Pesquisar

segunda-feira, 28 de março de 2011

26 de março de 2011 - JORNAL DO BRASIL


COISAS DA POLÍTICA
Wilson Figueiredo

Cem dias e cem noites
A julgar pela boa impressão geral, os cem dias de expectativa popular em torno de novos governos estão sendo suficientes para o brasileiro médio firmar impressão favorável à presidente Dilma Rousseff. Só agora o eleitor está conhecendo a presidente, que tem, cada vez menos, a ver com a candidata. E ainda sobra o suficiente para dar o que pensar ao ex-presidente Lula, que não contava com efeito favorável por esse lado em que ela se tem dado melhor do que a encomenda (e ele nem tanto).
Durante a campanha eleitoral foi impossível distinguir onde terminaria o efeito Lula em cascata, e se firmaria, por parte de Dilma Rousseff, um novo estilo de lidar com as pessoas e as situações. Lula inibia a personalidade oculta da candidata. Depois da eleição e antes da posse, o ex-presidente certamente estranhou, mas fez de conta que não lhe dizia respeito. Eram ainda, ou pareciam, recursos de campanha que se dissipariam com o tempo. Por parte de Dilma, o respeito, desde logo, se voltou para os cidadãos com prioridade – esta, sim – republicana.
A candidatura que pesava sobre a candidata não sobrecarrega a presidente eleita. Ao contrário. O período de carência, a se encerrar em duas semanas, deixa saldo superior à expectativa de um mandato constrangido por outro. A ter de optar entre a Dilma candidata e a Dilma presidente, não há dúvida que o cidadão tem razões de sobra para entender o fato como fenômeno político a ser levado em conta, daqui por diante, sob outra ótica. Em sua origem, os cem dias de carência têm sido suficientes, onde quer que ocorram, para governantes que chegam ao poder por via eleitoral. Não é mais exclusividade americana.
O presidente Roosevelt foi o primeiro a reservar cem dias do seu primeiro mandato para equacionar em 1933 o governo que lhe valeria quatro eleições sucessivas a partir de uma economia e uma sociedade abaladas pela crise de 1929,com tudo o que se passou sob a recessão e o desemprego. Desde então, entendem-se suficientes os cem dias para um novo governo sair da prancheta e passar à ação. O caráter de prazo de carência é menos severo entre nós, mas não impede os meios de comunicação de disputarem as informações sobre ministros e medidas marcantes no começo de todos os governos. A questão passa a ser como terminam. Ou quando são importunados pela fúria continuísta, que faz plantão onde se admite a reeleição. Pode ser que um dia Lula, que tratou como paródia a única sucessão de que não participou como candidato, veja de modo diferente o que ainda não acabou de se passar.
Por aqui, o presidente Jânio Quadros, cuja carência era outra, cumprindo o que prometera na campanha eleitoral, entrou de sola e, em sete meses (pouco mais do dobro dos cem dias), ateou fogo ao circo, queimouse e o que estava implícito se explicitou.
Já a presidente Dilma Rousseff, nos mesmos cem dias, tem sido gentil com o eleitorado e, sem arrancos retóricos, encaminhou a bom termo as mais delicadas situações que as urnas lhe confiaram como um buquê de espinhos. Encontrou o modo natural de sair da sombra do seu padrinho e, com o devido cuidado para não o melindrar, restaurou as boas maneiras no exercício do poder que o eleitor confia aos eleitos. Tais normas são universais, não precisam de aprovação do Congresso e fazem parte do que se entende por civilização.
Depois de terminada a campanha – e interessado direto em demonstrar que a democracia, ao contrário do que dizia Churchill (com o humor que tanta falta faz ao ex-presidente) é mesmo o pior de todos os meios de governar, com exceção dos demais – Lula se contentou com a primeira parte do raciocínio, e deixou claro quando, em pleno exercício dos poderes presidenciais, mandou os ministros estraçalharem a campanha. E, ainda na condição de presidente, não hesitou em desempenhar o papel de cabo eleitoral.


