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segunda-feira, 4 de abril de 2011

02 de abril de 2011 - JORNAL O GLOBO


Comando civil

Os dedos em riste parecem indicar que o ministro Jobim e o general Augusto Heleno estão brigando, mas não foi nada disso. Um dia após o general ter sido obrigado a cancelar a palestra “A contrarrevolução que salvou o Brasil”, pelo aniversário do golpe de 64, os dois e o comandante do Exército, general Enzo Peri, que ordenou o silêncio, estavam bem à vontade, tomando uísque e sorrindo, numa cerimônia militar em Brasília.


ENCONTRO
Após ordem de silêncio, general fica à vontade entre comando do Exército

Com direito a risadas e uísque, Heleno conversou animadamente com Jobim e Peri

Evandro Éboli

BRASÍLIA. O clima de constrangimento era zero. Um dia após levar um cala-boca do Comando do Exército e suspender a palestra "A contrarrevolução que salvou o Brasil", sobre o 31 de março, o general Augusto Heleno estava muito à vontade ao lado de quem ordenou o seu silêncio, o comandante do Exército, general Enzo Peri, e do ministro da Defesa, Nelson Jobim. O encontro festivo ocorreu ontem de manhã após uma cerimônia militar, no 4º andar do Quartel-General.
Heleno, Peri e Jobim conversaram animadamente, descontraídos, e riram várias vezes. A conversa durou mais de uma hora, com direito a uísque servido pelo cerimonial e poses para fotos com parentes de militares presentes ao evento.
Popular entre os oficiais, o general Heleno circulava bem à vontade pelo salão. Em conversa com O GLOBO, o militar se mostrou resignado por não ter feito seu discurso. Mas fez questão de enfatizar que todo ano sempre o fez. Sem citar nomes, sugeriu que a proibição de se manifestar no dia em que se comemora o golpe militar partiu da presidente Dilma Rousseff.
- Sempre fiz (discurso nesta data). E nunca houve isso (proibição). Órdi é órdi (ordem é ordem) - brincou Heleno.
Perguntado sobre de quem partiu a determinação para não falar, respondeu:
- Você não vai arrancar isso de mim. É trabalho para vocês, que analisam cenários e tal - afirmou.
A palestra do general estava marcada para anteontem, mas foi suspensa quarta-feira, após determinação de Peri.
- Mesmo se a suspensão fosse a poucos minutos da palestra, eu a suspenderia. Estou tranquilo. Vida que segue - disse Heleno, ontem.
No discurso que fez em 2010, no Quartel-General, Heleno reverenciou os militares que atuaram contra militantes de esquerda e, segundo ele, ajudaram a impedir que o país seguisse o exemplo de Cuba, Coreia do Norte, Albânia e União Soviética. Disse que, fora do contexto, é fácil falar sobre abusos na luta contra a subversão e que, entre os que condenam os militares, há muitos ex-guerrilheiros que ocupam altos postos da República.
Heleno está na reserva, mas continua à frente do Departamento de Ciência e Tecnologia do Exército. Ele deixará o cargo em maio. A solenidade de ontem foi de transmissão de cargos dos novos chefe de Gabinete do Comando do Exército, general Mauro César Cid, e do general Edson Leal Pujol, novo chefe do Centro de Informações do Exército (CIE).


POLÊMICA
PT e ministra fazem coro contra Bolsonaro

Demétrio Weber, Evandro Éboli e Cristiane Jungblut

BRASÍLIA. A liderança do PT na Câmara aderiu ao movimento contra o deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), acusado de racismo e homofobia por causa de declarações a um programa de TV. Ontem, o líder petista na Câmara, deputado Paulo Teixeira (SP), divulgou nota em que repudia as declarações, classificando a conduta de Bolsonaro como deplorável.
Em outra frente, a ministra de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, Luiza Bairros, disse que a fala do deputado foi racista. Ela aproveitou para relativizar o direito à imunidade parlamentar para expressar opiniões, lembrando que a Constituição define o racismo como crime inafiançável e imprescritível.
- O caso efetivamente está provocando muita reação e mostra que existe um repúdio da sociedade com esse tipo de atitude racista. Ao mesmo tempo, coloca para a Câmara a oportunidade muito boa de mandar uma mensagem para a sociedade, contrária a toda e qualquer tipo de declaração racista por um de seus membros. Espero que os deputados respondam à altura dos avanços que a sociedade já obteve no combate ao racismo - disse. - Liberdade de expressão, todos sabemos o que é. Como entendemos perfeitamente o que a Constituição considera crime de racismo.
A nota do líder do PT condenou as declarações feitas por Bolsonaro, manifestando apoio às seis representações contra o deputado já enviadas à Corregedoria e ao Conselho de Ética da Câmara. Uma sindicância investigará se houve quebra de decoro. "Suas declarações demonstram um total desrespeito à condição de representante de todos os cidadãos e cidadãs brasileiras e, em especial, do povo do Rio de Janeiro, já que em seu dia a dia faz comentários jocosos e estereotipados a respeito das mulheres, negros, homossexuais e militantes dos direitos humanos e pela democracia em geral", diz a nota.

