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segunda-feira, 28 de março de 2011

28 de março de 2011 - O GLOBO


DESTAQUE DE CAPA
Angra planeja obras para ter plano de fuga pelo mar

Além de contratar uma consultoria externa para reavaliar a segurança de suas encostas, a Eletronuclear, que opera as usinas Angra 1 e 2, estuda a construção de dois píeres nas imediações da central, na Baía da Ribeira e na Praia Brava, para criar uma alternativa de evacuação por mar, em caso de acidente. Embora as obras não sejam obrigação da empresa, a direção está preocupada com os deslizamentos constantes na rodovia Rio-Santos, que seria a rota natural de fuga numa emergência.


SEGURANÇA NUCLEAR
Mais duas rotas de fuga
Estudo prevê novos ancoradouros para retirar moradores de Angra em caso de acidente

Leonardo Cazes

Além de anunciar a contratação de uma consultoria externa para reavaliar a segurança das encostas no entorno de Angra 1 e 2, que já passam por um monitoramento constante, a direção da Eletronuclear, que opera as usinas, já tem em mãos um estudo para a construção de dois píeres nas imediações da central, visando a reforçar o plano de evacuação dos moradores da cidade, em caso de acidente ou outro evento não esperado. Um cais seria instalado na Baía da Ribeira, do lado direito das usinas, do ponto de vista do mar, e o outro na Praia Brava, do lado esquerdo, onde ficam as residências dos funcionários.
Apesar de não ser responsabilidade da empresa, criar uma alternativa de retirada das pessoas por mar é especialmente importante no caso de um deslizamento na Rio-Santos. Nos últimos anos, a rodovia, que passa pelo complexo de Angra, sofreu inúmeros escorregamentos. Uma grande avalanche em 1985 aconteceu na face oposta da montanha onde, do outro lado, fica Angra 1. Na ocasião, o Laboratório de Radioecologia foi soterrado e um pequeno cais com barcos de funcionários, destruído. A saída de água da usina, usada no processo de refrigeração, quase foi atingida. A vulnerabilidade da região, em razão de suas características naturais, sempre foi uma preocupação da Eletronuclear, que, em 2002, chegou a fazer a recuperação de 60 quilômetros da estrada, quase simultaneamente ao início da operação de Angra 2.

Estradas de acesso em estado precário
Como noticiou ontem O GLOBO, a crise nuclear no Japão - após o acidente provocado por um terremoto e uma tsunami jamais vistos no país - e as chuvas de janeiro na Região Serrana do Rio levaram a Eletronuclear a buscar uma segunda opinião sobre a situação geológica das encostas de seu terreno. Desde que as instalações começaram a ser utilizadas na Praia de Itaorna, onde estão as duas usinas e uma terceira em fase final de construção, oito pontos considerados críticos são permanentemente vigiados. Agora, uma comissão, juntamente com consultores independentes, vai checar de novo todas as obras e medidas de contenção já adotadas.
Os píeres devem permitir a atracação de barcos mais robustos para o transporte de um número maior de pessoas. Para isso, as áreas definidas para receber as novas estruturas precisam passar por um processo de dragagem, para aumentar o calado naquele ponto. A prefeitura de Angra dos Reis calcula que cerca de 20 mil pessoas morem nas áreas que ficariam vulneráveis em caso de emergência nuclear.
As características geológicas dos morros da região, somadas à lentidão da ação governamental nas obras de conservação e duplicação das vias de acesso às usinas, tornam ainda mais urgente a discussão sobre o pagamento de royalties da energia nuclear. Os recursos funcionariam como uma compensação financeira para o estado, pelo fato de sediar as usinas, e seriam usados para financiar programas de segurança, que envolvessem prevenção e o plano de evacuação.
Além das intervenções de rotina na Rio-Santos, a rodovia teve 26 quilômetros duplicados, no trecho entre Itaguaí e Itacuruçá - uma obra de R$245 milhões que levou quatro anos e ficou pronta em dezembro do ano passado. Na ocasião, o então ministro dos Transportes, Paulo Sérgio Passos, prometeu fazer o mesmo nos 160 quilômetros entre Mangaratiba e a divisa entre os estados de Rio e São Paulo, com recursos do PAC 2. Além da Rio-Santos, as duas outras opções de evacuação na região precisam passar por obras: a Paraty-Cunha e a estrada entre Angra e Barra Mansa (RJ-155).
- Na Rio-Santos, as encostas são muito deslizantes, isso é uma característica da Serra do Mar. Os especialistas dizem que o próprio corte feito para a construção da estrada é problemático. E, no caso de um acidente nas usinas, não há alternativas além dela. As outras duas opções seriam a estrada entre Angra e Barra Mansa, que está em estado precário, e a Paraty-Cunha. Se cair metade da chuva que caiu na Região Serrana (em janeiro), aquilo vira uma ratoeira nuclear - afirma o secretário estadual do Ambiente, Carlos Minc.
Os deslizamentos na região são frequentes, especialmente na época de chuvas. Eles ocorrem devido à estrutura geológica da área: como a faixa de terra entre a pedra e a vegetação nos morros é pequena, pode-se formar uma camada de água entre a pedra e a terra, o que provoca o desmoronamento.
Na opinião do diretor da Coppe/UFRJ, professor Luiz Pinguelli Rosa, os reatores de Angra 1 e 2 não estão sob risco, mesmo no caso de um desmoronamento. No entanto, os depósitos provisórios onde estão guardados 6.650 embalados - entre caixas e tonéis -, com materiais contaminados de baixa e média atividade e os geradores a diesel da usina, estão mais expostos.
- Os reatores estão a uma longa distância das encostas, ao contrário dos depósitos provisórios. Essa questão dos repositórios definitivos, inclusive, já deveria ter sido resolvida. Nós já temos um em Abadia (Goiás), onde estão os resíduos do acidente com o césio. A maior dificuldade é política, porque nenhum município quer receber isso - diz Pinguelli, acrescentando que os geradores são fundamentais em caso de falta de energia nas usinas. - No Brasil, já tivemos apagões que interromperam o fluxo de energia elétrica para as usinas, exigindo que os geradores entrassem em funcionamento imediatamente. São eles que vão bombear a água para resfriar os reatores, que, mesmo desligados, têm ainda muito calor concentrado. Se eles falharem, as pastilhas de urânio podem derreter por conta do calor e há risco de explosões. Foi o que aconteceu no Japão.
A construção de um repositório definitivo para os rejeitos de baixa e média atividade das usinas nucleares está sob responsabilidade da Comissão Nacional de Energia Nuclear (Cnen). Atualmente, há estudos em andamento sobre onde instalá-lo, mas sem definição. O assessor da presidência da Eletronuclear, Leonam dos Santos Guimarães, afirma que a empresa é parceira do Cnen nesse processo, já que, com o programa de criação de novas usinas no país, a estatal se tornará a sua principal usuária.
- A responsabilidade legal sobre o novo depósito é do Cnen, e a Eletronuclear é parceira nesse processo. A meta é que, em 2018, ele esteja pronto para atender ao funcionamento de Angra 3 - diz Guimarães.
Desde 2009, além do lixo de média e baixa atividade, também há no terreno das usinas um prédio que protege dois gigantescos geradores de vapor substituídos em Angra 1. Os geradores têm o tamanho de um vagão de trem cada um e são tratados como rejeito radioativo porque internamente estão contaminados.


