CRISTIAN KLEIN
Os exageros de Osama e de Obama
Ninguém ainda viu o corpo. Mas Osama bin Laden está morto. Obama, o presidente americano, garantiu. Sua popularidade cresceu, e o fim da caçada ao maior terrorista da história pode lhe garantir a reeleição. Mas a notícia que causou surpresa e, inicialmente, certa sensação de justiça, agora é substituída pelos questionamentos sobre a ação da tropa de elite enviada ao Paquistão. Osama estava desarmado? Por que não foi preso e levado a julgamento? Que direito têm os Estados Unidos de entrar no território de um Estado soberano e realizar sua vendeta?
As perguntas e a curiosidade sobre a operação não param de crescer. Parentes das vítimas dos atentados do 11 de setembro - a obra-prima maligna dirigida por Bin Laden - querem ver a víbora morta. O governo - depois de supostamente se livrar do corpo, jogado ao mar, sob a mal disfarçada alegação de respeito à tradição muçulmana - evita a divulgação de imagens. Poderia estimular uma temida reação de seguidores e do grupo terrorista criado por ele.
Mas até que ponto a Al Qaeda ainda tem o poder de fogo que culminou no atentado de 2001? As análises divergem. Por um lado, a descentralização da organização, hoje espalhada por núcleos semelhantes a filiais ou franquias, implicaria numa estrutura enfraquecida. Por outro, o fato de a Al Qaeda ter se adaptado e não depender de uma só figura personalista a tornaria um legado possivelmente maior e mais perigoso de Osama bin Laden.
A herança do terrorista ainda está por ser avaliada. Mas o fato é que, apesar da curta perspectiva, Bin Laden entrou para o panteão de "monstros" da história. É muito tentador compará-lo a Hitler, Stálin, Mussolini, Mao-Tsé tung, Pol Pot, ditadores que contribuíram para fazer do século 20 o mais assassino de todos. Em "A era dos extremos", o historiador Eric Hobsbawn estima em 187 milhões o número de pessoas mortas no período, em guerras e regimes totalitários - o que equivale a 10% da população mundial antes da Primeira Guerra.
Osama bin Laden, porém, é de outra estirpe de gênio do mal. Matou muito menos. Não comandava um Estado nacional, no qual pudesse pilotar uma máquina de extermínio e genocídios. Vivia nas franjas de sistemas políticos. Mas é o símbolo maior dos novos tempos, de uma ordem internacional que segue outra lógica. É reflexo da desintegração do arcabouço que se seguiu ao fim do conflito das duas maiores ideologias do século 20.
Num dos diagnósticos mais influentes sobre o período, descrito no livro "Após o liberalismo - Em busca da reconstrução do mundo" (1995), Immanuel Wallerstein sugere que a luta entre o capitalismo e o comunismo forjou um sistema que funcionava como um cimento ideológico a conter o conflito Norte-Sul. Apesar das aparentes divergências, tanto o leninismo quanto o wilsonismo (difundido por Woodrow Wilson, presidente americano entre 1913 e 1921) tinham como objetivo integrar politicamente os países periféricos ao sistema internacional. Para isso, ambos lançaram mão do conceito de desenvolvimento nacional, cujo resultado político foi a descolonização quase completa do mundo.
O alinhamento ao bloco capitalista ou ao comunista representava a possibilidade de modernização, de superação do atraso. Mas como as políticas públicas dos países periféricos não se mostraram eficientes, o projeto de desenvolvimento nacional acabou sofrendo dois fortes golpes. Primeiro, a "revolução mundial de 1968", que teria refletido o desencanto dos novos movimentos sociais (como o ambientalismo e o feminismo) com a "velha esquerda", que havia chegado ao poder sem realizar a promessa de justiça social. E depois, a crise da dívida da década de 1980, consequência dos elevados empréstimos feitos pelas economias centrais às nações periféricas.
O resultado foi o sucessivo desmonte de ditaduras militares de caráter desenvolvimentista na América Latina, bem como os movimentos que levaram à queda do Muro de Berlim.
Leninismo e wilsonismo eram face da mesma moeda. Seu fim - afirmava Wallerstein anos antes de o mundo inteiro ser apresentado à Al Qaeda - representava a desintegração e a possibilidade de surgimento do fundamentalismo.
É curioso, e provavelmente não uma coincidência, o fato de Osama bin Laden ter surgido das ruínas desse sistema. Bin Laden, antes de se voltar para o terrorismo de orientação religiosa havia sido um ativo colaborador dos Estados Unidos contra a invasão soviética no Afeganistão. Com o fim da guerra, seu grupo encontraria no fundamentalismo islâmico uma nova ideologia. Contra os valores ocidentais, contra a democracia e no vácuo do comunismo.
