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segunda-feira, 23 de maio de 2011

23 de maio de 2011 - CORREIO BRAZILIENSE


Barco naufraga no Lago Paranoá com 104 pessoas a bordo

Um barco de festas afundou no Lago Paranoá, por volta das 21h, com prováveis 104 pessoas a bordo, nas proximidades do Ascade, clube de servidores da Câmara de Deputados. Até a meia-noite de ontem, pelo menos seis pessoas haviam sido internadas nos hospitais da rede pública da cidade. Um bebê de seis meses morreu. A mãe dele estava desaparecida e as buscas continuariam durante a madrugada. Cinco ambulâncias, dois helicópteros e mais de cem homens do Corpo de Bombeiros participavam do socorro às vítimas. Sobreviventes relatam que o naufrágio teria durado cerca de cinco minutos. Quando começaram a ver a água entrando no barco, passageiros correram para a popa da embarcação. Suspeita-se que não havia colete salva-vidas para todos. Muitos pularam na água e conseguiram nadar até a margem. Outros foram resgatados pelos bombeiros. O comandante do barco, Airton Carvalho da Silva, 28 anos, foi ouvido na 10ª DP, no Lago Sul.


Desespero no Lago Paranoá
Exatamente um ano depois do acidente com uma lancha, que matou duas irmãs, no Lago Paranoá, a tragédia se repete: um barco com mais de 100 pessoas a bordo afunda, deixando um bebê morto

Uma festa no Lago Paranoá, na noite de ontem, terminou em tragédia. Cento e quatro pessoas — sendo 12 tripulantes e 92 convidados —, segundo informações preliminares, estavam em um barco que afundou, por volta das 20h30, próximo ao clube da Associação dos Servidores da Câmara dos Deputados (Ascade), no Trecho 2 do Setor de Clubes Sul. Até a meia-noite, 88 pessoas tinham sido resgatadas, de acordo com o Corpo de Bombeiros e a Polícia Militar do DF. A central de atendimento dos bombeiros (Ciade) confirmou pelo menos uma morte até o mesmo horário: a de um bebê de 6 meses, identificado pela tia Aline de Oliveira, 24 anos, como João Antônio. Segundo ela, a mãe da criança, Valdelice Fernandes, estava desaparecida. Pelo menos seis pessoas foram internadas em dois hospitais da cidade.
O barco teria saído, por volta das 19h30,  do Edifício Ícone, um prédio ao lado clube Cota Mil, localizado no Trecho 2 do Setor de Clubes Sul. Crianças, jovens e adultos estavam na embarcação chamada Imagination, que, segundo relatos dos passageiros, teria sido atingida por uma lancha. Um dos sobreviventes, o estudante Guilherme Soares, 15 anos, contou que os coletes salva-vidas só começaram a ser distribuídos depois que o barco começou a afundar na parte de trás. “Nem todo mundo conseguiu pegar o seu”, conta o morador do Paranoá. A água teria entrado, primeiro, pelo banheiro da embarcação. Desesperadas, muitas pessoas se jogaram no lago.
A tragédia mobilizou pelo menos uma centena de bombeiros, além de cinco ambulâncias, dois helicópteros e oito carros de resgate. Os clubes da Associação Geral dos Servidores da Polícia Civil do DF (Agepol) e do Ascade serviram de base para a operação de salvamento. Mantas térmicas foram usadas no primeiro atendimento às vítimas, já que a temperatura à beira do lago era muito baixa. Na hora do naufrágio, segundo o Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), chegava a 17ºC. “Como o dia todo foi frio, a temperatura da água deveria estar bem abaixo disso”, explicou o meteorologista Hamilton Carvalho.
Segundo um homem que trabalhava como garçom no barco de festas, o motor do Imagination parou duas vezes durante o trajeto. Logo depois de ser religado, voltou a pifar. “Veio, então, o efeito Titanic. A embarcação começou a afundar e foi um salve-se quem puder”, disse o homem, que não quis se identificar.
Dos passageiros resgatados, três mulheres permaneciam internadas no Hospital de Base e outras três pessoas no Hospital Regional da Asa Norte (Hran), até o fechamento desta edição. Mas os feridos foram levados para outras unidades hospitalares do DF.





