente com aviões fabricados pela Embraer e pela canadense Bombardier
STF nega habeas corpus para controladores
O Supremo Tribunal Federal negou ontem pedido de habeas corpus feito pela Federação Brasileira das Associações de Controladores de Tráfego Aéreo para que os dois controladores de voo envolvidos no acidente da Gol, em 2006, não fossem processados ao mesmo tempo na Justiça Federal e na Justiça Militar. Os dois sargentos são acusados por falhas que levaram o jato Legacy a colidir com o avião.
Azul quer ampliar voos no Norte e no Nordeste
A Azul pediu autorização à Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) para operar novos voos entre Rio e Salvador e entre Salvador, Recife e Fortaleza. Segundo a Azul, essas rotas permitirão a realização de viagens de ida e volta no mesmo dia. Além disso, a empresa pediu novas ligações entre Fortaleza e Belém e Belém e Manaus. Se forem aprovados, os voos terão início em 10 de julho.
SÃO PAULO RECLAMA
PARCERIA COM A STAR ALLIANCE
Leitora questiona a TAM
Estou grávida de 7 meses e moro em Angola. Foi divulgado que a TAM entrou para a Star Alliance, programa de milhagens que reúne 27 companhias aéreas e que estava sem membro oficial no Brasil desde o fim da parceria com a Varig, em 2007. Isso é mentira. A TAM me informou, após 44 dias sem resposta, que não faz upgrade da South African Airways (SSA). Quem arca com o meu prejuízo, se a demora para receber uma resposta prejudicar a minha chance de obter o upgrade com a SSA? Quais são as consequências por demorar 44 dias para a TAM me responder, por anunciar um serviço que não existe e não priorizar o atendimento a uma consumidora grávida?
MADELEINE LACSKO / SÃO PAULO
A TAM responde que informou a sra. Madeleine de que a empresa parceira não faz parte do Star Alliance Upgrade Award, produto que permite que os clientes usem seus pontos ou milhas para fazer upgrade de cabine entre as empresas-membros da aliança. Esclarece que tem acordos de integração dos programas de fidelização firmados com todas as companhias-membros da Star Alliance, que permitem aos clientes de todas as empresas da aliança acumular e resgatar pontos em voos operados por qualquer uma das parceiras.
A leitora critica: A TAM não respondeu minhas questões. A parceria com a South African Airways permite o crédito na TAM dos trechos voados pela parceira. Apesar de ter enviado uma cópia do meu cartão de embarque, a TAM respondeu que a companhia parceira "não me encontrou no voo". A SSA não confirmou tal afirmação da TAM e ainda me creditou os pontos devidos em seu próprio programa de milhagem.
Agência dos EUA ordena inspeção de aeronaves Boeing 737
05 de abril de 2011 | 18h 45
REUTERS
A agência norte-americana de aviação, FAA, ordenou nesta terça-feira que as companhias aéreas inspecionem seus aviões 737, da Boeing, com muito tempo de voo por rachaduras na fuselagem.
Companhias que usam as aeronaves 737-300, 400 e 500 com mais de 35 mil "ciclos" --decolagens e pousos-- devem realizar as checagens eletromagnéticas dentro de cinco dias.
A ordem veio em decorrência do pouso forçado no Arizona feito por uma aeronave da Southwest Airlines com um buraco na fuselagem, na semana passada. A agência também solicita que companhias aéreas examinem seus 737 antes que eles atinjam a marca de 30 mil ciclos.
As inspeções mais urgentes, envolvendo cerca de 80 aeronaves, em sua maioria da Southwest, deve ser repetida a cada 500 ciclos. A Southwest concluiu uma rodada de testes voluntariamente nesta terça-feira.
(Reportagem de John Crawley)
http://www.estadao.com.br/noticias/cidades,agencia-dos-eua-ordena-inspecao-de-aeronaves-boeing-737,702165,0.htm
OPINIÃO
A energia nuclear no Brasil
*Joaquim F. De Carvalho - O Estado de S.Paulo
O Brasil pode cobrir seu consumo de energia elétrica apenas com fontes renováveis de energia primária, sem apelar para usinas nucleares.
