DESTAQUE DE CAPA - O FIM DA CAÇADA
Mundo teme reação da Al Qaeda após a morte de Bin Laden
EUA reforçam segurança e afirmam ter "sepultado" o corpo de terrorista no mar seguindo a tradição islâmica
DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS
A morte do ex-terrorista número 1 do mundo, Osama bin Laden, aos 54 anos e com dois tiros anteontem no Paquistão, desencadeou uma onda de temor de que atentados retaliatórios ocorram em várias partes do mundo.
Leon Panetta, diretor da CIA, disse que "quase certamente" a rede Al Qaeda tentará vingar a morte de seu líder, ocorrida quase dez anos depois dos atentados do 11 de Setembro. "Bin Laden está morto, mas a Al Qaeda, não."
Os EUA reforçaram a segurança em cidades como Nova York e Washington e aumentarão a vigilância em aeroportos e estações de trem. Um alerta global para americanos por "potencial elevado de violência" no mundo foi emitido. Líderes europeus fizeram o mesmo.
Os EUA dizem ter "sepultado" no mar da Arábia o corpo de Bin Laden seguindo rito islâmico e que DNA confirmou com "99,9% de certeza" sua identidade. Mas imagens não foram divulgadas.
Ação para eliminar terrorista começou a ser armada em 2007
CIA chegou a mensageiro do terrorista interrogando presos em Guantánamo e localizou casa no Paquistão
Obama foi informado do paradeiro em fevereiro, pouco antes de viajar ao Brasil, e autorizou o ataque na sexta-feira
DAS AGÊNCIAS DE NOTÍCIAS
A versão do governo americano sobre a morte do terrorista saudita Osama bin Laden -a única disponível até agora- dá conta de que a operação, que culminou anteontem (horário de Brasília) com um ataque noturno de tropas especiais em helicópteros à mansão do saudita no Paquistão, começou a surgir no ano de 2007. Agentes da CIA (agência de inteligência dos EUA) descobriram a identidade de um mensageiro de Bin Laden interrogando detentos da prisão americana de Guantánamo, em Cuba.
O suspeito, que não teve o nome divulgado, era um protegido de Khalid Sheikh Mohammed, o suposto responsável pelo planejamento dos ataques do 11 de Setembro. Em 2009, a CIA descobriu que ele vivia com um irmão e uma família na região de Abbotabad, a 115 km da capital paquistanesa, Islamabad. O presidente Barack Obama foi avisado em agosto de 2010 de que a agência tinha uma pista quente sobre o paradeiro do saudita. A CIA achou em seguida a casa do mensageiro em Abbottabad, avaliada em US$ 1 milhão e destoante da vizinhança.
O local tinha muros de 4 m de altura, arame farpado, câmeras de vigilância e os habitantes queimavam seu lixo, para que não pudesse ser analisado por espiões. Toda aquela estrutura não se justificava para a proteção de um simples mensageiro. A CIA passou então a acreditar que os habitantes eram parentes de Bin Laden. Em fevereiro deste ano -pouco antes de o presidente viajar ao Brasil-, a agência estava convencida de ter encontrado o esconderijo do maior inimigo dos EUA e informou Obama.
A cúpula da segurança nacional sugeriu bombardear o local com aviões invisíveis a radares, segundo a rede americana de TV ABC News. Obama descartou a opção -queria uma prova definitiva de que o saudita estava no local. A solução foi enviar tropas especiais. A equipe seis de agentes especiais Seal, da Marinha, começou a treinar em mansão igual à de Bin Laden, construída nos EUA a partir de fotos de satélite. Especializada em operações de contraterrorismo, a unidade atua apenas em missões secretas no exterior, a serviço da CIA. O código usado pelas forças americanas para se referir a Bin Laden era "Gerônimo", diz a CNN.
AUTORIZAÇÃO
Obama autorizou o ataque na manhã da última sexta-feira. Por causa do mau tempo, ao menos dois helicópteros Black Hawk decolaram de uma base no Afeganistão por volta de 0h30 de ontem. Não há versões independentes sobre o ataque à mansão. Segundo os EUA, ao chegar à casa, o primeiro helicóptero foi alvo de um disparo de lança-foguetes e teve de fazer um pouso forçado.
Liderados por espião da CIA, os Seals desembarcaram e invadiram a mansão, trocando tiros com seguranças do saudita. O mensageiro, seu irmão e um filho de Bin Laden foram mortos. O saudita foi encurralado no último andar do edifício e morto com dois tiros. Inicialmente, John Brennan, conselheiro de Obama, disse que ele usou uma de suas esposas como escudo humano; mais tarde, fontes da Casa Branca negaram que se tratasse da mulher de Bin Laden e que ela tenha sido utilizada como escudo.