"Foi assustador"

“Foi um desespero só. As pessoas começaram a gritar. O barco começou a afundar pela parte de trás. Em cinco minutos, o barco havia afundado”, contou o aflito Guilherme Soares, 15 anos, morador da Vila Paranoá. Ele conseguiu se salvar nadando até a margem do lago. Guilherme calculou que tenha
ficado na água por cerca de 25 minutos. Perto das 23h, ele estava na porta do Hospital de Base acompanhando a prima Mônica de Araújo, de 21 anos, que estava com suspeita de ter quebrado um dos braços. Mônica foi resgatada pelo Corpo de Bombeiros. Guilherme continuava desesperado por não ter informações sobre o paradeiro de seu pai, sua madrasta e outra prima.
Na porta do Ascade, por volta das 23h, Jaqueline da Silva, 29 anos, contava à mãe, pelo celular: “Mãe, eu quase morri, se não fosse uma boia. Uma menina ficava me puxando e quase me afogou”. Operadora de telemarketing, moradora do Setor O, em Ceilândia, Jaqueline havia sido convidada, como marido, o maitre Fenelon Vasconcelos, 35, anos para uma festa, convite pelo qual pagou R$ 65. “Havia muita gente no barco. Acho que tinha mais de uma festa”.
“Foi tudo muito rápido. Quando vi que o barco estava afundando, corri, consegui pegar um colete pra mim e outro pra minha filha e nos jogamos na água. Não sei nadar, fiquei batendo perna até que fui resgatado”, contou Heraldo Saldanha, 39 anos, ao sair do Pronto-Socorro do Hospital Regional da Asa Norte. Ele estava com a mulher, Gildete, e os dois filhos. Todos pularam na água e se salvaram. Gildete contou que viu a água entrando no barco. “Foi assustador”. Por volta das 23h30, a família Saldanha pegou um táxi na porta e foi para casa.
O estudante Magno Moreira, 22 anos, estava no banheiro quando percebeu a água entrando na embarcação. Saiu correndo e se jogou no lago. “Me atirei na água e fiquei segurando no barco”, disse ele. Magno disse que “aparentemente” não havia colete para todo mundo. “Vim mais ou menos uns 25, 25 coletes”. Outro sobrevivente, Luís Eduardo Junqueira, 25 anos, disse que nadou e tentou ajudar os amigos. Ao saber que um barco havia naufragado no Paranoá, a família de Luís Eduardo correu para o Ascade e o encontrou são e salvo.


MEMÓRIA
Palco de tragédias

Não é a primeira vez que o Lago Paranoá é palco de tragédias na capital federal. Exatamente há um ano, na madrugada de 22 de maio de 2010, uma lancha de pequeno porte naufragou entre a QL 15 e a Ponte JK e matou duas irmãs, Juliana e Liliane Queiroz de Lira. As outras nove pessoas que estavam a bordo conseguiram se salvar. Um laudo do Instituto de Criminalística da Polícia Civil concluiu que a embarcação estava superlotada.
Em janeiro de 2010, um barco com dois pescadores também afundou próximo à Prainha, no Setor de Mansões do Lago Norte, e causou a morte de Vagner Pitambeira, de 28 anos. O amigo escapou nadando até a margem. Em maio de 2008, uma colisão envolvendo uma lancha e um pequeno barco perto do Palácio da Alvorada, residência oficial da Presidência da República, acabou matando o capitão do Exército Luiz Antonio de Matos, 30 anos. De acordo com a Marinha, o piloto da lancha não viu o outro barco.
A irresponsabilidade de banhistas e navegantes no Lago Paranoá também é causa de acidentes. Em novembro de 2007, o sargento reformado da Polícia Militar Ismar Lopes de Oliveira morreu ao ser atropelado por uma lancha no Setor de Clubes Norte. Ele mergulhava para retirar lixo do fundo do lago e, mesmo tendo sinalizado o local com bóias, foi atropelado por um condutor que não tinha habitação.