Isso não significa que se devam negligenciar as aplicações de radioisótopos na medicina, na agricultura, na indústria e na pesquisa científica. Essas aplicações têm importância crescente e deveriam ser tratadas prioritariamente nos orçamentos federais e estaduais, para ciência e tecnologia.
Apesar de toda a polêmica desencadeada pelas organizações ambientalistas, a alternativa mais interessante para ampliar o sistema elétrico brasileiro seria a de explorar potenciais naturais da Amazônia, tais como o potencial hidrelétrico, o turismo ecológico e o extrativismo.
Se o governo adotar uma política energética inteligente e rigorosamente aplicada, as empresas públicas e o empresariado do setor de geração elétrica deverão se transformar nos maiores defensores do ecossistema amazônico, pois alterações causadas por "plantations" e projetos de pecuária e de exploração mineral comprometerão o potencial hidrelétrico, inviabilizando as próprias hidrelétricas.
De acordo com a Empresa de Pesquisa Energética (EPE), o potencial hidrelétrico brasileiro é de 261 mil MW, dos quais 172 mil ainda não estão em aproveitamento.
Considerando-se que a região amazônica detém 65% do potencial hidrelétrico não aproveitado e se admitindo que, por motivos de caráter social e ambiental, os planos de expansão sejam reformulados, visando a limitar em 80% o aproveitamento desse potencial, ainda assim o Brasil poderá adicionar uma capacidade hidrelétrica de 137,6 GW aos 71,2 GW já instalados, perfazendo uma capacidade hidrelétrica total de 226,5 GW (incluindo as pequenas centrais hidrelétricas).
É importante notar que o aproveitamento do potencial hidrelétrico amazônico ocuparia menos de 1% (um por cento) da área da região, ou seja, menos do que ocupam alguns desses grandes projetos agrícolas ou de pecuária, contra os quais os ambientalistas não se manifestam.
Por outro lado, segundo um levantamento feito pelo Centro de Pesquisas de Energia Elétrica da Eletrobrás (Cepel), com a consultoria das firmas Camargo-Schubert Energia Eólica e True Windows Solutions, o potencial eólico brasileiro para ventos com velocidade média superior a 7 m/s é de 143 mil MW.
A interligação do sistema hidrelétrico com o sistema eólico permitiria que parte da energia gerada pelas centrais eólicas fosse "armazenada" - isto é, acumulada na forma de água nos reservatórios hidrelétricos - de maneira semelhante às malhas termoeólicas de alguns países europeus, nas quais a energia dos parques eólicos permite que se economize gás natural ou óleo combustível. Esse sistema poderia operar em sinergia com usinas termoelétricas a biomassa, pois a frota automotiva brasileira é em grande parte alimentada com etanol, forçando a produção do bagaço de cana (subproduto do etanol) em escala suficiente para alimentar termoelétricas de pequeno e de médio portes, totalizando, em conjunto, uma capacidade da ordem de 10 mil MW por volta de 2012, segundo a União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica).
Como, de acordo com o IBGE, a população brasileira deverá se estabilizar em 215 milhões de habitantes, por volta do ano 2040, o sistema integrado hidro-eólico-térmico (a bagaço) teria um potencial suficiente para oferecer eletricidade à população, em termos per capita, em quantidades equivalentes às de países de alto nível de qualidade de vida.
Portanto, ao contrário da França e do Japão, que não têm alternativa, o Brasil não precisa correr o risco de gerar em centrais nucleares a energia elétrica de que precisa ou precisará.
*MESTRE EM ENGENHARIA NUCLEAR E DOUTOR EM ENERGIA PELA USP, FOI DIRETOR INDUSTRIAL DA NUCLEN (ATUAL ELETRONUCLEAR)
BELO MONTE
OEA pede ao Brasil para suspender Belo Monte
Itamaraty considerou documento enviado pela Organização dos Estados Americanos uma interferência indevida em assuntos nacionais
Fátima Lessa - O Estado de S.Paulo
ESPECIAL PARA O ESTADO / CUIABÁ
A Organização dos Estados Americanos (OEA) determinou que o governo brasileiro suspenda "imediatamente" o processo de licenciamento e construção do Complexo Hidrelétrico de Belo Monte, em Altamira (PA) sob o risco de ser responsabilizado internacionalmente pelos impactos negativos causados pelo empreendimento.
