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terça-feira, 31 de maio de 2011

31 de maio de 2011 - VALOR ECONÔMICO


BRASIL
Dilma promete aumentar cooperação com o Uruguai em infraestrutura e tecnologia

Agência Brasil, de Montevidéu

O aumento da cooperação entre o Brasil e o Uruguai nas áreas de infraestrutura e tecnologia foi a tônica da visita da presidente Dilma Rousseff, ao Uruguai, ontem. Ao lado do presidente uruguaio José Mujica, Dilma disse que até o fim do ano serão concluídos dois trechos da ferrovia que liga os dois países. Os trechos a serem reativados ligam as cidades gaúchas Cacequi a Santana do Livramento, na fronteira com o Uruguai.
O Brasil é o principal destino das exportações uruguaias e também o principal fornecedor do país vizinho. Na declaração conjunta que fez ao lado de Mujica, Dilma enfatizou a necessidade de ampliar as trocas comerciais e ressaltou que o Mercosul foi fundamental para que o Cone Sul tivesse crescimento acima das taxas mundiais nos últimos anos.
Além da construção da ferrovia, Dilma também disse que o governo brasileiro apoiará outros projetos de integração com o Uruguai. "Seguiremos adiante com os grandes projetos de integração física, basicamente integração logística e energética fundamentais para o desenvolvimento da região."
Entre os projetos está a construção de uma segunda ponte sobre o rio Jaguarão, trabalhos de dragagem, sinalização e balizamento para a construção de 1,2 mil quilômetros de hidrovia ligando os dois países. A hidrovia, de acordo com a presidente, ligará a Lagoa Mirim e a Lagoa dos Patos.
Para a integração no setor de energia elétrica, Dilma defendeu a criação de um novo marco jurídico para reger a relação entre os dois países. "Esse marco tem uma característica de tentar uma relação estruturante, a longo prazo, entre o Brasil e o Uruguai no quadro de energia elétrica e ao mesmo tempo vamos resolver nosso problema de curto prazo, assegurando ao Uruguai a segurança de que o Brasil pode fornecer na área energética."
O Uruguai compra energia brasileira. Um dos projetos anunciados por Dilma é a construção de uma linha de transmissão de 500 quilovolts (kV) que vai interligar o Brasil com o Uruguai. Essa linha, que segundo Dilma ficará pronta no próximo ano, interligará Candiota, no Rio Grande do Sul, a San Carlos, cidade próxima a Montevidéu. O projeto será desenvolvido pela Eletrobras em conjunto com a UTE, uma empresa uruguaia. A cooperação na área de tecnologia, de acordo com a presidente, também foi uma prioridade da visita. "Vamos apoiar projetos nos campos da biotecnologia, nanotecnologia e tecnologia da informação."


QUESTÃO NUCLEAR
Início de operação de Angra 3 deve ser adiado um ano
Energia: Licitação para compra de equipamentos ainda não saiu e usina não deve funcionar antes de 2016

André Borges | De Brasília

A entrada em operação da usina nuclear de Angra 3, prevista para 2015, deverá sofrer adiamento de pelo menos um ano. O atraso na conclusão da obra será reflexo, em parte, da lentidão da Eletronuclear, estatal controlada pela Eletrobras, em realizar a licitação para adquirir equipamentos de toda a infraestrutura eletromecânica da nova usina.
A previsão inicial da estatal era de que o edital, estimado em R$ 1,5 bilhão, fosse publicado em setembro do ano passado. A publicação, no entanto, foi adiada para o fim do ano, e depois novamente prorrogada para março deste ano. A realidade é que, até agora, o edital não saiu. Essa situação deve comprometer o início das operações da usina, avalia o vice-diretor da do programa de engenharia nuclear da Coppe, pós-graduação de engenharia da UFRJ, Aquilino Senra. "Dada a situação atual, não acredito que Angra 3 fique pronta antes de 2016", comentou.
Segundo a Eletronuclear, "o edital está pronto, dependendo somente de aprovações internas". A empresa não soube informar quando o texto será publicado. O atraso, segundo a companhia, "deve-se ao fato de um edital desse porte ter de ser cuidadosamente verificado, analisado e rechecado". Só as especificações técnicas para os serviços e condições técnicas para os fornecimentos envolvem mais de 1,5 mil folhas.
Até dois meses atrás, havia 2,3 mil funcionários da construtora Andrade Gutierrez e de suas subcontratadas trabalhando nas obras civis de Angra 3. Estima-se que, no pico da construção, cerca de 5 mil trabalhadores estejam em atividade. Hoje Angra 3 tem executado cerca de 15% de seu projeto.
A Eletronuclear nega que o atraso em Angra 3 seja reflexo do acidente nuclear ocorrido em Fukushima, no Japão. Não há dúvidas, porém, da influência do episódio sobre o plano nuclear brasileiro, que prevê a construção de oito novas usinas nucleares.
Na semana passada, o debate sobre o programa nuclear brasileiro ficou tenso durante uma audiência da Comissão de Meio Ambiente da Câmara. Durante o encontro, que contou com a presença do presidente da Eletronuclear, Othon Luiz Pinheiro da Silva, o deputado Giovani Cherini (PDT-RS), que preside a comissão, afirmou que o programa nuclear brasileiro tem operado à revelia do Congresso e que o país pode ser vítima de verdadeiras "bombas-relógio" se não se precaver com as medidas de segurança necessárias.
Cherini afirmou que, embora o preço total estimado para a usina seja de aproximadamente R$ 10 bilhões, já se calcula que a obra poderá chegar a R$ 23 bilhões. Provocado pelo parlamentar, Othon Luiz Pinheiro da Silva disse ser um "ambientalista de carteirinha" e que a energia nuclear é melhor exemplo do ambientalismo, porque não colabora com o aquecimento global.
Na Câmara, os parlamentares estão colhendo assinaturas para que seja realizado um plebiscito sobre a instalação de novas usinas nucleares no país. Questionado sobre a realização da consulta à população, o presidente da Eletronuclear afirmou que apoiaria o plebiscito, caso ocorra antes uma campanha para elucidar as dúvidas a respeito da geração de energia elétrica por fissão nuclear.
Antes da tragédia no Japão, o governo estava com um estudo pronto nas mãos para anunciar os locais onde seriam instaladas quatro novas usinas no país. O ministro de Minas e Energia, Edison Lobão, chegou a afirmar que a instalação dos projetos, desenhados para consumir investimentos de R$ 30 bilhões, vinha sendo disputada por alguns Estados, principalmente da região Nordeste do país. "Vá perguntar hoje para algum município se ele quer sediar algum usina nuclear", provocou o deputado Giovani Cherini.
Hoje, as duas usinas nucleares em atividade no país - Angra 1 e 2 - fornecem juntas 2 mil megawatts (MW) de energia, o que representa 1,8% da matriz energética brasileira. Com Angra 3, deverão ser adicionados mais 1.405 MW na fonte nuclear.