"Não vou discutir promiscuidade"
Na entrevista ao programa "CQC", da Band, o deputado respondia a perguntas gravadas. A cantora Preta Gil quis saber o que Bolsonaro faria se um filho dele se apaixonasse por uma negra. O deputado respondeu: "Preta, não vou discutir promiscuidade com quem quer que seja. Eu não corro esse risco, porque meus filhos foram muito bem educados e não viveram em ambiente como lamentavelmente é o teu".


DOS LEITORES

General calado
 A ordem dada pelo general Enzo, comandante do Exército, para o general Heleno não falar mais nada sobre a Revolução Democrática de 1964, no dia 31 de março do corrente ano, foi a demonstração mais cristalina do tipo de democracia imposta pelo atual governo. Quem será que mandou o general Enzo impor este tipo de mordaça?
Otaviano Moreira Castro
Resende, RJ

Lamentável que aos chefes militares seja negado o direito de relembrar o 31 de março de 64, pois a data tem significado profundo para o Brasil. Basta compulsar as publicações da época, para se ver que foram as forças vivas da nação que exigiram que os quartéis fossem às ruas como recurso extremo contra os desmandos do governo João Goulart e dar um basta no caos generalizado que, por exclusiva responsabilidade dele, afundava o país. Aquela data faz parte da História recente da nação, e nenhum governo que se preze, por motivação alguma, muito menos de fundo ideológico, pode impedir que seja revivida. É assim que ocorre num país verdadeiramente livre e democrático.
Gilberto Pimentel
Rio

Duplos parabéns ao general Heleno. Primeiro, pela coragem de tentar evidenciar as verdadeiras causas que motivaram a deflagração do Movimento Democrático de 31 de março de 1964. Segundo, por ter preferido seguir, como exemplar soldado que é, os princípios constitucionais basilares das Forças Armadas — a hierarquia e a disciplina — cumprindo, sem tergiversações e comentários, a ordem superior para cancelar a palestra pretendida.
Rui da Fonseca Elia
Rio

O ministro Jobim, ordenando que o general Augusto Heleno se calasse sobre os malsinados episódios de 1964, que mergulharam o Brasil numa sanguinária ditadura, não só exerceu o seu dever como ministro e cidadão, além de ter evitado o que poderia ser, no mínimo, um desconforto para a presidente Dilma! Esse generais poderão dar suas “explicações” quando for instalada a Comissão da Verdade. Até lá, recolham-se.
Luiz Edmundo Germano de Alvarenga
Rio


NHENHENHÉM
Jorge Bastos Moreno

Brinde à democracia!

A imagem sempre será mais forte que o texto. O Exército decretou o fim das comemorações do 31 de Março nos quartéis. Mas o general Augusto Heleno, mesmo assim, resolveu fazer um discurso de saudação ao Golpe de 64. Jobim mandou Heleno rasgar o discurso. Ontem, numa solenidade militar, a cena: Jobim e Heleno, com copos de uísque nas mãos, disputavam, às gargalhadas, quem contava a melhor piada.


