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terça-feira, 19 de abril de 2011

19 de abril de 2011 - CORREIO BRAZILIENSE


DESTAQUE DE CAPA - BEM-ESTAR
Corram, homens, corram

Pesquisa mostra que o brasileiro come demais, bebe demais e está de mal com a balança. No país, os brasilienses são os que se alimentam melhor e mais aproveitam o tempo livre para praticar atividades físicas. Mas ainda é pouco: 58,4% dos homens da capital federal estão acima do peso. Entre as mulheres, a taxa é de 31,2%.


HISTÓRIA
Um atentado "fabricado"
Para os militares, explosão em gabinete na Câmara de Vereadores do Rio, em 1980, poderia ter sido provocada quando militantes de esquerda preparavam o artefato

Edson Luiz


Integrantes do serviço secreto de informações da ditadura duvidavam que a bomba que explodiu na Câmara de Vereadores do Rio de Janeiro, em 27 de agosto de 1980, fosse o resultado de um atentado protagonizado por simpatizantes dos militares. Um informe que circulou entre os órgãos de inteligência do governo da época, cinco dias depois do fato, avaliava que o artefato poderia ter sido detonado no momento em que estava sendo fabricado. A explosão ocorreu dentro do gabinete do vereador Antônio Carlos de Carvalho, considerado um militante do MR-8, um dos movimentos de esquerda que atuava contra o regime.
O informe foi produzido pela agência do Serviço Nacional de Informações (SNI) no Rio e indicava uma “pessoa idônea” como fonte dos dados coletados pelos arapongas. “O artefato que detonou na Câmara de Vereadores do Rio pode ter explodido enquanto estava sendo montado”, relata o documento. O relatório lista uma série de motivos que seriam indicadores de que a bomba havia sido detonada na fase de fabricação. “Esta sala é permanentemente fechada à chave, tem acesso controlado e normalmente as atividades em seu interior ocorrem após o expediente”, detalha o informe.
Na versão mais factível, completamente discordante do texto dos militares, a bomba chegou ao gabinete de Antônio Carlos — que também era conhecido por Tonico — em um embrulho ao lado do restante da correspondência diária. O pacote foi recebido por José Ribamar de Freitas, assessor e tio do político. O homem morreu no local e Tonico perdeu a visão de um dos olhos, teve o braço esquerdo amputado, assim como os dedos da mão direita. O vereador perdeu todos os dentes e 80% da audição, mas continuou na militância política até 1982. Morreu 11 anos depois de deixar a Câmara. No mesmo dia do fato ocorrido no Legislativo, outra bomba foi enviada à sede da OAB no Rio e matou Lyda Monteiro da Silva, secretária da instituição. A OAB era uma das entidades mais atuantes no processo de arrefecimento da ditadura.
Segundo avaliação dos arapongas do SNI, a mesa de trabalho de Tonico apresentava um rombo, no qual as farpas e arestas indicavam que o sentido da detonação teria sido de cima para baixo e da esquerda para a direita. “Pelo exposto, o artefato explodiu enquanto era manuseado, surgindo duas hipóteses: ou ele estava abrindo o engenho ou o estava montando”, observa o informe, ressaltando que o vereador tinha várias passagens pelos órgãos de segurança por sua militância política. O documento integra o acervo entregue ao Arquivo Nacional pelo Centro de Informações da Aeronáutica (Cisa), aberto ao público na semana passada.
Para sustentar a teoria de que a bomba teria sido montada no gabinete de Tonico, o SNI ainda levantou elementos que poderiam ajudar a incriminar o vereador. “A dependência onde a bomba explodiu é destinada à comissão de abastecimento, da qual é presidente o vereador Antônio Carlos de Carvalho (militante do MR-8)”, diz parte do informe: “Nesse local eram redigidos e impressos os folhetos e panfletos de propaganda e contestações”.
O Brasil vivia um momento político tenso em 1980. Com a força minada, a ditadura caminhava para o fim, mas correntes radicais ligadas aos militares defendiam a continuidade do regime. Vários atentados à bomba ocorreram no mesmo período e no ano seguinte. Também no Rio, uma sala do jornal Tribuna da Luta Operária foi alvo de um artefato, mas sem vítimas. Vários veículos de comunicação receberam ameaças. O então ministro da Justiça, Ibrahim Abi Ackel, considerou os atentados como crime contra a segurança nacional.