O barco estaria em reforma
Comandante afirmou à Polícia que, durante a festa, desceu à casa de máquinas diversas vezes para averiguar se estava entrando água

Em depoimento ontem à noite, o comandante do Imagination, Airton Carvalho da Silva Maciel, demonstrou estar bastante preocupado com o estado do barco. De acordo com o relato que ele fez a um agente ao chegar à 10ª Delegacia de Polícia, no Lago Sul, a embarcação passava por reformas. Por isso, durante o trajeto que fez no Lago Paranoá, Maciel teria descido pessoalmente à casa de máquinas várias vezes para checar se estava entrando água na embarcação.
A Polícia Civil abriu um inquérito para investigar as causas do acidente. Segundo as informações dos agentes, o depoimento do comandante não foi tomado pelo titular da 10ª DP, delegado Adval Cardoso, que não estava presente no momento. Até o fechamento desta edição, o interrogatório não havia sido concluído. Dois policiais militares foram chamados para fazer o teste do bafômetro em Maciel, um piauiense nascido em Teresina, de 28 anos. Mas o exame não encontrou traços de álcool em sua respiração.
No local do acidente, o secretário de Segurança Pública, Sandro Avelar, disse que as causas ainda não foram identificadas e que a prioridade, durante a madrugada, seria manter as buscas de possíveis desaparecidos. “O momento é de prestar auxílio às pessoas. Mas o trabalho de investigação continua”, disse.
O comandante assegurou que o barco só trazia 79 passageiros e 11 tripulantes, num total de 90 pessoas. A informação contradiz a fornecida pelo Corpo de Bombeiros, segundo a qual havia 104 presentes — 92 convidados para a festa e 12 empregados da embarcação.


Suposta segurança

 “Agora, o seu evento será inesquecível.” Essa é a chamada do site da empresa que administra o barco Imagination, uma embarcação de 150 metros quadrados. O item segurança é alardeado com o argumento de que o barco “foi construído e equipado segundo as normas da Marinha Mercante”.
No tópico regras e dicas, o site informa que logo após o embarque, os passageiros receberão orientações do comandante “para que o passeio transcorra com tranquilidade”. Entre as regras, merece destaque a obrigação de que “as crianças permaneçam de coletes salva-vidas durante todo o trajeto.”
 O Imagination pode ser usado para festas infantis, casamentos, aniversários, confraternizações, despedidas de solteiro, formaturas, palestras, encontros, lançamentos de produtos, entre outros eventos. Os atrativos anunciados são a decoração sofisticada, a pista de dança, a sala de tevê e uma tripulação treinada para atender com eficiência.


Preocupação na internet

A repercussão sobre o acidente com o barco no Lago Paranoá tomou conta das redes sociais ontem à noite. A partir das 21h20, quando as primeiras notícias sobre o naufrágio apareceram nos principais sites, uma enxurrada de mensagens no Twitter e uma série de comentários no Facebook mostravam a preocupação do brasiliense com o naufrágio. No Twitter, entre 22h15 e 23h30, a média de mensagens com a informação #lagoparanoa era de três tuitadas a cada segundo — o que rapidamente levou o tema aos trending topics (a lista dos 10 assuntos mais comentados na rede de micromensagens).
A maioria dos comentários era de internautas em busca de informações sobre a tragédia. Mas tinha gente, como o tuiteiro @wesley_azdo, que repassava detalhes sobre as condições do lago ontem à noite. “Estive no lago. Muitos ventos, ondas fortes, água gelada. Não dava para navegar”, escreveu. Noelle Caroline (@NocaC) pedia uma corrente de orações para as pessoas que estavam no barco. “Gente, rezando para esses candangos, que afundaram hoje no Lago Paranoá. Jesus, ajuda esse povo”, escreveu Noelle.
Já a internauta Thauana Helena (@thauportilho) demonstrava preocupação com as condições de segurança dos eventos em barcos. “Não é a toa que eu sempre tive medo do Lago Paranoá. E todas as festas que fui chamada para ir no barco, não fui. Mais um acidente lá”, concluiu, com o sinal de tristeza.
Participaram da cobertura Antonio Temóteo, Fábio Monteiro, Leandro Kleber, Manoela Alcântara, Maria Júlia Lledó, Saulo Araújo, Thaís Paranhos e Victor Martins


CONGRESSO
Mais uma mutação no Código Florestal
Emenda que será apresentada e votada amanhã dará liberdade para os estados definirem regras de regularização das áreas de preservação permanente

