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segunda-feira, 28 de março de 2011

26 de março de 2011 - CORREIO BRAZILIENSE


GOVERNO
Impasse na nova Lei de Segurança Nacional
Elaboração do projeto com as mudanças na legislação, criada na época da ditadura militar, está empacada por falta de consenso sobre a criminalização de atividades terroristas

Edson Luiz

Até o fim do ano, a Lei de Segurança Nacional (LSN), uma das mais temidas do país, e ainda em vigor no país, será transformada em Lei para a Defesa da Soberania e do Estado Democrático de Direito. Uma equipe interministerial trabalha em um texto de projeto de lei desde 2010. Mas durante as fases de discussões, alguns pontos foram motivos de polêmicas, como a criminalização do terrorismo, que ficou sem consenso entre os participantes do grupo. Criada em 1983, durante o regime militar, a LSN atingiu, entre outros, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e o sindicalista Chico Mendes, morto há 22 anos.
Dentro do governo, o assunto é tratado com cautela. Apesar de ter nomeado um grupo para discutir o texto com outros setores, o Ministério da Defesa diz que a coordenação dos trabalhos é feita pela pasta da Justiça, que também não fala sobre o assunto. O principal entrave que surgiu até agora é a questão envolvendo as atividades terroristas. A área militar defende que o tema seja criminalizado dentro da futura Lei para a Defesa da Soberania e do Estado Democrático de Direito, enquanto que os juristas são favoráveis à criação de uma legislação específica.

Para o advogado Pierpaolo
Bottinni, é preciso cautela na discussão do terrorismo. “É preciso saber se é conveniente fazer isso por meio da Lei de Segurança Nacional”, diz o jurista, que foi secretário de Reforma do Judiciário do Ministério da Justiça. Segundo Bottinni, o mesmo tema é discutido dentro da Lei de Lavagem de Dinheiro. “Tem que ver de que forma isso pode ser feito (a discussão), e de que maneira isso será trabalhado”, acrescenta o jurista.
De autoria do então presidente João Baptista de Figueiredo, a última aplicação da Lei de Segurança Nacional ocorreu há cinco anos, quando mais de 100 integrantes do Movimento de Libertação dos Sem-Terra (MLST), que depredaram dependências da Câmara, foram presos e acusados de crime político. Além disso, em outros momentos, mesmo depois da redemocratização do país, o instrumento jurídico chegou a ser usado. Em 1987, o ataque com pedras ao ônibus onde estava o então presidente José Sarney terminou com o enquadramento de duas pessoas na LSN. Em 2000, oito sem terras foram indiciados também pela lei.

Acre
Mas o uso abusivo da Lei de Segurança Nacional ocorreu no regime militar. Era uma forma de intimidação aos opositores da ditadura. No caso do ex-presidente Lula, a LSN era ainda mais rigorosa, já que estava em vigor uma legislação de 1967. O ex-presidente estava em Brasileia, no Acre, com o então presidente do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Xapuri (AC), Chico Mendes. Lula era também sindicalista, mas representava os metalúrgicos de São Bernardo do Campo, e protestava contra a morte de outro líder dos seringueiros, Wilson Pinheiro, assassinado por fazendeiros da região. A ditadura militar considerou a manifestação como uma incitação à violência. Lula acabou processado, mas o processo prescreveu e não houve condenação.

Como é
A pena mais alta prevista na Lei de Segurança Nacional é para crimes contra a vida que resultem em morte da vítima. Confira:

Causar guerras
Negociar com estrangeiros guerras ou hostilidades contra o Brasil. Nesse caso, a pena é de três a 15 anos de prisão, que dobra se realmente ocorrer a guerra. Se houver lesões corporais o acréscimo da prisão é de um terço, mas, se resultar em morte, sobe para 30 anos de reclusão.

Espionagem
O crime de espionagem tem a mesma pena para quem entrega documentos sigilosos para outras nações, que é de três a 15 anos de detenção.

Sabotagem
A reclusão é de três a 10 anos de prisão para quem fizer qualquer tipo de sabotagem e aumentará pela metade se houver dano aos meios de defesa e segurança nacional. A pena triplicará se resultar em morte.

Organização política
A lei, pelo seu artigo 16, proíbe a manutenção de associação, partido, comitê, entidades de classes, entre outros, que tenha como objetivo mudar o regime político do país. A pena é de um a cinco anos de prisão.