INTERNACIONAL
De volta ao alinhamento

Thelman Madeira de Souza

Com o objetivo de manter afastamento de um mundo bipolar, onde reinavam duas superpotências, EUA e União Soviética, em 1955, realizouse na cidade de Bandung, na Indonésia, uma Conferência Ásia–África, onde dirigentes de 29 países se reuniram para debater preocupações comuns e coordenar posições no campo das relações internacionais. No encontro, líderes do então chamado Terceiro Mundo tiveram a oportunidade de compartilhar as suas dificuldades na resistência às pressões das grandes potências, na manutenção da sua independência e na oposição ao neocolonialismo.
No encontro, ficou estabelecido, oficialmente, o Movimento de Países Não Alinhados, sobre uma base geográfica mais ampla, onde o Brasil preferiu ficar apenas na qualidade de observador, ao invés de se integrar ao movimento de independência, numa manifestação típica de país dependente e colonizado. Pontos importantes dessa conferência foram a discussão sobre a corrida armamentista entre os EUA e a União Soviética e o enunciado de princípios que deveriam nortear as relações entre as nações grandes e pequenas, os Dez Princípios de Bandung, adotados como objetivos da política de não alinhamento e critérios para fazer parte do movimento. Nesse conclave, os presidentes Tito, da Iugoslávia, e Gamal Abdel Nasser, do Egito, emergiram como lideranças terceiromundistas.
Um dos princípios consagrados em Bandung – o respeito à soberania e integridade territorial de todas as nações – vem sendo sistematicamente desrespeitado pela única superpotência que sobrou após a queda da União Soviética, ao substituir, à ponta de baioneta, o direito internacional pelo direito interno americano. Com isso, qualquer cidadão do mundo fica alcançável pela justiça americana, enquanto que nenhum americano pode ser julgado pelos tribunais internacionais. Essa afronta ao direito internacional, cuja história é também a história da sua não aplicação, transforma-o em um conjunto de regras a serem aplicadas apenas pelo Estado hegemônico, que preserva a sua soberania e relativiza a dos outros Estados. O século 21 tem sido palco dessa anomalia político-jurídica. As intervenções militares tomadas unilateralmente já se tornaram rotina em nosso mundo globalizado de maneira assimétrica. Com ou sem o consentimento da ONU, os paladinos da democracia e dos direitos humanos defendem, manu militari, seus interesses estratégicos, seja na Ásia, América Latina ou Oriente Médio. Afinal, os comensais dos negócios do petróleo precisam viver, e os empresários do complexo industrial-militar precisam de guerras para ganhar o seu dinheirinho suado de sangue.
Nesse contexto adverso para as nações periféricas, durante o século 20, o Brasil fez uma diplomacia caudatária dos interesses norte-americanos. Chegamos a admitir, durante a ditadura militar, que o que era bom para os EUA era bom para o Brasil.
Findo o regime de exceção, chegamos a patamares de submissão nunca vistos em nossa política externa, principalmente no período FHC, quando o nosso chanceler em voo para os EUA aceitou retirar os seus sapatos dentro da aeronave, durante revista de rotina em busca de terroristas.
Com a eleição de Lula, o Itamaraty muda um pouco o seu perfil e passa a reivindicar um papel de destaque nas discussões dos grandes temas internacionais como o comércio, o meio ambiente e a reforma da ONU. O Brasil tenta se colocar como interlocutor confiável dos países periféricos junto às potências hegemônicas, ainda que na esfera de influência de Washington.
A política externa da era Lula distancia-se um pouco do alinhamento automático às decisões americanas no campo das relações internacionais. Com Dilma Rousseff, essa marca é sepultada, sob o discurso ambíguo dos direitos humanos. Essa guinada transforma o Brasil em porta-voz dos interesses norte-americanos na América do Sul. Inaugura-se a diplomacia da concessão, que se cristaliza com a visita relâmpago de Obama.
Excluídas as formalidades de praxe, os objetivos reais do visitante são comerciais, políticos e estratégicos na região. Em outras palavras, Obama veio buscar acordos que deem preferência aos americanos na venda do petróleo do pré-sal, na compra do maquinário para a sua exploração e na compra de aviões de caça.