» Vinicius Sassine

O PMDB cercou o governo mais uma vez e ressuscitou uma regra - considerada pelo próprio Planalto como uma das mais retrógradas do ponto de vista ambiental - que já havia sido sepultada na elaboração do relatório final sobre o novo Código Florestal. Os partidos acertaram votar amanhã o relatório do deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP) e mais uma única emenda, de autoria do deputado Valdir Colatto (PMDB-SC). A Emenda nº 164 prevê a transferência para os estados da atribuição de definir regras de regularização de áreas de preservação permanente (APPs).
A possibilidade de os estados terem seus próprios códigos florestais já havia sido descartada na elaboração do relatório de Aldo, mas volta à discussão com grandes chances de ser decidida no plenário da Câmara. Essa regra é uma ampliação da própria Emenda nº 164, que originalmente previa apenas a permissão de “atividades agrossilvopastoris” em áreas consolidadas em APPs. Decidido a ser oposição ao governo na definição do novo Código Florestal, o PMDB produziu uma emenda ainda mais permissiva.
Se o destaque for votado e aprovado, representará uma derrota retumbante para o governo. As horas que antecedem a votação serão decisivas para a Casa Civil tentar impedir mais essa ofensiva dos ruralistas. “Começo a negociação sobre essa emenda a partir de amanhã (hoje). É possível termos uma proposta que não transfira atribuições aos estados e que não permita consolidações em APPs”, diz o líder do governo, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP). “Vamos votar mesmo sem acordo. Não será a primeira vez que um governo é derrotado, nem a primeira vez que um presidente veta o que o Congresso aprova”, ameaça.
Até agora, três pontos opõem o conteúdo do relatório de Aldo Rebelo ao que o governo deseja em relação ao assunto: a permissão das áreas consolidadas em APPs, a dispensa de reserva legal em propriedades com menos de quatro módulos fiscais e a anistia a desmatadores que devastaram antes de 22 de julho de 2008. O impasse sobre as áreas consolidadas impediu a votação no último dia 11. Uma emenda do DEM, que seria votada em plenário, retirava o poder de a União decidir por decreto quais áreas consolidadas seriam permitidas em APPs. Agora, os partidos concordaram em votar amanhã - com exceção de PT, do PV e do PSol - a emenda de autoria do PMDB, um partido da base aliada.
Na emenda, Valdir Colatto inclui a possibilidade de “atividades agrossilvopastoris, ecoturismo e turismo rural” em APPs. Na interpretação do governo, o termo “agrossilvopastoris” abarca qualquer tipo de atividade de pecuária e agricultura. O Ministério do Meio Ambiente (MMA), inclusive, já calculou o quanto isso representa: o país tem entre 100 e 120 milhões de hectares de APPs, dos quais 40 milhões são passivos ambientais. Se o conteúdo da emenda passar a ter validade, poderão ser suprimidos pelo menos 60 milhões de hectares, segundo o MMA, o equivalente a 103 áreas do tamanho do DF. “Isso basicamente acaba com APP no meio rural”, diz um dos técnicos do governo que acompanha as negociações sobre o novo código.
Transferir para os estados a possibilidade de definir leis sobre APPs é ainda mais grave: “É um retrocesso inimaginável. O governo sempre defendeu o Código Florestal como uma regra nacional”, diz o técnico. “O governo não está feliz, a área ambiental está protestando muito. Mas a emenda vai jogar para os estados a possibilidade de regulamentação de APPs”, afirma o líder do PMDB na Câmara, Henrique Eduardo Alves (RN). Ele sustenta que o acordo para a votação da emenda já foi selado com os partidos. “Essa emenda é um bode na sala, não tem como prosperar. Ela premia quem desmatou”, rebate o líder do PT na Casa, deputado Paulo Teixeira (SP).


Manifestação no Ibirapuera

Um protesto no Parque do Ibirapuera, em São Paulo, reuniu cerca de mil pessoas (foto) contra a aprovação do novo Código Florestal. A manifestação foi organizada ontem por uma coalizão de ONG chamada S.O.S. Florestas, que tenta barrar a validação da nova lei ambiental. A ex-senadora Marina Silva (PV-AC), porta-voz dessa corrente ambiental contrária ao novo código, participou da manifestação. Ela cobrou o cumprimento da promessa feita pela então candidata à Presidência Dilma Rousseff (PT) de vetar qualquer proposta que permita o desmatamento de áreas de preservação permanente (APPs) e de reservas legais, além de iniciativas de anistia a desmatadores. Marina e outros ex-ministros do Meio Ambiente vão entregar a Dilma uma carta com a cobrança.