CÓDIGO FLORESTAL
Sarney contesta emenda do Código Florestal que anistia desmatadores
Congresso: Pemedebista diz que impeachment de Collor foi apenas um "acidente" na história

Agência Brasil, de São Paulo

O presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), adiantou sua posição na votação do Código Florestal em polêmica entrevista em que disse que o impeachment do ex-presidente Fernando Collor de Mello foi apenas um "acidente" na história do Brasil. Sarney minimizou o episódio em que Collor, atual senador do PTB, teve seus direitos políticos cassados pelo Congresso Nacional. "Eu não posso censurar os historiadores que foram encarregados de fazer a história. Mas acho que talvez esse episódio seja apenas um acidente que não devia ter acontecido na história do Brasil", disse, ao ser questionado sobre o motivo da exclusão do impeachment dos painéis que contam a história do Senado.
Ao falar sobre o novo Código Florestal, em discussão no Senado, Sarney afirmou que o projeto não pode Anistiar proprietários que promoveram desmatamento. "Acho que os desmatadores não podem ser Anistiados. Temos que preservar cada vez mais nossas florestas que são hoje muito importantes para o país", argumentou. O presidente do Senado ressaltou que os senadores devem ter mais tempo para discutir o tema, sem a pressa para a votação, como ocorreu na Câmara.
No entanto, o PMDB de Sarney deve votar em peso, no Senado, o texto aprovado na Câmara dos Deputados. A bancada pemedebista é a maior da Casa, com 19 senadores. "A tendência é aprovar o Código Florestal da forma como está", disse o presidente nacional do partido, senador Valdir Raupp (RO). "Não tem como mudar o que teve o apoio do PMDB [na Câmara]", completou. Raupp disse que, qualquer mudança a ser negociada com os demais partidos terá que ser discutida antes com a bancada da Câmara, " obrigatoriamente".
A Anistia aos desmatadores foi incluída na Câmara Federal, na Emenda 164, que prevê o benefício aos proprietários rurais que plantaram ou fizeram pastos em áreas de proteção permanente (APPs) até julho de 2008. De acordo com o texto aprovado pela Câmara, essa medida terá validade até que o governo crie um programa de regularização. Além disso, a emenda transfere para Estados e o Distrito Federal, em conjunto com a União, o direito de também legislar sobre meio ambiente. A emenda foi negociada pelas lideranças do PMDB e da oposição, na Câmara, para o texto ser aprovado.
O PMDB quer manter-se na relatoria da matéria na Comissão de Agricultura do Senado, uma das três pelas quais o projeto terá que obrigatoriamente passar. O partido quer indicar o ex-governador de Santa Catarina Luiz Henrique. Na Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), a tendência é que o presidente do colegiado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), também indique Luiz Henrique para a relatoria. Entretanto, ele mantém em aberto a indicação para, ainda, tentar um acordo com o governo.
O presidente do PMDB disse, ainda, que tem conversado com colegas de outros partidos com representação no Senado e a tendência é a mesma que a do seu partido. A exceção é o PT.
No PTB, que tem a terceira maior bancada com seis senadores, a tendência, também, é acompanhar os deputados que aprovaram o texto do relator Aldo Rebelo (PCdoB-SP), acrescido das emendas apresentadas. O líder do partido e vice-líder do governo, Gim Argello (DF), destacou, no entanto, que terá que se reunir com a bancada para confirmar essa tendência.
Até mesmo senadores de partidos tradicionalmente alinhados com o governo petista, como Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), saíram em defesa do projeto da Câmara e de pontos polêmicos como a transferência aos Estados da competência de legislar sobre a liberação de plantações e pecuária em áreas de proteção permanente. Segundo Vanessa Grazziotin, a medida é positiva porque as autoridades locais "conhecem bem" as peculiaridades de seus Estados.
No PSDB, que tem dez senadores, a maioria da bancada está afinada com o texto da Câmara. Há dúvidas, no entanto, sobre como o partido votará nos pontos mais polêmicos, segundo o líder do partido no Senado, Álvaro Dias (PR). "A maioria da bancada segue essa corrente rural", disse o tucano.
O petista Lindberg Farias (RJ) disse que, em seu partido, "tirando poucas exceções" existe o clima mais positivo para tentar modificar o texto dos deputados. O senador destacou que o PT está atento para a comoção [negativa] da sociedade diante do projeto aprovado pela Câmara.


INTERFERENCIA POLÍTICA
Atuação de Lula na crise desagrada Dilma
Governo: Segundo assessores, presidente não pediu para seu antecessor se reunir com aliados em Brasília

