DECISÃO DO STF
Decisão abrirá mais debates
“Agora, cabe ao Congresso estabelecer as disciplinas legais e decorrentes desta decisão” Nelson Jobim, ministro da Justiça
MARCELLO CASAL/ABR
A decisão do Supremo Tribunal Federal (STF) de
reconhecer a união homossexual estável deve incentivar o debate sobre propostas de casamento civil entre pessoas do mesmo sexo e de tornar a homofobia um crime. O ministro Carlos Ayres Britto, relator da ação que resultou na equiparação dos direitos dos casais homossexuais com os heterossexuais, disse que a decisão tem muitas consequências que são impossíveis de prever.
Segundo o ministro, a adoção, o casamento, a sucessão e a declaração de imposto de renda podem ser exigidos pelos casais. “São tantas (possibilidades) que nossa imaginação é limitada para prever todas as hipóteses que podem ocorrer”. Britto esclarece que a decisão autoriza, inclusive, procedimentos como fertilização in vitro por casais homossexuais, e não é necessário autorização da Justiça, pois a decisão do STF é vinculante.
A decisão da Corte, segundo Britto, vale por si e não precisa de adendo e complemento do Legislativo. “Mas isso não é um fechar de portas para o Poder Legislativo, ele é livre para dispor sobre todas as consequências da nossa decisão”.
O presidente do STF, Cezar Peluso, chamou o Congresso Nacional à responsabilidade de legislar sobre os direitos dos homossexuais. “Há uma convocação que a Corte faz para o Poder Legislativo para que assuma essa tarefa a que não se sentiu muito propenso a exercer: regulamentar essa equiparação”. Segundo Peluso, a decisão do STF apenas supre uma lacuna normativa que precisa ser preenchida pela elaboração de uma lei. Ele entendeu que, para evitar injustiças maiores, a Corte aplicou a analogia da semelhança entre relações heterossexuais e homossexuais.
De acordo com o ministro Gilmar Mendes, algumas tentativas de regulamentação dos direitos homossexuais feitas por parlamentares esbarravam em impugnação no STF para aqueles que argumentavam que a lei seria inconstitucional. “A decisão do STF retira qualquer óbice neste sentido”, lembrou.
NO CONGRESSO
Na opinião do deputado Jean Wyllys (PSOL-RJ), a decisão do STF vai incentivar a discussão em torno da proposta sobre o casamento civil entre pessoas do mesmo sexo. Ele é o autor de uma proposta de emenda à Constituição (PEC) sobre o assunto no Congresso. O deputado considera que a decisão STF é uma vitória importante, mas, agora, é preciso fazer valer a decisão no texto da lei.
“É uma grande conquista num país onde o Legislativo, desde 1995, não legisla nada relativo ao direito LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais)”, disse. A PEC conta com mais de 70 assinaturas. Mas, para começar a tramitar, é preciso 171. “Apesar do fato de alguns deputados estarem vociferando contra a proposta nas redes sociais com argumentos pobres intelectualmente, acredito que, agora, possamos conseguir mais assinaturas”, disse.
O deputado Jair Bolsonaro (PP-RJ), conhecido por sua posição radicalmente contrária aos direitos dos homossexuais, disse que a PEC não tem chance de tramitar no Congresso Nacional. Ele criticou a decisão do STF e disse que “ninguém tem orgulho de ter um filho gay”.
O presidente da ONG Estruturação, ligada a causas LGBT (lésbicas, gays, bissexuais e transexuais), Júlio Cardia, acredita que a decisão do STF representa um marco na história dos direitos humanos no Brasil. “A decisão é um grande avanço na garantia dos direitos LGBT”, avalia. Vivendo com um parceiro norte-americano, Júlio diz que a decisão do STF irá contribuir para que o companheiro consiga cidadania brasileira. “Pretend o tornar nossa relação uma união estável o quanto antes. Assim, teremos nossos direitos e meu namorado conseguirá a cidadania brasileira”, conta.
O reconhecimento da união homoafetiva como entidade familiar, faz lembrar o direito a adoção. Segundo Eliene Bastos, diretora do INDFam, a adoção está entre os direitos concedidos aos casais heterossexuais que declaram união estável. Logo, se estende aos casais homoafetivos.
“Já há casos em que a Justiça permitiu a adoção. Com a decisão do STF, é possível que a Justiça passe a conceder a guarda em nome do casal. Mas, para adotar, é preciso entrar na fila. É um processo demorado”, esclarece Eliene Bastos.
Garantia para os militares
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, disse ontem que os direitos de militares com união estável com parceiro do mesmo sexo serão garantidos pelas Forças Armadas, como pensão em caso de morte.
