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terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

15 de fevereiro de 2011 - VALOR ECONÔMICO


INFRAESTRUTURA
Dilma intervém para evitar atrasos na Copa
Ministro do Esporte diz que obras nas cidades-sede estão perto da "zona de risco"

Luciano Máximo e Cristiane Agostine | De São Paulo

Preocupada com atrasos nos preparativos para a Copa do Mundo de 2014 no Brasil, a presidente Dilma Rousseff começará a chamar, depois do Carnaval, prefeitos e governadores das 12 cidades e Estados que sediarão o evento para "uma conversa chegada", o que representará a passagem para um estágio de intensificação de medidas no planejamento brasileiro, disse ao Valor o ministro do Esporte, Orlando Silva. Segundo ele, Dilma dará prioridade máxima ao mundial, que ocorrerá em exatos 40 meses, no fim de seu mandato e às vésperas da eleição presidencial. O ano de 2011 será crucial, e se os projetos e as obras não deslancharem nos próximos meses, o país entrará numa "zona de risco", prevê o ministro.
De acordo com Silva, a presidente Dilma também pediu a elaboração de um balanço trimestral sobre a evolução dos empreendimentos nas 12 capitais. A ideia é que as prefeituras e os governos estaduais sigam à risca a matriz de responsabilidades da Copa, documento que sela compromissos entre os entes federativos. "Vamos fazer um TAC [termo de ajuste de conduta] entre as cidades, os Estados e a União, dizendo quem faz o quê e paga o quê e quais são os cronogramas."
A orientação do governo federal é dar maior transparência aos processos, evitar atrasos e afastar problemas de sobrepreço e irregularidades nos projetos. "A Dilma quer agora um balanço a cada três meses. O sujeito vai ter que se explicar por que [o projeto inicial] era R$ 300 milhões e agora é R$ 600 milhões. Vai ter que esclarecer para a sociedade por que o projeto não ficou pronto", ilustra.
O ministro aproveitou para comentar relatório publicado semana passada pelo Tribunal de Contas da União (TCU), que indicou uma série de problemas nos projetos da Copa de 2014: descumprimento de prazos, aportes desnecessários, riscos de aditivos contratuais e sobrepreço. Para ele, as informações do órgão estão incompletas.
"Temos colaborado fortemente com o TCU, a última leva de informações requeridas era de dezembro. Pedimos novo prazo, que vai vencer em 26 de fevereiro", ponderou o ministro, que considera natural algumas alterações de custos e prazos. "Em Cuiabá, a obra do estádio começou e, durante o estaqueamento, foi descoberto um grande lençol freático. Tem que ver que empresa fez a sondagem do terreno e aplicar uma multa. A obra continuará no mesmo lugar, será preciso triplicar o estaqueamento. Vai custar mais."
Além disso, a presidente convocou uma reunião para o dia 2 de março com 23 ministros para tratar exclusivamente de assuntos relacionados à Copa do Mundo. No encontro, serão apresentadas informações colhidas em campo por Silva e sua equipe, que têm percorrido as 12 cidades-sede desde a semana passada. "Pretendemos dar um balanço dos preparativos e medidas para intensificar as ações do Mundial da Fifa no Brasil. Este ano é chave, porque é o ano que concentra o início da maior quantidade de obras, sobretudo de mobilidade urbana e aeroportos. Se não agirmos adequadamente entramos numa zona de risco", afirma Silva.
De acordo com a previsão de gastos federais, estaduais e municipais e financiamentos da Caixa Econômica Federal e do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), disponíveis no Portal da Transparência, dos R$ 23,5 bilhões estimados para a construção de estádios e obras de mobilidade urbana e reformas em aeroportos, as autoridades públicas brasileiras contrataram R$ 8,6 bilhões e conseguiram executar apenas R$ 207,2 milhões - 0,87% do total.
O baixo índice de execução dos orçamentos públicos não significa necessariamente que todos os projetos estejam atrasados, pois contratos já firmados com a iniciativa privada garantem a condução de obras. Nos cálculos do ministro, as construções dos estádios estão em andamento em 10 das 12 sedes. "Não temos obras em São Paulo, porque foi trocado o endereço do estádio - era o Morumbi, passou a ser o projeto Corinthians, em Itaquera. Também não temos obras em Natal, porque a licitação não teve nenhum concorrente. O novo edital, previsto para março ou abril, já tem 28 grupos interessados."
O ministro diz que a maior preocupação é com as obras de infraestrutura. Ele atribui os atrasos à falta da cultura de planejamento. "As cidades têm um plano conceitual, mas não têm uma estratégia clara. Queríamos deixar um legado de transporte urbano, mas as prefeituras traziam projetos de intervenção viárias, queriam facilitar a circulação dos carros na cidade."


