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segunda-feira, 23 de maio de 2011

22 de maio de 2011 - FOLHA DE SÃO PAULO


TREM-BALA
Trem de carga entre Rio e SP tem ociosidade de 66%
Pleno uso evitaria 5.000 viagens por dia de caminhão na Dutra, diz estudo
Para analistas, falha é do modelo de concessão; MRS, que opera linha, afirma que problema de logística traz restrição

DIMMI AMORA
ENVIADO ESPECIAL AO VALE DO PARAÍBA

Enquanto o governo tenta emplacar o trem-bala entre Rio e São Paulo, a linha ferroviária existente entre os dois centros mais importantes do país trabalha com uma ociosidade de 66,2% no transporte de carga. É o que mostra estudo feito pela ANTT (Agência Nacional de Transportes Terrestres), a pedido da Folha, sobre o chamado Ramal de São Paulo. Se fosse utilizado em sua plenitude, evitaria cerca de 5.000 viagens diárias de caminhão de carga (27 toneladas) pela via Dutra, que acompanha seu traçado, o que representa 36% do movimento de caminhões do último trecho de São Paulo.
O trecho principal começa em Barra Mansa (RJ) e vai até o bairro do Brás (SP). O levantamento usou parâmetros mínimos de tráfego e atestou que ele poderia levar 35,3 milhões de toneladas anuais de carga. Em 2010, transportou 11,9 milhões. O modelo da concessão é apontado por especialistas como um dos fatores para essa realidade. A via é administrada desde a década de 1990 pela MRS Logística, empresa que tem como principais sócios a Vale e a CSN.
"Não temos poder de fazer a MRS transportar mais carga pelo ramal, mesmo ocioso. Queremos que, se ela não usa, outros possam usar", afirma o presidente da ANTT, Bernardo Figueiredo. A empresa diz que não consegue carregar mais volume por problemas logísticos e devido ao compartilhamento de trilhos com trens de passageiros em São Paulo. Mas especialistas apontam o fato de que a linha acaba transportando só produtos que interessam a sua controladora, da área de mineração e siderurgia, e que não é adaptada para cargas de menor volume e maior valor -que vão em contêineres.

PRIVATIZAÇÃO
"Para a Vale, a MRS não é receita. É custo. Foi uma falha na privatização não ter permitido a entrada de terceiros na via", diz Antonio Pastori, economista e ex-funcionário do BNDES na área de logística, ressalvando que o problema é semelhante nas outras concessões pelo país. Segundo o estudo, 92,7% do volume transportado em 2010 refere-se apenas a três produtos: minério de ferro (86,3%), carvão mineral (2,7%) e siderúrgicos (3,7%). Outros 18 produtos ficaram com apenas 7,3% do volume.
Apesar da alta de 20% no volume transportado em 2010 ante 2006, a concentração em minério, carvão e siderúrgicos é praticamente a mesma de cinco anos atrás.


ANÁLISE
País precisa de mais ferrovias para elevar competitividade

MANOEL A.S. REIS
ESPECIAL PARA A FOLHA

O Brasil é um grande produtor de commodities agrícolas e minerais, itens com baixo valor agregado e transportados em elevadas quantidades ao longo de grandes distâncias. Tais produtos não podem ser onerados com valores altos de frete, para evitar o comprometimento de sua competitividade. Assim, o sistema ferroviário e também o hidroviário são os ideais para o seu transporte nas longas distâncias, embora no Brasil isso seja realizado em larga escala por meio do transporte rodoviário, de alto custo e baixa capacidade, o que reduz fortemente sua competitividade internamente e nas exportações.
Nossa rede ferroviária possui 28 mil quilômetros de extensão, número pífio quando comparado ao das redes de outros países semelhantes em porte e recursos naturais (a rede hidroviária é insignificante, mesmo tendo o país uma das maiores redes de rios do mundo). Durante muitos anos, o país deixou de considerar e planejar sua rede de transporte de baixo custo. Hoje, há consciência dessa falha e certo afobamento para minorar o problema.
A maioria das ferrovias concentra-se no Sul e no Sudeste e parcialmente no Nordeste e esteve por anos sob controle e operação estatal, até o início dos anos 1990, quando foi concedida à iniciativa privada.  As regiões Norte e Centro-Oeste, que correspondem a cerca de 65% do território nacional, são um quase completo vazio de ferrovias. Por meio do PNLT (Plano Nacional de Logística e Transportes), desenvolvido pelo Ministério dos Transportes, em cooperação com o Ministério da Defesa, foi planejada a implantação de mais 12 mil quilômetros de ferrovias até 2025, com uma distribuição geográfica que permitirá cobertura muito mais ampla do território nacional e a desejável prática da intermodalidade (sequência conveniente de sistemas de transporte).
Essa implantação permitirá o acesso ferroviário de grande parte do território nacional a qualquer um dos principais portos marítimos do país, de norte a sul. A nova realidade fica ainda aquém das necessidades do país, mas permitirá uma redução expressiva dos custos logísticos das commodities e de outros produtos, proporcionando o desejável aumento da competitividade e das exportações brasileiras para o mercado global. Resta o governo acelerar essas implantações. É preciso que dê sua contribuição e ajuste a regulação correspondente, de forma a tornar atraentes para a iniciativa privada os investimentos nessas implantações.
Um fator de importância é que as concessões sejam realizadas de forma a permitir a fluidez do transporte nas longas distâncias, ao contrário do que foi feito nas concessões iniciais, que criaram blocos limitados a regiões relativamente restritas, dificultando a integração.
MANOEL A.S. REIS, professor da FGV-EAESP, é coordenador do GVcelog (Centro de Excelência em Logística e Supply Chain).