Claudia Safatle e Cristiano Romero | De Brasília

A presidente Dilma Roussef só substituirá o ministro chefe da Casa Civil, Antônio Palocci, se houver prova concreta de que ele usou práticas ilícitas para multiplicar seu patrimônio. Na sexta feira, Palocci enviou as explicações sobre o faturamento de sua empresa de consultoria ao Procurador-Geral da República, Roberto Gurgel. O Palácio do Planalto vai aguardar a avaliação do procurador sobre os argumentos do ministro. "Vamos esperar uns dias", comentou um assessor da presidente. Dilma gosta de Palocci, acha que ele merece um voto de confiança e não vai tomar providências açodadas, atendendo às pressões políticas.
A atuação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva para conter a deterioração do quadro político, na semana passada, foi ruim para Dilma, na avaliação de assessores próximos. O ex-presidente desembarcou em Brasília onde ficou por dois dias. Primeiro, teve reunião com toda a bancada do PT no Senado, depois, na casa do presidente do Senado, José Sarney, reuniu-se com parlamentares aliados.
Dilma fala frequentemente com Lula, mas, segundo informações de um ministro, ela não pediu a intervenção do ex-presidente para contornar o conflito político armado não só pelas suspeitas sobre Palocci, mas também pela enorme insatisfação das lideranças da base aliada com o tratamento recebido do governo até agora. Avalia-se, no Palácio do Planalto, que o próprio Lula não teve a dimensão do que significaria aquele encontro na casa de Sarney. "Foi um exagero", comentou graduada fonte oficial.
A crise que abalou o governo nos últimos quinze dias forçou a presidente a rever a estratégia da articulação política, duramente criticada pelos aliados, e a retomar a iniciativa na administração..
Dilma vai, a partir de agora, intensificar os contatos com as lideranças do governo no Congresso. Ontem, Palocci esteve com Michel Temer, numa preparação do jantar do vice-presidente, ontem mesmo, com o presidente do Senado, José Sarney (PMDB), e outras lideranças do PMDB. A conversa de Palocci com Temer serviu, também, como uma prévia da reunião de Dilma com expoentes do PMDB amanhã.
Hoje, a presidente se reúne com 12 governadores dos Estados da Copa do Mundo. Os prefeitos das cidades que serão sedes dos jogos também participarão do encontro. Amanhã, terá um almoço com senadores do PMDB e reunião com o Conselho Político, com a presença dos presidentes dos partidos que apoiam o governo. Ela vai antecipar ao Conselho as medidas do programa Brasil sem Miséria, que será anunciado na quinta-feira. "É a primeira vez que ela antecipa medidas do governo aos aliados", contou uma fonte.
A derrota do governo no Código Florestal e o desgaste na relação com o PMDB mostraram que a coordenação política, tal como está, não funciona. "O governo vai ter que corrigir isso", admitiu um assessor graduado. Há suspeitas sobre o que vai mal na coordenação, que envolve dois ministros (Palocci e Luiz Sérgio, das Relações Institucionais), os líderes na Câmara, Cândido Vaccarezza (PT-SP), e no Senado, Romero Jucá (PMDB-RR), além dos líderes do PT na Câmara e no Senado - Paulo Teixeira (SP) e Humberto Costa (PE) - e do líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN).
Segundo as avaliações do governo, Vaccarezza e Teixeira são rivais dentro do PT e não se entendem; Eduardo Alves está mais preocupado com sua eleição para a presidência da Câmara; Jucá é visto como alguém que às vezes joga pelo governo, outras vezes pelo PMDB.
Outra constatação da assessoria da presidente é de que foi um erro misturar, na semana passada, o caso Palocci com a votação do Código Florestal, as relações ruins com o PMDB e, ainda por cima, deixar que as dúvidas sobre o estado de saúde de Dilma atormentassem os mercados e os aliados. "Vamos tratar de cada um dos assuntos de forma separada", afirmou a autoridade.
No momento, as duas prioridades políticas do governo são: defender Palocci; e pacificar a relação da presidente Dilma com os aliados. Faz parte dessa estratégia, por exemplo, adiar o máximo possível a votação do Código Florestal no Senado. O Palácio do Planalto reconhece, inclusive, que foi um equívoco fazer do Código um tema de governo, subestimando a força dos ruralistas e o interesse da sociedade pelo assunto.
Os PT agendou para esta semana uma reunião da Executiva em Brasília para tratar da crise política envolvendo seu principal ministro. O partido quer unidade e consistência na condução da defesa de Palocci, embora ainda haja muita convicção de que o ministro não convenceu o partido de sua inocência. Avaliam ainda petistas que, no mensalão, se houve erro, foi majoritariamente em benefício do partido, ao contrário de agora, quando o único beneficiado direto foi o próprio Palocci.


CASO PALOCCI
Ministros do PT são cotados para substituir Palocci

Paulo de Tarso Lyra | De Brasília

Desde o início da crise envolvendo o ministro-chefe da Casa Civil, Antonio Palocci, apesar das informações da Presidência de que ele não será demitido, indicam-se nomes de possíveis substitutos. Os três nomes mais citados, entre os petistas e outros partidos da base são o ministros Fernando Pimentel (Desenvolvimento), Paulo Bernardo (Comunicações) e Alexandre Padilha (Saúde). "Claro que tem muito olho crescendo na direção do cargo", disse um articulador do PT na Câmara.
O nome mais forte nas especulações petistas é Pimentel. O titular do MDIC é amigo de longa data da presidente Dilma e militaram juntos contra a ditadura militar. Indicado pela própria presidente como um dos principais nomes da campanha presidencial do ano passado, acabou perdendo espaço com o surgimento do escândalo do dossiê contra os tucanos.
O segundo cotado para o cargo é o atual ministro das Comunicações, Paulo Bernardo. Bernardo e Dilma não eram próximos antes de 2003, mas se tornaram amigos durante o governo de Luiz Inácio Lula da Silva. Lula também gosta muito de Bernardo - até mais do que de Pimentel, já que este, quando era prefeito de Belo Horizonte, defendeu uma aliança com o PSDB de Aécio Neves para a sucessão na prefeitura e colocou o diretório nacional do PT com um pé atrás com a sua conduta.
Na semana passada, quando almoçou com senadores petistas, a residência escolhida por Lula foi a da senadora Gleisi Hoffmann (PT-PR), mulher de Bernardo, o que reforça o prestígio do casal. Bernardo também é o favorito dos setores do PT que se sentem pouco atendidos pelo governo.
Embora não citado diretamente ao cargo, o ministro Alexandre Padilha é lembrado como alguém que teve bom desempenho como coordenador político do governo Lula, ao ocupar o Ministério das Relações Institucionais, com a ressalva de que no período não houve crise do governo com o Congresso. Padilha poderia ao antigo cargo, fortalecendo o gabinete da presidente. Durante a transição, ele chegou a ser confirmado para permanecer na Pasta. Foi para a Saúde depois de Dilma desistir do secretário estadual de Saúde do Rio, Sérgio Côrtes.
Com a situação delicada de Palocci, o PMDB aumentou a pressão por mais espaço no governo. Segundo pemedebistas, existe uma longa lista de cargos abertos e que precisam ser preenchidos.


