DESTAQUE DE CAPA
China compra carne suína e jatos do Brasil
A visita da presidente Dilma Rousseff à China foi marcada por acordos para compra de carne de porco de três frigoríficos brasileiros e aviões da Embraer. Só de jatos Legacy, poderão ser 450.
China libera produção de jatos e importação de carne suína do Brasil
Acordos são fechados durante visita da presidente Dilma Rousseff ao país
Gilberto Scofield Jr.
PEQUIM. A "diplomacia de resultados" que a presidente Dilma Rousseff decidiu implementar como filosofia básica no Itamaraty já conseguiu resolver alguns impasses que se arrastavam há algum tempo nas relações comerciais e de investimentos entre Brasil e China. Entre eles, o futuro das operações da Embraer na nação asiática - onde a empresa participa, desde 2002, de uma joint-venture com a estatal Aviation Industries of China II (Avic II) para a produção do ERJ-145, um jato de 50 passageiros considerado pequeno demais para o tráfego no país - ou a compra, pelos chineses, de carne suína brasileira. Três frigoríficos brasileiros foram certificados para exportar carne ao país.
Segundo o embaixador do Brasil na China, Clodoaldo Hugueney, a Embraer ganhará sinal verde do governo de Pequim para produzir no país os jatos executivos da família Legacy, um filão que acena com um potencial de venda de 450 aviões nos próximos dez anos. Hoje, pessoas físicas não podem ser donas de jatos executivos ou de helicópteros na China, restrição que vem sendo contornada com a colocação das aeronaves em nome de empresas, privadas ou estatais. Mas a pressão, tanto dos executivos e novos milionários chineses quanto dos maiores fabricantes de jatos do mundo, está fazendo o governo rever a proibição.
Além da fabricação do Legacy, o embaixador brasileiro afirmou que a China dará finalmente à Embraer a licença que a empresa precisa para vender dez jatos ERJ-190, de cem passageiros, para a estatal de aviação Southern China, uma ordem de compra contratada em janeiro e que esperava no limbo o sinal verde de Pequim.
- O governo chinês já entendeu que um superávit comercial brasileiro baseado numa pauta de exportação de três commodities não é sustentável e está disposto a reequilibrar a relação entre Brasil e China - disse Hugueney. - Falta aos empresários brasileiros uma disposição maior para negociar.
Huawei anuncia investimento no Brasil
A presidente comemorou também o anúncio, feito pelo presidente da empresa de equipamentos de comunicação chinesa Huawei, Ren Zhangfei, de um investimento de cerca de US$350 milhões na instalação de um centro de pesquisa, desenvolvimento e treinamento de mão de obra na região de Campinas, onde a companhia já possui uma fábrica. Além disso, a Huawei pretende doar US$50 milhões, em dez anos, em equipamentos de computação para universidades brasileiras.
- Empresas de tecnologia e comunicação da China, como Huawei, ZTE e Foxconn, também estão interessadas em fornecer equipamentos para o Plano Nacional de Banda Larga - afirmou o ministro do Desenvolvimento, Fernando Pimentel, presente ao encontro de meia hora entre Ren Zhangfei e Dilma Rousseff, no qual foi anunciado o investimento da Huawei.
Boa parte dos cerca de 250 empresários que acompanham Dilma já percebeu que, de fato, grandes mudanças no perfil das trocas comerciais sinobrasileiras não acontecerão se depender dos objetivos econômicos chineses, que tendem muito mais à geração de emprego e renda em solo nacional do que para a busca de operações lucrativas em outros países.
- O Brasil precisa direcionar estes recursos para setores de seu interesse - afirmou o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade.
As empresas brasileiras também anunciaram investimentos na China. É o caso do frigorífico Marfrig, que informou que colocará cerca de US$300 milhões em duas joint-ventures com chineses (uma com a Cofco, a maior empresa de alimentos do país), voltadas para logística e distribuição de produtos alimentícios, abate de frangos e fabricação de rações animais.
Dilma chegou ontem de manhã a Pequim e passou o dia no quarto do Hotel Saint Regis preparando os textos dos discursos que fará hoje no encerramento do Seminário Empresarial Brasil-China. Ainda hoje ela encontrará o presidente da China, Hu Jintao, com quem assinará atos de parceira e cooperação em cerimônia no Grande Palácio do Povo.As ações da Embraer chegaram a subir 2,48% ontem. Embraer ON (ordinária, com direito a voto) fechou em alta de 0,31%. Já a ação Marfrig ON teve a segunda maior alta do Ibovespa, de 2,56%, para R$16,05.