TEORIA MILITAR MODERNA
"Pai" da ação contra Bin Laden prega velocidade
Em livro, William McRaven lista as regras do sucesso de uma missão
Almirante é o único que teve nome divulgado da equipe dos EUA que matou o terrorista em operação no Paquistão

LUIS KAWAGUTI
DE SÃO PAULO

Um pequeno grupo de militares, altamente treinados, pode derrotar um inimigo até dez vezes mais numeroso e mais bem protegido se seguir seis regras básicas (confira no quadro ao lado). Essa é a teoria apresentada no livro do almirante americano que ganhou fama mundial instantânea após planejar e preparar a operação que matou o líder terrorista Osama bin Laden em 1º de maio. William McRaven, 55, é o único nome conhecido da equipe que matou Bin Laden. Os militares do Time Seis do Seal (mergulhadores de elite da Marinha dos EUA) que atuaram na operação trabalham diretamente com a CIA (agência de inteligência americana), e suas identidades são sigilosas.
O livro "Spec Ops" (spec ops: estudos de caso em guerra de operações especiais -teoria e prática, da editora Ballantine Book) foi lançado em 1995 por McRaven, que já foi um Seal. Quando planejou o ataque ao esconderijo de Bin Laden no Paquistão, ele estava no comando do grupo JSOC (sigla em inglês para Comando Conjunto de Operações Especiais), sediado no Afeganistão e formado pelos militares das principais forças especiais dos EUA (Seals, Rangers e Deltas, entre outros).

SUPERIORIDADE
McRaven baseia seu livro no conceito de "superioridade relativa" de Carl von Clausewitz, o criador da teoria militar moderna. Trata-se da habilidade de um comandante de concentrar suas forças no ponto decisivo da batalha para conseguir a vitória, mesmo que o inimigo seja mais numeroso e armado. Foi o que aconteceu no Paquistão, quando 79 Seals invadiram um país soberano para matar Bin Laden, sob o risco constante de entrar em combate com o Exército paquistanês do norte -cuja academia fica a dez minutos do local do esconderijo. Outro exemplo, este analisado no livro, aconteceu em 1976, quando 180 comandos israelenses invadiram o aeroporto de Entebbe (Uganda) e resgataram cerca de 90 reféns das mãos de extremistas e do Exército nacional.

VELOCIDADE
Para McRaven, a operação especial deve contar com recursos ilimitados, providos pelo governo, e informações (sobre a localização e defesas do inimigo) fornecidas por todas as agências de inteligência do Estado. Os alvos devem ser poucos, e a tecnologia envolvida, totalmente nova -como na morte de Bin Laden, quando os Seals usaram helicópteros invisíveis a radar, de configuração ainda desconhecida, para entrar no Paquistão sem alertar suas Forças Armadas.
A essência do sucesso recai, porém, na velocidade. Os militares têm que ser capazes de chegar de surpresa e cumprir seu objetivo principal em poucos minutos (os israelenses levaram três minutos para proteger os reféns; os Seals, após um acidente com um helicóptero, mataram Bin Laden em 15 minutos).
Chegar rápido ao objetivo principal é o mesmo que atingir a "superioridade relativa". Nesse ponto da batalha, o inimigo não tem mais tempo nem condições de contra-atacar de forma efetiva. Já se houver demora para chegar ao alvo principal, diz McRaven, o pequeno grupo de forças especiais fica exposto ao que Clausewitz chama de "fricções da guerra". Ou seja, o grupo fica sujeito a falhas individuais, ao acaso e ao choque com um Exército convencional, mais numeroso e armado -ao qual a reduzida tropa não tem condições de resistir por um tempo prolongado.
 

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