PERSONAGEM DA NOTÍCIA
O pai da idéia

O deputado Valdir Colatto (PMDB-SC) é um dos parlamentares mais radicais da bancada ruralista. Engenheiro agrônomo e vice-presidente da Frente Parlamentar Agropecuária (entidade que já presidiu por três vezes), Colatto é referência para os outros deputados interessados na defesa do agronegócio. O parlamentar faz essa defesa sem meias palavras. Não à toa, grudou no relator do novo Código Florestal, deputado Aldo Rebelo (PCdoB-SP), principalmente nos momentos mais decisivos da composição do novo texto. Muito do que o relatório carrega tem a interferência do peemedebista.
Nas brigas mais ferrenhas com os deputados ambientalistas, nas eternas discussões sobre o novo código, Colatto (foto) foi para a linha de frente. A defesa do agronegócio na Câmara se confunde com seus interesses particulares. O deputado é agropecuarista em Santa Catarina e foi dirigente da Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), além de ter comandado cooperativas agropecuárias.
Como secretário de Articulação Nacional do governo de Santa Catarina, entre 2003 e 2006, Colatto conseguiu elaborar um Código Florestal específico para o estado e viu a proposta ser aprovada pela Assembleia Legislativa catarinense. É uma das leis estaduais mais criticadas e contestadas na esfera ambiental, pelo retrocesso que representa, na visão de ambientalistas. A lei, inclusive, é questionada no Supremo Tribunal Federal (STF).
No Congresso, o deputado faz reverberar propostas como essas. É o autor do projeto do Código Ambiental Brasileiro, semelhante ao aprovado em Santa Catarina. Esse projeto levou à criação da comissão especial voltada especificamente para a elaboração do novo Código Florestal Brasileiro. A Emenda nº 164, que passou a ser uma possibilidade real para o dia da votação do novo código, é a última cartada do ruralista.


As trombadas do PT com o governo
Temas em discussão no Congresso criam divergências e abrem feridas, incluindo ameaças de rebelião dos petistas. Apesar disso, o Planalto tem vencido os embates e imposto sua vontade

» Izabelle Torres

As imposições do Planalto na pauta do Congresso e as reações contra o que nos bastidores apelidou-se de “trator governista” têm deixado à mostra as feridas abertas entre o governo e o PT. Se por um lado os petistas tiveram de atropelar o próprio discurso e calar-se diante de decisões como a privatização de aeroportos brasileiros, por outro, a cúpula palaciana diz que tem tido de negociar com a legenda como faz com aliados interessados em espaço político e cargos.
Não é pequena a lista de divergências entre o governo e seu partido. Um dos principais embates já ensaiados é em torno da proposta da jornada de trabalho de 44 para 40 horas sem redução de salários. O presidente do partido, Rui Falcão, eleito contra a vontade da presidente Dilma Rousseff, já anunciou que é o maior defensor da mudança e que ela faz parte de uma das prioridades da legenda no Congresso. O Planalto, por outro lado, não concorda com o teor da matéria e quer adiar a votação no plenário da Câmara.
O fim do fator previdenciário também é uma bandeira petista que contraria a vontade do governo. Integrantes da legenda no Congresso já fazem campanha há meses pela derrubada do veto presidencial à proposta. Deputados do partido, inclusive, apresentaram projetos este ano tratando do assunto, em uma tentativa de criar um plano alternativo para o caso de o trator governista impedir a votação do veto. O fator rende aos cofres públicos cerca de R$ 1,5 bilhão por ano, mas reduz algumas aposentadorias em até 40%. “Só quem perde com essa situação são os aposentados. Independentemente de partidos, o importante é garantir condições justas a essas pessoas”, defende o senador Paulo Paim (RS), um dos petistas mais revoltados com a posição palaciana sobre o assunto.