DEFESA
Rio sedia maior feira de defesa e segurança da AL
Grandes expectativas a respeito dos programas de investimento do governo brasileiro, a tendência crescente da integração entre Forças Armadas e as de segurança pública, Copa do Mundo e Olimpíadas explicam o crescimento incomum da LAAD – Defence & Security, maior feira de segurança e defesa da América Latina, que acontece de hoje a sexta-feira, no Riocentro, Rio de Janeiro. A avaliação é de Sérgio Jardim, diretor-geral da Clarion Events, responsável pela realização do evento.
O total de opositores, cerca de 650 empresas, praticamente dobrou em relação aos 336 da edição anterior, há dois anos. Os organizadores esperam, este ano, a presença de 24 mil visitantes, 32% a mais do que os 18,2 mil de 2009. São delegados oficiais (militares de alta patente) da América Latina e de outros continentes, oficiais generais e superiores das três Forças do Brasil e de outros países, autoridades e funcionários do governo brasileiro, embaixadores, adidos militares, executivos da indústria de defesa, polícias civil e militar, formadores de opinião. A feira vai ocupar os pavilhões 3 e 4 do Riocentro e área de exposição externa, totalizando 47 mil metros quadrados.
A LAAD 2011 é a oitava edição da feira bienal, e a segunda após a divulgação da Estratégia Nacional de Defesa (END), em dezembro de 2008, pelo então presidente Lula. Desde então, Jardim acredita que a lei tenha dado passos concretos que projetaram, para o mundo, o potencial do mercado brasileiro. “O Brasil definiu as diretrizes e prioridades dos investimentos na END. Mas, no evento de 2009, o mercado ainda via a proposta com certo descrédito”, avalia. “Em 2009 e 2010, o país fechou alguns programas, como o que prevê a aquisição de submarinos, de helicópteros para transporte de pessoal, entre outros. E grande parte da indústria mundial começou a acreditar que a intenção do governo é mesmo desenvolver os projetos e corrigir o envelhecimento dos nossos meios de combate. Muitas empresas internacionais querem fazer negócios no Brasil.”
O diretor-geral da Clarion também aponta a demanda gerada pelos eventos esportivos globais marcados para o Brasil e a expansão dos desembolsos em segurança pública e em ações de combate à criminalidade. “A integração entre Forças Armadas e de segurança é tema recorrente, devido aos projetos em curso: segurança de fronteiras, proteção às riquezas e organização de eventos de grande visibilidade, como é o caso da Copa do Mundo e das Olimpíadas”.
Essa conjugação de fatores produziu várias novidades que poderão ser conferidas no evento. A primeira delas, ressalta Jardim, é a presença significativa de autoridades do setor de segurança e da polícia. E, ao contrário das edições anteriores, não estarão como visitantes. Pela primeira vez, vão se reunir, durante o evento, com conselhos e plenárias nacionais de diferentes instituições: o Colégio Nacional dos Secretários de Estado de Segurança Pública (Consep), o Conselho Nacional de Comandantes Gerais das Polícias militares e dos Corpos de Bombeiros militares do Brasil (CNCG-PM/BPM), o Conselho Nacional dos Chefes de Polícia Civil (CONCPC) e o Conselho Nacional das Guardas Municipais (CNGM). Reflexo direto do fortalecimento das estratégias de segurança pública.
Compradores internacionais
Tradicionalmente, a LAAD recebe delegações estrangeiras. Este ano, também – de 55 países. Mas, além das autoridades governamentais, nova iniciativa pretende estreitar as redes de contato dos fabricantes, especialistas e estudiosos da área com os profissionais responsáveis pela análise e pelos processos de compra nos governos. É o Programa Comprador, que, de acordo com Jardim, convida pessoal técnico da área de suprimentos e compras.
“Em assuntos de defesa, os itens adquiridos são de grande porte, de análise complexa, envolvendo processos de homologação, muitas vezes aprovação no Congresso”, explica o diretor-geral da Clarion. Pois o Programa Comprador traz, este ano, 182 convidados, de dez países, que atuam exatamente na aquisição de equipamentos de segurança e defesa no mercado internacional. “A feira de Londres [DSEi - Defence & Security Equipment International, promovida pela Clarion na Inglaterra] já faz isso com grande sucesso. E decidimos aderir”, diz Jardim. “O objetivo da LAAD é ser uma feira de negócios, um ambiente em que as pessoas possam fazer contatos.”