ORGANIZAÇÃO DA COPA DE 2014
Presidente reúne governadores e prefeitos da Copa

De São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Porto Alegre, Brasília e Recife

No primeiro encontro convocado pela presidente Dilma Rousseff com todos os prefeitos e governadores envolvidos na organização da Copa do Mundo de 2014, a reunião deverá ser marcada hoje em Brasília por uma agenda de cobranças recíprocas. De um lado, a presidente, maior interessada no sucesso da Copa - que pode favorecer sua reeleição - exigirá mais empenho, sobretudo das cidades-sede que estão com o cronograma mais atrasado. Do outro lado, prefeitos e governadores, aproveitarão para obter de Dilma compromisso com demandas regionais. O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, não irá ao encontro.
A reunião - adiada para que a presidente se recuperasse de uma pneumonia, no início do mês - ocorre num momento de fragilidade política. Dilma enfrenta a crise do caso que atinge seu ministro da Casa Civil, Antonio Palocci, e a primeira grande derrota no Congresso, com a aprovação do Novo Código Florestal. Em março, a presidente teve encontros individuais com alguns governadores como o de São Paulo, Geraldo Alckmin.
O prefeito de Porto Alegre, José Fortunati (PDT), e o governador de Minas Gerais, Antonio Anastasia (PSDB) têm posições distintas em relação à crise porque passa a presidente. Fortunati demonstra apoio, enquanto o tucano Anastasia prefere não misturar assuntos políticos e administrativos. Em comum, ambos estão de olho em projetos que requerem parceria com a União.
José Fortunati disse que vai pedir o apoio de Dilma para a revitalização do cais do porto da cidade, que prevê a implantação de um complexo de lazer e gastronomia. A licitação das obras foi feita, mas a Agência Nacional de Transportes Aquaviários (Antaq) embargou o processo por se tratar de área da União. O desfecho depende de uma autorização do governo federal.
Fortunati não vê a crise política no entorno do ministro Palocci como ameaça aos investimentos federais em obras da Copa. Mesmo assim, disse que vai aproveitar a viagem para conversar sobre o assunto com prefeitos da base de apoio da presidente. "Vamos pensar no que fazer e, da minha parte, vou fazer o que for preciso para contribuir para que essa crise seja debelada o mais rapidamente".
Antonio Anastasia procura se manter distante das articulações políticas em relação ao caso Palocci. Inteiramente vinculado a seu antecessor, o senador Aécio Neves (PSDB-MG), Anastasia se resguarda aos temas estaduais. Entre ele e Aécio, há uma espécie de divisão de tarefas: o governador jamais discorda de iniciativas do senador. Aécio não interfere na boa relação administrativa entre Belo Horizonte e Brasília. Na primeira visita de Dilma à capital mineira, os presidentes estaduais do PSDB e do DEM foram à solenidade patrocinada pelo governo federal. A prioridade para o governo mineiro é conseguir convencer a presidente a acelerar o processo de concessão do aeroporto internacional de Confins para a iniciativa privada.
Já a prefeita de Fortaleza, Luizianne Lins (PT), vice-presidente da Frente Nacional de Prefeitos (FNP), revelou que a turbulência política em Brasília está atrapalhando sua administração. Como exemplo, ela disse estar com muitas dificuldades para liberar uma emenda da bancada cearense na Câmara, que aprovou a construção de um aterro hidráulico em Fortaleza. "Estou tentando falar com o Palocci para viabilizar isso e não consigo", revelou. Luizianne avalia que Dilma deve intensificar as agendas públicas como estratégia para debelar a crise política. "O governo não pode parar por conta disso (crise política)", afirmou.
Além da liberação da emenda para o aterro, projeto de R$ 45 milhões, Luizianne vai pedir ao governo federal mais empenho no processo de desburocratização dos financiamentos concedidos pela Caixa Econômica Federal às cidades-sede.
Na Bahia, a preocupação também é com a liberação de recursos, do BNDES. Uma das principais obras, de reconstrução do estádio da Fonte Nova, pode atrasar caso o banco de fomento federal continue a acatar recomendação do Tribunal de Contas do Estado de bloquear o financiamento até que o projeto executivo seja apresentado. "Não há atraso. Estamos com esse impasse, se não houver solução em 30 dias, a obra vai atrasar", afirmou o secretário estadual para a Copa de 2014 da Bahia, Ney Campello. O secretário questiona que a interpretação dos tribunais de contas estaduais e da União sobre as obras da Copa tem se baseado na lei de licitações, mas a maioria dos contratos emperrados refere-se a concessões ou a Parcerias Público-Privadas (PPPs).
A entrevista dada pelo governador da Bahia, Jaques Wagner, cobrando explicações mais claras de Palocci sobre o aumento do patrimônio pessoal, não foi vista como pressão sobre a presidente, ou uma jogada combinada, para a queda do ministro. O próprio Wagner assustou-se com a repercussão de suas palavras e disse, a interlocutores no Palácio, que "mantém toda a confiança em Palocci, mas acha que ele precisa se explicar logo para acabar com as suspeitas e insinuações".
Em Pernambuco, a avaliação é de que há um movimento orquestrado em Brasília para forçar Dilma a deixar a seara administrativa e entrar na disputa política, paralisando o governo. Uma fonte no Palácio do Campo das Princesas, sede do Executivo Estadual, sugere que pode se tratar de fogo amigo: "Não vemos no PSDB ou no DEM capacidade para articular esse movimento". Também preocupado com a possibilidade de paralisação do governo, o prefeito do Recife, João da Costa (PT), vai apresentar no encontro de hoje a maquete de um importante projeto viário da capital pernambucana, incluído no chamado PAC da Copa.
A governadora do Rio Grande do Norte, Rosalba Ciarlini (DEM), tem a expectativa de que a reunião resulte em mais agilidade no andamento das obras, atrasadas, afirma, por causa da burocracia. "A expectativa é positiva. Tem muita coisa a ser feita, é bom que ela [Dilma] esteja na linha de frente", disse. A capital potiguar está entre as mais atrasadas.
O prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, não comparecerá à reunião. Ficará na cidade para recepcionar autoridades como Michael Bloomberg, prefeito de Nova York, e Bill Clinton, ex-presidente dos Estados Unidos, que confirmaram presença no C40 Summit, cúpula sobre desenvolvimento sustentável. Em seu lugar, irá a vice-prefeita Alda Marco Antonio (PMDB) e o secretário municipal de Assuntos para a Copa do Mundo de 2014, Gilmar Tadeu (PCdoB). "Acredito que será uma reunião de controle. Kassab não nos passou nenhuma demanda específica", diz Tadeu.
Por conta dos atrasos, São Paulo, ao lado de Natal, deixará de ser uma das sedes da Copa das Confederações, em 2013, e perdeu o centro internacional de imprensa para o Rio de Janeiro. O secretário-geral da Fifa, Jérôme Valcke, ameaçou a cidade de ser excluída da Copa de 2014.
O Rio será representado pelo prefeito Eduardo Paes e o vice-governador Luiz Fernando Pezão.
(Vandson Lima, Ana Paula Grabois, César Felício, Paulo de Tarso Lyra e Murillo Camarotto)