MEMÓRIA
Regime em decadência

Um dos episódios mais marcantes do período final da ditadura militar brasileira é o atentado à bomba frustrado no pavilhão do Riocentro, em 30 de abril de 1981. Durante um show organizado para celebrar o Dia do Trabalhador, um artefato explodiu dentro de um veículo Puma no qual estavam dois militares: o sargento Guilherme Pereira do Rosário e o então capitão Wilson Dias Machado. Guilherme morreu e Wilson se feriu com gravidade. Na ocasião, o governo não se furtou de culpar radicais de esquerda pela autoria do suposto atentado.
Anos depois, ficou claro, até por testemunhos de militares, que o ato frustrado era de autoria dos próprios integrantes da ditadura. A bomba estourou antes do tempo, no carro dos oficiais. A ideia, segundo relatos do general Newton Cruz, era que o artefato fosse detonado próximo à Casa de Força do Riocentro para criar alvoroço e tumulto, mas não matar ninguém. No aspecto simbólico, a bomba fazia parte de uma iniciativa de setores radicais para convencer os moderados a um novo período de recrudescimento do regime. Seria uma forma de paralisar a moderada abertura em andamento e que se consolidaria quatro anos depois, com a transição para o governo civil de José Sarney. Ninguém foi punido.


VERBAS PÚBLICAS
TCU não vê atraso na Copa
Tribunal acredita que flexibilizar a lei de licitações permitirá o fim das obras a tempo

Tiago Pariz

Na contramão da previsão sombria do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), o Tribunal de Contas da União (TCU) aposta que as obras dos aeroportos e da maioria dos estádios para a Copa do Mundo serão entregues no prazo previsto e não causarão constrangimento por atrasos desnecessários. O discurso afinado com o Palácio do Planalto deve-se a um motivo: a confiança de que será aprovado o regime especial de licitações, que afrouxa exigências com a justificativa de acelerar os projetos.
Na avaliação de ministros do TCU, incluindo o presidente do órgão, Benjamin Zymler, o estudo do Ipea que apontou que nove dos 13 aeroportos não ficarão prontos em tempo desconsiderou parte importante: a flexibilização das regras de concorrência. O regime especial está em discussão pelo Congresso e é tratado como prioridade pela base governista para ser aprovado no primeiro semestre.
Zymler elogiou a proposta em análise pela Câmara. Segundo ele, o TCU destacou técnicos para contribuir com a elaboração do texto. “Podemos dizer que 90% do projeto de lei contém boas práticas e 10% precisa de mais discussão. O TCU está pronto para contribuir”, disse o presidente da Corte.
Entre as ideias para agilizar o processo de concorrência estão a inversão de fases, a não divulgação do orçamento e a possibilidade de adequação dos projetos para atender exigências da Fifa. O órgão que regula o futebol mundial dá-se ao direito de apresentar novas exigências durante ou após a realização de um certame.
O ministro Valmir Campelo, que realizou palestra ontem para colegas do TCU, descartou a possibilidade de atrasos no cronograma atrapalharem o prazo final. “Eu acredito no modelo. Pode haver atraso de dois, três ou quatro meses, mas não vai comprometer”, afirmou. Durante a apresentação do ministro, Lucas Furtado, procurador-geral do Ministério Público junto ao TCU, manifestou contrariedade com a flexibilização da lei de licitações. “Estou preocupado com o afrouxamento da Lei nº 8.666. É possível que percamos a Copa antes de começar o jogo”, vaticinou o procurador. A preocupação é que o regime especial de licitações abra brechas para adendos infinitos nos projetos dos aeroportos de forma a elevar o orçamento total, hoje estipulado em pouco mais de R$ 5,15 bilhões (veja quadro).

Elefantes
Com relação aos estádios, o TCU considera que o maior risco é a construção de “elefantes brancos”, inúteis depois dos jogos. Documento distribuído durante a palestra considera que “em quatro cidades-sedes observou-se o risco de a rentabilidade gerada pela arena não cobrir os custos de manutenção”. Os estádios citados estão em Natal, Manaus, Cuiabá e Brasília. O Mané Garrincha terá capacidade de 71 mil pessoas a um custo de R$ 696 milhões. Campelo aproveitou a palestra para, inclusive, fazer lobby para que a abertura da Copa ocorra na capital federal.

