MUDANÇAS
Novas e velhas potências se chocam na sucessão no FMI
David Wessel | The Wall Street Journal
Os impérios não costumam sucumbir do dia para a noite. As velhas potências não abdicam facilmente de suas regalias. E as em ascensão não conseguem exercer o poder agilmente.
"As mudanças mundiais quase sempre alimentaram conflitos econômicos, criaram problemas para o gerenciamento da economia e aumentaram as tensões diplomáticas", disse recentemente o historiador da economia Barry Eichengreen, da Universidade da Califórnia em Berkeley, num simpósio. Às vezes as mudanças causam conflitos militares; muitas vezes, irrompem em tensões na economia e nas finanças internacionais.
Nesse contexto, a tensão sobre o sucessor de Dominique Strauss-Kahn na direção do Fundo Monetário Internacional (FMI) é mais que um cabo de guerra sobre que nacionalidade ganhará o comando do órgão credor multilateral.
É uma verdadeira engasgada nas instituições mundiais criadas em 1945 e que ainda não se ajustaram ao peso dos países emergentes, é um sinal da aquiescência relutante dos EUA e da Europa a um mundo que não dominam mais, uma manifestação do desconforto da China com o fato de que a administração de sua economia importa para o resto do mundo. É um pequeno passo à frente no que um relatório do Banco Mundial chamou esta semana de "multipolaridade" de um mundo com mais de uma ou duas potências econômicas.
Durante quase 60 anos o comando do FMI foi reservado a um europeu, e o do Banco Mundial, a um americano - uma tradição arcaica, se não ilegítima.
"A Europa não tem mais o direito divino de ocupar esse cargo", escreveram esta semana Arvind Subramanian e Nicolas Véron, do Instituto Peterson de Economia Internacional, um centro de pesquisa de Washington. "O mundo mudou e os arranjos antiquados de 1945 (...) têm de evoluir de acordo com a realidade." O próximo diretor-gerente do FMI, dizem, deve ser escolhido com base no mérito, "que não se encontra só na Europa".
Quando Strauss-Kahn foi escolhido, em 2007 - depois de um espanhol, de um alemão e de um francês que ocupou o posto por treze anos, que sucedeu a outro francês que o ocupou por nove -, houve promessas de que seria diferente da próxima vez.
Mas ninguém previa que o cargo ficaria vago justo no momento em que o FMI está emprestando tanto para a Europa e disciplinando os governos perdulários do continente. Previsivelmente, a Europa afirma que não é o momento certo de aceitar um não europeu. E autoridades da Rússia à África do Sul e à China, previsivelmente, criticam os furos dessa lógica.
Mohamed El-Erian, da Pimco, o gestor de recursos egípcio que está numa lista crescente de possíveis chefes do FMI, propõe a seguinte escolha ao Fundo: "Mantenha sua abordagem feudal ou crie um processo seletivo aberto e meritocrático com critérios claros e transparência." A primeira alternativa, diz ele, é mais rápida, mas "não tem credibilidade nem legitimidade". A segunda resolve "uma velha carência", mas é mais demorada.
A prisão de Strauss-Kahn em meio a uma crise financeira na Europa não favorece um processo ponderado e transparente. O mercado acha que, se os maiores países emergentes não se unirem rapidamente para apoiar um dos vários candidatos não europeus com experiência, o FMI vai acabar sob a tutela de outro europeu. Os franceses, que parecem sempre já ter alguém pronto, têm uma opção conveniente: Christine Lagarde, sua ministra da Economia.
A criação do FMI e de suas instituições afiliadas após a devastação da Grande Depressão e da Segunda Guerra iniciou uma era de estabilidade em que os EUA dominaram a economia mundial. Nas finanças internacionais, essa ordem do pós-guerra começou a ruir nos anos 70, quando a economia americana tropeçou, o dólar caiu, a Europa foi reconstruída e o Japão se tornou potência mundial.
A tendência rumo a um mundo multipolar foi interrompida nos anos 80 e 90 com o colapso da União Soviética, a indigestão da Europa ao engolir a reunificação da Alemanha e a crise financeira asiática, em que os EUA lideraram a cavalaria. "A potência dominante", disse Eichengreen, "não mais podia agir unilateralmente, mas acabou assumindo a liderança."