O evento é aberto apenas a convidados. Conta com o apoio institucional do Ministério da Defesa e das três Forças Armadas do Brasil, além do apoio da Associação Brasileira das Indústrias de Materiais de Segurança e Defesa (Abimde) e da Associação das Indústrias Aeroespaciais do Brasil (Aiab). Estarão lá os grandes fabricantes nacionais e estrangeiros do mercado de Defesa e de Segurança, desenvolvedores de tecnologia de ponta em equipamentos, sistemas, dispositivos de proteção, tecnologia da informação, blindagens, simuladores, aeronaves, veículos e embarcações militares, sistemas de comunicação e sistemas integrados de comando e controle. A LAAD é promovida e organizada pela Clarion Events, dedicada à promoção e organização de feiras de negócios, congressos. Nascida no Reino Unido, hoje seus mais de 100 eventos atendem a 15 diferentes setores, é como defesa e segurança, lazer, entretenimento, financeiro, varejo, jogos, arte e energia em todos os continentes.
RASTREAMENTO
Campanha pelo desarmamento já tem data
Ministério já reservou R$10 milhões para indenizar donos de armas recolhidas
Jailton de Carvalho
BRASÍLIA. O ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, anunciou ontem que a campanha pelo desarmamento terá início em 6 de maio e se estenderá até dezembro. O governo decidiu antecipar o recolhimento de armas numa reação à tragédia de Realengo. O ministério examina ainda a possibilidade de pagar por munições e também tornar obrigatória a inclusão de chips nas armas de fogo vendidas no país para facilitar eventuais rastreamentos, conforme revelou O GLOBO domingo. Inicialmente estão reservados R$10 milhões somente para o pagamento de indenizações.
Cardozo também anunciou a criação de um conselho nacional, formado por representantes do governo e da sociedade civil, para discutir as linhas gerais da campanha e medidas adicionais de controle da circulação de armas no país. O conselho, presidido pelo ministro, será composto por dirigentes das ONGs Viva Rio e Sou da Paz, da Igreja Católica, do Conselho Nacional de Igrejas Cristãs e da OAB, entre outros representantes da sociedade civil.
Os ministros da Defesa, Nelson Jobim, e da Secretaria Nacional de Direitos Humanos, Maria do Rosário, deverão indicar representantes para o conselho, que tem reunião marcada para segunda-feira. O Brasil tem hoje 16 milhões de armas, 14,5 milhões em mãos de civis, conforme dados da Viva Rio. Duas dessas armas, uma delas roubada há 16 anos, foram usadas por Wellington Menezes de Oliveira no massacre de 12 crianças, em Realengo.
- A tônica dessa campanha é conseguirmos o maior número de armas fora de circulação. Não temos uma meta previamente fixada. Queremos ultrapassar as campanhas anteriores - afirmou Cardozo.
O ministro deixou claro que este ano o governo não concederá anistia para armas não registradas, como reivindicam parlamentares da chamada "bancada da bala". Quem não entregar armas sem registro corre o risco de responder a inquérito pelo crime. Cardozo anunciou as medidas após encontro com técnicos do ministério e dirigentes de grupos como Viva Rio e Sou da Paz.
Durante o encontro, Antônio Rangel, um dos coordenadores do Viva Rio, reiterou a proposta de que o governo pague por munições e não apenas por armas durante a campanha. Cardozo disse que terá de analisar a viabilidade jurídica da proposta.
A ideia é garantir o desembolso logo após a entrega das armas. Isso pode ser feito com cheque ao portador ou com um cartão. Os detalhes técnicos vão ser definidos pelo Banco do Brasil, chamado a participar da campanha. Nas campanhas anteriores, às vezes os pagamentos se arrastavam por meses, o que, para Cardozo, desestimula pessoas interessadas em se livrar das armas. Para o Sou da Paz, é importante começar a campanha o mais rapidamente possível.
- As pessoas estão sensibilizadas (por causa da tragédia de Realengo). E isto leva a ação - disse Melina Risso, diretora do Sou da Paz.