Tratorada
Apesar das reclamações e da choradeira nas reuniões da legenda — em uma delas, na semana passada, dois deputados sugeriram a rebelião —, o partido tem sido atropelado pelas decisões do governo. Crítico fervoroso das privatizações feitas pelo governo tucano, o PT teve de engolir calado o anúncio de que Dilma Rousseff vai privatizar aeroportos para facilitar as obras para a Copa do Mundo e as Olimpíadas. “Aceitar isso sem uma rebelião foi como rasgar nossa história. Falei isso na reunião da bancada e fui apoiado. As coisas não vão poder continuar assim”, desabafa um petista do Nordeste que, apesar do medo de retaliação, enumerou para os colegas uma lista de reivindicações não atendidas e posições ideológicas atropeladas.
Até em questões ambientais os integrantes do PT reclamam das orientações palacianas. Mais flexíveis às limitações para plantio de alimentos do que a ideia defendida pelo Ministério do Meio Ambiente, a bancada não tem consenso sobre o Código Florestal e promete cobrar caro se for obrigada a obedecer novamente às imposições do governo. As ameaças e a insatisfação têm rendido conversas freqüentes entre membros do partido e o líder governista, Cândido Vacarezza (PT-SP), que já coleciona inimigos por ser considerado intransigente no cumprimento de ordens por medo de perder a função. Na última quinta-feira, o líder passou mais de duas horas conversando, afirmando a importância do PT e prometendo trabalhar para atender aos pleitos até agora relegados.
Para o deputado André Vargas (PT-PR), integrante do diretório nacional, as diferenças de posição estão sendo resolvidas com conversas e acordos entre o partido e o governo. “Tem de haver diálogo. Mas é preciso entender que a maioria dos definidores da política está no governo”, diz. A opinião de Vargas, na verdade, é uma forma conciliadora de dizer que, no fim dos embates, o Planalto sempre vence porque é o detentor do poder. “O PT tem tido que abrir mão dos próprios discursos e das ideias que defendia. Creio que não há como um partido fazer isso com boa vontade e sem desgastes”, avalia Antonio Augusto Queiroz, diretor do Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (Diap).



OS EMBATES
Governo e PT já anunciam divergências sobre temas da pauta do Congresso. Conheça alguns deles:
» Redução da jornada de trabalho sem diminuição dos salários;
» Privatização de aeroportos;
» Fim do fator previdenciário;
» Possibilidade de o governo decidir por decreto sobre áreas e produtos que serão plantados em determinadas regiões do país.


NAS ENTRELINHAS
Denise Rothenburg

Apesar do cenário instável, a presidente tem uma ampla base. E hoje dirá que o sucesso do Brasil, tanto no resgate social quanto na Copa de 2014, depende de um esforço conjunto

Dilma no comando
Recuperada da pneumonia, a presidente Dilma Rousseff vai aproveitar o fim do mês de maio para inaugurar uma nova forma de relacionamento com a base governista e com os estados. Começará pelos partidos aliados. Os líderes foram chamados para uma reunião hoje. A convite dela, vão conhecer os detalhes do projeto de combate à miséria. Estarão representados todos os partidos que apoiam seu governo.
Na semana que vem, dia 31, será a vez de governadores e prefeitos, mais precisamente os representantes das 12 cidades escolhidas para sediar os jogos da Copa do Mundo de 2014. A intenção da presidente é fazer um encontro olho no olho para cobrar das autoridades o sucesso do Mundial.
Hoje, a sensação geral é a de que não haverá tempo para colocar a estrutura de pé daqui a três anos, ou melhor, dois, se levarmos em conta o período da Copa das Confederações. Em dois anos, é preciso resolver os problemas de São Paulo, Rio de Janeiro, Belo Horizonte, Brasília, Porto Alegre, Curitiba, Salvador, Recife, Natal, Fortaleza, Cuiabá e Manaus. Tudo apesar da crise econômica que se avizinha, com perspectivas inflacionárias, e da instabilidade política do momento, com as últimas denúncias.
As iniciativas da presidente são positivas. Afinal, desde fevereiro, quando o Congresso retomou suas atividades, há reclamações de que o governo é hermeticamente fechado nas mãos de poucos ministros, em especial, o da Casa Civil, Antônio Palocci. A presidente agora deixará claro com todas as letras que quem está no comando é ela. E o sucesso ou fracasso do governo será dividido com parlamentares.
Dilma pretende dividir os bônus com todas as autoridades envolvidas nos dois projetos — tanto o combate à pobreza quanto a Copa do Mundo. Mas é sempre bom lembrar que quem divide bônus também rateia ônus, na hipótese de fracasso. Especialmente, os prefeitos, muitos deles candidatos à reeleição no ano que vem. Esses terão que se desdobrar nos próximos 12 meses para dar conta do serviço. Afinal, Dilma não vai arcar sozinha com a responsabilidade de ver alguma cidade excluída da Copa.
Quanto aos aeroportos, ela, obviamente, não dará nome aos culpados, mas todos sabem que a responsabilidade está nas mãos do governo federal. E o atraso nos projetos tem nome: Luiz Inácio Lula da Silva. Em 2009 e 2010, o então presidente estava tão entretido em escolher e fazer o sucessor que se esqueceu de jogar seu peso político na concessão de aeroportos, de forma a acelerar as obras. Tudo para quem ninguém pudesse dizer no horário eleitoral que o presidente, petista, havia “privatizado” os aeroportos. Resultado: se Dilma quiser terminar o trabalho em tempo, terá que entregar mesmo à iniciativa privada e logo.
A expectativa geral no governo e fora dele é a de que a presidente terá o apoio de que necessita para levar avante os dois projetos. Afinal, embora alguns tenham dúvidas sobre o PT pós-mensalão, ninguém na esfera política duvida da boa vontade e do esforço de Dilma em levar adiante seus projetos. E é com essa confiança que ela irá jogar. Como dizia o craque Garrincha — que dá nome ao estádio de Brasília e assim deveria permanecer —, só falta combinar com os adversários.