Vandalismo político
Devastar, saquear, extorquir, roubar, sequestrar, manter em cárcere privado, entre outras coisas, para financiar organizações clandestinas pode resultar em até 10 anos de prisão.

Inverdades
Caluniar ou difamar uma alta autoridade dos Três Poderes, como os presidentes da República, do Senado, da Câmara e do Supremo Tribunal Federal (STF), pode resultar em até quatro anos de prisão.


MEIO AMBIENTE
Financiamento de Angra 3 a perigo
Governo alemão pode rever os empréstimos destinados à usina brasileira e comprometer o andamento da obra

Vinicius Sassine

O governo brasileiro fez a opção por ignorar a decisão da Alemanha de suspender o funcionamento de usinas nucleares construídas antes da década de 1980, apesar das semelhanças entre os empreendimentos do tipo nos dois países e do acordo bilateral existente desde 1975 — que prevê o suporte financeiro dos alemães na construção da usina Angra 3, em Angra dos Reis (RJ). Agora, duas semanas após a tragédia nuclear no Japão e a suspensão por três meses das operações em sete reatores nucleares no país europeu, o Ministério da Economia germânico decidiu reavaliar as garantias aos financiamentos previstos para Angra 3.
O montante envolvido é de 1,3 bilhão de euros (mais de R$ 3 bilhões), dinheiro que seria utilizado na aquisição de tecnologia, produtos e serviços para a usina brasileira. O financiamento da Alemanha equivale a um terço do dinheiro previsto no Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) para Angra 3, cuja retomada da construção começou no ano passado. Se a Alemanha decidir pela suspensão do financiamento, a terceira usina nuclear brasileira poderá não sair do papel.
O governo da chanceler Angela Merkel decidiu suspender as operações nos reatores nucleares mais antigos do país depois do acidente em Fukushima, no Japão, em decorrência de um terremoto seguido por um tsunami. As três usinas brasileiras — Angra 1, 2 e 3 — têm projetos anteriores à década de 1980. Angra 2 e Angra 3 são citadas no acordo bilateral de 1975 e têm a mesma tecnologia dos reatores alemães. Mesmo assim, as estatais brasileiras responsáveis pelo funcionamento das usinas e os ministérios que definem o programa nuclear do país não enxergaram qualquer razão para mudanças nos procedimentos de segurança, ou mesmo para a suspensão das atividades. O máximo que será feito é uma verificação desses procedimentos.
Em comunicado divulgado na última quarta-feira, o Ministério da Economia da Alemanha informou que cobrará do governo brasileiro informações sobre “procedimentos” e “padrões” que serão adotados em Angra 3. Como a usina é um projeto da década de 1970 — inclusive com equipamentos adquiridos naquele período —, a pasta germânica quer saber o que foi feito para tornar Angra 3 uma usina nuclear segura. Essa é uma condicionante para a manutenção do bilionário suporte financeiro ao projeto.
“O governo discute, agora com mais intensidade, essa fiança federal para crédito de exportação com relação à tecnologia nuclear”, diz um comunicado do Ministério da Economia. Dentro da Eletrobras Eletronuclear, estatal responsável pela construção de Angra 3, gestores admitem que a decisão de suspender as atividades dos reatores nucleares no país europeu deve interferir nos financiamentos previstos para Angra 3. Outros órgãos internacionais, porém, podem decidir fazer parte do empreendimento, segundo esses gestores. Oficialmente, a estatal diz que não houve qualquer contato da agência de crédito alemã para reavaliar a participação. A Eletrobras também afirma não ter sido comunicada oficialmente e que, por isso, não comentaria o assunto.

Serviços
Segundo a Eletrobras Eletronuclear, os serviços de engenharia e as aquisições de equipamentos no mercado internacional custarão 1,5 bilhão de euros (R$ 3,5 milhões), o que só será viável por meio de financiamentos internacionais. O crédito deve ser providenciado por um pool de bancos europeus, tendo à frente o francês Societé Generale. A garantia dos empréstimos, conforme o acordo firmado, é responsabilidade de uma agência alemã de crédito à exportação, a Hermes. O objetivo do governo germânico, ao garantir essa fiança, é estimular as exportações do país.