A proposta de uma nova consulta popular sobre a proibição da venda de armas, lançada pelo presidente do Senado, José Sarney, é vista com reservas por Cardozo. Para ele, não há problemas jurídicos na sugestão.
- Mas é preciso ver se é uma boa ideia - disse.
CAÇAS SUPERSÔNICOS
FAB fecha acordo para modernizar caças
Aeronáutica pagará US$85 milhões para empresa israelense equipar aeronaves
Cassio Bruno e Daniela Kresch
TEL AVIV e RIO. A Embraer contratou a empresa israelense Elbit Systems como principal fornecedora do projeto de modernização de 11 caças supersônicos F-5 para a Força Aérea Brasileira (FAB). O acordo, anunciado ontem, é avaliado em US$85 milhões (R$133 milhões) e será posto em prática pela subsidiária da Elbit no Brasil, a gaúcha Aeroeletrônica (AEL). As aeronaves modernizadas deverão ser entregues em 2013.
Os caças, comprados ano passado da Jordânia, ganharão computadores de bordo, radares e sistemas ultramodernos, como o "EW" (Eletronic War, ou Guerra Eletrônica) e um software de gerenciamento de munição. A empresa israelense fornecerá um simulador de voo e equipamentos de apoio em terra.
A FAB conta com 57 caças F-5, sendo que 46 deles já foram modernizados. A Elbit Systems também está envolvida na modernização de 54 aviões Bandeirante (C-95). Em dezembro, a primeira aeronave com a nova cabine de controle fez seu primeiro voo, considerado um sucesso. Até hoje, o novo Bandeirante já completou 70 voos experimentais e, em maio, deve ser posto à disposição da FAB.
Dassault: negociações sobre caças estão paradas
O vice-presidente da Dassault Aviation, Eric Trappier, disse ontem esperar que até o fim do ano o governo Dilma Rousseff decida sobre a compra dos 36 caças Rafale, fabricado pela empresa francesa. Em entrevista a jornalistas brasileiros, Trappier confirmou que estão paradas as negociações com o governo, que só pretende se decidir em 2012.
- É uma decisão de longo prazo. Entre fechar o contrato, entregar os aviões e o início das operações são 30, 35 anos. Entendemos que houve um congelamento (das negociações) por motivos orçamentários - afirmou Trappier, referindo-se aos cortes de R$50 bilhões no Orçamento anunciado por Dilma, em janeiro.
ANCELMO GOIS
Fator aeroporto
O Galeão-Tom Jobim não é o único aeroporto que causa dor de cabeça nos organizadores da Copa de 2014. O de Curitiba está com 15% das lâmpadas de balizamento da pista queimadas, o que impede pousos com nevoeiro, por exemplo.
Por causa disso...
Ontem de manhã, o Centro de Gerenciamento da Navegação Aérea suspendeu os voos São Paulo-Curitiba por 20 minutos.
NEGÓCIOS & CIA
Maria Fernanda Delmas (interina)
Segurança
A Netcom Malam Team, empresa de TI de Israel que faturou US$ 600 milhões em 2010, aproveita a feira Laad, hoje, para buscar negócios na área de segurança no Brasil. Com a experiência de contratos com governos, além da segurança nos Jogos de Atenas e Pequim e na Copa da África do Sul, quer aproveitar os eventos esportivos no Brasil e o avanço nos projetos de segurança pública.
Defesa aérea
Já a Santos Lab lançará na Laad a 2ageração do Carcará (avião não tripulado adotado pelas forças armadas), que vai “enxergar” no escuro. E o Azimuth, avião-alvo para treinamento com mísseis. A brasileira aposta em preço 50% menor do Azimuth (R$ 45 mil) para concorrer com a britânica Meggitt no mundo.
OPINIÃO
Dificuldades em Paris
Arnaldo Niskier
Há um clima extremamente favorável ao restabelecimento, em grande estilo, das relações culturais entre o Brasil e a França. Até a II Guerra Mundial vivíamos em permanente lua de mel, embalados pelos efeitos concretos da latinidade prestigiada e reconhecida. Depois, a nossa segunda língua estrangeira moderna tornou-se monotemática, com o avassalador predomínio da língua inglesa. O crescimento em nuvem da informática deu curso a essa troca, que se consolidou sem plebiscito.