Maracanã no limbo
Técnicos do TCU não fazem previsão para o valor total da obra de renovação do Maracanã, no Rio de Janeiro, que deverá receber a final da Copa. A previsão inicial é de R$ 705,6 milhões, o maior de todas as 12 arenas, mas engenheiros das empresas que venceram a licitação estipulam que o valor pode ser elevado em R$ 1 bilhão. Segundo os técnicos do tribunal, o orçamento real só poderá ser calculado quando o governador do Rio, Sérgio Cabral, entregar todos os projetos ao ministro Valmir Campelo.


Voo para 2014

Na visão do TCU, na contramão de relatório do Ipea, os aeroportos das 12 cidades-sedes da Copa do Mundo não estão atrasados e muitos ficarão prontos a tempo da Copa das Confederações, em 2013.

Belo Horizonte
O aeroporto de Confins tem reforma prevista no valor de R$ 408,6 milhões, mas os trabalhos não começaram. Apesar disso, o TCU aposta no prazo de outubro de 2013.

Brasília
O projeto de ampliação do terminal não teve início. O custo de R$ 748,4 milhões. A entrega está prevista para abril de 2013.

Cuiabá
A ampliação do terminal e as readequações do sistema viário e do estacionamento têm custo previsto de R$ 87,5 milhões.
A previsão de finalização é julho de 2013.

Curitiba
As obras de ampliação do pátio e da pista de manobra não foram iniciadas. Com custo de R$ 72,8 milhões, a previsão é terminar tudo até julho de 2013.

Fortaleza
Obras não iniciadas. A reforma e ampliação do terminal vai custar R$ 279,5 milhões e, para o TCU, será entregue em outubro de 2013.

Manaus
A obra não começou e tem meta de ser entregue em dezembro de 2013. O custo previsto é de R$ 327,4 milhões.

Natal
Com um projeto avaliado em R$ 168,9 milhões, é um dos aeroportos mais problemáticos e recebe atenção especial da Casa Civil. A previsão é que a obra seja entregue em abril de 2014.

Porto Alegre
As obras ainda não foram iniciadas, mas a previsão é de entrega em junho de 2013. O custo é de R$ 345,8 milhões.

Recife
As obras da nova torre de controle não foram iniciadas e a previsão é de inauguração em fevereiro de 2013. O investimento é o menor de todos, R$ 19,8 milhões.

Rio de Janeiro
A previsão é que o Aeroporto do Galeão seja entregue em janeiro de 2013, com um custo de R$ 687,3 milhões. As obras já tiveram início.

Salvador
O projeto, com valor de R$ 45,1 milhões, não saiu do papel, mas será entregue, segundo o Tribunal, até março de 2013. A previsão é reforma do terminal e a ampliação do pátio de aeronaves.

São Paulo
É um dos poucos com obras em andamento e tem o maior orçamento, previsto em R$ 1,9 bilhão. Serão construídos novos terminais de passageiros no aeroporto de Guarulhos e de Campinas.


BRASÍLIA-DF

Por Luiz Carlos Azedo
Com Leonardo Santos

Blindados
O Exército vai recauchutar 376 veículos blindados M-113. Por meio de acordo assinado entre os EUA e o Brasil, a empresa que fabricou os veículos será encarregada da modernização do veículo de transporte de tropas com tração do tipo lagarta. A reforma custará US$ 48 milhões

Candango
O ministro Artur Vidigal de Oliveira, da classe dos togados do Superior Tribunal Militar (STM), é o primeiro integrante de tribunal superior natural de Brasília. Nasceu em 6 de outubro de 1960, cinco meses após a inauguração oficial da capital da República.


DESARMAMENTO
Comoção na volta às aulas
Estudantes emocionados e pais preocupados com a segurança dos filhos marcaram a retomada das atividades no Colégio Tasso da Silveira, em Realengo (RJ). Hoje, recomeçam a estudar os jovens que presenciaram os 12 assassinatos.