Em comunicado oficial enviado ao Itamaraty, a Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH) do organismo internacional argumenta o suposto prejuízo da construção da obra aos direitos das comunidades tradicionais da bacia do Rio Xingu. O governo tem 15 dias para comunicar que medidas foram tomadas.
Além da suspensão, a Comissão determina que o governo brasileiro realize o processo de consulta "prévia, livre, informada, de boa-fé e culturalmente adequada" com cada uma das comunidades indígenas afetadas antes da construção da usina.
A decisão da CIDH é uma resposta a um pedido encaminhado pelo Movimento Xingu Vivo para Sempre e 40 entidades de defesa das comunidades indígenas e da Bacia do Xingu em novembro de 2010.
De acordo com a denúncia, as comunidades indígenas e ribeirinhas da região não teriam sido consultadas, de forma apropriada, sobre o projeto.
Reação. O governo brasileiro recebeu com "estarrecimento" e "perplexidade" e considerou "injustificáveis" as solicitações da OEA. Em uma nota dura, o Itamaraty criticou a Organização pela interferência que foi considerada indevida em assuntos nacionais.
"O governo brasileiro, sem minimizar a relevância do papel que desempenham os sistemas internacionais de proteção dos direitos humanos, recorda que o caráter de tais sistemas é subsidiário ou complementar, razão pela qual sua atuação somente se legitima na hipótese de falha dos recursos de jurisdição interna", informa a nota.
A nota lembra que Belo Monte teve sua construção autorizada pelo Congresso e passou por inspeções e estudos de impacto ambiental tanto pelo Ibama quanto pela Funai e o governo tem atuado para responder às "demandas existentes" das populações indígenas. "O governo brasileiro considera as solicitações da CIDH precipitadas e injustificáveis."
"Estamos acompanhando com muito rigor a situação das populações indígenas, sabemos da sua importância. Não precisamos da OEA para nos dizer o que fazer. Foram feitas várias ações internas e ainda são feitas consultas", disse o porta-voz do Itamaraty, ministro Tovar Nunes.
O diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hubner, também considerou descabido o pleito da entidade. "Não sei o que a OEA tem a ver com o processo de licenciamento de Belo Monte."
Segundo Hubner as audiências públicas com as comunidades indígenas foram devidamente realizadas. / COLABORARAM LISANDRA PARAGUASSU E KARLA MENDES
Reações
TOVAR NUNES - PORTA-VOZ DO ITAMARATY
"Estamos acompanhando com muito rigor a situação das populações indígenas, sabemos da sua importância. Não precisamos da OEA para nos dizer o que fazer. Foram feitas várias ações internas e ainda são feitas consultas."
NELSON HUBNER - DIRETOR-GERAL DA ANEEL
"Não sei o que a OEA tem a ver com o processo de licenciamento de Belo Monte."
INTERNACIONAL
CRISE EM ABIDJÃ
ONU diz que presidente de facto da Costa do Marfim negocia rendição
Jamil Chade - O Estado de S.Paulo
Diplomatas da ONU e da França informaram ontem que o presidente de facto da Costa do Marfim, Laurent Gbagbo, pediu um cessar-fogo. Segundo os franceses, ele está em um bunker construído sob sua residência oficial. O chefe militar de Gbagbo, Philippe Mangou, confirmou que seus soldados pararam de combater. As tropas do presidente eleito, Alassane Ouattara, já controlam Abidjã, maior cidade do país.
"A guerra acabou", disse à TV France24 Alcide Djedje, chanceler de Gbagbo, que foi à embaixada francesa negociar a rendição. "Pela primeira vez, Gbagbo deu sinais de que aceitará a vontade do povo e os resultados da eleição", afirmou Choi Young-jin, enviado da ONU à Costa do Marfim, em referência à votação de novembro - Ouattara foi reconhecido como vencedor pela comunidade internacional, mas Gbagbo nunca aceitou o resultado.