PARA ENTENDER
A Autoridade Pública Olímpica (APO) é um consórcio público que reúne o governo federal, o governo do Estado do Rio de Janeiro e do município do Rio. A autarquia comandará as ações governamentais com vistas aos jogos olímpicos do Rio de Janeiro, em 2016, terá 484 cargos e orçamento próprio. Segundo o ministro do Esporte, Orlando Silva, um terço dos cargos será de livre provimento. Para criar a função, o governo estudou modelos implementados em Sidney, Seul, Barcelona, bem avaliados pelo Comitê Olímpico Internacional. A escolha do modelo faz parte da estratégia do Brasil para sediar os jogos e evitar a derrota. O Rio já tinha disputado três vezes. Para vigorar, precisa ser aprovada pelo Congresso, pela Assembleia do Rio e pela Câmara Municipal do Rio.


Ministro quer autarquia fora de obras

Sem sucesso na tentativa de emplacar um nome para o comando da Autoridade Pública Olímpica (APO), o ministro do Esporte, Orlando Silva, e seu partido, PCdoB, querem delimitar a atuação de quem estiver à frente do cargo. O ministro ressalta que a autarquia a ser criada será responsável por gerenciar projetos ligados à Olimpíada de 2016, mas não por executar ou licitar obras. Para controlar eventuais mudanças na função, o PCdoB indicou o deputado Daniel Almeida (BA) para a relatoria da Medida Provisória 503, de 2010, que cria a autoridade olímpica. A MP deve ser votada amanhã pelo plenário da Câmara.
Para o ministro do Esporte, o mais importante neste momento é definir as atribuições da autoridade olímpica. Silva destacou que a autarquia não terá status de ministério, não terá ingerência sobre obras da Copa de 2014, nem deverá influenciar na contratação de projetos. "É importante colocar luz sobre o modelo de governMinistro quer autarquia fora de obrasança, porque, convertido em lei, é desejável que esse modelo seja permanente até 2016", afirma Silva.
Segundo o ministro, a principal função da APO será coordenar os interesses do governo federal, do estadual e municipal do Rio de Janeiro. "O que foi concebido é o monitoramento da obra. A vantagem é poder apontar atrasos e intervir."
A MP prevê que a autarquia faça licitações, contratações e convênios para a execução das obras e serviços em casos "imprescindíveis para assegurar o cumprimento das obrigações assumidas perante o Comitê Olímpico Internacional." Para o ministro, no entanto, essa não é função da APO. "O que foi elaborado, assinado e está no relatório a ser votado não prevê isso. Apenas excepcionalmente. Se algum dos entes não cumprir seus compromissos, a APO poderia intervir para garantir que o empreendimento seja realizado", diz.
A decisão do governo federal de dividir o comando das ações com vistas à realização da Olimpíada desagradou o PCdoB. O partido pretendia indicar um nome para a APO. O principal cotado para presidir a autarquia é o ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles. O nome será definido pela presidente Dilma Rousseff e tem de ser aprovado pelo Senado.
O ministro, no entanto, desconversou sobre a possível indicação de Meirelles. "Acredito que não é muito bom fulanizar a discussão. Antes de debater nomes, é importante discutir o modelo de governança", diz. "Meirelles tem capacidade para exercer múltiplas funções. Só posso falar isso. Não tive nenhum comunicado de Dilma sobre quem será indicado."
Silva reforçou que o ministério terá influencia sobre a APO. "Nosso papel é de dar suporte. Estou vinculado a esse projeto, porque até aqui eu o conduzi. Em alguma medida vou continuar participando."
(LM e CA)


