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quarta-feira, 16 de fevereiro de 2011

16 de fevereiro de 2011 - O GLOBO


DESTAQUE DE CAPA
Chefe de Polícia afastado deve ser indiciado por vazamento

Afastado ontem do comando da Polícia Civil após tensa negociação que começou segunda-feira e envolveu até o governador Sérgio Cabral, o delegado Allan Turnowski deve ser indiciado hoje pela Polícia Federal, sob suspeita de vazamento de informação. Grampos telefônicos teriam flagrado uma conversa com o inspetor Christiano Gaspar Fernandes: na gravação, o então chefe da polícia avisava que Christiano era alvo da investigação da PF que resultou na Operação Guilhotina, com a prisão de 30 policiais civis e PMs acusados de corrupção. O inspetor é acusado de ser miliciano. Mesmo assim, Turnowski entregou o cargo sob elogios do secretário de Segurança e do governador Sérgio Cabral. A Câmara de Vereadores pode abrir CPI para investigar a passagem do delegado Carlos Oliveira pela Secretaria Especial de Ordem Pública, da prefeitura do Rio.


ORÇAMENTO 2011
Corte na Defesa chegará a R$4,1 bilhões
Jobim diz que, mesmo assim, processo de compra de caças para a FAB não será prejudicado

Vivian Oswald

BRASÍLIA. O Ministério da Defesa deve perder até R$4,1 bilhões este ano e pode ser uma das pastas mais afetadas pelos cortes. Originalmente, segundo o ministro Nelson Jobim, o orçamento previsto para 2011 era de R$15,1 bilhões. Mas, para se ajustar ao corte inédito de R$50 bilhões, a Defesa deve perder 36% dos chamados recursos contingenciáveis, que somam entre R$10,5 bilhões e R$11 bilhões. Isso significa que Jobim terá que redistribuir entre as forças cerca de R$6,9 bilhões a serem usados em manutenção operativa e projetos.
- Vou chamar as forças e distribuir o corte entre elas - disse Jobim, após reunião com o ministro do Planejamento, Guido Mantega, a ministra do Planejamento, Miriam Belchior, e o secretário do Tesouro Nacional, Arno Agostin.
Apesar do corte expressivo no Orçamento da Defesa, Jobim descartou qualquer impacto sobre a decisão da compra de caças para a Força Aérea Brasileira (FAB). Ele explicou que este é um processo que deve demorar "no mínimo um ano". Segundo Jobim, depois de aprovado pela presidente, o assunto é levado ao Conselho de Defesa Nacional, para voltar à presidente e, em seguida, ser levado às forças, para que discutam os contratos.
- Não há despesas orçamentárias previstas para este ano em relação aos caças. Mas a decisão da presidente tem que sair ainda este ano.
Os cortes da pasta, porém, podem afetar a incorporação de recrutas, que pode ser reduzida em 2011. O decreto com os detalhes dos cortes por ministério deve ser publicado em 22 de fevereiro, quase um mês antes do prazo legal de 20 de março, segundo a secretária de Orçamento do Ministério do Planejamento, Célia Corrêa, que também participou da reunião na Fazenda.


DIREITOS HUMANOS
Para diretor da Human Rights, situação no Irã será teste para governo Dilma
Ativista elogia nova orientação do Itamaraty sobre direitos humanos

Fernanda Godoy

NOVA YORK. O diretor para Américas da Human Rights Watch, o chileno José Miguel Vivanco, disse que a ONG internacional está "bastante e positivamente impressionada" com os sinais de mudança na política do governo brasileiro para os direitos humanos, desde que a presidente Dilma Rousseff assumiu o poder. Ontem, O GLOBO revelou que a HRW apoiou formalmente, em carta ao chanceler Antonio Patriota, a proposta do Brasil para que o tema seja discutido no Conselho de Direitos Humanos da ONU com rigor e sem alinhamento ideológico. Para Vivanco, a situação no Irã, onde protestos estão voltando a ser reprimidos com violência, será um grande teste para o governo Dilma:
- A presidente Dilma tem deixado claro, em termos inequívocos, que pretende incorporar os direitos humanos como um dos componentes da política externa brasileira. Para ser franco, durante o governo do presidente Lula, esse componente esteve bem ausente da política externa - disse Vivanco.
Na opinião do diretor da Human Rights Watch, o governo Lula tinha dois pesos e duas medidas, e agia assim não por pragmatismo, mas por ideologia, de uma maneira que teria atingido a credibilidade internacional do país:
- Não vejo que a distinção entre Lula e Dilma seja entre pragmatismo e idealismo. Não há nada de errado com o pragmatismo. Não temos ilusões. O problema com Lula e seu governo, na minha percepção, era que ele se sentia desconfortável com a ideia de valores universais, que devem ser desfrutados por todas as pessoas, independentemente da tradição ou cultura do país. Acho que ele prejudicou a influência do Brasil no mundo - afirmou Vivanco.
O diretor da HRW destaca que Dilma tem expressado sua crença nos direitos humanos como valores universais sem "contexto ou justificativa" para sua violação. As políticas domésticas de Dilma também mereceram elogios, incluindo a Comissão da Verdade, para tratar de crimes cometidos durante a ditadura militar (1964-1985) e da questão dos desaparecidos.


