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segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

BRASIL ECONÔMICO


BRASIL
Setor privado vira fator-chave para exploração de urânio
Lei permite parcerias com o Estado, mas nunca foi aplicada

Juliana Rangel

A parceria entre o governo e o setor privado será o fator-chave para a exploração de urânio no Brasil, segundo especialistas ouvidos pelo. O desenvolvimento de novas reservas do minério—usado como combustível de reatores nucleares — é fundamental para atender a demanda da usina de Angra III e, futuramente, dos reatores que o governo pretende construir a partir de 2019. Esta também poderá ser uma opção caso o Brasil decida exportar urânio para outros países, um mercado em potencial crescimento.
 A oportunidade aparece porque, apesar da exploração das jazidas nacionais de urânio ser monopólio da Indústrias Nucleares do Brasil (INB), a empresa é autorizada pela legislação a atuar com sócios privados em minas, desde que tenha participação majoritária nos projetos. O modelo, previsto na lei 6.189, de outubro de 1974, até hoje nunca foi colocado em prática.

Atualmente, as únicas parcerias da INB com a iniciativa privada ocorrem quando há exploração de outros minérios com urânio associado. É o caso do consórcio Santa Quitéria, feito com a Galvani, para uma mina no Ceará. O sócio privado está investindo US$ 350 milhões em uma mina de fosfato. O urânio associado ficará com a INB.
A estatal, que fatura R$ 300 milhões por ano, produz apenas o suficiente para fornecer para Angra I e Angra II. Coma entrada em operação de Angra III, em 2015, ela deverá dobrar seu resultado financeiro para R$ 600 milhões. Para atender a nova usina, ela está dobrando sua capacidade instalada de 400 toneladas por ano, por meio da duplicação da usina e Caetité, no Sudoeste da Bahia, um investimento de R$ 130 milhões, e apostando na usina do Ceará.
O assessor da presidência da INB, Luiz Felipe da Silva, conta que os estudos mais recentes sobre as reservas brasileiras são de 1984. Mas, com a entrada de novos reatores em operação, o governo terá de investigar o real potencial brasileiro em urânio.
“A prospecção ficou meio parada porque tínhamos um nível confortável de reservas para nossa demanda. Mas agora temos que retomar (os estudos)”.

Ida e volta
Um dos problemas que atravancam a atividade da INB é o fato de o Brasil ainda não dispor de unidades suficientes de enriquecimento de urânio.Hoje, 90% desse trabalho é feito no exterior. Depois, o urânio enriquecido volta ao país para ser transformado em pó e pastilhas, que compõem varetas, depois unidas em grades e utilizadas nos reatores.
No Brasil, 10% do enriquecimento necessário é feito na fábrica de Resende. Até 2015, quando a primeira etapa de sua expansão estiver concluída, ela será capaz de enriquecer 60% do produto brasileiro. Na segunda etapa, em2017, 100%. “O cenário agora mudou muito e espera-se que o programa de exploração de urânio seja retomado”, diz o assessor da presidência da Eletronuclear, Leonam dos Santos Guimarães.

Autonomia em falta
Atualmente, o urânio é responsável por3% da matriz energética brasileira. Mas a INB não tem orçamento próprio e seus investimentos dependem do Tesouro Nacional. Além disso, a estatal é ligada ao Ministério de Ciência e Tecnologia, e não à pasta de Minas e Energia, onde são desenhadas as metas do setor.
“A INB, como empresa, não tem capacidade de atendimento do crescimento da demanda. Por isso é que pode buscar uma solução que envolva o setor privado”, observa o professor titular de energia nuclear da Coppe UFRJ, Aquilino Senra Martinez.


País pode se aproveitar da demanda global
Segundo a Agência Internacional de Energia Atômica, há planos para mais de 160 novas usinas

Com o recente aumento do preço internacional do urânio, reacendeu- se no governo a discussão sobre a necessidade de reavaliação das reservas para exportação, já que a demanda interna deverá crescer lentamente. O Plano Decenal de Energia—que mapeia as necessidades energéticas — não prevê a construção de nenhum reator até 2019, fora Angra III. Daí em diante, o objetivo são quatro novos reatores, até 2030.
Assim, o mercado externo parece mais favorável no primeiro momento. No mundo, existem 439 usinas nucleares, segundo a Agência Internacional de Energia Atômica (AIEA). Em 2008, a China tinha planos para construir 78 reatores. A Rússia planejava a construção de 25; a África do Sul, de 24; a Índia, de 15; e, os Estados Unidos de 20.
O professor Aquilino Senra Martinez, da Coppe UFRJ, diz que o Brasil tem recursos hídricos para gerar energia mais barata que a da matriz nuclear. O mesmo não ocorre com a França, por exemplo. Lá, 80% do abastecimento é via urânio.
Ainda assim, ele lembra que se o Brasil quiser exportar terá que acelerar a exploração. “Precisaríamos de maior investimento, mas essa decisão só pode ser tomada depois que o país definir o quanto de urânio vamos precisar no futuro”.
O Brasil tem reservas comprovadas de 300 mil toneladas e especula- se que haja mais 800 mil em solo nacional. Considerando um preço médio de US$ 100 mil por tonelada em2010, as reservas totais estão estimadas em cerca de US$ 110 bilhões.
Ligada ao Ministério de Minas e Energia, a Empresa de Pesquisa Energética (EPE) está preocupada como aumento dos preços e vê boas oportunidades para o Brasil como fornecedor mundial. No Plano Nacional de Energia de 2030, ela lembra que o país tema técnica de enriquecimento e pode, além de aproveitá - la internamente, “ter um papel importante no cenário mundial no fornecimento de combustível nuclear”.
O documento prevê que os estoques com custo de exploração abaixo de US$ 40 por quilo serão suficientes para suprir, no máximo, 58%da necessida de mundial em 2020. Se os estoques tiverem custo até US$ 80 por quilo, o fornecimento ficará em até 85%.
A Secretaria de Assuntos Estratégicos (SAE) informou que a Presidência devolveu ao ministro da pasta, Moreira Franco, um pedido feito pela gestão anterior para que se avaliasse a viabilidade do enriquecimento de urânio para consumo interno e possível venda. Mas um técnico do governo é cético: “A política recente é nitidamente contra a exportação. Seria muito bom que se pudesse exportar alguma coisa para dar mais porte e dimensão ao nosso programa”.
J.R.

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