DESTAQUE DE CAPA - ORÇAMENTO
Cortes atingem concursos de 2011 e moradia
Governo suspende todas as seleções previstas para este ano e reduz em 40% os recursos destinados para o programa Minha Casa, Minha Vida, uma das bandeiras da campanha de Dilma Rousseff. Além de exigir uma economia dos ministérios, enxugamento retira R$ 18 bilhões das emendas parlamentares.
Concursos só em 2012
Ministério do Planejamento anuncia suspensão das seleções públicas e prevê contratações apenas em casos emergenciais
Ivan Iunes - Tiago Pariz e Diego Abreu
O anúncio do detalhamento dos cortes de R$ 50 bilhões no Orçamento da União trouxe a estiagem de concursos públicos para o Executivo até o fim do ano. Dos cerca de R$ 5 bilhões previstos para a contratação de pessoal pela União, em 2011, a tesoura do Ministério do Planejamento limou R$ 3,5 bilhões. “Não vai ter concurso público nenhum neste ano. A não ser que tenha uma emergência. Até mesmo aqueles que já tinham sido realizados e que não tinham o curso de formação concluído não vão sair”, afirmou a secretária de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Célia Correa.
Nos próximos nove meses, os principais concursos com previsão de abertura pretendiam selecionar pelo menos 4 mil novos servidores (veja quadro). O corte foi justificado pela necessidade de o governo federal ajustar as contas públicas para frear o crescimento e conter a volta da inflação. A porteira fechada para os concursos não afeta diretamente as seleções para o Judiciário e o Legislativo, mas por conta do clima de ajuste fiscal, as seleções feitas pelos dois Poderes também devem ficar para o ano que vem. Do corte anunciado ontem pelos ministros da Fazenda, Guido Mantega, e do Planejamento, Miriam Belchior, cerca de R$ 18 bilhões virão de investimentos previstos em emendas parlamentares e R$ 32 bilhões de despesas com custeio, como a contratação de novos servidores e abertura de concursos públicos.
A notícia da escassez nos concursos até o fim do ano frustrou quem se dedica em tempo integral às seleções públicas. O autônomo Pedro Paulo Ferreira, de 25 anos, intensificou os estudos no começo do ano com a esperança de passar na seleção para técnico do Senado, cujo edital estava previsto para ser publicado neste semestre. Embora não faça parte do corte anunciado pela União, a seleção também foi adiada pelo presidente da Casa, José Sarney (PMDB-AP). “Gastei R$ 2,8 mil com cursinho e tenho me dedicado sete horas por dia para estudar. O governo deveria cortar outras coisas ou deixar de dar aumento para os próprios ministros, deputados e senadores. Só não poderia cortar os concursos”, disse Ferreira.
Segundo o autônomo, que atualmente trabalha com o pai na Ceasa, a suspensão dos concursos públicos é um balde de água fria para a maior parte dos concurseiros. “Fico frustrado com a notícia. É desesperador. Muita gente ficou sem rumo”, desabafou. Além dos concursos do Judiciário e do Legislativo, ficam livres dos cortes as seleções de empresas estatais sem dependência orçamentária da União, como a Petrobras e os Correios. De acordo com o Planejamento, os reajustes salariais já negociados com as categorias serão mantidos, mas novos aumentos estão descartados. “Não vai haver nenhum tipo de calote este ano”, garantiu Célia. Entre os reajustes na fila de votações do Congresso, está o de 56% para os servidores do Judiciário.
“Lado bom”
Matriculada em um cursinho para o cargo de auditor tributário, a servidora do Ministério das Comunicações Dilcimar Resende de Mello, de 47 anos, preferiu ponderar a decisão do governo. Ela espera que os cortes não interfiram no edital da seleção para auditor, que tem prova marcada para abril, mas considera que um adiamento curto, por apenas um ou dois meses, seria providencial. “Estou estudando firme desde novembro. Se adiasse por um mês, seria até bom para estudar mais, mas se ficar para o ano que vem, vai ser desmotivante”, afirmou.
Há, porém, quem esteja comemorando a decisão do governo de cortar os concursos. É o caso da psicóloga Karla Couto, 29 anos, que estuda há cinco meses, de cinco a seis horas por dia, para a seleção do Tribunal Regional Federal da 1ª Região. Em princípio, a seleção não corre riscos. Apesar de ter deixado um emprego na iniciativa privada, ela enxerga o “lado bom” de não haver concursos em 2011. “O lado bom é que muita gente vai desistir de estudar e eu vou ter mais tempo para me preparar”, disse. Opinião semelhante tem a telefonista Liviane Félix, 26, que estuda há um ano para concursos diversos, mas avalia que precisa de mais tempo para atingir o objetivo de se tornar servidora pública. “Independentemente dos cortes, o importante é não parar, porque uma hora os concursos vão sair e
Caso a caso
O governo federal pretende analisar caso a caso as excepcionalidades à regra de proibição de novos concursos até o fim do ano. Seleções que se destinem à substituição de terceirizados definidas pela Justiça ou a contratação de pessoal para formação de órgãos recém-criados, como a Autoridade Pública Olímpica, devem escapar da regra de freio nas contas com pessoal. Algumas estatais que não dependem dos recursos da União também podem acionar o freio nas nomeações de aprovados, como é o caso da Petrobras e dos Correios, mesmo que a determinação do Planejamento não atinja as empresas diretamente.