Enquanto isso, na oposição...
O PSDB elege no próximo sábado a sua comissão executiva nacional. Os tucanos esperam que seja o começo de uma nova fase. Mas, por enquanto, nada indica que isso ocorrerá de fato. Na última quarta-feira, por exemplo, quase todos os senadores do PSDB foram ao gabinete do senador Aécio Neves dar um abraço no ex-senador Tasso Jereissati (CE), que aceitou presidir o Instituto Teotônio Vilela. O único que faltou foi o senador Aloysio Nunes Ferreira, de São Paulo. José Serra também passou por Brasília naquele dia, mas teve que ir embora mais cedo. Ele esteve na cidade para conversar com o PDT sobre a reforma política. Houve, no PSDB, quem quisesse fazer intriga com o fato de Serra e Aloysio não terem feito qualquer gesto de apreço a Tasso naquele dia. Mas o comando partidário tratou logo de rechaçar qualquer mal-entendido, dizendo que vê cabelo em ovo quem tenta fazer intriga entre Serra, Aécio e Tasso ou se refere à ausência de Aloysio na recepção a Tasso como algo premeditado.
Até nesse ponto Dilma tem sorte. Enquanto ela toma as rédeas políticas do governo, a oposição continua mais voltada para si do que para os problemas do governo. Nesse quadro, basta Dilma segurar o PMDB, para não ter com o que se preocupar no Congresso. Afinal, na Câmara, a base continua ampla. E no Senado, não é desejo do partido ser oposição e nem criar embaraços graves para o Executivo. O PMDB, aliás, começou a sorrir na semana passada quando garantiu para Orlando Pessuti uma vaga no conselho de administração do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico Social (BNDES) e, pelo andar da carruagem, vai continuar a sorrir. Afinal, se tem uma coisa que o PMDB sabe fazer é sobreviver a uma crise. Seus caciques estão aí justamente para confirmar essa tese.