Hoje, há algo de novo no ar, além dos aviões militares Rafale, testados com sucesso nos ataques à Líbia. A visita de uma semana a Paris revela fatos no mínimo curiosos, como a popularidade de Lula. As conversas com motoristas de táxis, grandes sensores do que pensa o povo, em geral, podem levar a uma notável conclusão: quando declinamos a condição de brasileiros, a reação deles não é mais falar em Pelé ou Ronaldo Fenômeno. O nome que explode, quase por unanimidade, é o do nosso ex-presidente. É claro que o fato merece uma análise mais profunda.
Para que esse momento de convergência possa atrair bons resultados, também em termos geopolíticos, é essencial um grande esforço, de parte a parte. Ao assistir à original matinée literária, promovida na Sorbonne Nouvelle, para discutir a obra de dois grandes acadêmicos e escritores brasileiros, Ana Maria Machado e João Ubaldo Ribeiro, em francês e em português, espantou-nos a afluência de estudantes e pesquisadores falantes da língua de Machado de Assis: eram mais de 200, num entusiasmo contagiante.
Ao final da sessão de três horas, o anticlímax: os jovens se queixaram de que o governo francês havia cancelado os concursos públicos para professores de língua portuguesa, sob argumentos pueris. Convenhamos, uma atitude pouco inteligente das autoridades.
E tem o nosso lado. No 31º Salão do Livro de Paris, uma impressionante demonstração de pujança da indústria livreira, com milhares de visitantes e compradores, o Brasil não se fez representar. Foram homenageados escritores nórdicos e a cidade de Buenos Aires (considerada pela Unesco, em 2011, capital da cultura mundial). Nosso país, nada. Não se entende o silêncio do Ministério da Cultura.
A queixa não para aí. Ao perguntar pelas ações da outrora vibrante Casa do Brasil em Paris, somos informados de que ela vive grandes dificuldades, geradas pela má condução do problema, por parte do governo federal.
Se agimos assim, desprezando nossas afinidades culturais, bem se pode imaginar o futuro dessas relações, aparentemente promissoras. Não é hora de reagir?
A corrida contra o tempo para a Copa
As críticas do presidente da Fifa, Joseph Blatter, ao ritmo da preparação do país para sediar a Copa do Mundo não podem simplesmente ser atribuídas a supostos interesses políticos. Se estão ou não contaminadas pelo jogo de bastidores que antecede a sucessão na entidade, as declarações do dirigente encerram uma séria advertência: estados e municípios que se comprometeram com um caderno de encargos (esportivos, urbanísticos e legislativos) precisam correr contra o tempo. Há evidentes atrasos nos cronogramas
Blatter advertiu: "Gostaria de dizer para meus colegas brasileiros que a Copa de 2014 é amanhã. Os brasileiros acham que ela vai ser depois de amanhã." E, na esteira dessa crítica, mandou uma dura advertência: Rio e São Paulo, as duas maiores e economicamente mais importantes cidades do Brasil, podem ficar fora da Copa das Confederações, em 2013 - o que seria vexatório para um país que tem, na Copa e, dois anos depois, nas Olimpíadas, a chance de mostrar ao mundo capacidade de se inscrever na seleta lista de nações em condições de promover megaeventos.
A CBF, por óbvio, não gostou das palavras do presidente da Fifa, mas poucos dias depois acabou admitindo: o prazo para a conclusão de obras importantes, como a reforma do Maracanã, teve de ser estendido. É possível que a reavaliação de datas, na esfera esportiva, não altere o calendário com que a CBF e entes federativos se comprometeram. Mas deve-se lembrar que a realização do torneio de futebol (e, igualmente, os Jogos de 2016) é apenas parte dos pacotes. Especificamente em relação ao evento mais próximo, a Copa, há 54 projetos envolvendo intervenções não só nos complexos esportivos, mas também na infraestrutura das sedes - sistema viário, hotéis, aeroportos, segurança etc. É perigosamente sintomático que todos tenham sido reprogramados em relação ao que ficara definido em janeiro passado.
Em particular, é inquietante a letargia com que se tem tratado a questão da modernização da rede de aeroportos. Eles ocupam lugar de destaque na estrutura de recepção de turistas e delegações, mas o setor patina em entraves burocráticos que atrasam reformas físicas dos terminais e em paralisantes discussões ideológicas sobre a maneira como eles devem ser administrados.