Agora essa era está acabando, diante da crise financeira gerada pelos EUA, em 2008, e do crescimento impressionante dos mercados emergentes. "Nem os EUA nem a China", escreveu Eichengreen, "têm capacidade para administrar sozinhos os problemas econômicos mundiais, e nenhum dos dois terá a capacidade de ditar os termos" da solução. A tensão sobre quem vai comandar o FMI é algo menor se comparada ao desafio de garantir o suprimento de energia ou de buscar uma solução mundial para a mudança climática.
Num cenário com final feliz, as instituições mundiais mudam - a ascensão do G-20, grupo de países desenvolvidos e emergentes para substituir o mais estreito G-7, é um exemplo disso - e as grandes economias são forçadas a uma cooperação mutuamente benéfica.
Mas esse não é o único cenário, alerta Eichengreen. As décadas posteriores à Primeira Guerra foram marcadas pela incapacidade das potências em decadência e em ascensão de estabilizar a economia global e criar instituições funcionais; o resultado foi a Grande Depressão e a Segunda Guerra.
GUERRA COMERCIAL
Brasil inquieto na guerra dos subsídios
Assis Moreira | De Genebra
O Brasil reagiu ontem a uma nova etapa da disputa entre a americana Boeing e a europeia Airbus manifestando "grande preocupação" com os bilhões de dólares de subsídios recebidos pelos concorrentes da Embraer para produção de novas aeronaves, e considera que essa situação precisa ser resolvida logo.
Está em jogo na disputa dos dois gigantes aeronáuticos um tipo de subsídio que é para o lançamento de novos aparelhos, que a Embraer diz não receber. O Brasil se inquieta com os subsídios pesados que estão sendo dados também pelo Japão, Rússia, China e ainda Canadá, no desenvolvimento de jatos que vão competir com os aparelhos da companhia brasileira.
"A Embraer arca com 100% dos custos de desenvolvimento e lançamento de uma aeronave, enquanto os outros têm um apoio competitivo extraordinário, que é indevido e ilegal e que torna a operação barata para as empresas", afirmou o embaixador brasileiro junto à OMC, Roberto Azevedo. "Estamos examinando, à luz dos resultados (da disputa Boeing-Airbus) que tipo de ação o Brasil pode tomar, inclusive falando com as outras partes", completou.
Na longa disputa entre Boeing e Airbus, a OMC confirmou em março que o construtor americano recebera pelo menos US$ 5,3 bilhões de subsídios ilegais de Washington. Ontem, acionado pelos EUA, foi a vez de o Órgão de Apelação da OMC, espécie de corte suprema do comércio internacional, confirmar que a União Europeia dá subsídios ilegais para a Airbus na forma de financiamentos para lançamento de novos aparelhos, apoio à infraestrutura e injeção de capital.
No entanto, os juízes mudaram decisão do painel anterior de que a Alemanha, Espanha e o Reino Unido deram recursos para o lançamento do super jumbo Airbus-380 que também constituiria subsídios proibidos porque estariam vinculados ao desempenho de exportação da aeronave. Os juízes não disseram que a operação europeia era legal, e sim que o painel anterior fizera interpretação errada. A Boeing calcula que Airbus recebeu US$ 18 bilhões de subsídios ilegais, incluindo US$ 4 bilhões para o A380, o mais novo aparelho desenvolvimento pelo grupo europeu.
Como terceira parte envolvida na disputa, o Brasil recebeu sem surpresa a decisão agora do Órgão de Apelação, porque usou o mesmo argumento contra o Canadá na disputa entre Embraer e Bombardier e não foi bem sucedido. Estava claro que todos os aparelhos da Bombardier eram para exportação. Mesmo assim, na época o painel de especialistas e o Orgão de Apelação não viram evidências suficientes de ilegalidade, e insistiram que era preciso provar que, se o avião não fosse exportado, o subsídio do governo canadense não seria concedido para a Bombardier.