O retorno dos alunos à Escola Municipal Tasso da Silveira, palco da tragédia que resultou na morte de 12 jovens, vítimas de um atirador, foi marcado por emocionantes reencontros e pelas tentativas da Direção do colégio em Realengo (RJ) de modificar o cenário do massacre com atividades culturais. Professores aguardaram na porta os alunos e muitos pais se aglomeraram na porta do colégio preocupados com a segurança dos filhos.
A fim de acalmar o nervosismo, a Secretaria de Educação do Rio de Janeiro confirmou que haverá um psicólogo permanente na escola para acompanhar os estudantes, além da instalação de um agente da Guarda Municipal e de postos de primeiros socorros.
Os alunos encontraram os muros da escola pintados de branco, graças ao trabalho voluntário de mais de 100 pessoas. Apesar do esforço, a presença dos estudantes foi menor do que a esperada. Dos 140 que fazem parte das turmas do 9º ano do turno da tarde, 82 voltaram ao colégio ontem. Além disso, 21 pedidos de transferência foram registrados até o fim da tarde de ontem.
Hoje, a expectativa dos professores gira em torno da volta dos alunos do turno da manhã, que estavam na escola no momento do massacre e presenciaram o ataque de Wellington Menezes. Ontem, mais um dos feridos recebeu alta. O jovem de 14 anos havia sofrido uma lesão vascular no ombro direito. Segundo a Secretaria de Saúde do estado, três estudantes permanecem internados.

Audiência
Enquanto em Realengo o esforço era para esquecer o dia da tragédia, em Brasília, senadores e especialistas em educação participavam de uma audiência pública no Senado para debater a segurança nas escolas do país. O evento foi marcado por discursos a favor de políticas que valorizem e preparem melhor os professores, pela defesa de mais investimentos em educação e, principalmente, por críticas à proposta que tramita no Congresso estabelecendo a implantação de câmeras e de detectores de metais nos colégios.
Segundo a subsecretária para Educação Integral, Cidadania e Direitos Humanos do Distrito Federal, Gícia de Cássia Falcão, uma alternativa na preparação dos profissionais para casos de violências nas escolas é a realização de cursos de mediação de conflitos e o aumento dos repasses do governo federal para a educação.
Consenso entre os especialistas ocorreu também em torno da proposta do Senado determinando a instalação de câmeras e detectores de metais nas instituições de ensino. Na avaliação da diretora do Sindicato dos Professores no Distrito Federal, Rosilene Correia, o aparato de segurança pode produzir um efeito drástico nas instituições de ensino, aumentando a pressão sobre os alunos e os distanciando do ambiente escolar. Segundo ela, a solução está nos investimentos na educação, não no controle e na fiscalização dos alunos dentro dos colégios.


Benefício imediato

Débora Álvares

O Ministério da Justiça destinará R$ 10 milhões do orçamento deste ano para o pagamento de indenizações na nova Campanha Nacional de Desarmamento. Com o valor, será possível pagar pela devolução de pelo menos 33 mil armas — quem entregá-las nos postos de coleta receberá entre R$ 100 e R$ 300.
De acordo com o ministério, o valor é suficiente para suprir a arrecadação de armas com a campanha, a ser lançada em 6 de maio. Mas o órgão não descarta destinar mais dinheiro para a causa. “Se for necessário, teremos prazer em pegar um crédito para pagar as indenizações”, destacou o secretário executivo do Ministério da Justiça, Luiz Paulo Barreto, após reunião com entidades da sociedade civil, como o Viva Rio e o Instituto Sou da Paz, órgãos de segurança — Ministério da Defesa, Polícia Federal, entre outros —, o Banco do Brasil e a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB).
Para estimular a devolução, o Conselho do Desarmamento vai apostar na alteração no pagamento do benefício. “A indenização será imediata. A pessoa receberá um protocolo e poderá trocar pelo valor correspondente em qualquer agência do Banco do Brasil”, destacou Barreto.
A secretária nacional de Segurança Pública, Regina Miki, ressaltou que isso será possível a partir de uma revisão no decreto que trata de desarmamento. “A legislação diz que a boa-fé em entregar a arma tem que ser averiguada, mas não queremos isso”, ressaltou, lembrando que, nas últimas campanhas, a indenização era liberada somente após a confirmação da procedência do armamento. Com a modificação, a expectativa é de que a iniciativa em caráter permanente tenha mais sucesso que as duas anteriores — realizadas entre 2004 e 2009, com 550 mil armas entregues.
Há a intenção ainda de aumentar a quantidade de locais de entrega — além das unidades da Polícia Federal, que participaram anteriormente, as polícias Civil e Militar, as Forças Armadas e até igrejas poderão ser conveniadas. “Nunca se fez uma rede tão ampla. Vamos ampliar os locais de entrega, sempre com a presença de um agente da força pública para garantir a segurança do armamento devolvido”, afirmou Paulo Barreto. Os postos ainda não foram definidos e serão divulgados antes do início da campanha.