NEGÓCIOS & CIA

Prejuízo no ar 1
A Team transferiu ontem toda a área administrativa do Santos Dumont para o aeroporto de Jacarepaguá. A mudança é consequência da suspensão dos voos da aérea, um mês atrás, pela Anac. Até aqui, o prejuízo é de R$1,2 milhão, diz o presidente Mario Moreira.

Prejuízo no ar 2
Por causa das perdas, diz Moreira, a Team pagou só 74% do salário de janeiro aos funcionários. O presidente informa que a companhia iniciou ontem a instalação do EGPWS em seus aviões. O sistema de alerta sobre proximidade de solo em aviões é exigência da Anac. A empresa voltará a voar na 2ª.

Prejuízo no ar 3
A  ida  para Jacarepaguá  foi negociada com a  Infraero.  “O caminho para uma aérea regional  é operar em aeroporto secundário. É a oportunidade de ampliar voos”, diz Moreira. Ele afirma que as  linhas para Macaé, Campos e Vitória serão mantidas no Santos Dumont.

No clube
A Anac entrou para a Flight Safety Foundation (FSF). A entidade de segurança na aviação tem 1.200 membros em 150 países.


ANCELMO GOIS

Um dia, quem sabe
De um ministro próximo a Dilma, explicando por que a compra dos caças da FAB foi adiada para 2012:
- Depois dos cortes no Orçamento, não há dinheiro nem para comprar uma fubica.

Aliás...
Já no espírito dos cortes, o ministro da Defesa, Nelson Jobim, foi ontem a pé até o Ministério da Fazenda para discutir onde passar a tesoura. Para Jobim, as Forças Armadas não têm que ficar descontentes:
- Têm que cumprir.

Pró-memória...
A França pode perder esta encomenda para os EUA por causa, acredite, de Ahmadinejad.
É que, em junho de 2010, seria anunciada a compra dos caças da Dassault. Mas foi adiada porque Lula não gostou de Sarkozy ter descumprido o combinado e deixado o Brasil sozinho na defesa do Irã.

Aceita sócios
A miúda da aviação Webjet vai abrir seu capital.