Na berlinda
O governo cortou R$ 3,5 bilhões da previsão de despesas com contratação de servidores e concursos, ou 70% do total previsto para 2011
NO FIO DA TESOURA
Veja a lista de seleções que estão sob risco
-Órgão - Vagas
-INSS - 2.500
-Polícia Federal - 1.000
-Empresa Brasil de Comunicação - 400
-Ibama - 362
-Ancine - 100
-Biblioteca Nacional - 44
Total - 4.406
EM BANHO-MARIA
Confira os concursos em andamento ou que aguardam as nomeações de aprovados
-Ministério Público da União - 6.804**
-Marinha (Aprendizes-Marinheiros) - 2.200
-Inmetro - 253
-Ministério do Meio Ambiente - 200
-Anatel - 141
-Aneel - 139
-Ministério do Turismo - 112
-marinha Mercante - 100
-Infraero - 99
-CNPq - 95
-Embratur - 84
-Abin - 80
-Marinha (Segundo Oficial de Náutica) - 60
-Instituto Rio Branco - 26
Total - 10.393
**até 2014
Defesa sem R$ 4,3 bi
O corte de R$ 4,3 bilhões no orçamento do Ministério da Defesa, R$ 300 milhões superior ao anunciado inicialmente, vai afetar a aquisição de submarinos e helicópteros de tecnologia francesa e aviões cargueiros, segundo a secretária de Orçamento Federal do Ministério do Planejamento, Célia Correa. Como havia antecipado o Correio, o Prosub, programa de construção de quatro submarinos convencionais e um de propulsão nuclear, terá os repasses diminuídos. A compra faz parte de um acordo com a França e prevê multa para atraso na liberação de recursos. Segundo Célia Corrêa, o Ministério da Defesa terá de renegociar os contratos e alongar o cronograma de pagamentos para compensar a escassez de recursos. “Em função da situação fiscal, vamos ter de rever. Não vamos ter condição de pagar”, disse a secretária. O Ministro da Defesa, Nelson Jobim, negou a paralisação do Prosub, e do cargueiro KC-390, produzido pela Embraer. “O Prosub continuará. O KC-390 tem que continuar, porque nós temos um timing importante, que é 2018, quando 1,5 mil Hércules saem do mercado”, afirmou Jobim.
No anúncio do detalhamento do corte, o governo previu uma redução de R$ 19,1 bilhões nas receitas em relação ao que foi aprovado pelo Congresso. Mas, levando-se em conta as previsões de arrecadação que o Executivo colocou no projeto de lei do Orçamento enviado em agosto do ano passado, há um aumento de R$ 8,2 bilhões na previsão de receita. O maior crescimento ocorre na Contribuição Social do Lucro Líquido e na Cofins. Foram R$ 3 bilhões a mais para a CSLL e R$ 5,7 bilhões para a Cofins, na comparação com os dados informados pelo governo no projeto de lei. O aumento da previsão de arrecadação está em linha com o crescimento de 15,34% na arrecadação tributária de janeiro, na comparação com o mesmo período de 2010.
(TP)
AVIAÇÃO
TAM reajusta passagens
Empresa aérea avisa que bilhetes ficarão, em média, 5% mais caros ainda neste mês, por causa da alta do querosene
Gustavo Henrique Braga
O presidente da TAM, Líbano Barroso, admitiu ontem que a empresa reajustará os preços das passagens ainda neste mês, repassando à clientela o aumento do querosene de aviação. O combustível vem sendo remarcado desde meados de janeiro, quando estourou a crise no Norte da África e no Oriente Médio e as cotações do petróleo dispararam. A expectativa é de que os bilhetes emitidos pela maior companhia aérea do país fiquem, em média, 5% mais caros. “Vamos repassar o efeito (da alta) do combustível tanto para as passagens de rotas internacionais quanto para o Brasil”, disse Barroso. Ele destacou que, com os reajustes, a tendência é de que as receitas da empresa em fevereiro fiquem acima do faturamento de janeiro, mesmo que a taxa de ocupação das aeronaves caia um pouco em função dos preços maiores dos bilhetes. O executivo evitou, porém, fazer projeções para o restante do ano. Mas admitiu que tudo dependerá o comportamento do petróleo no mercado internacional.
