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quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

16 de fevereiro de 2011 - JORNAL BRASIL ECONÔMICO

 
BRASIL
Compras caras põem em xeque modelo de gastos públicos
Mesmo com licitação e pesquisa prévia de preços, governo paga mais por itens como adoçantes e carimbos. Para especialistas, motivos vão de fraude e despreparo dos gestores ao ‘custo-governo’ das vendas

Carolina Alves


As licitações existem para garantir que o governo compre pelo menor preço e assim evite desperdiçar o dinheiro público, certo? Nem sempre. O poder público brasileiro tem pago até três vezes mais por itens que custam bem menos nas lojas ou supermercados, segundo informações do Portal da Transparência, o site mantido pelo governo com dados sobre os gastos dos poderes da República. Em janeiro de 2011, por exemplo, o Senado pagou R$ 7,2 por um adoçante que custa R$ 2,3 no supermercado. A própria Presidência da República comprou por R$ 32 um carimbo de plástico que vale, em média, R$ 12. O levantamento de preço, feito pelo, considera três fornecedores diferentes na capital paulista, que possui um dos custos de vida mais caros do país. “A obrigatoriedade de licitação existe para evitar isso”, afirma Jorge Hage Sobrinho, ministro- chefe da Corregedoria Geral da União (CGU). Ele explica que, em todo processo, é preciso fazer um levantamento de preços antes da publicação do edital para definir qual é o valor limite que o órgão deseja pagar por um determinado produto.
“Se ele [instituição] faz uma pesquisa séria, sabe qual é o preço que as pessoas comuns pagam. Quando acontece do preço mais baixo oferecido pelas empresas ser muito mais elevado que o do mercado, o processo deve ser cancelado e uma nova licitação realizada”, defende.
Ele afirma, inclusive, que muitas vezes os entes governamentais compram um mesmo item aos poucos para evitar a licitação e, assim, favorecer determinada empresa. Por lei, não é preciso licitar compras abaixo de R$ 8mil para a administração direta (governo e ministérios) e de R$ 16 mil para a indireta (empresas e autarquias). “Muitas fraudes são dessa natureza”, conta Hage.  Também há casos em que as empresas atuam em conjunto para oferecer um preço elevado. “Mas há situações em que as fornecedoras não têm interesse em responder à pesquisa de mercado prévia feita pelos órgãos públicos. Quando respondem, põe o preço lá em cima. Já começa errado”, diz Hage.
Para o advogado Ricardo Pagliari Levy, sócio da Pinheiro Neto Advogados, a prática é comum. “É normal cobrar mais caro da administração pública, pois existe um certo ‘custo-governo’. As chances de atraso no pagamento são altas e as regras do jogo podem mudar a qualquer hora. Muitas vezes, o governo altera as quantidades adquiridas em nome do interesse público, o que afeta o preço contratado ”, explica.

Lei joga contra
A própria legislação pode gerar desperdícios de verba pública. “Na hora de lançar o edital, o governo não pode detalhar muito as características do produto para não favorecer nenhum fabricante, o que faz com que as empresas entreguem itens de qualidade inferior à demandada”, afirma Levy. Para minimizar esse tipo de entrave nos processos licitatórios, a CGU defende a flexibilização da legislação. “Seria melhor dispensar a exigência da consulta formal (contatar empresas para coleta de preços) e admitir a consulta informal (como internet). Às vezes é assim que você fica sabendo o preço verdadeiro”, analisa.
Segundo o especialista em administração pública da Unesp, Valdemir Pires, a base desse problema está no conceito de compras do governo. “O arcabouço legal das licitações foi desenvolvido para combater corrupção e garantir o menor preço,mas não combate o desperdício”, diz. “Qual é a necessidade de um adoçante de R$ 7,2?”, questiona.
Procurados, os órgãos envolvidos não se manifestaram.

EFICIÊNCIA X DESPERDÍCIO
Órgãos pagam mais caro que outros em licitações semelhantes

Não é apenas na comparação com preços de mercado que o governo gasta mais do que poderia em suas compras. No ano passado, por exemplo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) chegou a desembolsar R$ 401 mil por 170 computadores, ou R$ 2,3 mil por unidade. O produto, de especificações semelhantes, foi adquirido por R$ 1,5 mil à unidade pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 2010. “Há uma falta de atenção enorme em relação à qualidade do gasto público.
Pequenas “economias, embora tenham preço individual baixo, são muito importantes em conjunto no orçamento da União”, avalia Fernando Coelho, professor de administração pública da USP. Para ele, é preciso criar uma “cultura de compras unificada” entre os entes públicos.
Hoje, é possível que órgãos utilizem um recurso chamado adesão à ata de registro público, que tem como objetivo garantir a compra de um item por um preço mais econômico, conquistado por outro ente governamental em aquisição semelhante. Contudo, esse conceito tem sido utilizado de forma equivocada. “Quando um órgão fez uma compra por um preço bom, aquela ata pode servir de referência para outros entes públicos. O que acontece, muitas vezes, é que o órgão comprou mal e acaba permitindo que outros venham a aderir àquele preço alto”, diz Jorge Hage Sobrinho, ministro da CGU. Para o especialista em gastos públicos da Unicamp, Francisco Lopreato, falta, ainda, punição às empresas que vendem muito mais caro para o governo.
“Nos Estados Unidos, quando uma empresa é pega em fraude, com preços muito altos ou produtos de má qualidade, ela fica de fora do processo de licitação por anos. No Brasil, é possível fazer isso, mas raramente ocorre. Uma companhia que ficou proibida de vender para um órgão acaba vendendo para outro. Não há comunicação dentro do próprio governo”, analisa.
C.A.
 
ORÇAMENTO
Ajuste reduz orçamento da Defesa em36%

O ajuste fiscal de R$ 50 bilhões do orçamento vai tirar ao menos 36% dos recursos do Ministério da Defesa, que podem ser cortados dos gastos não obrigatórios. Desta forma, dos R$ 15 bilhões previstos no orçamento de 2011, a pasta poderá utilizar apenas R$ 11,7 bilhões para gastos com projetos e manutenção operativa da Marinha, do Exército e da Aeronáutica. O ministro Nelson Jobim garantiu que o corte não afetará a compra de aviões de combate para a Força Aérea Brasileira (FAB).

FONTE: BRASIL ECONÔMICO

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