POLÍTICA
Presidente da GE é o primeiro empresário a ser recebido por Dilma

Paulo de Tarso Lyra | De Brasília

A presidente Dilma Rousseff recebe amanhã o presidente mundial da General Electric, Jeffrey Immelt, que vai apresentar ao novo governo o projeto de criação de um centro de pesquisas na Ilha do Fundão, no Rio de Janeiro. Trata-se de um investimento de US$ 550 milhões que deve estar pronto em 18 meses. Immelt será o primeiro representante do setor produtivo a ter uma audiência privada com a presidente desde a posse, em 1º de janeiro.
Aliados de Dilma justificam a ausência de mais empresários na agenda com dois argumentos: ela aproveita este início de gestão para "inteirar-se" da máquina pública federal e prefere que as audiências tenham uma pauta consolidada, para que o encontro seja mais produtivo.
A General Electric vai usar os incentivos da Lei de Inovação Tecnológica do Ministério de Ciência e Tecnologia. O Centro funcionará ao lado da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ) e do Centro de Pesquisas da Petrobras (Cenpes), uma parceria que combina com a filosofia do governo federal de conciliar conhecimento com aplicação prática no mercado de trabalho.
Além disso, nestes primeiros 45 dias de mandato, Dilma teve que acompanhar as enchentes em diversos Estados, definir os cortes no Orçamento, encaminhar um projeto de lei com a política de valorização do salário mínimo e ainda promover as trocas de comando no setor elétrico.
Apesar de ter mantido, ao longo de sua gestão na Casa Civil, entre 2005 e 2010, uma estreita relação com o setor privado - fortalecido com as obras de infraestrutura do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) - Dilma ainda não havia recebido nenhum empresário desde que assumiu a Presidência da República. Durante a campanha, ela encontrou-se com o presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Borges e, no governo de transição, combinou com o empresário Jorge Gerdau a criação do Fórum Governamental de Competitividade e Gestão.
Dilma dedicou sua agenda de início de mandato a conhecer a rotina do governo. Exceção feita aos ministros mais próximos, como o chefe da Casa Civil, ministro Antonio Palocci, há queixa de outros integrantes da Esplanada sobre as dificuldades de se conseguir uma audiência com ela. O ministro da Defesa, Nelson Jobim, titular de uma Pasta com uma demanda milionária - a compra dos caças - e de um passivo político delicado - a instalação da Comissão da Verdade - teve a primeira reunião privada no Planalto na sexta-feira, mesmo dia em que o Valor publicou uma matéria afirmando que ele estaria "insatisfeito" com a falta de atenção presidencial.
Outra justificativa para a ausência de empresários na agenda de Dilma neste início de mandato está relacionada ao estilo gerencial da presidente. Por primar pela objetividade, sobretudo na gestão, Dilma prefere que os encontros de trabalho tenham uma pauta mais consolidada, para que o tempo seja melhor aproveitado e os resultados alcançados com mais facilidade.
Por isso, opta por encaminhar os empresários para audiências preliminares com os ministros das respectivas áreas de atuação. Mesmo sendo profunda conhecedora do setor elétrico, Dilma prefere que os executivos do ramo procurem primeiro o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão. Representantes da iniciativa privada estão sendo orientados a adotar esta prática todas as vezes que solicitarem uma audiência com a presidente.
O caso de Jeffrey Immelt, por exemplo, não aconteceu com base em uma preferência pessoal da presidente. Ele já havia apresentado o mesmo projeto do centro de pesquisa ao atual secretário-executivo do Ministério de Desenvolvimento, Indústria e Comércio (MDIC), Alessandro Teixeira, quando este era presidente da Agência Brasileira de Promoção de Exportação e Investimentos (Apex). Na audiência de amanhã, Immelt estará acompanhado do ministro do MDIC, Fernando Pimentel.