O governo federal se mostrou inepto como gerente - do que é prova a estrutura assustadoramente ineficaz do Galeão, no Rio -, mas, preso a uma visão política anacrônica e a compromissos clientelistas, relutou em contar com a eficiência da iniciativa privada para revitalizar o setor. Mas a ex-ministra-chefe da Casa Civil, Dilma Rousseff, ao assumir a presidência passou a admitir licitações de aeroportos.
As perspectivas são críticas: mesmo com as obras em curso, Confins, em Belo Horizonte, operará com 153% de saturação; Brasília e Fortaleza, com 118%; Guarulhos (SP) e Cuiabá, com 111%. Por mais que a CBF e o governo tenham se queixado de Blatter, há um quadro preocupante que precisa ser enfrentado com vigor.
INFRAESTRUTURA
Falta qualificação para trabalhadores
Distrito Federal necessita de atendimento rápido e eficiente ao torcedor estrangeiro
BRASÍLIA. Brasília vai ser uma das sedes da Copa do Mundo de 2014 no Brasil, mas padece de problema básico no setor de serviço: carece de atendimento qualificado e rápido ao consumidor. Esta deficiência já foi identificada pelos setores empresariais da cidade. A Associação Comercial do Distrito Federal promove cursos de capacitação da mão-de-obra para o atendimento ao torcedor estrangeiro que acompanhará sua seleção na capital do país.
- Esta é uma crítica constante e verdadeira. É preciso uma nova cultura de atendimento em Brasília e precisamos qualificar os trabalhadores. Muitos empregados não buscam se especializar porque não consideram atividades de garçom e recepcionista como uma profissão. E não se preparam e não param no emprego - disse Danielle Moreira, presidente da Associação Comercial do Distrito Federal.
- É preciso convencer um trabalhador que ele pode fazer treinamento para ser garçom e este ser seu emprego para o resto da vida, se ele for bem qualificado. Do contrário, um dia será auxiliar de pedreiro, no outro vai estar trabalhando de frentista. Ou seja, sem algo estável e seguro - disse Danielle.
Setor hoteleiro insuficiente
No setor empresarial, a aposta é na expansão hoteleira. Estima-se que Brasília tenha, atualmente, 25 mil leitos disponíveis nos seus hotéis, quantidade considerada insuficiente para receber os torcedores estrangeiros durante o Mundial de 2014.
- É um setor precário, mas, por outro lado, esta insuficiência é boa, porque vai exigir investimento. E o mercado vai cuidar disto - assegurou Cláudio Monteiro, secretário-executivo do Comitê Brasília-2014.
Ele afirmou, ainda, que uma enorme área pública, próxima ao estádio, será comercializada para a construção de 16 novos hotéis. Será a expansão do Setor Hoteleiro Norte.
Aeroporto precisa de reforma
Na última quinta-feira, o governador Agnelo Queiroz participou de reuniões com representantes dos ministérios do Planejamento e do Esporte. Foi tratar das obras do Veículo Leve Sobre Trilhos (VLT) e da expansão do aeroporto de Brasília.
- Melhorar o aeroporto é uma necessidade da cidade, independentemente da realização da Copa do Mundo. Por isto não nos preocupa, é uma obra que vai sair. A Infraero nos garantiu que a reforma vai estar pronta, com a capacidade atual duplicada - disse Cláudio Monteiro.
Danielle Moreira afirmou que a associação comercial oferece cursos de língua estrangeira - inglês e espanhol - para motoristas de táxis e recepcionistas de hotéis, de restaurantes e de bares, para facilitar a comunicação com os turistas estrangeiros.
- O evento da Copa valorizou profissões que estavam um pouco esquecidas, como profissionais do setor do turismo, que experimenta agora uma alta - disse Danielle Moreira.
As autoridades do Distrito Federal asseguram que todas obras realizadas em função da Copa do Mundo serão aproveitadas depois de 2014. É o chamado legado da Copa. O estádio que está sendo construído será utilizado como um espaço multiuso, para shows de atrações nacionais e internacionais.
- Brasília entrou neste circuito e não tem volta - acredita Cláudio Monteiro.
ACORDO
Operários da Usina de Jirau encerram greve
Camargo Corrêa fecha acordo semelhante ao de Santo Antônio
BRASÍLIA. Os operários da Usina de Jirau, no Rio Madeira, em Rondônia, decidiram ontem voltar ao trabalho, encerrando uma greve que começou em 15 de março. A retomada da construção da hidrelétrica foi decidida em uma assembleia, na qual ainda ficou acertado o início da campanha salarial. A obra emprega cerca de quatro mil trabalhadores. No dia em que os operários iniciaram a paralisação, houve um grande quebra-quebra, que culminou com a destruição de veículos e alojamentos, entre outras instalações.