Outro ponto interessante é que apesar da imagem de fanatismo, de irracionalidade, Bin Laden e Al Qaeda são fruto de uma lógica que estaria por trás dos grupos terroristas. Num artigo intitulado "The strategic logic of suicide terrorism", o cientista político Robert Pape, da Universidade de Chicago, mostra como a partir da década de 90 houve um crescimento dos ataques suicidas, em contraste com a queda do número de episódios de violência terrorista.
A explicação para o fenômeno é que os extremistas teriam aprendido que o ataque suicida é o melhor método para alcançar seus objetivos. Pape analisa 187 ataques realizados entre 1980 e 2001, por grupos como Hamas e Jihad Islâmica (contra Israel), Tigres Tamis (contra o Sri Lanka), separatistas da Chechênia (contra a Rússia) e Al Qaeda (contra os EUA).
Ele chega a quatro descobertas: 1) a de que o terrorismo suicida é estratégico (fruto de ampla campanha de grupos organizados e não um ato isolado de fanatismo); 2) busca coagir democracias modernas a fazerem concessões à autodeterminação nacional; 3) traz recompensas (a causa obteve mais ganhos após recorrer a operações suicidas; exemplos são a retirada de forças militares americanas e francesas do Líbano em 1983 e de forças israelenses da Faixa de Gaza em 1994); e 4) sua taxa de sucesso não está relacionada a ações ambiciosas. Em geral, infligir níveis baixos e médios de punição à população civil é mais vantajoso. Ou seja, aumentar a violência não garante maior probabilidade de ganhos. A reação vem à altura. Bin Laden e Al Qaeda podem ter exagerado.
INFRAESTRUTURA
Queda nos investimentos em energia e tarifas altas preocupam o governo
Paulo de Tarso Lyra | De Brasília
Depois de autorizar mudanças nos aeroportos brasileiros, é a vez de o setor elétrico ocupar o primeiro lugar nas preocupações da presidente Dilma Rousseff. Ela reuniu-se na segunda-feira com o ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, o secretário-executivo da pasta, Márcio Zimmermann, e o diretor-geral da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), Nelson Hubner, para traçar um amplo diagnóstico do setor, segundo informações de um assessor próximo.
Dilma questiona e pede soluções para o alto valor das tarifas de energia elétrica - quase metade composta por encargos incidentes sobre a conta - e a possibilidade de redução de investimentos às vésperas de megaeventos, como a Copa do Mundo de futebol de 2014 e a Olimpíada de 2016, no Rio de Janeiro.
Duas situações reforçam o temor do governo de uma diminuição no nível de investimentos privados ao longo dos próximos anos: a decisão da Aneel de reduzir de 9,95% para 7,15% a Taxa de Remuneração - o que as empresas ganham para investir no sistema e compensar os gastos com o risco Brasil e outras perdas econômicas - e o término, em 2015, da maioria das concessões de distribuidores e geradoras de energia, o que deixaria os investidores receosos de aplicar recursos sem a garantia de que continuarão operando no setor no futuro.
A mudança na Taxa de Remuneração está sendo avaliada pela Aneel dentro do 3º Ciclo de Revisão Tarifária, iniciado em setembro do ano passado. A redução já estava decidida e a agência deveria começar a aplicar a mudança de percentual nas primeiras distribuidoras, como a Companhia Elétrica do Ceará (Coelce). Mas as distribuidoras reclamaram que essa mudança significaria uma redução de R$ 5 bilhões anuais em seus cofres - algumas delas teriam um queda de aproximadamente 30% na receita - o que limitaria a capacidade de investimentos no setor.
Com a pressão, a Aneel prorrogou até o dia 27 de maio a consulta pública sobre o tema para buscar uma alternativa. A possibilidade de diminuição no ritmo de investimentos é uma notícia ruim. Dilma disse aos seus auxiliares que o país não tem problemas quanto às fontes de energia - a matriz nacional é limpa e renovável.
As condições da geração e distribuição, porém, não oferecem o mesmo grau de confiabilidade. A capital federal, Brasília, que será uma das 12 cidades-sede da Copa do Mundo de futebol de 2014, e o Rio de Janeiro - já escolhido para abrigar a partida final da copa e sediar a Olimpíada de 2016 - sofrem com apagões mesmo em dias em que não há chuva. Com o natural aumento no movimento de pessoas no país em eventos deste porte, o temor é que haja um colapso no sistema.