Servidores terão outro regime de previdência complementar

Ribamar Oliveira | De Brasília

O governo vai mandar ao Congresso Nacional um novo projeto para instituir o regime de previdência complementar dos funcionários públicos. O projeto está sendo discutido no âmbito dos Ministérios da Previdência Social e do Planejamento, segundo informou ontem o líder do governo no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR).
Em 2007, o governo do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva encaminhou ao Congresso o projeto 1992/2007 instituindo o regime de previdência complementar dos servidores. O projeto, no entanto, foi engavetado na Câmara dos Deputados, principalmente por causa das pressões das entidades representativas dos juízes federais.
Agora, a discussão voltou à 'estaca zero'. O governo debate, de acordo com Jucá, se será um único fundo de pensão para todos os servidores ou três fundos, um para o Poder Executivo, outro para o Poder Legislativo e outro para o Judiciário.
Essa mesma questão foi discutida exaustivamente há cinco anos pelo governo do ex-presidente Lula, que concluiu que a melhor e mais justa alternativa era a criação de um único fundo para os funcionários dos três Poderes. O projeto de lei 1992/2007 autoriza a criação de entidade fechada de previdência complementar denominada Fundação de Previdência Complementar do Servidor Público Federal (Funpresp), que teria regras únicas para todos os servidores e seria constituída sob o regime de contribuições definidas.
A solução proposta pelo governo passado nunca foi aceita pelo juízes, que defenderam, desde o início, a criação de um fundo de previdência complementar apenas para o Poder Judiciário. Aos juízes, juntaram-se em oposição ao projeto as corporações sindicais dos demais servidores públicos.
A criação da previdência complementar para os funcionários públicos está prevista na Constituição. Somente depois da criação desse regime a reforma do sistema previdenciário dos servidores, aprovada em 2003, poderá ser colocada em prática. A reforma prevê que os funcionários públicos passarão a receber aposentadorias até o teto do INSS, como ocorre com os trabalhadores da iniciativa privada, podendo complementar esses valores por meio do fundo de pensão.

EMPRESAS / SERVIÇOS
Fluxo de passageiros cresce 16,4% e marca a menor taxa em 18 meses

Alberto Komatsu | De São Paulo

O transporte aéreo de passageiros no país cresceu 16,43% em janeiro, diante de igual período do ano passado. Apesar do bom resultado, é a taxa mais baixa desde julho de 2009, quando a demanda doméstica teve expansão de 9,43%. Desde o último trimestre de 2010, a Agência Nacional de aviação Civil (Anac) tem destacado a desaceleração do tráfego de passageiros, após meses consecutivos de crescimento acima de 20%. A oferta de assentos teve alta de 13,80%.
Especialistas e executivos do setor têm notado a perda de velocidade do ritmo de crescimento dos voos domésticos. Eles estimam que neste ano a demanda por voos domésticos vai ficar em torno de 15%, depois de ter registrado crescimento de quase 23,5% em 2010, o melhor resultado desde 2005.
"Mais do que a desaceleração, os dados mostram que ainda há um forte crescimento da demanda, impulsionada pela saúde da economia e pela política de preços das companhias", afirma o especialista em aviação da consultoria Bain & Company, André Castellini.
Os dados da Anac também mostram a continuidade da perda de fôlego do duopólio TAM / Gol. Juntas, elas responderam por 80,62% da demanda doméstica em janeiro. No mesmo mês de 2010, a fatia conjunta era de 84,04%.
Avianca Brasil, Azul, Trip e Webjet viram a sua participação conjunta passar de 15,24% para 18, 32%, na comparação entre os meses de janeiro, um crescimento de 3,08 pontos percentuais, enquanto a fatia de TAM e Gol recuou 3,42 pontos na mesma comparação.
O levantamento da demanda doméstica no mês passado indica, ainda, que aumentou a distância entre a líder TAM e a Gol. A primeira teve fatia de 43,35% diante dos 37,27% da segunda, ou uma diferença de 6,08 pontos percentuais. Em janeiro de 2010, a diferença era de 2,02 pontos percentuais, pois a TAM tinha 43,03% de participação, enquanto a Gol tinha 41,01%.
"Essa diferença vem de uma maior agressividade na oferta da TAM e na sua política comercial", diz Castellini. A oferta de assentos da TAM cresceu 12,31% em janeiro e a da Gol teve expansão de 3,87%.
O fluxo de passageiros em voos para fora do Brasil registrou expansão de 11,48% em janeiro, em relação ao mesmo período de 2010. A oferta de assentos cresceu 14,11% na mesma base de comparação. A TAM respondeu por 85,20% do fluxo de passageiros transportados, seguida pela Gol, com 13,35%.