Na prática, ontem a UE ganhou pontos no seu litígio com a Boeing e não será obrigada a retirar os subsídios no prazo de 90 dias. Pode mesmo fazer mudanças domésticas em seus programas nos próximos meses e argumentar que está consistente com as regras da OMC. No entanto, os EUA comemoraram também como vitória a decisão da OMC, na sua campanha de 20 anos contra financiamentos que considera ilegais para a Airbus e que afetam a Boeing.
Para os EUA, os juízes da OMC confirmaram que "décadas de subsídios" fornecidos por países da UE para a Airbus "são inconsistentes com as regras da OMC".
Segundo comunicado americano, o Órgão de Apelação afirmou que a ajuda para o lançamento de novos aparelhos nos últimos 40 anos, assim como outros subsídios contestados pelos EUA, causaram "efeitos adversos para os interesses dos EUA e não são consistentes com as regras de subsídios da OMC".
Na guerra dos comunicados, a UE igualmente comemorou uma vitória para Airbus. "Mais importante é que o Órgão de Apelação concluiu que o apoio fornecido pela Alemanha, Espanha e Reino Unido para o lançamento do Airbus A380 não é subsídio proibido às exportações. Também rejeitou a reclamação dos EUA de que outros pagamentos para lançamento de aparelho eram subsídios à exportação", afirmou a UE.
Na linha oposta de seu colega americano, o comissário europeu de comércio, Karel de Gucht, declarou que a queixa central americana contra Airbus "foi rejeitada inteiramente", incluindo reclamações sobre subsídios para pesquisa e desenvolvimento e infraestrutura, ou parcialmente aceitas.
Por sua vez, o Brasil observa com inquietação o ciclo de litígios e constata que "não é possivel continuar com esse grau de imprevisibilidade e assimetria nas condições de competição", inclusive porque a Embraer sofre concorrência desleal.
Para o representante brasileiro, há duas maneiras de lidar com a situação atual no mercado de jatos. Uma é continuar num processo de litígios que não se esgota. Basta ver que a Boeing e a Airbus têm anos de disputa. A outra é negociar um entendimento sobre condições de apoio governamental a produção, com previsibilidade e plano nivelado da concorrência.
"A melhor forma é evitar um ciclo litigioso improdutivo e custoso, por meio de negociações que deem previsibilidade nas condições de apoio aos construtores aeronáuticos", afirma o embaixador Azevedo, que foi o principal negociador brasileiro de toda a disputa entre Embraer e Bombardier.
Recentemente, todos os grandes construtores aeronáuticos fizeram novo acordo na Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), para evitar uma guerra nas condições de financiamento de vendas das aeronaves. Agora, o próximo passo seria sobre o apoio na produção. Só que, enquanto o litígio jurídico não se esgota na OMC, é difícil começar a falar de acordo, porque não há clareza sobre as regras do jogo.
POPULARIDADE
Anulação de anistia enfraquece Mujica no Uruguai
Daniel Rittner | De Buenos Aires
Num momento de fragilidade política do presidente José Mujica, cuja popularidade caiu para o nível mais baixo em 14 meses de governo, a Câmara de Deputados do Uruguai está dividida para votar o fim da anistia dada a acusados de violações dos direitos humanos durante a ditadura no Uruguai (1973-1985). O Senado já aprovou a anulação da Lei de Caducidade. A Câmara deve votar o tema hoje.
Mujica - ele próprio um ex-guerrilheiro tupamaro mantido preso por mais de uma década e confinado em um poço por dois anos - é contra a anulação, que abriria caminho para o julgamento de ex-torturadores. A coalizão governista de esquerda Frente Ampla, que tem 50 dos 99 deputados, decidiu contrariar o presidente e apoiar o fim da anistia. A oposição, formada pelos partidos Nacional e Colorado, defende a vigência da lei atual. Tudo caminhava para uma votação apertada, mas previsível, até que o deputado governista Víctor Semproni - também vítima de torturas - anunciou, na segunda-feira, sua decisão de não acompanhar o partido e se abster.
O anúncio de Semproni complicou ainda mais a situação do presidente. Ao mesmo tempo em que defende publicamente a manutenção da anistia, Mujica tenta evitar uma crise na Frente Ampla, que costuma votar de maneira unida.