VISÃO DO CORREIO
A tragédia de Realengo e a ação da Câmara

Ao curso dos últimos 20 anos, as políticas de segurança pública aprovadas pelo Congresso avançaram, salvo mínimas exceções, sob impulso de tragédias provocadas pelo crime organizado e eventuais chacinas. Atrelaram-se à noção de que aumentar as penas inibiria a atividade delituosa, desatentas à exclusão social como um dos fatores mais dinâmicos da violência. Não sobreveio às punições mais rigorosas qualquer declínio nas estatísticas criminais.
Malgrado a miopia dos legisladores, uma iniciativa escapou à insensibilidade rotineira: em função da Lei n° 10.826, de dezembro de 2003 (Estatuto do Desarmamento), a população recolheu à Polícia Federal, de forma espontânea, mais de 500 mil armas de fogo. Os atentados a tiros se reduziram, mas, pouco tempo depois, aumentaram bem acima dos registros anteriores à lei. Era previsível que a redução no circuito de armas funcionaria apenas como lenitivo e cessaria se não acompanhadas de ações estruturais.
Agora, enxameiam no Congresso ideias de variadas concepções para criar proteção às unidades do ensino fundamental. Tamanha movimentação política se destina a dar satisfação à sociedade chocada com a execução de 12 crianças por um atirador na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, Rio de Janeiro. Alguns parlamentares se apressam em elaborar projetos de lei, outros pretendem desarquivar antigas proposições, mas a maioria cuida apenas de se colocar debaixo dos holofotes da mídia.
A proposta do presidente do Senado, José Sarney, de convocar plebiscito para saber se o povo aprova a proibição da venda de armas no país, desatou o alvoroço legislativo na Câmara. Em outubro de 2005, em consulta idêntica, 64% dos brasileiros responderam não à interdição do comércio de armamentos. Não está em causa discutir se é válido ou não o entendimento de Sarney. Mas toda a atoarda à volta do problema sugere que o carro vai adiante dos bois.
Há mais de 10 anos transita nas serventias do Poder Legislativo o projeto de lei que institui o novo Código de Processo Penal (CPP). Aprovado no Senado em dezembro de 2010, desde então se encontra na Câmara dos Deputados. As emendas que lhe foram apresentadas e outras em via de apresentação prenunciam que a matéria levará ainda muito tempo antes de se converter em lei. Não parece prestigiar a lógica o açodamento quanto à inovação da legislação penal antes de vitalizar o universo jurídico com o novo CPP.
Também desponta como mais conveniente ouvir a Comissão Parlamentar de Inquérito que investigou o tráfico de material bélico. Concluiu-se, ali, que 66% dos armamentos introduzidos no país procedem de contrabando oriundo do Paraguai. Hoje, há 17 milhões de armas ilegais no Brasil, 4 milhões em poder das sociedades de celerados, disse a mesma CPI. Policiar as fronteiras assume, portanto, prioridade absoluta quando se trata de desmuniciar as vanguardas do crime.


ARI CUNHA
Visto, Lido e Ouvido

Com Circe Cunha

Transparência
» Continuam obscuras as negociações entre a Infraero e lojas nos aeroportos. Vale a atenção para o que vem acontecendo depois que a presidente Dima vetou a prorrogação dos contratos sem licitação nos aeroportos. São quase 5 mil lojas nos 67 aeroportos coordenados pela Infraero. As negociações precisam ser mais transparentes. A Copa está chegando.