CASAS DE CÂMBIO
Avanço de corretoras em aeroportos é inviável, diz Infraero

De Brasília

A Infraero não acredita em ampliação das corretoras de câmbio nos aeroportos, que poderiam ser uma alternativa para ampliação da oferta de moeda durante a Copa do Mundo de 2014. Os custos elevados, principalmente com os aluguéis cobrados nos aeroportos, tornam a operação pouco rentável, avalia Gustavo do Vale, presidente da empresa.
Segundo ele, o aluguel de um espaço no aeroporto de Guarulhos, por exemplo, pode sair por R$ 250 mil mensais. "As transações são de pequenos valores, o que inviabilizaria o alto custo de manutenção das casas de câmbio", disse, em entrevista ao Valor.
A utilização dos espaços nos aeroportos brasileiros é definida por meio de licitação. Quem oferecer o maior valor ganha o direito de explorar o espaço por um período pré-determinado. Se o proprietário não conseguir vencer o leilão para renovar seu espaço, no entanto, perde todo o investimento já feito.
Existem hoje 48 casas de câmbio que deveriam se espalhar pelos 67 aeroportos da rede Infraero. A distribuição, porém, é bastante concentrada. Quase metade das corretoras está em dois aeroportos: Guarulhos (12) e Galeão (oito). A quantidade de estabelecimentos, apesar de ser pequena, não deve aumentar muito, segundo Vale, que até o fim do ano passado era diretor do Banco Central (BC).
Uma saída para contornar a pequena presença de corretoras de câmbio, segundo ele, seria abrir a possibilidade para que os turistas pudessem trocar moeda nos locais que mais frequentam. "As casas de câmbio nos aeroportos não são a solução. O correto é deixarmos os restaurantes, hotéis e taxis aceitarem moeda estrangeira. Não vejo por que um taxista não poderia receber em dólares", disse Vale.
Vale ainda afirmou que essa baixa concentração em aeroportos não é a regra ao redor do mundo. O serviço também foi criticado. "O correto é que toda vez que um voo chegue de outro país elas (corretoras) estejam funcionando, mas ainda é normal que quando um voo internacional aterrize, elas não estejam abertas ", disse Vale.
De cada quatro turistas que chegam ao país, três vem pela via aérea, segundo dados do Ministério do Turismo. Cerca de 60% desembarcam em São Paulo e 20%, no Rio. "Se o mercado continuar restrito às casas de câmbio, vamos continuar basicamente na ilegalidade, com vários trocadores, um em cada esquina", disse Vale.
(TV)