Ele aproveitou ontem um momento simbólico - as comemorações de 200 anos da batalha que iniciou o processo de independência e deu origem ao Exército do Uruguai - para fazer um apelo aos deputados. Reconheceu que existem "dores ocultas" e "mães que choram pelos ossos de seus filhos", mas fez um chamado à tolerância e pediu: "Necessitamos um país acima das diferenças. O ódio é cego e serve apenas para a barbárie".
Ainda sob o risco de encarar uma derrota, a oposição alega que a Frente Ampla desrespeita os resultados de duas consultas populares sobre a anulação da Lei de Caducidade, feitas em 1989 e em 2009. "É muito grave que se queira ignorar o voto dos uruguaios", disse ao Valor o presidente do Partido Colorado, Pedro Bordaberry, filho do ex-ditador Juan María Bordaberry e candidato derrotado nas últimas eleições presidenciais. "O povo disse não e agora [a Frente Ampla] propõe, de forma inconstitucional e antidemocrática, ignorar a decisão. Isso põe o Uruguai na rota de Venezuela e Cuba."
A Suprema Corte já se pronunciou sobre um caso específico e invalidou a aplicação da lei, mas pode ser acionada novamente. Em caso de empate na votação prevista para hoje, o regimento uruguaio prevê que se convoque uma sessão conjunta do Congresso, na qual se exige o mínimo de dois terços para aprovar o fim da anistia. A Frente Ampla não teria chances.
Toda essa confusão abalou a imagem de Mujica, que chegou ao poder em março de 2010, para o segundo governo de esquerda da história do país. A proporção de uruguaios que aprovam sua gestão caiu para 41%, muito abaixo dos 75% obtidos 14 meses atrás e nove pontos percentuais a menos do que ele tinha em fevereiro.
De acordo com Juan Carlos Doyenart, diretor da Interconsult, consultoria responsável pela pesquisa, Mujica tem transmitido "uma imagem de falar muito, filosofar, lançar questões sobre a mesa dizendo o que se deveria fazer, mas fazendo muito pouco". "A população em geral começa a reclamar que ele faça coisas, que um presidente está aí para mandar, para fazer, não somente para falar."
Mujica enfrenta problemas também na gestão da economia. O PIB cresce pelo nono ano seguido - o Uruguai foi um dos países latino-americanos que menos sentiu a crise global de 2008/2009 -, mas a inflação voltou a incomodar. Em abril, os preços tiveram alta de 8,34% no acumulado em 12 meses, bem acima dos 6% de teto da meta. Para combater a inflação, o governo está implementando uma impopular combinação de alta dos juros e cortes de gastos.
AVIAÇÃO
Deputados criticam má qualidade dos serviços das empresas aéreas
Tarso Veloso | De Brasília
Parlamentares e companhias aéreas desentenderam-se, ontem, em audiência pública, na Câmara dos Deputados, realizada para debater os serviços oferecidos pelo transporte aéreo. Os parlamentares criticaram a má qualidade dos serviços e as empresas defenderam-se das críticas alegando que a demanda cresceu muito além do esperado.
A diretora do Departamento de Proteção e Defesa do Consumidor do Ministério da Justiça, Juliana Pereira da Silva, disse que as reclamações contra empresas aéreas cresceram muito de 2009 para 2010. "Nós entendemos que o crescimento da demanda influencia sim, mas precisamos tentar reduzir as reclamações e resolver os problemas na hora", enfatizou.
Vários políticos criticaram a cobrança extra da "cadeira conforto", feita pela TAM, de R$ 30 reais, para utilizar as seis poltronas das saídas de emergência e as seis primeiras da aeronave.
O vice-presidente comercial da TAM, Paulo Cezar Castello Branco, disse que a cobrança das cadeiras é uma tendência mundial e que foi instituída ano passado. "As cadeiras só são vendidas no momento do check-in e é uma opção do passageiro pagar ou não", disse Castello Branco.