BRASIL S/A
Questão política

Antonio Machado

Depois de provar em Pequim a dureza das negociações com o governo chinês e da distração, na sequência, da cúpula dos Brics também na China, a presidente Dilma Rousseff reencontrou-se com a inflação e com os seus desdobramentos já entrando na retórica da oposição.
Não é que o PSDB tenha trazido um contraponto econômico ao debate sobre a decisão do governo de espaçar no tempo as medidas contra a inflação para preservar o ritmo de crescimento econômico e, assim, os programas empresariais de investimento e o nível de emprego.
A assimetria de expectativas entre o governo e a maior parte do mercado financeiro sobre a trajetória da inflação coincidiu com a propaganda partidária do PSDB na TV e no rádio. E é compreensível que dois temas candentes e de apelo popular do momento tenham pautado o programa tucano: o atraso das obras nos aeroportos em relação ao calendário da Copa do Mundo de 2014 e a inflação, simbolizada pela antipática máquina de remarcação de preços nos supermercados.
O partido poderia alargar tal agenda organizando debates no país. Mas aí é preciso saber o que propor. Na oposição, ou no que restou dela depois da derrota nas eleições de 2010 e da razia do PSD, o partido do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, ex-Dem, o país continua uma questão abstrata — apesar do esforço do ex-presidente Fernando Henrique para modernizar as teses programáticas do PSDB.
Esse debate só está quente entre os economistas, os profissionais do mercado financeiro e no próprio governo, já que não há consenso na Fazenda, no Banco Central, no BNDES e entre ministros com maior intimidade com as questões da economia sobre a estratégia seguida.
Ela é essencialmente política, determinada pela presidente, e não uma decisão baseada no manual da política monetária e no regime de meta de inflação, sistema que orienta o BC a buscar a convergência da inflação à meta central — no caso, 4,5% — no ano calendário.
Mas a regra permite exceções frente a choques de oferta. É o caso atual, com os preços dos alimentos no mundo em franca disparada, e também aqui, apesar das safras portentosas dos últimos anos. Para commodities, como soja, milho e carne, porém, não há nacionalidade do preço: ele é dolarizado, já que acompanha as cotações externas.
Tal ingrediente agiu como adubo no solo fértil para a inflação no Brasil. Essa é a questão política que a oposição não sabe destacar e, enquanto não tiver um programa a apresentar, vai continuar como nas eleições em 2010: à espera de erros do “outro”. Ou de milagre.

Tríade sem simetrias
A condução das políticas de crescimento econômico, apenas uma das facetas de um projeto de desenvolvimento, não é algo linear nesse governo, como não foi com Lula. E praticamente inexistiu nos dois mandatos de FH, mais focado na solvência pública externa e fiscal.
Com Lula, a questão desenvolvimentista ressurgiu, mas com lista de obras, política ativa de redistribuição de renda e recomposição dos salários do funcionalismo federal e dos quadros do Estado, uma tríade de objetivos nem sempre convergentes. É questão em aberto.

Recidiva proposital
A multiplicidade de objetivos, vez ou outra destacada a primazia do investimento, desgovernou a inflação quando o choque de oferta cruzou com o expansionismo fiscal dos últimos dois anos do governo Lula, com a distensão do crédito ao consumo, com a queda dos juros básicos em 2010 (altos, mas então no menor nível histórico) e com o laxismo da banca pública, sobretudo o BNDES — ator solitário do processo desenvolvimentista, sem o qual ele só existiria no papel.
A recidiva inflacionária, portanto, não foi acidental, mas fruto de decisões de política econômica nem sempre coerentes, misturando diretrizes que favorecem o consumo sobrepostas ao investimento que se quer incentivar num quadro de oferta industrial apertada, altos custos de produção, taxa cambial apreciada — parte pela assimetria dos juros de política monetária —, e gasto público expansionista.

Variações da crítica
Nesse ambiente, trazer o IPCA, hoje com variação anual de 6,3%, à meta, implicaria capotar a economia. Dilma optou pelo crescimento econômico menor e inflação na meta só em 2012. A opção é legítima.
Mas embute riscos. Só que não é isso o que incomoda a crítica dos mercados. Para ela, a Selic deveria subir até vergar a expectativa de inflação, sem nenhum compromisso com o crescimento. Os críticos no governo não avalizam tal cenário. Eles defendem maior aperto do crédito e fiscal. Dilma rejeita cancelar projetos polêmicos, como trem-bala, e encolher o gasto público. Se estiver certa, será sua alforria política. Em caso contrário, irá manietada até 2014.