Antes de decolar com o corpo de Bin Laden, os militares explodiram o helicóptero avariado e recolheram documentos. O cadáver foi levado para um porta-aviões.
EUA afirmam que "sepultaram" corpo de Bin Laden no mar
Decisão, que evita "peregrinação", foi creditada a ritual islâmico; não está claro como foi comprovado o DNA
Governo americano diz ser "inconcebível" que terrorista não tivesse apoio paquistanês para se manter escondido
ANDREA MURTA
DE WASHINGTON
Um "sepultamento" no mar marcou o desfecho ontem do terrorista Osama bin Laden, localizado e morto com dois tiros no Paquistão após quase dez anos de buscas pelas forças dos EUA. Imagens do corpo do líder da rede Al Qaeda ainda não foram divulgadas. Funcionários do governo afirmam que ainda não foi decidido se fotos serão liberadas, mas que um exame de DNA confirmou com "99,9% de certeza" a identidade do terrorista. Não está claro como o DNA foi testado. Por enquanto, o mais provável é que o material recolhido do corpo tenha sido comparado com DNA recolhido de familiares de Bin Laden após o 11/9 -uma de suas irmãs morreu de câncer no cérebro há cerca de um ano em Massachusetts.
Além de evitar a criação de um ponto de "peregrinação", a decisão de levar o corpo ao mar foi creditada ao curto período de tempo entre o fim do ataque e a conformidade com rituais islâmicos. Foram executados ritos religiosos no navio USS Carl Vinson, no mar da Arábia, em uma cerimônia que começou às 2h10 e terminou às 3h10 da manhã (de Brasília), segundo a Casa Branca.
O corpo foi lavado e posicionado em um lençol branco. Um militar leu comentários preparados para a ocasião, que foram traduzidos para árabe por um nativo da língua. Bin Laden foi então colocado em uma prancha que desceu ao mar. Um funcionário do governo indicou que preparativos para um eventual funeral começaram há meses, com consultas a especialistas islâmicos. Ele afirmou também que nenhum país podia ou queria abrigar o corpo.
PAQUISTÃO
Segundo John Brennan, conselheiro da Casa Branca para segurança nacional, os EUA investigam como ele conseguiu se manter tanto tempo no esconderijo. "É inconcebível que não tivesse apoio paquistanês." Ele disse que a ação foi unilateral. O presidente do Paquistão, Asif Ali Zardari, confirmou a informação, mas negou que o país soubesse do paradeiro de Bin Laden.
Ontem, o presidente Barack Obama afirmou que "o mundo é um lugar melhor" sem Bin Laden. "Nosso país manteve o compromisso de fazer Justiça." Já a secretária de Estado Hillary Clinton disse que a morte renova os esforços contra a Al Qaeda. Ela aproveitou para estender as mãos à ala mais moderada do Taleban: "Não podem esperar que deixemos [o Afeganistão]; não podem nos derrotar. Mas podem deixar a Al Qaeda e participar de um processo político pacífico".
Patriota se diz preocupado com represálias
FLÁVIA FOREQUE
DE BRASÍLIA
O chanceler brasileiro, Antonio Patriota, afirmou que a notícia da morte de Osama bin Laden tem uma "dimensão interessante e positiva" diante da onda de manifestações pró-democracia em diversos países árabes. "Acho que é um desenvolvimento que não deixa de ter uma dimensão interessante e positiva, no momento em que o mundo árabe se manifesta, do Marrocos ao golfo [Pérsico], por mais liberdade de expressão, por mais democracia e melhores oportunidades", disse.
Patriota explicou que a figura de Bin Laden ajudou a estigmatizar a imagem do mundo islâmico "como um mundo onde as alternativas seriam entre a autocracia e o fundamentalismo islâmico". "Nós sabemos que não é esse o caso", completou. O ministro disse ainda que o governo brasileiro se solidariza com as vítimas dos desastres provocados pelo terrorista e "com aqueles que buscam justiça".
Patriota reforçou a posição do Brasil de condenação a qualquer ato terrorista, independente de sua motivação, e afirmou temer possíveis reações à notícia. "Nos preocupa muito que haja represálias. Esperamos que esse acontecimento não desencadeie nenhum atentado. Mas não temos neste momento nenhuma informação que nos leve a temer algum ato específico", declarou o chanceler brasileiro.
ELIANE CANTANHÊDE
E eu com isso?
BRASÍLIA - Reação do chanceler Antonio Patriota à morte de Bin Laden: "Acho que é um desenvolvimento que não deixa de ter uma dimensão interessante e positiva, no momento em que o mundo árabe se manifesta, do Marrocos ao Golfo, por mais liberdade de expressão, por mais democracia e melhores oportunidades".