O deputado Romário Faria (PSB-RJ) questionou a questão da acessibilidade nos aeroportos. Um caso chamou a atenção na semana passada. A deputada federal Mara Gabrilli (PSDB-SP) não conseguiu desembarcar no aeroporto de Guarulhos pois o Ambulift, equipamento motorizado, com elevador, que transporta passageiros com deficiência, estava quebrado. A dificuldade para conseguir poltronas para uso de milhagem e compra de passagens por preços promocionais foram outros problemas debatidos, com críticas ao tempo de antecedência com que as passagens devem ser adquiridas. As empresas explicaram que, nos dois casos, a limitação ocorre pelo número reduzido de lugares para o sistema de fidelidade.
As companhias debateram os problemas em reunião conjunta com as comissões de Turismo e Desporto, de Viação e Transporte, de Fiscalização Financeira e Controle e de Defesa do Consumidor. Já foi agendada outra audiência pública para o dia 1º de junho com a presença da Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) e a Empresa Brasileira de Infra-Estrutura Aeroportuária (Infraero), para discutir a estrutura dos aeroportos.
INFRAESTRUTURA
Brasil é o 2º maior para investimento
Daniela D"Ambrosio | De São Paulo
A indústria brasileira da construção - incluindo obras civis e infraestrutura - é a segunda, no mundo, com maior potencial de investimentos. Estudo da consultoria global Roland Berger mostra que o Brasil deve ter crescimento de 5,1% entre 2008 e 2013 - para uma expansão mundial de 2,3% no mesmo período. O país só fica atrás da Ásia, cujo aumento no período é estimado em 7,1%.
Por conta disso, a indústria de máquinas e equipamentos pesados, que cresceu 23% em 2010, deve ter uma expansão de 15% entre 2010 e 2014, quando deve atingir vendas de 38,6 mil unidades. Em 2009, foram vendidas 18 mil unidades e, no ano passado, foram comercializadas 22,1 mil unidades.
O Programa de Aceleração do Crescimento (PAC), a Copa do Mundo de 2014 e as Olimpíadas de 2016 são os principais fatores de crescimento para o setor. "Há grandes déficits e necessidades de investimento a serem solucionadas, como portos e aeroportos", afirma Thomas Kunze, da Roland Berger.
Para dar conta dos grandes projetos que o Brasil vai sediar, além das melhorias estruturais, o país precisa sair de 19% do PIB de investimento em infraestrutura para 23%. Na China e na Índia, países onde o governo investe pesado em infraestrutura, o percentual foi de 47,8% e 32%, respectivamente, em 2009. Só em portos, o Brasil teria de receber de US$ 10 bilhões a US$ 15 bilhões em investimentos e em aeroportos, de US$ 8 bilhões a US$ 13 bilhões.
Ainda de acordo com o levantamento, os grandes competidores globais são os que lideram o mercado brasileiro. A Roland Berger aponta a Caterpillar como a principal fornecedora de máquinas e equipamentos pesados em 2009, com 3,87 mil unidades; seguida pela Case, com 2,88 mil; a Volvo, com 1,54 mil; e Komatsu, com 1,32 mil unidades vendidas. "Ainda que haja gargalos, há uma demanda latente por máquinas e equipamentos no Brasil", diz Kunze.
O Finame, do BNDES, que exige índice de nacionalização de 60%, dá um grande impulso ao setor.
DEVASTAÇÃO
Desmate na Amazônia volta a crescer e governo cria "gabinete de crise"
Mauro Zanatta | De Brasília
O desmatamento da Amazônia Legal voltou a crescer nos últimos nove meses encerrados em abril de 2011. Uma área do tamanho do município do Rio de Janeiro foi derrubada. Foram exatos 1.849 quilômetros quadrados de vegetação devastada entre agosto de 2010 e abril, segundo o Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe). O resultado é 26% superior aos 1.454 km2 registrados no período anterior.
Depois de alguns meses longe do foco principal dos desmatamentos, Mato Grosso voltou a ser apontado como vilão. O Estado respondeu por 40% da devastação registrada pelo sistema de detecção do Inpe. As derrubadas no maior produtor de grãos e fibras do país cresceram 43% na comparação entre os períodos - de 505 km2 para 730 km. Os campeões da derrubada foram os municípios de Alto Boa Vista, Nova Ubiratã, Bom Jesus do Araguaia, Cláudia, Santa Carmem, Porto dos Gaúchos e Peixoto de Azevedo e Marcelândia.