Obras
O início das obras de Angra 3 foi em 1984, mas logo foram paralisadas. O projeto foi retomado em 2010, no âmbito do PAC, e é uma das prioridades da política de expansão de geração de energia do governo Dilma. Se ficar pronta em 2015, conforme o previsto, Angra 3 incrementará em 70% a geração de energia nuclear produzida na região. Os gastos previstos no PAC são de R$ 9 bilhões.


MUNDO
Irã acusa EUA de pressionar a ONU
Regime islâmico critica decisão de nomear relator para avaliar o país, mas omite crítica direta ao governo brasileiro

» Isabel Fleck

Uma decisão “injusta”, “ilegítima” e tomada sob pressão dos Estados Unidos. Foi assim que o Irã interpretou a resolução do Conselho de Direitos Humanos (CDH) da ONU de designar um relator especial para investigar a situação do país. Das 47 nações representadas no organismo, 22 votaram a favor — inclusive o Brasil —, sete foram contrários e 14 se abstiveram. Segundo a chancelaria iraniana, alguns países “em dúvida” teriam cedido à pressão dos EUA, acusados também de manter uma postura “dúbia”, ao apontar violações de direitos humanos em outros países e não respeitá-los no próprio território. No entanto, nenhuma autoridade iraniana singularizou o Brasil nem procurou o governo brasileiro para falar sobre o voto, que rompeu uma política de sete anos se abstendo na votação de resoluções contrárias ao Irã.
O chanceler iraniano, Ali Akbar Salehi, declarou por meio de seu porta-voz, Ramin Mehmanparast, que a decisão do CDH foi tomada, “apesar das dúvidas de alguns países, sob pressão dos Estados Unidos”. O objetivo seria “fazer pressão sobre a República Islâmica para desviar a atenção sobre as violações dos direitos humanos no Ocidente, em particular nos EUA”.
O presidente da Comissão de Política Externa e Segurança Nacional do Majlis (parlamento), Ala’eddin Boroujerdi, também classificou a votação em Genebra como “inaceitável, irreal e completamente motivada por razões políticas”. “Uma resolução como essa não tem valor judicial nenhum”, acrescentou, adiantando que o Irã não deve aceitar a visita de nenhum relator da ONU.

Dilma e Obama
No dia em que Teerã acusou os países favoráveis à resolução de cederem à pressão de Washington, a presidente Dilma Rousseff recebeu telefonema do colega americano, Barack Obama. O porta-voz do Planalto, Rodrigo Baena, garantiu à imprensa que o tema do Irã e da votação não foi abordado. Segundo Baena, Obama ligou para agradecer a hospitalidade “maravilhosa” e convidar a anfitriã a visitar Washington — o que foi prontamente aceito por Dilma. A viagem não tem data marcada, mas deve ocorrer entre agosto e outubro. No telefonema, de cerca de cinco minutos, a presidente agradeceu as “palavras gentis” do visitante sobre ela, no discurso que fez no Rio de Janeiro, e classificou a vinda de Obama como um “marco” nas relações bilaterais.
O fato de a visita de Obama ter antecedido em poucos dias o voto do Brasil no CDH, contrariando um governo considerado “amigo”, suscitou especulações sobre a ligação entre os dois eventos e um possível acerto entre os presidentes. A possibilidade foi negada pelo Itamaraty, que destaca a ênfase que Dilma já dava aos direitos humanos antes mesmo de tomar posse. A chancelaria, contudo, admite que há  “convergência” e  “identificação” da postura assumida pelo novo governo com a de outros países, como EUA e Suíça.
Para o embaixador Roberto Abdenur, que esteve à frente da representação brasileira em Washington entre 2004 e 2007, o Brasil, de fato, não tomou essa atitude “para atender aos americanos”. “A presidente Dilma já tinha sinalizado esse voto quando, ainda no governo anterior, discordou da posição seguida na Assembleia Geral (quando o Brasil se absteve de votar)”, disse. Agora, os países membros poderão sugerir nomes para o cargo de relator especial, e a decisão será do presidente do conselho, o tailandês Sihasak Phuangketkeow.
O escolhido será responsável por elaborar um relatório, que poderá servir de base para possível censura do CDH a violações de direitos humanos no país.
 FONTE: CORREIO BRAZILIENSE

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