ECOS DA REVOLUÇÃO DO NILO
ONU é alvo de extremismo
Em protesto contra queima do Alcorão nos EUA, afegãos invadem sede e matam 7 estrangeiros

Afegãos que protestavam contra a queima do Alcorão por uma igreja da Flórida entraram num complexo das Nações Unidas em Mazar-i-Sharif, no norte do país, mataram ao menos sete funcionários da ONU e incendiaram um dos prédios. Entre os mortos, havia quatro guardas nepaleses, uma piloto norueguesa, um sueco e um romeno. Cinco manifestantes afegãos também morreram durante a confusão. Suspeitas de que insurgentes tenham se infiltrado entre os manifestantes com o objetivo de atacar a organização levaram o Conselho de Segurança da ONU a convocar uma reunião de emergência, que terminou com uma condenação ao ataque.
Um relatório inicial da polícia dizia que duas vítimas teriam sido degoladas, mas a informação foi negada por autoridades afegãs. Após o episódio, autoridades declararam estado de emergência na cidade, e prenderam cerca de 20 pessoas suspeitas de envolvimento na ofensiva. Um deles, supostamente o mentor do ataque, vem da província de Kapisa, considerada um reduto da insurgência, a 400 quilômetros de Mazar i-Sharif.
Moradores da cidade contam que, na véspera, grupos religiosos percorreram as ruas convocando a população com megafones, para uma manifestação pacífica contra a queima de um Alcorão pelo pastor Wayne Sapp, em 20 de março. O exemplar do livro sagrado dos muçulmanos foi queimado após ter sido “julgado” durante cinco horas por fiéis de uma pequena igreja da Flórida, e considerado culpado. A cerimônia foi realizada na presença do controverso pastor Terry Jones, que já havia provocado um debate internacional ao convocar a uma grande queima pública do livro no dia 11 de setembro — evento cancelado no último momento, depois que até o presidente Barack Obama se pronunciou contra a ação.


Mulá adverte para risco de mais violência
Ontem, o Departamento de Estado dos EUA criticou tanto a matança quanto a profanação do Alcorão pelo pastor:
— Ele não reflete o respeito que o povo dos EUA tem pelo Islã.
Mas Jones disse não ter remorso. “Precisamos responsabilizar esses países e essas pessoas pelo que fizeram, assim como por quaisquer desculpas que usem para promover suas atividades terroristas”, disse o pastor, num comunicado. “O Islã não é uma religião de paz”.
Membro do conselho de religiosos do Afeganistão, o mulá Qyamudin Kashaf, no entanto, lembra que a situação pode se deteriorar, como em 2006, quando o país assistiu a centenas de manifestações contra caricaturas de Maomé publicadas num jornal dinamarquês, que deixaram quatro mortos.
— Já esperávamos a violência que estamos vendo. A menos que levem o pastor a julgamento e peçam a maior punição possível, vamos testemunhar violência e protestos não apenas no Afeganistão, mas no mundo todo.
O presidente Barack Obama, e o secretáriogeral da ONU, Ban Ki-moon, também condenaram “com todas as forças” o ataque. A manifestação começou ontem após as tradicionais rezas da sexta-feira, perto de uma grande mesquita da cidade. Além de condenar a queima do Alcorão, o mulá incentivou os fiéis a protestarem contra a instalação de bases americanas permanentes no país. Aos gritos de “não queremos a América no nosso solo!” e “morte a Obama!”, a multidão marchou até a frente do complexo da ONU, onde a passeata começou a sair do controle. Um pequeno grupo começou a jogar pedras e escalar o muro para entrar num dos prédios. Testemunhas contam que algumas pessoas conseguiram pegar as armas dos guardas do complexo e entraram no local, atirando nos funcionários.
Para o governador da província de Balkh, o incidente foi provocado por insurgentes que se infiltraram na manifestação com o objetivo de atacar funcionários da ONU. O diretor de Comunicação da ONU no Afeganistão, Kieran Dwyer, afirmou que os funcionários ficaram presos dentro do complexo e foram perseguidos.
— Eles são civis, estão aqui para realizar trabalho humanitário, não estavam preparados para essa situação — afirmou Dwyer.
Ele disse que ainda era cedo para relatar como ocorreu o ataque, mas adiantou que a organização adotará agora novas medidas de segurança. O ataque é o maior contra a ONU no Afeganistão desde 2009, e surpreendeu até mesmo a população local, já que a cidade é considerada uma das mais seguras do país. Mazar-i-Sharif, no norte afegão, inclusive, consta na lista de cidades que passarão a pleno comando do governo de Cabul ainda este ano, mas esse incidente poderia levar a Otan a rever seus planos.
FONTE: JORNAL O GLOBO

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