O acordo firmado entre os trabalhadores e a empreiteira Camargo Corrêa, responsável pela obra, foi semelhante ao firmado com operários da Usina de Santo Antônio, que também vem sendo construída no Rio Madeira. Foram assegurados uma antecipação salarial de 5%, aumento da cesta básica de R$110 para R$132 (o valor final será decidido durante a campanha salarial) e licença de cinco dias a cada três meses trabalhados, com direito a passagens aéreas.
Ficou decidido ainda que a empresa pagará passagens de ônibus para aqueles que moram fora das capitais de seus estados e que será feita uma avaliação da empresa que fornece o vale-alimentação. Os trabalhadores também poderão escolher um plano de saúde de cobertura nacional. Além disso, outro ponto acertado na negociação é o pagamento de um abono, equivalente a 50 horas do salário, para os trabalhadores que permaneceram alojados e para os que realizaram serviços de manutenção no canteiro de obras entre os dias 18 e 31 de março.
O ministro do Trabalho, Carlos Lupi, acompanhou a assembleia de ontem e visitou os canteiro de obras de Jirau e Santo Antônio. (Mônica Tavares).
TENSÕES POLÍTICAS
Atentado eleva tensão na Bielorrúsia
Explosão no metrô, a 100 metros da sede do governo, mata 11 e fere 100
MINSK. Uma explosão numa importante estação de metrô de Minsk, capital da Bielorrúsia, colocou ontem autoridades em alerta para possíveis novos ataques no país, apenas quatro meses após o presidente Alexander Lukashenko vencer um quarto mandato consecutivo, numa eleição marcada pela repressão.
O atentado, que ocorreu a cem metros da sede do governo, deixou ao menos 11 mortos e cerca de cem feridos. Apesar de não haver informações sobre as causas da explosão, autoridades não descartam que ela tenha sido planejada no exterior, e ordenaram as forças de segurança a revisar todos os seus arsenais para ver se algo havia sido roubado.
O atentado à estação de Oktyabrskaya, no Centro da capital, ocorreu por volta das 18h (horário local), quando centenas de pessoas retornavam do trabalho de metrô. Segundo testemunhas, a explosão ocorreu numa plataforma no momento em que as portas dos vagões se abriam. Passageiros que circulavam no local contaram, ainda, que presenciaram um clarão, um estrondo e fragmentos caindo do teto.
— As portas (do trem) abriram e então houve uma explosão — afirmou Igor Tumash, de 52 anos. — Vi pessoas caídas no chão sem se mexer. Havia muito sangue.
Imagens mostraram bombeiros carregando dezenas de pessoas ensanguentadas. Há relatos de que muitos dos feridos estavam numa escada rolante que foi destruída no momento do ataque. Várias vítimas foram hospitalizadas e muitas tiveram suas mãos, pernas e braços amputados, segundo informaram médicos da capital.
Num discurso à TV após uma reunião de emergência com alguns ministros, Lukashenko ligou o atentado a uma explosão num show de rock em 2008, que feriu cerca de 50 pessoas.
EUA e UE reagiram à repressão de dezembro
Alvo de constante pressão por sufocar a oposição no país, o presidente disse que não descarta a possibilidade de o ataque ter sido planejado no exterior. O líder da ex-república soviética, que está no poder desde julho de 1994, costuma alegar que forças externas tentam desestabilizar seu regime.
— Esses (atentados) são, talvez, ligados à mesma fonte. Temos que descobrir quem teria interesse em acabar com a paz e a estabilidade do país, quem está por trás disso — disse o presidente, acrescentando que os responsáveis deverão ser encontrados e punidos.
— Nos lançaram um sério desafio. Devemos dar uma resposta adequada. Não descarto que (este ataque) seja um presente do exterior.
As tensões políticas na Bielorrússia vêm aumentando desde dezembro, quando grandes protestos contra a eleição presidencial desencadearam uma dura repressão. Mais de 700 pessoas foram presas, incluindo sete candidatos à Presidência. Desde então, Lukashenko e seus aliados estão proibidos de viajar para a União Europeia.
FONTE: JORNAL O GLOBO
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