Ótimo. E o que isso significa? Absolutamente nada, a não ser que Patriota, Dilma e o governo brasileiro inteiro não têm nada a dizer sobre uma ação militar dos EUA no Paquistão para matar Bin Laden.
Quando foi da Colômbia no Equador e o alvo era um terrorista das Farc, o Brasil fez, aconteceu, articulou uma condenação praticamente unânime da OEA contra o governo colombiano. Agora, não tem sequer o que declarar.
A diferença de reações pode ser pelas circunstâncias e pela questão geográfica: os EUA já estavam no país, e o Paquistão e a Al Qaeda ficam do outro lado do mundo, enquanto o Equador e as Farc ficam aqui nas nossas barbas. Ou pode ser questão de estilo: Colômbia-Equador foi na era Lula-Amorim, EUA-Bin Laden, na Dilma-Patriota.
Mesmo em "off" (quando autoridades não querem seus nomes publicados), as frases foram curiosas. Um condenou o terrorismo, outro lamentou as mortes nas torres gêmeas e nada mais disseram.
Quem foi um pouco além disse que o Brasil condena o terrorismo, se solidariza com as famílias do 11 de Setembro e compreende o grande alívio com o fim de Bin Laden, mas não concorda com o método. Tentar conter o terrorismo pela força tende a ter efeito bumerangue: uma sensação momentânea de segurança e um recrudescimento de dimensões imprevisíveis.
A questão é como a operação norte-americana vai ser assimilada no peculiar mundo árabe: como um ataque só a Bin Laden ou uma demonstração de força para o islã? Disso dependem e realização, a força e a dinâmica da contraofensiva.
VLADIMIR SAFATLE
Insultos à memória
Em Rondônia, há uma pequena cidade chamada Presidente Médici. Este é o mesmo nome de um estádio de futebol em Sergipe.
Os paulistanos que quiserem viajar de carro para Sorocaba conhecerão a rodovia Castello Branco. Aqueles que procurarem uma via sem semáforos para o centro da capital paulista poderão pegar o elevado Costa e Silva.
Há mesmo alguns paulistanos que moram na rua Henning Boilesen: nome de um empresário dinamarquês, radicado no Brasil, que financiava generosamente a Operação Bandeirante e que, em troca, podia assistir e participar de torturas contra presos políticos na ditadura militar.
Há alguns anos, os são-carlenses foram, enfim, privados da vergonha de andar pela rua Sérgio Fleury: nome de um dos torturadores mais conhecidos da história brasileira. Estes são apenas alguns exemplos da maneira aterradora com que o dever de memória é praticado no Brasil.
Se monumentos, cidades e lugares públicos podem receber o nome seja de ditadores que transformaram o Brasil em um Estado ilegal resultante de um golpe de Estado seja de torturadores sádicos é porque muito ainda falta para que a memória social sirva como garantia de que o pior não se repetirá. Sem esta garantia vinda da memória, os crimes do passado continuarão a destruir a substância normativa do presente, a servir de ameaça surda à nossa democracia.
Lembremos como o Brasil foi capaz de legalizar o golpe de Estado em sua Constituição de 1988. Basta lermos o artigo 142, no qual as Forças Armadas são descritas como "garantidoras dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, da lei e da ordem". Ou seja, basta, digamos, o presidente do Senado pedir a intervenção militar em garantia da lei (mas qual? Sob qual interpretação?) e da ordem (social? Moral? Jurídica?) para legalizar constitucionalmente um golpe militar.
Tudo isso demonstra como ainda não há acordo sobre o que significou nosso passado recente. Por isso, ele teima em não morrer. Um núcleo autoritário e violador dos direitos humanos nunca foi apagado de nosso país. Não é por acaso que somos o único país latino-americano onde o número de casos de tortura em prisões cresceu em relação à ditadura.
O que não deve nos surpreender, já que ninguém foi preso, nenhuma mea-culpa dos militares foi feita, ninguém que colaborou diretamente com a construção de uma máquina de crimes estatais contra a humanidade foi objeto de repulsa social.
Que a criação de uma Comissão da Verdade possa, ao menos, fazer com que o Brasil pare de insultar a memória dos que sofreram nas mãos de um Estado ilegal governado por usurpadores de poder.
Que ninguém mais precise morar em Presidente Médici.
VLADIMIR SAFATLE escreve às terças-feiras nesta coluna.
AVIAÇÃO
Lucro da Embraer cresce 295% no 1º tri
A Embraer registrou lucro líquido de R$ 174,3 milhões no primeiro trimestre, ante R$ 44,1 milhões no mesmo período de 2010. O Ebitda (lucro antes dos juros, impostos, depreciação e amortização, na sigla em inglês) foi de R$ 259,8 milhões, ante R$ 209,6 milhões no primeiro trimestre de 2010.
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