“As Forças Armadas estão submetidas ao sistema constitucional, logo cumprirão as decisões legais. Agora, cabe ao Congresso estabelecer as disciplinas legais e decorrentes desta decisão”, disse o ministro em viagem ao Rio de Janeiro.
A Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) comemorou a decisão do STF. Para a entidade, a decisão é o reconhecimento dos princípios da igualdade e da dignidade do ser humano previstos na Constituição.
"Trata-se de um fato presente na vida da sociedade brasileira e que merecia reconhecimento pelo Judiciário no sentido de garantir os direitos decorrentes de uma situação semelhante à da união estável”, disse o presidente da OAB, Ophir Cavalcante, por meio de nota. HOMOFOBIA Após o reconhecimento dos direitos da união estável de casais do mesmo sexo, os homossexuais precisam agora reforçar suas reivindicações para que o Congresso torne a homofobia crime. Essa é a avaliação do ativista Claudio Nascimento, articulador de uma das ações julgadas pelo STF e superintendente de Direitos Individuais, Coletivos e Difusos do Estado do Rio de Janeiro.
Para ele, o STF enfrentou "um tema mais árido" que a homofobia. Agora, cabe ao Congresso, discutir a criminalização do preconceito contra gays, que gera inúmeras mortes no País. "Isso coloca o Congresso Nacional numa posição de vergonha, de escárnio, pois ficou 20 anos numa postura de retranca, sem avançar nessa matéria", completou o ativista. “Pesquisas mostram que a homofobia tem se refletido em assassinatos e agressões contra gays”, lembrou Cláudio Nacimento.
DESARMAMENTO
Campanha modesta
Previsão é feita com base nos recursos destinados às indenizações
Da Redação, com agências
Aprevisão do Governo Federal para a nova campanha nacional de desarmamento é tímida se comparada às outras duas edições anteriores. De acordo com o ministro da Justiça, José Eduardo Cardozo, o orçamento da pasta para pagamento de indenizações a pessoas que entregarem suas armas é de R$ 10 milhões.
Como o valor mínimo por compensação é de R$ 100 para armas de baixo calibre, o ministério dispõe de recursos para bancar no máximo 100 mil pagamentos. Nas campanhas anteriores, 2004/2005 e 2008/2009, foram recolhidas 550 mil armas, mas não foi informado o valor total pago em indenizações.
Cardozo disse que está torcendo para que tenha de cortar recursos em outras iniciativas do ministério para poder ampliar a dotação para pagamentos de indenizações. O ministro ainda afirmou que os cortes orçamentários de R$ 50,1 bilhões promovidos pelo Governo Federal em fevereiro não afetarão a campanha ou qualquer outra iniciativa da pasta. No caso do Ministério da Justiça, o contingenciamento soma R$ 1,52 bilhão.
"Que Deus me ajude a ter que cortar outras ações do ministério para colocar mais de R$ 10 milhões (para pagar indenizações). Nunca vi nenhum ministro gostar quando acaba um recurso. Eu não vou gostar se isso acontecer e vou encontrar mais recursos dentro do ministério para comprar mais armas", disse Cardozo, após a solenidade de lançamento da campanha no Palácio da Cidade, sede social da Prefeitura do Rio, em Botafogo, Zona Sul da cidade.
OPORTUNISMO
Apesar do orçamento modesto, a campanha deste ano tem inovações para tentar facilitar a entrega das armas. Será garantido o anonimato das pessoas que doarem seu armamento. As peças recolhidas serão inutilizadas de imediato, as indenizações poderão ser sacadas no dia seguinte à doação e o número de postos de entrega será ampliado, com o credenciamento de instituições e entidades da sociedade civil. A campanha vai até o dia 31 de dezembro.
Em discurso, Cardozo reclamou das críticas de que a antecipação do início da campanha era oportunista e demagógica. "Há quem diga que essa campanha é feita por oportunismo e me atribuem uma conduta demagógica. Quero dizer que se eu tivesse o poder de fazer uma campanha dessa sozinho, eu faria. Mas não é o caso. A campanha foi feita com parceiros", argumentou o ministro.
Depois, o ministro seguiu para Volta Redonda, no interior do Rio, para acompanhar a destruição de mais de mil armas nos fornos da Companhia Siderúrgica Nacional (CSN). Participaram do ato o governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), o prefeito da cidade, Eduardo Paes (PMDB), e representantes de associações e entidades.
Prevista para começar apenas em junho, a campanha foi antecipada em um mês como resposta ao massacre promovido por Wellington Menezes de Oliveira na Escola Municipal Tasso da Silveira, em Realengo, no dia 7 de abril.
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