Em Paris, o ministro das Relações Exteriores da França, Alain Juppé, garantiu que Gbagbo estava a ponto de se render. Segundo Juppé, a única saída para o líder marfinense é deixar o poder e reconhecer formalmente Ouattara como vencedor das eleições.
Horas depois, no entanto, Gbagbo adotou um tom desafiador em entrevista por telefone à TV francesa LCI. Ele confirmou que solicitou o cessar-fogo, mas negou que estivesse a ponto de se render e reiterou que é o vencedor da votação.
"O Exército pediu a suspensão das hostilidades e está discutindo o cessar-fogo, mas, em nível político, não foi tomada nenhuma decisão", disse Gbagbo. "Venci as eleições e não negocio a minha saída."
De acordo com testemunhas, os combates em Abidjã foram interrompidos às 9h30 (6h30, hora de Brasília) e soldados leais a Gbagbo foram vistos abandonando suas posições. Segundo Mangou, o presidente de facto estaria apenas esperando que a ONU desse garantias de segurança para ele, sua família e seus aliados.
Na semana passada, a Cruz Vermelha denunciou o massacre de 800 pessoas perpetrado por partidários de Ouattara no interior do pais.
Desde que a guerra civil começou na Costa do Marfim, pelo menos 1 milhão de pessoas foram obrigadas a deixar suas casas, das quais cerca de 400 mil cruzaram as fronteiras do país.
Após quatro meses de intensos combates, o impasse entre as duas forças rivais começou ser rompido na segunda-feira, quando a ONU e a França decidiram atacar posições de Gbagbo em Abidjã, abrindo caminho para o avanço dos soldados de Ouattara.
HAITI
Candidata derrotada denuncia fraude
A ex-primeira-dama haitiana Mirlande Manigat, que perdeu as eleições presidenciais do Haiti para Michel Martelly, acusou ontem o Comitê Eleitoral Provisório (CEP) de ter falsificado o resultado do segundo turno da votação em favor de seu oponente. O vencedor prometeu ontem que será "o presidente de todos os haitianos".
PERU
Eleição peruana mostra pouca renovação política
Partidos fracos e repressão da era Fujimori explicam desinteresse de estudantes e trabalhadores
Renata Miranda - O Estado de S.Paulo
ENVIADA ESPECIAL / LIMA
Não há novidades entre os candidatos que concorrem com alguma chance nas eleições presidenciais de domingo no Peru. O ex-presidente Alejandro Toledo, a deputada Keiko Fujimori e o nacionalista Ollanta Humala, que perdeu as eleições de 2006 para o presidente Alan García, estão entre os três primeiros colocados nas pesquisas. A falta de renovação evidencia um dos principais pontos fracos da política peruana.
"A causa disso é a fragilidade dos partidos políticos, que são o centro de formação de novos líderes", afirma ao Estado a analista política Cynthia Sanborn, da Universidade do Pacífico. "Quase todos os partidos atuam apenas como instrumentos eleitorais que se ativam para as eleições e depois deixam de atuar."
No fim de semana, a Ipsos-Apoyo, considerada a empresa de pesquisas mais confiável do Peru, informou que Humala tem 27,2% das intenções de voto, enquanto Keiko tem 20,5% e Toledo, 18,5%. Em quarto e quinto lugares estão outras figuras carimbadas da política do país: o ex-ministro da Economia Pedro Pablo Kuczynski, com 18,1%, e o ex-prefeito de Lima Luis Castañeda, com 12,8%.
Em períodos entre as eleições, a participação política é baixa e não há envolvimento de jovens nas organizações da sociedade civil. "Os jovens não veem a política como uma atividade interessante", explicou Cynthia.
Para o cientista político Enrique Bernales, da Comissão Andina de Juristas, os dez anos da era de Alberto Fujimori (1990-2000) influenciaram de forma decisiva para afastar da política tanto o movimento estudantil quanto o de trabalhadores. A única maneira de haver renovação no quadro político peruano é fazer com que os jovens participem ativamente de movimentos da área.
"Durante a ditadura fujimorista, os jovens foram impedidos de se organizar politicamente e acabaram sendo desmobilizados, desmotivados e atemorizados", disse Bernales. "E a presença desse grupo faz falta porque é uma parcela da população que refresca e renova a política por estar mais disposta a discutir e pensar temas de interesse do país. Dos políticos que já atuam na área, pouco podemos esperar."