OPINIÃO
Agências reguladoras e democracia

Carlos Lessa

Quero relatar vicissitudes, como cidadão, com a Light. Tenho uma obra próxima da inauguração. Obviamente a planta do prédio foi aprovada pela Prefeitura do Rio de Janeiro, mas existe um poste da Light com fiação perigosa, praticamente no meio da entrada da garagem, em uma calçada estreita. Em 7 de dezembro passado, protocolei na Light um pedido de remoção de poste e rede. Desde essa data, apesar de estar disposto a pagar pela remoção (é necessário um deslocamento de 3 metros), não consegui sequer receber orçamento da Light, embora tenha recebido pelo menos quatro comunicados da Light informando que o orçamento estaria pronto entre 15 e 30 dias. Em 2 de maio, pela segunda vez, busquei a Ouvidoria da Light, que se comprometeu a me dar o orçamento dentro de 15 dias e, até agora, não recebi nada.
Creio que a maioria das famílias brasileiras já viveu com alguma concessionária de serviço público privada (água e esgoto, energia elétrica, gás, comunicações, etc) um pequeno ou grande drama, percebeu sua impotência e o difícil processamento de qualquer questão, inclusive aquelas de bom senso elementar. O cidadão é jogado de uma mesa a outra, recebe notícias vagas e não é atendido em seu pleito. Claro que é possível recorrer à justiça, porém, além dos custos, há a necessidade de reunião de provas e a finalização do processo quase sempre é incompatível com a necessidade do cidadão, que pode recorrer ao Procon e ser submetido a seus rituais. As concessionárias são as recordistas de processos no Procon. Aparentemente preferem pagar multas do que realizar os investimentos e os ajustamentos administrativos para melhorar seu desempenho.
O cidadão se sente impotente ante a concessionária. Quando conversa com alguém no balcão, recebe promessas, explicações padronizadas, vagas e insuficientes. Quase sempre a promessa não é cumprida. Quase sempre o atendente é simpático e se solidariza com o drama e confessa também sua impotência.
Esse quadro de deterioração do serviço público é um resultado da ideologia neoliberal que, em busca da privatização, definiu algumas poucas atividades como "essenciais" ao Estado e partiu para a privatização afirmando que os cidadão seriam protegidos pelas Agências reguladoras. Essa é uma mentira ideológica da pior qualidade! Ninguém que trabalha pode acompanhar as decisões das Agências, porém os interesses privados focados naquela atividade exercem a plenitude de seu peso na orientação das decisões das Agências. Cada Agência Reguladora procura ter autonomia do Conselho Monetário Nacional (CMN), que põe e dispõe sobre juros, taxa de câmbio, política de reservas e fiscalização do setor bancário e do mercado de capitais.
Qualquer um formado em Economia tem dificuldade de entender as decisões do CMN e do BC. Assumo o que Thomas Jefferson afirmou, em 1802: "Penso que as instituições bancárias são mais perigosas para nossas liberdades do que exércitos inteiros prontos para o combate". Um pai da democracia norte-americana advertiu, porém não impediu que, em 1913, fosse fundado o Fed americano. W. Wilson, em 1916 disse: "Existe um poder tão organizado, sutil, vigilante, unido, completo e penetrante que seria melhor que sequer sussurrássemos quando dirigimos palavras de condenação contra este poder". Esse presidente, claramente arrependido, foi quem assinou, em 1913, o ato de constituição do Fed.
Para o cidadão, o controle do dinheiro é um mistério, porém os serviços públicos são muito mais próximos do seu cotidiano - é uma zona tornada misteriosa pela atuação das concessionárias em conluio com as Agências Reguladoras. Há pouco tempo, a Agência Reguladora dos serviços de eletricidade retirou o ônus da concessionária privada quando interromper o fornecimento por falha operacional ou técnica. Se um aparelho eletrodoméstico queimar, a única indenização será apenas o não pagamento da conta de fornecimento do dia da interrupção.
No passado, a cidadania reclamava do serviço público e, por vezes, lograva sensibilizar o poder político. Hoje, frente aos mistério das concessionárias, o brasileiro é intimidado com o argumento do "poder de mercado" e da (falsa) competição. Pleitos do que seria um direito pelo serviço prestado, não atendidos por razões mercantis pela concessionária, são embargados. O serviço público privatizado e a Agência Reguladora tem sido instrumentos combinados de tortura da família brasileira.
O neoliberalismo com Estado mínimo e formato institucional que retira do poder político a capacidade de intervenção nas concessionárias é uma forma de concentra poder em relação à cidadania. À fragilidade do cidadão se contrapõe, no formato neoliberal, o poder de dominação dos mercados. É uma falsa democracia o cidadão poder protestar e recorrer à justiça, pois mesmo se vitorioso, sofre toda a postergação de atendimento de seu direito.
O setor financeiro pode praticar ganhos abusivos e transferir para o dono da conta, via tarifas bancárias, todos os seus custos administrativos. O CMN acha perfeitamente normal que, numa economia de lento crescimento, seja explosivo o ganho bancário. Tão sedutor é ganhar com os serviços ligados ao dinheiro que uma enxurrada de bancos do exterior está se propondo a investir no Brasil. Se o conluio com os bancos brasileiros já torna a vida do cidadão difícil, imagine o que será com a presença de bancos estrangeiros.
A rentabilidade patrimonial de algumas concessionárias privadas de serviços públicos é espetacular. Alguém já disse que as distribuidoras de energia elétrica no Brasil têm a mais elevada rentabilidade. O reverso desse quadro é um país com enorme potencial hidrelétrico que pratica uma tarifa de energia elétrica absurdamente elevada. A moldura institucional neoliberal possibilita ganhos substanciais das concessionárias e não dispõe de capacidade para obrigá-las a investir em infraestrutura. A matriz energética brasileira está evoluindo de forma perversa em direção à energia não-renovável.
A matriz logística é péssima do ponto de vista de custos e convive com recordes de morticínio. O DNT e a Polícia Rodoviária Federal registraram, em 2009, 7.376 mortes. No mesmo ano, morreram, na Alemanha, 3657 pessoas. O Brasil tinha, naquele ano, 62 mil quilômetros de rodovia, enquanto a Alemanha tinha 231 mil quilômetros. Obviamente, os dias de hospitalização e a tragédia de mutilações permanentes se movem na mesma direção que as mortes nas rodovias.
Privatizar e regular de forma obscura não é solução em sociedades complexas e modernas. O neoliberalismo mutila a democracia.
Carlos Francisco Theodoro Machado Ribeiro de Lessa é professor emérito de economia brasileira e ex-reitor da UFRJ. Foi presidente do BNDES; escreve mensalmente às quartas-feiras.


INTERNACIONAL/CRIME
Narcotráfico cresce no Peru e ameaça fronteira do Brasil
Plantações de coca migram da região andina para a Amazônia; dois agentes da PF foram mortos