VISÃO DO CORREIO
Descaso atinge mão de obra e infraestrutura

A escassez de mão de obra revelada por estudo da Consultoria Manpower não constitui surpresa nem para o governo nem para empresários. Talvez não esperassem que o número fosse tão alto. Segundo a pesquisa, 57% das organizações enfrentam dificuldade na hora de preencher vagas. A escassez não se restringe a quadros altamente qualificados. Atinge também funções básicas — motoristas, secretárias, contadores, operadores de produção e representantes de vendas. É o pior dos mundos.
Pessoas buscam colocação. Mas, incapazes de entender um manual de instruções ou de manejar máquinas minimamente sofisticadas, perdem a oportunidade de entrar no mercado formal de trabalho. Formam, então, um exército de desocupados que, para sobreviver, são obrigados a se dedicar a bicos. Ficam à margem dos benefícios assegurados pela legislação trabalhista e pelos avanços da civilização. Em suma: reproduzem a pobreza.
O colapso da mão de obra acompanha o da infraestrutura e tem a mesma raiz. Sem planejamento de longo prazo, o país não se preparou para crescer. Estradas, portos, aeroportos, energia, logística de armazenagem e transporte não mereceram a atenção necessária para enfrentar os desafios previsíveis. A “década perdida”, como são chamados os anos 1980, contribuiu para a imprevidência. O que se tinha era suficiente para o gasto de uma economia praticamente estagnada.
Técnicos e demais profissionais existentes respondiam às necessidades do mercado. Sem pressão de demanda, cursos profissionalizantes ficaram em segundo ou terceiro plano. A corrida se concentrou no patamar superior, cujas portas se escancaram sem preocupação com investimentos na excelência. O ensino básico, calcanhar de Aquiles nacional, tampouco mereceu a atenção devida. O governo, num esforço hercúleo, empenhou-se em universalizar o acesso à escola. Na verdade, tentava recuperar o tempo perdido. Nossos vizinhos sul-americanos haviam vencido essa etapa havia muito tempo. O interesse, concentrado na quantidade, não se estendeu à qualidade. Resultado: a avaliação do ensino implantada na década de 90 revelou a existência de milhões de analfabetos — reais e funcionais.
Os números indignam e assustam. Ao concluir o ensino básico, 62% dos brasileiros leem mal e não entendem o enunciado; 89% deles são incapazes de fazer as quatro operações. Nada menos que 14 milhões de adultos engordam as estatísticas dos analfabetos. O fiasco ultrapassou as fronteiras nacionais. Entre os 65 países avaliados pelo Pisa (o mais respeitado teste comparativo do desempenho escolar), O Brasil aparece em 53ª lugar. É este país — que precisa desesperadamente melhorar a qualidade do ensino público para poder crescer — que se dá ao luxo de adotar livro didático com ensinamentos heterodoxos. “Os livro” e “nós pega o peixe”, segundo a obra, são corretos embora sujeitos a preconceitos lingüísticos. O Ministério da Educação, ao abonar a tese, condena os jovens à ignorância e à mediocridade — incapazes de disputar uma do milhão de vagas existentes. Perdem eles. Perde o país. 


DEU NO WWW.CORREIOBRAZILIENSE.COM.BR

Voo 447: para investigador, houve problema em sensores
Em uma matéria publicada ontem pelo semanário alemão Der Spiegel, um investigador do acidente com o avião da Air France ocorrido em maio de 2009 afirmou que houve uma súbita parada da aeronave devido ao gelo acumulado nos sensores de velocidade e que o piloto não estava na cabine na hora do problema. Assim que percebeu, ele voltou correndo e gritou instruções para os copilotos. A reação está registrada, de acordo com o investigador, que não foi identificado, nas caixas-pretas recuperadas há poucos dias. O Birô de Investigações e Análises (BEA) planeja divulgar as primeiras descobertas sobre as informações contidas nos equipamentos no fim desta semana.


GRITA DO CONSUMIDOR

DECOLAR.COM
Empresa deixa de reembolsar valor de passagens

Rômulo Cirilo
Asa Sul

Em janeiro, o empresário Rômulo Cirilo, 45 anos, comprou duas passagens aéreas no site Decolar.com e fez o pagamento por meio de boleto bancário. “Uma passagem era para mim e a outra, para a minha esposa. Ela desistiu da viagem e eu pedi o reembolso. Desde então, a empresa me enrola e não me passa o dinheiro. Ligo para a companhia e, quando consigo falar com uma atendente, a ligação misteriosamente cai”, queixa-se o leitor.

Resposta da Decolar.com
“A Decolar.com, em contato via e-mail com o senhor Rômulo Cirilo, informou-o sobre o procedimento adotado neste caso, bem como sobre o prazo para que a operação ocorra. Desta forma, a Decolar.com está à disposição do consumidor para o esclarecimento de eventuais dúvidas que possam surgir.”

Comentário do leitor
“A Decolar.com depositou o dinheiro.”

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