Tiro ao alvo vendado
O diabo é que o debate mistura a crítica com causa à causa única que movimenta o circuito financeiro: acertar a Selic decidida pelo BC, o que implica ganhar ou perder no giro com títulos do Tesouro, e entre uma e outra reunião do Copom agitar as causas da inflação.
Ignorar tais nuanças é como praticar tiro ao alvo vendado. De um modo geral, a questão tem duas vertentes: a dos comprometidos com papéis e a do governo, que, por sua vez, tem duas variantes. A que está no comando mistura a Selic com controle do crédito ao consumo — as tais medidas prudenciais. A outra diverge do uso suplementar do câmbio apreciado e receita menos gasto fiscal. Parece sutileza, mas são duas orientações muito distintas. Tal discussão não acabou.


CUBA
Para os jovens, o "impossível"
Em artigo, Fidel pede à nova geração do regime que "retifique" e reinvente o socialismo.

O líder histórico da revolução de 1959, Fidel Castro, aproveitou a realização do Congresso do Partido Comunista de Cuba (PCC) e pediu aos jovens que devem assumir o comando do regime que “sigam demonstrando que o socialismo é também a arte de realizar o impossível”. Em mais um artigo da série que vem publicando nos meios oficiais desde que se afastou do poder, em 2006, por problemas de saúde, Fidel apoiou as reformas apresentadas por seu irmão e sucessor, Raúl Castro, em especial a nova política para rejuvenescer a direção, dominada até aqui pelos veteranos da Serra Maestra. “A nova geração está convocada a retificar e mudar sem hesitação tudo que deve ser retificado e mudado”, escreveu.
“A direção do partido deve ser a soma dos melhores talentos políticos de nosso povo, capaz de enfrentar a política do império, que coloca em perigo a espécie humana”, acrescentou, em artigo publicado pelo diário Granma e pelo site Cubadebate.cu. Fidel estima que a missão dos novos dirigentes do partido único é ainda mais difícil que a assumida por sua geração quando, há 50 anos, proclamou o socialismo em Cuba, “a 90 milhas dos Estados Unidos”. “Persistir nos princípios revolucionários é, a meu ver, o principal legado que podemos deixar. Não há margem de erro neste instante da história humana. Ninguém deve desconhecer essa realidade”, advertiu.
No sábado, Raúl propôs limitar a um máximo de 10 anos os mandatos na alta cúpula do regime, medida sem precedentes no modelo comunista ortodoxo. A fórmula foi apresentada na abertura do 6º Congresso do PCC, que aprovará cerca de 300 reformas econômicas e elegerá uma nova direção política.
“Chegamos à conclusão de que é recomendado limitar ao máximo de dois períodos consecutivos de cinco anos o desempenho de cargos políticos e estatais fundamentais. Isso é possível e necessário nas atuais circunstâncias”, afirmou o presidente cubano perante os mil delegados ao congresso. Em seu artigo, Fidel Castro disse ter ficado “assombrado” com o preparo dos participantes, “a maioria dos quais era criança ou não havia nascido há meio século”, observou. “Não me importava tanto o que diziam, mas a forma como diziam.”
O texto de Fidel, publicado no domingo, justifica sua ausência nos festejos pelos 50 anos de socialismo em Cuba. O veterano dirigente, de 84 anos, alega não ter condições de aguentar o calor e o sol forte, mas enfatiza que, apesar das limitações de saúde, ainda pode cumprir um papel na luta ideológica. “Eu prometi que seria um soldado das ideias e esse dever ainda posso cumprir”, escreveu o ex-presidente cubano.

Só um passo
A ideia de limitar os mandatos na alta cúpula do regime comunista foi exaltada com cautela pelos EUA como um “passo importante”, com a ressalva de que, embora bem-vinda, a mudança não garante que Cuba tome o rumo da democracia. “O limite dos mandatos é potencialmente um passo importante na direção correta. Essa possibilidade nos encoraja”, afirmou em Washington o porta-voz do Departamento de Estado para a América Latina, Charles Luoma-Overstreet, em e-mail enviado à agência de notícias France Presse. “Esse passo, no entanto, não garante por si só que os cubanos possam determinar democraticamente seu futuro econômico e político”, ponderou Luoma-Overstreet.

FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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