EMPRESAS / INDÚSTRIA
Shell vai negociar com Cade para manter os negócios de aviação

De São Paulo

A Shell deverá manter conversações com o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade) para manter os negócios de aviação, considerados estratégicos para a companhia.
Na semana passada, o Cade condicionou a aprovação da compra da Cosan pela Shell à venda dos ativos físicos da Jacta Participações, que comercializa combustível de aviação nos principais aeroportos do país. A Shell comprou os negócios de aviação, que pertenciam aos ativos da Esso há dois anos. A empresa opera nesse setor em 54 aeroportos.
A empresa que adquirir os ativos terá o direito de participação nos parques de abastecimento localizados nos aeroportos de Guarulhos (SP), Galeão (RJ) e Guararapes (PE). A Shell terá de vender os parques de abastecimento mantidos pela Cosan nos aeroportos da Pampulha (Belo Horizonte), Viracopos (Campinas), Curitiba e Brasília.
Segundo Vasco Dias, presidente da Raízen, a companhia ainda está em negociação com o Cade, uma vez que esse foi o primeiro parecer do conselho. "São 100 anos de história da Shell nesse segmento", afirmou. Essa decisão, segundo ele, não afeta os negócios da Raízen. (MS)


Previsão da Boeing

A Boeing entregará no fim deste ano seu primeiro 747-8 Intercontinental, uma nova versão do jato 747 com mais capacidade de passageiros e menos consumo de combustível. A primeira entrega do modelo será feita para um cliente particular durante o quarto trimestre deste ano, depois de ter iniciado os primeiros voos de teste em março, detalhou ontem à Agência Efe o porta-voz, Jim Proulx.
No entanto, somente no início de 2012 uma companhia aérea comercial, a Lufthansa, receberá o primeiro 747-8 Intercontinental.
A Boeing procura compensar os atrasos de seu 787 Dreamliner, um modelo cuja estreia já acumula três anos de atraso devido, entre outras questões, à paralisação de seus voos de testes em novembro, após uma aeronave ter feito uma aterrissagem de emergência no Texas.