A corrida pelo aumento da produção de soja e milho, cujas altas cotações internacionais têm estimulado os produtores, e a expectativa de alterações nas regras do novo Código Florestal são parte da explicação. "A expectativa de impunidade e a demora na votação do Código Florestal foram ruins para nós", admite o secretário de Meio Ambiente de Mato Grosso, Alexander Maia. Ele diz que alguns resolveram "botar abaixo" a floresta antes da aprovação de uma eventual lei de "desmatamento zero" no Congresso. "A gente tinha medo disso."
O secretário, um oficial da Polícia Militar que comandou a Casa Civil na gestão Blairo Maggi (PR), afirma que tem combatido a devastação com 275 homens há mais de 30 dias. "Quem fez isso está sendo sancionado. Tenho 16 pessoas identificadas, com licenciamentos suspensos e sem benefícios. Vão para o Ministério Público. Nós agimos para evitar um mal maior. Não queremos que a detecção se concretize em aumento real do desmatamento no fim do ano", disse. Alexander Maia deu como exemplo um produtor de Nova Ubiratã, cuja residência oficial é no Paraná: "Ele derrubou 1.500 hectares de uma vez. Fomos lá e paramos tudo."
O sistema do Inpe detectou uma forte aceleração do desmatamento entre março e abril. O total passou de 103,5 km2 em 2010 para 593 km2 em 2011.
Diante disso, o governo federal anunciou ontem a criação de um "gabinete de crise" para ampliar as operações de combate ao desmatamento na região. Os ministros Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e Aloízio Mercadante (Ciência e Tecnologia) anunciaram o reforço do monitoramento com três novos satélites até 2014. "Quem tiver apostando no desmatamento para abrir novos pastos, vai ter o boi apreendido e doado para o Programa Fome Zero", afirmou Izabella.
O Instituto Brasileiro de Meio Ambiente (Ibama) informou que o desmatamento na Amazônia Legal será "sufocado" com o embargo de todas as áreas desflorestadas. As áreas embargadas terão ampla divulgação, o que impedirá a comercialização de gado ou grãos ali produzidos. Os compradores desses produtos também serão responsabilizados por crime ambiental.
Principais interessados na conservação da floresta, os produtores rurais defendem medidas fortes do governo. "Se for desmatamento ilegal, tem que ir para cadeia", diz o presidente da Associação Brasileira dos Produtores de Soja e Milho (Aprosoja), Glauber Silveira. "Precisamos de um Estado forte, de fiscalização e lei para obrigar a cumprir, punir e multar". Silveira afirma que a "sensação de impunidade" acaba por estimular o crime ambiental. "No campo e nas cidades", ressalva. A Aprosoja, segundo ele, tem trabalhado "intensamente" para levar a mensagem de preservação das florestas a todos os produtores do país. "O interesse de uma minoria que desmata não pode atrapalhar aqueles que querem fazer a coisa certa. Tem que aprovar o Código Florestal no Congresso e ninguém mais vai poder dizer que não sabia das regras."
OPINIÃO
Deixando os arquivos das Farc para trás
Chávez pagou um preço político pelas tensões com a Colômbia.
Será uma mina de ouro para os historiadores. Mas já conhecemos os principais pontos do livro de 240 páginas publicado em 10 de maio pelo Instituto Internacional de Estudos Estratégicos (IISS), um "think-tank" londrino, que reproduz e analisa o enorme volume de e-mails e dados eletrônicos capturados pelas forças de segurança colombianas no acampamento de Raúl Reyes, "ministro de Relações Exteriores" das Farc, que foi morto em 2008. Diversas publicações, inclusive "The Economist", divulgaram, três anos atrás, as principais revelações bombásticas obtidas dos arquivos das Farc: que autoridades da Venezuela de Hugo Chávez aparentemente ofereceram US$ 300 milhões e armas aos guerrilheiros, e toleraram a presença de acampamentos das Farc e de seus líderes em seu solo.