ZONA RISCO
Cai a esperança na contenção do vazamento no Japão
Possível dano no sistema de contenção do reator três preocupa população, que está saindo de suas casas

David Jolly - The New York Times

Oficiais do governo japonês começaram, na sexta- feira, a encorajar a população a evacuar uma faixa ainda mais distante da usina nuclear Fukushima, dando sinal de pouca esperança na contenção do vazamento de material radioativo dos reatores. As autoridades afirmam que darão assistência às pessoas que queiram sair de suas casas e que estejam entre 20 e 30 quilômetros de distância da usina, encorajando, desta forma, uma evacuação voluntária.
No dia 15 de março, as autoridades afirmaram que somente os residentes de um raio de até 20 quilômetros estariam em perigo. Mas o governo americano aconselhou seus cidadãos a uma distância de, no mínimo, 80 quilômetros de Fukushima.
Em uma coletiva de imprensa na noite da última sexta-feira, que marcou as duas semanas do terremoto seguido de tsunami, o Primeiro Ministro Naoto Kan se esquivou da pergunta sobre a ordem de evacuação, dizendo que o governo estava apenas seguindo recomendações da Comissão de Segurança Nuclear do Japão.

Três funcionários sofreram queimaduras
Na ocasião, autoridades japonesas mostraram evidências de que a estrutura de contenção do reator número três da usina poderia estar danificada. Isto aumenta a possibilidade de vazamento de material radioativo.
Segundo o diretor da Agência de Segurança Industrial e Nuclear japonesa (JNIS, na sigla em inglês), Hidehiko Nishiyama, um dos sinais do dano foi percebido na última quinta-feira, quando três funcionários que trabalhavam no resfriamento do reator sofreram queimaduras ao entrarem em contato com a água em torno da usina, expressivamente mais radioativa que o normal.
O reator número três, o único dos seis a usar o combustível Mox, foi danificado depois de uma explosão de hidrogênio no dia 14 de março. Desde então, trabalhadores estão tentando resfriá-lo, jogando água do mar, além de, recentemente, tentar reiniciar o sistema de resfriamento.
A notícia dada na sexta-feira, junto com a descoberta de um isótopo radioativo no sistema de abastecimento de água de Tóquio e outras localidades vizinhas, abalou o otimismo do início da semana, dando a sensação de que a batalha para consertar os danos na usina de Fukushima será longa.
– A situação ainda requer muito cuidado. Nossas medidas têm o objetivo de prevenir que as circunstâncias fiquem ainda piores – afirmou o primeiro ministro Naoto Kan.
 Ele também pediu desculpas aos empresários e fazendeiros, cujas vidas foram altamente afetadas com o vazamento de material radioativo. Ele aproveitou para reconhecer a ajuda dos Estados Unidos e agradecer às pessoas que estão arriscando as vidas no esforço de resfriar os reatores da usina.
As autoridades japonesas afirmam que não há ordem de evacuação na secunda zona ao redor de Fukushima, e que as pessoas podem escolher ficar.
Mas muitas delas já se retiraram por espontânea vontade, pois afirmam se sentirem prisioneiras, sem poder comprar as coisas e imobilizados pela falta de gasolina.
 – A vida naquela área tem sido muito difícil. As pessoas não querem entrar lá para fazer entregas de remédio, comida, suprimentos, nada – contou o deputado Noriyuki Shikata.
Enquanto isso, as autoridades continuam sob a suspeita de não estarem falando totalmente a verdade sobre os vazamentos. Shunichi Tanaka, ex-presidente da Comissão de Energia Atômica do país, chamou o governo de irresponsável em uma entrevista a um jornal local, por admitirem que as pessoas que moram relativamente próximas a usina permaneçam em suas casas, sem esclarecer o perigos que elas correm.
– O governo ainda não disse concretamente porque as pessoas precisam evacuar e isso não motiva os outros a saírem.
A Agência de Polícia Nacional divulgou, na última sexta-feira, que o número oficial de mortos já passa de dez mil pessoas, com mais 17.500 desaparecidas.
FONTE: JORNAL DO BRASIL

Nenhum comentário:

Postar um comentário