Humberto Saccomandi | De Lima

O narcotráfico está em forte crescimento no Peru, mas o tema está passando ao largo das campanha eleitoral. Agora em junho, a ONU deve apontar o país como o maior produtor mundial de cocaína, superando a Colômbia. E, segundo fotos de satélite, a produção da folha de coca, antes concentrada nos vales andinos, já chegou à Amazônia peruana, bem perto da fronteira com o Brasil. Mas nenhum dos dois candidatos à Presidência tem propostas claras de como enfrentar o narcotráfico. Esse é o assunto que mais preocupa o Brasil na relação com o Peru.
As autoridades brasileiras já perceberam a escalada do problema na extensa fronteira de quase 3.000 km entre os dois países. Em novembro, na região da tríplice fronteira com o Peru e o Colômbia, houve um confronto com traficantes peruanos e dois policiais federais brasileiros foram mortos. Em janeiro, a Polícia Federal capturou o peruano que chefiava o tráfico do lado peruano, numa operação na qual novamente houve confronto armado.
"O narcotráfico vive um momento de apogeu no Peru. Isso começou em 2008, quando se sentiram no Peru os efeitos do combate ao narcotráfico na Colômbia", disse Jaime Antezana, principal pesquisador peruano de questões relacionadas.
Ele teme que o país sofra um duplo processo de colombianização e mexicanização. Por colombianização, ele entende a infiltração de pessoas ligadas ao narcotráfico na política e nas instituições públicas. Por mexicanização, a formação de poderosas milícias do narcotráfico que poderiam enfrentar as forças de segurança.
Segundo Antezana, com as eleições deste ano já se pode falar de uma "narcobancada" no Congresso, com entre 10 e 15 congressistas, e de narcoprefeitos pelo país. Ele não citou nomes. Pablo Escobar, o famigerado líder do cartel colombiano de Medellín, chegou a ser senador. Antezana relata ainda o crescente número de confrontos armados graves entre traficantes e as forças de segurança peruanas; foram 8 em 2009 e 11 em 2010.
Apesar disso, o tema mal é abordado na campanha eleitoral, que se encerra com o segundo turno presidencial, neste domingo. No último debate, anteontem, os dois candidatos fizeram promessas vagas de reforçar as forças de segurança e atacar a lavagem de dinheiro para combater o narcotráfico, mas pesam sobre eles graves incertezas.
Keiko Fujimori é filha do ex-presidente Alberto Fujimori, em cujo governo foi montado um esquema de narcotráfico dentro do Estado peruano, liderado pelo então chefe do serviço secreto, Vladimiro Montesinos. O ex-presidente e Montesinos estão presos, mas muitos peruanos temem que um eventual governo Keiko seja tomado por gente ligada ao seu pai.
Ollanta Humala, um ex-militar, promete mais recursos aos militares para combater o tráfico, mas ao mesmo tempo acena com vários benefícios aos produtores de folha de coca, inclusive um perdão para a produção além do limite legal, que acaba virando matéria-prima para a cocaína.
No Peru, assim como em outros países andinos, existe uma produção legal de folha de coca, usada para consumos tradicionais, como o chá de coca ou mascar a folha, hábito muito difundido nas áreas mais altas do país.
No ano passado, a ONU já apontou o Peru como o maior produtor de folha de coca do mundo. Segundo relatório da ONU, em 1999 o país tinha 38 mil hectares de área plantada de coca. Em 2009, eram 60 mil hectares, contra 59 mil na Colômbia. Mas, devido a diferentes técnicas de processamento da folha, a Colômbia ainda reteve a liderança no potencial de produção de cocaína.
Este ano, com a continuada repressão ao cultivo na Colômbia, a produção da folha no Peru deve superar em muito a colombiana. Com isso, o país deve assumir o primeiro lugar na produção de cocaína.
O mais importante, porém, é o incremento da produtividade. "Em 2000, estima-se que o Peru produzia 43 mil ton de folha de coca. Já em 2009 teriam sido 128 mil ton. Houve mudanças importantes nas técnicas de produção. Não é mais aquela produção artesanal, com uma planta aqui, outra ali. Hoje usam-se técnicas de cultivo modernas, fertilizantes", disse Antezana. Ele estima que o potencial de produção de cocaína no Peru tenha passado de 141 toneladas, em 2000, para 317 toneladas em 2007.
O narcotráfico no Peru era tradicionalmente dominando por colombianos, que compravam a pasta-base peruana. Mas, por volta de 1995, os cartéis colombianos começam a ser desmantelados. "Em 2000, chegam ao Peru os mexicanos. Há uma correlação entre essa chegada e o crescimento do cultivo de coca. Os mexicanos não querem a pasta-base, eles compram a cocaína. E têm duas exigências: alta qualidade, o que levou a um aperfeiçoamento dos laboratórios no Peru, e alto volume", diz Antezana.
As autoridades peruanas ainda não acreditam na formação de cartéis no país. "São os colombianos e mexicanos que vêm aqui negociar a droga para distribuí-la", afirmou o ex-candidato presidencial Pedro Pablo Kuczynski.
Mas Antezana não está tão seguro disso. Segundo ele, já há a formação de clãs que controlam a produção em áreas do Peru. Além disso, grupos peruanos controlam a distribuição de cocaína na periferia de Buenos Aires e disputam o controle no Paraguai, o que poderia ser o embrião da formação de cartéis peruanos. "No Brasil, a distribuição é feito por grupos brasileiros", diz ele.
"Entre 2005 e 2007 houve uma série de choques entre a polícia argentina e clãs peruanos. Isso significa que já eram organizações fortes e poderosos, que podiam enfrentar as forças de segurança argentinas", diz Antezana. "Há o risco de que surjam no Peru organizações que controlem toda a cadeia da cocaína." Segundo uma autoridade brasileira, que pediu para não ser identificada, o combate ao narcotráfico pelo governo peruano é precário e ineficaz. Chega a faltar gasolina para veículos das forças de segurança. "Não temos um Estado lutando contra o narcotráfico. Há uma sensação de impunidade aqui", disse Antezana. "Por isso, a produção da cocaína está migrando para cá."
O governo peruano nega a condescendência com o narcotráfico e diz que a repressão na Colômbia é mais eficiente devido à forte ajuda financeira e técnica dos Estados Unidos. E alega que Washington se preocupa menos com o Peru, pois a droga peruana vai principalmente para a Europa e países sul-americanos, enquanto que a Colômbia abastece primordialmente o mercado americano. No início de seu governo, o atual presidente peruano, Alan García, chegou a sinalizar com uma política de forte combate ao narcotráfico, mas esse ímpeto cedeu depois da aprovação pelo Congresso americano do acordo de livre comércio entre EUA e Peru, no final de 2007.
Esse forte incremento do narcotráfico no Peru preocupa o governo brasileiro. "As plantações de coca estão chegando à região de fronteira com o Brasil, a área conhecida como trapézio amazônico. Detectamos várias plantações do lado peruano, em fotos por satélite", disse outra autoridade brasileira, que também pediu para não ser identificada. Ainda não está claro o que fez a produção chegar à Amazônia peruana. Em geral, as folhas produzidas na selva tem um teor de alcaloide, princípio ativo da droga, menor que as folhas produzidas nos vales andinos. Antezana diz que isso pode ter ocorrido para facilitar o contato com traficantes brasileiros que visitam regularmente a região de fronteira. Autoridades brasileiras especulam ainda que pode se tratar de uma espécie de coca melhorada, que teria um teor alto de alcaloide mesmo plantada na selva. Ainda não foram feitas operações de erradicação na região, de modo que não se conhece a planta.
"Muita gente crê que se pode conviver com o narcotráfico. Por isso, não é um tema importante na campanha eleitoral", disse Antezana. "Mas basta ver o que está acontecendo no México." Além de atuar na repressão na fronteira, Antezana espera do Brasil uma ajuda maior na luta contra a pobreza nas regiões produtoras de coca no Peru. "Se não houver uma política de desenvolvimento econômico e social da zona andina, o combate ao narcotráfico não é sustentável."
Um executivo de uma grande empresa brasileira concorda com essa avaliação e cita as quatro hidrelétricas no Peru (duas em construção e duas em fase de projeto) que devem vender parte de sua energia ao Brasil. "Essas obras vão gerar muitos empregos em regiões pobres e produtoras de coca." Um autoridade brasileira cita ainda a construção da rodoviária interoceânica, que ligará a região central do Peru ao Acre, como um novo eixo de desenvolvimento. Apesar de a rodovia não estar completamente pronta (falta uma ponte, que deve ser inaugurada até julho), o movimento do lado peruano já atingiu a meta prevista para 2013. Antezana, porém, está pessimista. "Vejo um câncer se instalando silenciosamente no meu país, e ninguém faz nada."