O IISS acrescenta alguns novos detalhes. Sugere, por exemplo, que as autoridades venezuelanas podem ter solicitado às Farc que fornecessem treinamento de guerrilha urbana a grupos de militantes chavistas e que assassinasse um adversário de Chávez. Mas não está claro se as Farc efetivamente fizeram isso, assim como não há comprovação de que a Venezuela realmente tenha pago à guerrilha os prometidos US$ 300 milhões.
A principal novidade em torno do livro do IISS diz respeito ao contexto em que ele veio à luz. Apenas um ano atrás, Chávez rompeu os laços diplomáticos com a Colômbia, depois que Alvaro Uribe, nas últimas semanas de sua presidência, decidiu repetir sua denúncia de colaboração da Venezuela com as Farc. Mas Juan Manuel Santos, o sucessor de Uribe, adotou uma abordagem mais sutil em relação ao problemático vizinho da Colômbia: uma política de détente e persuasão. A mudança foi simbolizada na véspera do lançamento do livro do IISS com a extradição, pela Colômbia, para a Venezuela, de Walid Makled, um traficante de drogas que alega ter ligações com o círculo íntimo de Chávez, e também procurado pelos EUA.
Deveria ser inaceitável para qualquer governo na América do Sul tentar minar um vizinho democrático colaborando com um grupo como as Farc, engajado em atividades terroristas e tráfico de drogas. O governo da Venezuela, e países que o apoiam, tentaram, em atitude idiota, desacreditar o livro do IISS, afirmando que os arquivos das Farc são uma criação da contrainteligência colombiana - alegação não substanciada por nenhuma evidência. Mas essa cortina de fumaça encobre uma mudança na atitude de Chávez, distanciando-se das Farc e aproximando-se do governo colombiano.
Não há dúvida de que o governo Chávez manteve uma íntima, embora complexa, relação com as Farc, por vezes usando-as como instrumento útil para nelas manter centrado o foco dos que considerava inimigos da Venezuela: a Colômbia de Uribe e o governo americano de George Bush. Pela primeira vez, no mês passado, Chávez reconheceu que alguns de seus aliados haviam colaborado com as Farc, mas insistiu em que "tudo se passou sem nosso conhecimento".
Mas Chávez pagou um preço político interno pelas resultantes tensões com a Colômbia, quando ele rompeu laços comerciais e econômicos. Não é coincidência que as áreas da fronteira ocidental da Venezuela são redutos da oposição. Diante de uma crucial eleição presidencial no próximo ano, em que a oposição tem uma chance real de ganhar, Chávez não pode antagonizar mais de um milhão de eleitores de origem colombiana.
Por sua parte, Santos tranquilizou Chávez no sentido de que a Colômbia não intervirá na Venezuela. Com efeito, sua oferta é que a Venezuela tem muito mais a ganhar com relações amistosas com um país vizinho de 46 milhões de habitantes do que com as Farc. Quando conversei com Santos em Bogotá, em março, ele descreveu os ganhos iniciais da Colômbia decorrentes dessa política: não apenas o governo venezuelano pagou suas dívidas pendentes para com os exportadores colombianos, como "pela primeira vez aplicou pressão às Farc". Os dois governos estão progredindo com projetos comuns na fronteira.
Até agora, de ambas as partes, essa reaproximação tem caráter tático. Mas Santos está praticando um jogo potencialmente de mais longo prazo. Ele reforçou a posição diplomática de seu país na América do Sul - uma iniciativa encapsulada na nomeação de uma colombiana, María Emma Mejía, para o cargo de secretário-geral da Unasul. A escalada de segurança de Uribe pôs fim aos sonhos delirantes de vitória militar acalentados pelas Farc. Mas os guerrilheiros continuam a ser mais do que um mero fator irritante. Um êxito nas negociações de paz com as Farc exige que aceitem a democracia. Isso significa que precisam ser derrotados não apenas militarmente, mas também política e diplomaticamente, algo em que Santos está agora empenhado
Michael Reid é editor de "Américas" na revista "The Economist" e autor do livro "O Continente Esquecido: A Batalha Pela Alma Latino-Americana (Editora Campus)
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