Dilma também está preocupada com o término do prazo de concessões das principais distribuidores e geradoras do país, previsto para 2015. Segundo dados da Aneel, vencerão em 2015 as concessões de 68 usinas que, juntas, têm potência instalada de 21,4 mil megawatts (MW). Isso equivale a cerca de 20% da atual capacidade instalada de produção de energia no país. Na área de distribuição, expiram, entre 2015 e 2016, os contratos de 40 concessionárias, muitas delas estratégicas, como as administradas pela Chesf.
O temor de que isso provoque uma paralisação nos investimentos não é injustificado. Em 2008, o então governador de São Paulo, José Serra (PSDB), tentou privatizar a Cesp - cuja concessão também vence em 2015. Não conseguiu, pois os empresários não quiseram comprar uma das principais distribuidoras do país diante da possibilidade de tê-la nas mãos por apenas sete anos.
As dúvidas quanto à concessão não são apenas políticas ou econômicas, mas também jurídicas. Especialistas do setor e do próprio governo divergem sobre a forma para se alterar o regime de concessão - caso seja essa a decisão a ser tomada. Para alguns juristas, seria preciso enviar ao Congresso um novo projeto de lei, alterando a legislação atual. Outros defendem que a situação poderá ser resolvida com um mero decreto presidencial.
Dilma também pressiona pela redução no preço das tarifas, considerado por ela alto demais. O ministro do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior, Fernando Pimentel, apoia a medida, por considerar que a energia cara diminui a competitividade da indústria brasileira. Aproximadamente 45,3% da tarifa é decorrente de encargos que incidem sobre ela.
O governo, porém, não abre mão da Reserva Global de Reversão (RGR), prorrogada até 2035 pela Medida Provisória 517, em tramitação no Congresso. O governo afirma que a RGR mantém programas sociais, como o Luz para Todos. O fundo tem hoje R$ 15,6 bilhões e cerca de R$ 7 bilhões são usados para financiar o setor elétrico, principalmente projetos da Eletrobras.
AVIAÇÃO
Lufthansa reduz perda no primeiro trimestre
Cornelius Rahn | Bloomberg
A alemã Lufthansa, segunda maior empresa aérea da Europa, divulgou ontem prejuízo operacional de € 227 milhões no primeiro trimestre, ante € 330 milhões do mesmo período de 2010, beneficiada pela recuperação da economia, que elevou a demanda por transporte de cargas e passageiros. A previsão média de nove analistas consultados pela Bloomberg era de perdas de € 247 milhões.
O tráfego de passageiros cresceu 6,9% no trimestre, o que contribuiu para elevar as vendas em 10%, para € 6,4 bilhões. O prejuízo líquido aumentou de € 298 milhões para € 507 milhões, incluindo baixa contábil de € 292 milhões referente às operações de hedge.
"O negócio operacional mostrou-se como eu esperava, mas os efeitos contábeis foram altos demais e exigirão uma explanação", disse Uwe Weinreich, analista da UniCredit, que classifica as ações da Lufthansa com recomendação de "manter". "Suponho que são relacionados ao hedge de combustível, câmbio e juros."
As ações da Lufthansa, que define lucro operacional como o lucro antes de impostos e juros, ajustado para ganhos e perdas relacionadas aos ativos e investimentos financeiros, acumulam desvalorização de 11% no ano. O valor de mercado da empresa é de € 6,6 bilhões.
As margens de lucro vêm sendo espremidas pelo aumento no custo dos combustíveis, após o petróleo bruto ter atingido em 2 de maio a maior cotação em dois anos e meio, e a Lufthansa espera cortar outras despesas para compensar o impacto, disse o executivo-chefe da companhia, Christoph Franz.
O aumento no tráfego foi contido pela clima de tensão no Oriente Médio, que reduziu a demanda por rotas atendidas pelas subsidiárias Austrian Airlines e British Midland, e pelo terremoto e tsunami no Japão em 11 de março, que levou a Lufthansa a modificar seus voos para o país.
Os lucros das empresas aéreas cairão quase 50% neste ano, por causa da alta do petróleo, conforme previsão da Associação Internacional de Transporte Aéreo (Iata, na sigla em inglês), divulgada em 2 de março.
A meta da Lufthansa é cortar custos anuais de € 1 bilhão, na comparação entre os números de 2008 e 2011. Desse total, pelo menos € 350 milhões referem-se a cortes previstos para este ano. A Lufthansa planeja tornar a unidade austríaca lucrativa neste ano. A British Midland ainda terá prejuízo, disse Franz, na terça-feira. A Lufthansa contabilizou lucro líquido de € 1,1 bilhão em 2010, melhor resultado anual desde 2007.
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