SABOTAGEM DE COMPUTADORES
EUA preveem resposta militar a ataque de hackers

Siobhan Gorman e Julian E. Barnes | The Wall Street Journal

O Pentágono chegou à conclusão de que sabotagem de computadores com origem em outro país pode ser considerada um ato de guerra, uma avaliação que pela primeira vez permite aos Estados Unidos responderem usando a força militar convencional.
A primeira estratégia cibernética formal do Departamento de Defesa americano, da qual alguns trechos não confidenciais devem vir a público mês que vem, representa uma tentativa inicial de lidar com um mundo em mutação, no qual um hacker pode representar uma ameaça tão significativa aos reatores nucleares, linhas de metrô ou oleodutos quanto o exército de um país hostil. Em parte, o Pentágono pretende que seu plano sirva como um alerta contra potenciais adversários sobre as consequências de se atacar os EUA dessa forma. "Se você atacar nossa rede elétrica, talvez lancemos um míssil numa de suas chaminés", disse um representante das Forças Armadas.
Ataques recentes contra os sistemas do Pentágono - bem como a sabotagem do programa nuclear do Irã com o vírus Stuxnet - deram uma nova urgência aos esforços dos EUA para desenvolver uma postura mais formal contra os ataques cibernéticos. Um momento crucial se deu em 2008, quando pelo menos um sistema dos computadores militares americanos foi invadido. No fim de semana, a Lockheed Martin, grande fornecedora das Forças Armadas dos EUA, disse que foi vítima de infiltração de espiões, apesar de ter minimizado a importância do incidente.
O relatório também vai acender o debate sobre uma série de assuntos delicados dos quais o Pentágono não tratou, como se os EUA podem ser capazes de saber com certeza a origem dos ataques e como definir quando a sabotagem é séria o suficiente para se caracterizar como um ato de guerra. Uma ideia que ganha força no Pentágono é a de "equivalência". Se um ataque cibernético causa mortes, prejuízo, destruição ou um transtorno de alto nível que um ataque militar causaria, então seria um candidato a ser considerado um "ato de guerra".
A estratégia vai destacar a importância de sincronizar a doutrina de guerra cibernética dos EUA com a de seus aliados e definirá princípios para novas políticas de segurança. A Organização do Tratado do Atlântico Norte (Otan) deu um primeiro passo no ano passado quando decidiu que, no caso de um ataque cibernético contra um aliado, um grupo faria uma "avaliação conjunta" sobre os ataques, mas não seria exigida uma ajuda mútua para a resposta. Oficiais do Pentágono acreditam que os ataques de computador mais sofisticados exigem os recursos de um governo. Por exemplo, as armas usadas num grande ataque tecnológico, como a derrubada de uma rede elétrica, teriam provavelmente sido desenvolvidas com apoio estatal, dizem.
A iniciativa de formalizar o pensamento do Pentágono surgiu da constatação dos militares de que o governo tem sido lento no desenvolvimento de defesas contra esse tipo de ataque, mesmo com a crescente dependência da internet pela infraestrutura civil e militar. As Forças Armadas estabeleceram um novo comando no ano passado, chefiado pelo diretor da Agência de Segurança Nacional, para consolidar a rede de segurança e os esforços de ataque. As regras que guiam as guerras tradicionais são resultado de uma série de tratados internacionais, incluindo as Convenções de Genebra, bem como as práticas que os EUA e outros países consideram como lei internacional. Entre outras coisas, elas cobrem a conduta de guerra, o tratamento de prisioneiros e os limites para o uso de certas armas. A guerra cibernética não é coberta pelos tratados atuais e as autoridades militares querem buscar um consenso entre os aliados para saber como proceder.
"Ato de guerra" é uma expressão política, não jurídica, diz Charles Dunlap, um major-general aposentado da Força Aérea americana. Dunlap argumenta que os ciberataques que têm um efeito violento são o equivalente legal dos ataques armados, ou do que os militares chamam de "uso da força". James Lewis, um especialista em segurança de informática do Centro para Estudos Estratégicos e Internacionais que assessorou o governo do presidente Barack Obama, disse que os diretores do Pentágono estão identificando que tipo de ataque cibernético constituiria um uso de força. Muitos planejadores militares acreditam que o gatilho para a retaliação deveria ser a quantidade de dano - real ou tentado - causado pelo ataque.
A culpabilidade, argumentam os planejadores militares em debates internos no Pentágono, depende do nível com que o ataque, ou as próprias armas, podem ser associados a um governo estrangeiro. Essa é uma perspectiva complicada na melhor das hipóteses.
A breve guerra entre Rússia e Geórgia, em 2008, incluiu um ataque cibernético que afetou os websites das agências do governo georgiano e de instituições financeiras do país. O dano não foi permanente, mas causou transtorno nas comunicações. Um estudo subsequente da Otan dizia que era muito difícil aplicar as leis do conflito armado àquele ataque cibernético porque tanto o autor da ofensiva quanto o impacto não estavam claros. Na época, a Geórgia culpou sua vizinha Rússia, que negou qualquer envolvimento.
Também ainda se sabe pouco sobre uma das armas cibernéticas mais conhecidas, o vírus Stuxnet que sabotou algumas das centrífugas nucleares do Irã. Embora alguns especialistas suspeitem que foi um ataque israelense, possivelmente com ajuda americana, isso não foi provado. O Irã foi o local de apenas 60% das infecções, segundo um estudo da firma de segurança de informática Symantec. Entre os outros locais estavam Indonésia, Índia, Paquistão e EUA.
Israel e EUA se negaram a comentar as alegações. Oficiais de defesa recusam-se a discutir os potenciais adversários cibernéticos, embora tenham identificado ataques anteriores como originados na Rússia e na China. É por isso que os planejadores militares acreditam que a melhor maneira de impedir grandes ataques é responsabilizar os países que fazem armas cibernéticas pelo seu uso. Um paralelo, dizem especialistas externos, é a política do governo George W. Bush de atribuir responsabilidade aos governos estrangeiros por abrigar organizações terroristas, política que levou à campanha militar dos EUA para derrubar o Talibã do poder no Afeganistão.

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