OPINIÃO
Consistência da política externa

José Eli da Veiga

Nada pode ser mais fútil que previsões sobre fenômenos sociais, sejam mais culturais, políticos, econômicos, militares, demográficos ou tecnológicos. Todavia, na formulação de estratégias, planos e programas governamentais, não há como se escapar de algum conjunto de suposições sobre o futuro. Que até pode estar explícito sob a cômoda construção de "visões" ou "cenários", mas sem jamais conseguir evitar que uma parte fique apenas subentendida.
Como avaliar, então, o grau de verossimilhança (ou de frivolidade) dessas antecipações forçosamente embutidas em tão importantes documentos programáticos? A procura de resposta a essa indagação só pode apelar para a história, que oferece ao menos três certezas: 1) o senso comum sempre erra; 2) a análise convencional também padece de profunda falta de imaginação; 3) mesmo assim, algumas coisas podem ser bem previstas e, efetivamente, o foram.
Era simplesmente impossível imaginar no século XIX como seriam as duas guerras mundiais do século XX. Mas as ascensões dos Estados Unidos e da Rússia foram limpidamente previstas por cérebros tão diferentes quanto os de Alexis de Tocqueville (1805-1859) e de Friedrich Nietzche (1844-1900). O que indica que certas tendências objetivas mais profundas se impõem por mais aleatórios que possam ser os encadeamentos conjunturais.
Por exemplo: é certeza que o século XXI será dominado pela busca de novas formas de energia que permitam a superação da era fóssil, mesmo que não seja possível afirmar hoje quais descobertas ou invenções se revelarão as mais decisivas. Uma das possibilidades, que certamente será favorecida por pressões de Forças Armadas (principalmente norte-americanas), vai ser a geração de energia baseada no espaço e lançada à Terra como radiação de micro-ondas. Isso poderá criar uma nova plataforma para o poder geopolítico dos Estados Unidos, país que assim se tornaria o maior produtor de energia do mundo. Simultaneamente, também serão cada vez mais aeroespaciais os sistemas de defesa e de preparação para guerras. O foco central das operações militares estará na capacidade de destruição dos satélites inimigos.
Não é preciso ir mais longe para que se perceba a inconsistência da ideia de que o Brasil se tornará uma "potência" por obra e graça de suas vantagens agro-energéticas, como supõem duas importantíssimas e bem recentes elaborações da Presidência da República: o "Plano Brasil 2022" e a "Mensagem ao Congresso Nacional, 2011". Qualquer nação com chances de se tornar potência neste século já dispõe de programa aeroespacial avançado, em vez de só poder planejar para 2022 a construção de seu primeiro veículo lançador de satélites (VLS).
Pior: esse imenso risco de não poder participar do grande jogo político internacional deste século não deve ser visto como deficiência apenas nacional, pois nesse âmbito é todo o subcontinente que tende a ficar excluído, a menos que seja fortemente acelerado o processo de constituição do bloco sul-americano.
A única maneira de evitar que a força centrípeta da multipolarização em curso torne as nações da América do Sul ainda mais periféricas é obter cacife para que elas ao menos não possam ser ignoradas pelos principais apostadores: os Estados Unidos e seus consortes, a União Europeia e o eixo China-Japão.
É muito pouco dizer que cabe ao Brasil não se deixar incorporar a nenhum desses três grandes blocos/áreas de influência, mesmo que de forma parcial. Ao contrário, é crucial avaliar em que medida cada qual tenderá a contrariar qualquer projeto de o bloco sul-americano adquirir capacidade competitiva para um futuro em que a segurança - tanto energética como militar - dependerá essencialmente de bases espaciais. Melhor: é preciso saber se algum deles poderia ter a propensão inversa: vir a apoiar tal ambição.
Dos três, é a Europa que estará mais inclinada em tal direção. Principalmente depois do intenso exame de consciência que se seguiu à participação de grande número de seus membros da "coalização dos dispostos" que ajudou os Estados Unidos no Iraque, processo que já havia sido desencadeado pela inevitabilidade de contar com a intervenção militar dos Estados Unidos para que fossem encerrados os conflitos na Bósnia e em Kosovo nos anos 1990.
A União Europeia será levada a empregar cada vez mais a assistência econômica como ferramenta de política externa para promover a cooperação internacional. Além disso, também estará propensa a redefinir o papel do envolvimento militar, afastando-o da velha perspectiva de defesa do Estado-nação para aproximá-lo de um projeto transnacional de pacificação e intervenção humanitária.
Por isso, o mais estratégico anúncio da primeira Mensagem da presidente Dilma ao Congresso é que em 2011 "objetiva-se aprofundar a parceria estratégica com a União Europeia". Pena que no âmbito aeroespacial tudo permaneça tão limitado a uma acanhada aliança do Brasil com a Ucrânia, quando já deveria estar a pleno vapor um programa de cooperação da Unasul com a UE.
*José Eli da Veiga - professor titular da USP (FEA e IRI) e autor de "Sustentabilidade" (Ed. Senac, 2010), escreve mensalmente às terças.

 Fonte; Valor Econômico

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