Bernales, no entanto, acredita que as eleições de domingo para o Congresso podem representar um ponto de virada. "Nos últimos anos, os peruanos mostraram-se cansados de partidos velhos e promessas não cumpridas", afirmou o analista.
De acordo com ele, um sinal disso é a perda de apoio que o Partido Aprista Peruano - que se origina na tradicional Aliança Popular Revolucionária Americana (Apra) -, do presidente García, teve recentemente. Pesquisas de opinião indicam que a legenda terá dificuldades para alcançar até mesmo 10% das cadeiras do Congresso.
"Acredito que novos partidos se fortalecerão nos próximos 15 anos. Esta deve ser a última eleição na qual teremos as mesmas figuras políticas em evidência", diz Bernales.
QUEM É QUEM
Alejandro Toledo
Economista ex-presidente do Peru (2001-2006), terminou o governo com apenas 8% de popularidade
Ollanta Humala
Líder populista de esquerda, foi derrotado nas últimas eleições por causa da proximidade com o presidente venezuelano Hugo Chávez
Luis Castañeda
Fundador do partido Solidariedade Nacional. Ex-prefeito de Lima (2003-2010). Renunciou para se candidatar a presidente
Pedro Pablo Kuczynski
Conhecido como "PPK", foi ministro da economia do governo Toledo. Economista, é bastante criticado por também ter nacionalidade americana
Alan García
Nos anos 80, foi um dos presidente mais impopulares do Peru. Voltou ao cargo em 2006. Apesar de não poder se reeleger é um dos nomes fortes da política peruana
Keiko Fujimori
Filha do ex-presidente Alberto Fujimori (1990-2000), é considerada herdeira política do pai
VISÃO GLOBAL
Irã é o jogo mais abrangente para EUA
Árabes que vinham conspirando com Washington contra Teerã começam a se preocupar mais com suas cidades
*David E. Sanger, The New York Times - O Estado de S.Paulo
Numa tarde de terça-feira, em meados de março, na Casa Branca, enquanto o presidente Barack Obama ouvia os argumentos de seus assessores de segurança sobre os prós e os contras do uso da força militar na Líbia, a conversação logo passou para os efeitos num país estrategicamente muito mais vital: o Irã.
Os mulás de Teerã, observou Thomas Donilon, o assessor de Segurança Nacional, observam cada movimento de Obama no mundo árabe. E se o presidente não respaldasse sua declaração de que Muamar Kadafi "perdeu sua legitimidade para liderar", sua atitude seria considerada um sinal de debilidade - e talvez um sinal de que não estava igualmente disposto a respaldar a promessa de nunca permitir que o Irã obtenha a capacidade de construir uma arma nuclear.
"Não é preciso chegar ao exagero e afirmar que este foi o fator decisivo, ou mesmo o fator principal na decisão de intervir na Líbia", afirmou na semana passada Benjamin Rhodes, um assessor sênior que participou da reunião. Em todo caso, acrescentou, o efeito para o Irã estará sempre incluído na discussão. Neste caso, afirmou, "a capacidade de aplicar esse tipo de força na região e rapidamente - ao mesmo tempo que tratamos de outras ações militares no Iraque e no Afeganistão - combinada com a natureza desta ampla coalizão representa uma mensagem muito forte para o Irã sobre nosso poder em termos militares e diplomáticos".
O que se passou naquela tarde demonstra de maneira vívida um fato raramente mencionado a respeito das respostas do governo aos levantes que varrem a região: a equipe de Obama não tem nenhuma ilusão quanto à importância de Kadafi no longo prazo. A Líbia é um evento secundário. Conter o poder do Irã continua sendo seu objetivo central no Oriente Médio. Toda decisão - da Líbia ao Iêmen ao Bahrein e à Síria - está sendo examinada sob o prisma de como afetará o que, até meados de janeiro, constituía o cálculo predominante na estratégia regional do governo Obama: como retardar o avanço nuclear do Irã, e acelerar o surgimento de oportunidade para um levante bem-sucedido naquele país.