Somente na semana passada, o barril do óleo registrou valorização superior a 14%, a maior alta para o período em dois anos. A instabilidade na Líbia, que tem a oitava maior reserva de petróleo do mundo, levou a cotação do produto a encostar nos US$ 120. Mas o compromisso da Arábia Saudita de suprir a oferta líbia ajudou a derrubar a cotação do barril para a casa dos US$ 100 em Nova York e de US$ 110 em Londres.
Casamento
A TAM registrou, no ano passado, lucro líquido de US$ 637,4 milhões, com queda de 48,9% em relação a 2009. O recuo decorreu, principalmente, da valorização do real frente ao dólar. Para 2011, no entanto, a aposta é de incremento nos resultados. Segundo Barroso, a empresa aposta em crescimento na demanda doméstica entre 15% e 18%, depois de um salto de 23,5% em 2010. Ele destacou que TAM manterá firme o processo de corte de custos. “Vamos aumentar em 30 minutos o tempo de uso das aeronaves e de tripulantes, o que dilui custos fixos, e reduzir o tempo dos aviões em solo para diminuir gastos com taxas aeroportuárias”, disse, ressaltando que foco da TAM continuará sendo a rentabilidade.
A empresa aumentou a sua participação de mercado em relação à Gol, com uma fatia de 43,35% contra 37,27% da rival. “Nossa liderança no mercado doméstico é confortável”, alfinetou Barroso. A TAM está em processo de fusão com a chilena LAN. A operação está sendo avaliada por um tribunal de defesa da concorrência do Chile, que decidiu, no fim de janeiro, abrir um processo depois do pedido de consumidores daquele país. O casamento não pode avançar antes que o tribunal o aprove.
Aeroportos no limite
O ministro da Defesa, Nelson Jobim, admitiu ontem que os aeroportos brasileiros operam no limite, mas afirmou que eles estarão preparados para receber o aumento da procura por causa da Copa do Mundo de 2014 e dos Jogos Olímpicos de 2016. Segundo ele, não há motivo para alarde. As más condições de operação dos terminais são apontadas como um dos principais problemas de infraestrutura para os dois megaeventos esportivos. Os organizadores das competições já alertaram para a necessidade de modernização, de obras de expansão e de melhoria no atendimento e no conforto.
“A infraestrutura está sem dúvida no limite e temos que ampliar. Estamos respondendo a isso”, disse Jobim, acrescentando que a Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (infraero) está fazendo investimentos para atender tanto ao aumento natural do mercado brasileiro quanto para suprir a demanda adicional dos eventos. “Tivemos aumento substancial de demanda no ano passado e temos uma programação de investimentos que suportará o crescimento da procura por conta dos eventos.”
Jobim citou, como exemplos das alterações, a unidade modular que já funciona no aeroporto de Florianópolis para ampliar a capacidade e instalações semelhantes que serão instaladas em São Paulo, Brasília e outras cidades sensíveis. “Esses módulos são bons, ajudam e tem conforto”, disse.
ORIENTE MÉDIO
Brasil eleva o tom do discurso
Renata Tranches
Durante sua participação na 16ª sessão do Conselho de Direitos Humanos das Nações Unidas (ONU), o Brasil adotou um tom mais duro para condenar os regimes autoritários do Oriente Médio e do norte da África. A postura confirma as indicações de que a política externa brasileira, sob a Presidência de Dilma Rousseff, vai contrastar com posicionamentos mais benevolentes do Brasil relacionados ao tema durante o governo Luiz Inácio Lula da Silva.
Em seu discurso, a secretária de Direitos Humanos, Maria do Rosário, afirmou que “nenhum governo se sustentará pela força e pela violência”, e pediu o “diálogo político” para resolver a crise nos países árabes — como na Líbia, que era o tema da reunião. A ministra argumentou que as questões econômicas, políticas e sociais não devem se sobrepor às discussões envolvendo suspeitas de violações dos direitos humanos e crimes contra a humanidade, como estão sendo vistos os ataques de militares leais a Muamar Kadafi contra manifestantes desarmados.
“Essas situações estiveram ausentes de deliberação deste Conselho”, afirmou Maria do Rosário. Ela acrescentou ainda que “o Brasil considera, e tem defendido, que este conselho debata as violações de direitos humanos em todos os países, onde quer que elas ocorram. Governo algum se sustentará pela força ou pela violência”. Segundo a ministra, no governo Dilma, direitos humanos não se negociam e a presidente é “intransigente” com o tema.