PANORAMA ECONÔMICO
Míriam Leitão

Erros caros
Com um belo monte de equívocos, o Brasil está entrando num trem-bala para duas encrencas. As duas maiores obras são buracos sem fundo do ponto de vista fiscal, e quanto mais afundam, mais o governo se envolve. A Bertin, que é uma das empresas de Belo Monte, está em crise financeira; o governo tenta pôr os Correios para turbinar o trem-bala. Os dois projetos têm isso em comum: estão errados.
Há montes de argumentos contra as duas obras. A ferrovia é o caminho certo para o Brasil, mas o trem-bala consumirá dinheiro demais, impedindo inclusive o progresso ferroviário inadiável do país. Energia limpa é o caminho certo para o Brasil, mas a hidrelétrica de Belo Monte vai consumir dinheiro demais numa obra cujo projeto não foi avaliado adequadamente do ponto de vista econômico, fiscal, ambiental e climático. Confesso não entender por que um país com poucos recursos para investir escolhe dois projetos faraônicos num tempo em que há tanto a fazer.
O custo do trem-bala já foi revisto três vezes e está agora em R$35 bi. Ninguém do setor realmente acredita que ficará nisso. Pode ser muito mais, até porque no trem-bala 50% do projeto são túneis e pontes. Mas imaginemos que seja este o preço final. De acordo com o diretor-executivo da Associação Nacional de Transporte Ferroviário (ANTF), Rodrigo Vilaça, se em vez de trem-bala fosse feito um trem de alta velocidade convencional, que levasse três horas o trajeto, ao invés de uma hora, o custo seria reduzido a um terço:
- Quanto mais rápido andar o trem, menor capacidade terá de fazer curvas. O trajeto precisa ser praticamente em linha reta, o que encarece a obra pela geografia montanhosa da região.
O especialista em logística Paulo Fernando Fleury concorda. Acha que o Brasil tem inúmeros bons e necessários projetos na área ferroviária, com custos individuais em torno de R$4 bi a R$5 bi. É uma diferença descomunal com o custo do trem-bala. Fleury também considera que a entrada dos Correios não resolve o problema:
- O projeto é de um trem de passageiros. Como será feito o embarque e desembarque dos malotes e cargas dos Correios? Os passageiros vão ficar esperando o trem carregar e descarregar?
A entrada dos Correios no trem-bala tem mais a ver com o mesmo defeito que há em Belo Monte: pôr mais e mais governo através de estatais, para assim dar conforto aos investidores e fazer com que eles se animem. Mesmo assim, o leilão foi adiado para 29 de abril e ainda não há certeza de que haverá mais de um consórcio.
A ANTF estima que a economia brasileira demande, hoje, 50 mil quilômetros de ferrovias. Temos 28 mil. Nem quando todos os projetos previstos pelo Governo Federal saírem do papel, em 2023, chegaremos a esse número. O trem-bala vai consumir sozinho metade de que será investido no setor nos próximos anos. Ou seja, há uma clara distorção de prioridades, num contexto de urgência para ampliação da rede. Para se ter uma ideia, o crescimento do volume transportado em 2010 chegou a 19,1%: 471,1 milhões de toneladas de carga, contra 395,5 milhões em 2009. A maior parte disso são commodities que o Brasil exporta: minério de ferro, soja, milho, petroquímicos, mas também produtos para construção civil, impulsionados pelo crescimento da economia.
As ferrovias correspondem a apenas 25% de nossa matriz de transporte. O trem-bala não mudará isso porque fará transporte apenas de passageiros, e a uma distância curta, de cerca de 500 quilômetros, ligando Rio, São Paulo e Campinas. A discrepância com outros países de dimensão continental é enorme. A Rússia tem 81% de sua matriz em ferrovias. O Canadá, 46%; Austrália, 43%; EUA, 43%; e China, 37%. Estamos na lanterna e atrasados. Para piorar, 80% da malha ferroviária nacional têm mais de um século, segundo a ANTF.
O "Valor Econômico" trouxe na segunda-feira a assustadora notícia de que a Bertin está inadimplente em R$450 milhões em garantias que tinha que depositar, porque vários empreendimentos nos quais entrou estão atrasados. O grupo criava boi. Passou de uma hora para outra ao setor de infraestrutura e assumiu proporções gigantes, empurrado pelas licitações que ganhou para construir termelétricas e rodovias. E esse é o grupo-chave do consórcio que ganhou a licitação para construir Belo Monte. As garantias que tem que depositar são de nove termelétricas atrasadas. Segundo reportagem de Josette Goulart, do "Valor", "algumas medidas para contornar o problema do atraso no depósito de garantias estão sendo estudadas pela empresa e órgãos governamentais." O que têm órgãos governamentais com a dificuldade de uma empresa privada? Pode ter certeza que o final da história será mais subsídio e ajuda do governo, além do que o grupo já recebeu. No mercado, comenta-se que o BNDES procura comprador para o grupo Bertin para sair da encalacrada que o governo entrou ao organizar o consórcio na véspera do leilão de Belo Monte.
O trem-bala tem um belo monte de subsídios: R$20 bilhões de empréstimos do BNDES a juros baixos, de R$5 bilhões de doação do governo para o caso de o movimento de passageiros não ser o que foi projetado, e o Tesouro é que vai dar garantia para o empréstimo do BNDES. O governo também criará uma estatal, ao custo de R$3,4 bilhões, a Etav, Empresa do Trem de Alta Velocidade. O consultor Marcos Mendes, do Centro de Estudos do Senado, que fez o estudo mostrando todos esses subsídios embutidos, disse à imprensa que o governo é que está bancando esse projeto bilionário sem estudar os benefícios.
Os riscos são enormes nos dois projetos. No DNA de ambos, há a mesma insensata teimosia, a mesma derrama de dinheiro público, o mesmo voluntarismo estatizante. O Brasil precisa de energia renovável e de mais ferrovias, mas resolveu apostar as suas fichas nos projetos errados e caros. Onde o governo está com a cabeça?


 FONTE: JORNAL O GLOBO

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