Jogo de xadrez. Na realidade, o debate sobre o Irã torna mais complicado cada movimento no jogo de xadrez na região. No final desta era de levantes, que a Casa Branca considera tão avassaladora quanto as mudanças que transformaram a Europa depois da queda do Muro de Berlim, sucesso ou fracasso serão julgados pela capacidade do Irã de realizar ou não suas ambições e tornar-se a força mais poderosa da região.
Na semana passada, as decisões tomadas na Casa Branca diziam respeito a um firme apoio dos manifestantes que estavam sendo assassinados na Síria e no Iêmen. Em cada caso, os assessores da Casa Branca faziam um cálculo, na maior parte silencioso, sobre a possibilidade de uma ação beneficiar ou não os iranianos, ou pelo menos de terem mais espaço para respirar.
Em janeiro, funcionários americanos mostravam-se confiantes em que haviam conseguido cercar o Irã: as novas sanções estavam produzindo efeito, os russos deixavam de entregar armas sofisticadas que o Irã queria para se proteger de um ataque israelense ou americano, e um misterioso e complexo vírus de computador, chamado Stuxnet, provocara o caos na tentativa iraniana de enriquecer urânio.
Mas tudo isso mudou com a chegada da Primavera Árabe. Repentinamente, as autoridades árabes que nos últimos dois meses haviam conspirado com Washington para esmagar os iranianos começaram a se preocupar mais com suas cidades do que com as centrífugas iranianas que produzem combustível nuclear. E a atenção de americanos e europeus se concentrou em outra questão, enquanto o petróleo a US$ 108 o barril reduzia o efeito de muitas sanções impostas pela Casa Branca na esperança de que convencessem os iranianos de que o programa nuclear não valia seu custo.
Então, quando a Casa Branca vê a região através das lentes persas, o que vê? No discurso de segunda-feira, Obama afirmou que a Líbia representava um caso especial - uma urgente responsabilidade moral de proteger os líbios e uma oportunidade para fazer a diferença com o que ele definiu como as capacidades americanas "únicas".
Os funcionários de alto escalão do governo sabiam que uma demonstração dessa capacidade seria útil em relação ao Irã. Mas a incógnita é como o Irã reagiria. "Talvez o Irã se sentisse encorajado a fazer o que não faz há anos: ir à mesa de negociações. Mas também se pode argumentar que esta atitude favoreceria a linha dura, que afirma que a única proteção concreta contra os EUA e Israel é produzir a bomba", disse um funcionário envolvido no debate sobre a Líbia.
Mas, pelo menos em público, o secretário da Defesa Robert Gates disse ao Congresso que não esperasse que o programa nuclear do Irã acelerasse muito por causa do ataque à Líbia - ou que as forças de segurança do Irã reprimissem ainda mais violentamente os movimentos de protesto que quase conseguiram estrangular.
O problema torna-se ainda mais complexo quando pensamos nos aliados árabes que não têm o menor problema em atirar nos manifestantes quando procuram prejudicar o Irã. A Arábia Saudita e o Bahrein são os principais exemplos. Os sauditas consideram o Irã a maior ameaça às próprias ambições regionais, e cooperaram em muitas iniciativas lideradas pelos EUA para cercar Teerã. Mas as relações entre Washington e Riad raramente estiveram tão tensas.
Para o Rei Abdullah, a decisão de Obama de abandonar o presidente Hosni Mubarak do Egito foi um sinal de fraqueza, e uma advertência de que ele poderá acabar com a liderança saudita se as manifestações em favor da democracia vingarem no seu país. Talvez isto explique por que a Casa Branca não se preocupou em olhar quando os sauditas enviaram tropas para o vizinho Bahrein para ajudar a esmagar os protestos da maioria xiita naquele país.
Embora Obama queira ver realizadas as aspirações dos manifestantes em prol da democracia, não tem nenhum desejo de ver a queda do governo que hospeda a 5.ª Frota, no Golfo Pérsico, em frente ao Irã. / TRADUÇÃO ANNA CAPOVILLA
*É JORNALISTA, GANHADOR DO PRÊMIO PULITZER E ESCRITOR
Nenhum comentário:
Postar um comentário