Na administração passada, em algumas ocasiões, o Brasil se absteve de condenar países por questões relacionadas aos direitos humanos, como foram os casos de Cuba, Irã, Coreia do Norte, Mianmar, Sudão e Sri Lanka. O que se viu ontem no discurso da ministra, em Genebra, foi uma mudança de tom na condução da política externa. Na opinião do professor de relações internacionais Héctor Luis Saint-Pierre, da Universidade Estadual Paulista (Unesp), enquanto o governo Lula defendia o princípio da soberania, segundo o qual se tratava de questões internas de cada país, o governo Dilma vê a defesa dos direitos humanos uma maneira do Brasil se projetar internacionalmente. “Pode-se dizer que essa será a cor da política externa brasileira no novo governo Dilma”, disse Saint-Pierre.
OPINIÃO
Sinais dos tempos
Carlos Alexandre
Tal como o egípcio Hosni Mubarak, o ditador Muamar Kadafi se apega aos últimos nacos de poder para se manter no governo em Trípoli. Isolado politicamente, o tirano se lança à batalha final antes de ser executado ou condenado. A onda revolucionária que varre o mundo árabe impressiona pela força e rapidez. Mas assim como todos os levantes históricos, a revolução Facebook terá uma segunda fase, o momento de acomodação. E então começam os desafios. Saddam Hussein foi extirpado do poder em 2003. Passados oito anos, o Iraque ainda tenta construir uma democracia, às custas de bilhões de dólares norte-americanos. Não há previsão de tempo tranquilo para Tunísia, Egito, Líbia, Iêmen e outras nações em ebulição.
O vendaval político no Oriente Médio parece, à primeira vista, um fenômeno distante da realidade latino-americana. Mas os fatores que levaram à revolta árabe também são visíveis em países vizinhos ao Brasil. A profunda crise econômica, as restrições à liberdade de expressão, as reiteradas perseguições à mídia independente e o prolongamento no poder são temas recorrentes no noticiário da Venezuela, por exemplo. Não seria surpreendente se um movimento insurgente a Hugo Chávez ganhasse força, tal qual ocorreu na praça Tahrir. Outro país latino-americano com risco de instabilidade é Cuba, após longo período sem garantias democráticas. Recentemente, o regime imposto por Fidel Castro começou um processo de abertura política, mas as greves de fome de dissidentes como Guillermo Fariñas e Orlando Zapata — esse último morreu em 2010, após 85 dias de inanição — são exemplos da dolorosa transição de Cuba para um regime com menos autoritarismo e mais liberdade. A democracia também está fragilizada no Haiti. Há décadas castigado pela ditadura e ainda seriamente abalado pelo terremoto de 2010, o país abriga um novo fator de instabilidade política. A volta de Jean-Claude Duvalier, o Baby Doc, representa um fantasma do regime de linha-dura. Esse cenário contribui para uma tensão entre os atores políticos. A revolta árabe em 2011 não pode ser vista como um fenômeno isolado. Trata-se de um sinal dos tempos, que pode soprar nas nossas cercanias muito antes do que se poderia imaginar.
NOTAS
ARGENTINA
Videla no tribunal
O ex-ditador argentino Jorge Rafael Videla, de 85 anos, e outros ex-militares sentaram-se ontem no banco dos réus, acusados de um plano sistemático de roubo e de mudança de identidade de 500 bebês, filhos de desaparecidos — a maioria nascida em prisões clandestinas. “Fomos a herança de guerra do regime”, declarou à France-Presse Leonardo Fossati, testemunha de acusação e vítima. Os pais de Fossati, ambos desaparecidos, militavam na União de Estudantes Secundários e na Juventude Peronista quando foram sequestrados, em 1977. “Nasci em uma delegacia. Uma família de muito boa-fé me adotou. Mas, graças às Avós da Praça de Maio encontrei minha verdadeira família e minha identidade”, disse. O julgamento durará até o fim de ano e tentará provar a existência de um sistema destinado a se apropriar de menores. Cerca de 30 mil pessoas foram presas ou desapareceram durante a ditadura.
PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL
Morre último veterano
O último veterano norte-americano da Primeira Guerra Mundial, que mentiu sobre sua idade para conseguir se alistar no exército morreu aos 110 anos. Um representante dos familiares de Frank Buckles disse que o veterano faleceu de causas naturais no domingo, em casa, perto de Charles Town, na Virgínia Ocidental. Buckles havia comemorado seu 110º aniversário em 1º de fevereiro — e, segundo parentes, já não estava bem de saúde desde o fim do ano passado. Buckles foi motorista de ambulâncias no Exército americano durante os combates da Primeira Guerra Mundial na Europa. Antes do fim do conflito, alcançou o status de cabo. Durante a Segunda Guerra Mundial, foi capturado pelos japoneses nas Filipinas, tendo sido mantido prisioneiro por mais de três anos.
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