SEGURANÇA NUCLEAR: Líder do governo na Câmara diz que compensação financeira será discutida ainda este ano
Royalty do urânio entra na pauta política
Projeto que propõe 10% do faturamento bruto das usinas para estados começa a ser analisado no segundo semestre

Carolina Brígido

BRASÍLIA. Apesar de o governo ainda não ter posição definida sobre uma eventual cobrança de royalties na área nuclear - o chamado royalty do urânio -, políticos governistas acreditam que o assunto possa ser discutido ainda este ano no Congresso Nacional. O líder do governo na Câmara, deputado Cândido Vaccarezza (PT-SP), prevê que, no próximo semestre, o debate chegará à Câmara e ao Senado.
No último dia 17, o deputado Fernando Jordão (PMDB-RJ) apresentou um projeto de lei propondo royalties de 10% sobre o faturamento bruto das usinas. Uma proposta semelhante já havia sido apresentada em 2004 pelo então senador e hoje governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), mas ela previa um repasse menor: de 5%.
- Essa discussão de royalties está posta, mas o governo não tem qualquer encaminhamento - disse Vaccarezza.
O projeto está na Coordenação de Comissões Permanentes e não há previsão de quando sairá de lá. Para o deputado Fernando Ferro (PT-PE), antes de se decidir o percentual, é preciso haver uma discussão profunda sobre a segurança do uso da energia atômica.
- Eu sou favorável ao uso da energia nuclear. Mas o que aconteceu no Japão revela que precisamos ter um debate sobre segurança. Precisamos tirar lições disso - analisou.
Para ele, é preciso embutir nos royalties custos com prevenção e situações de emergência. O parlamentar considera que 10% são um bom percentual para início das negociações:
- Essa matéria não é simples. Depende de um debate mais criterioso, até por conta dos problemas recentes que vimos no Japão. Além da compensação para estados e municípios, temos os problemas ambientais, que quase sempre são considerados secundários.
Na opinião de Ferro, o acidente no Japão vai prejudicar os planos do governo de criar quatro usinas no Nordeste. Ontem, um grupo fez um protesto na Avenida Delfim Moreira, no Leblon, contra o uso da energia nuclear.


Líder do governo: acidente não vai afetar debate

O  líder  do governo na Câmara,  deputado Cândido Vaccarezza  (PT), acredita que  o acidente nuclear no  Japão não afetará as discussões sobre o uso desse tipo de energia no Brasil:
— O acidente no Japão não  leva à condenação do uso de energia atômica, que é segura e  limpa. O Japão precisa desenvolver tecnologias para enfrentar os terremotos. É uma situação que não tem a ver com a realidade brasileira.
O deputado Otávio Leite (PSDB-RJ) também defende que estados e municípios recebam 10% a título de royalties. Ele considera imprescindível a destinação de parte dos recursos para situações de emergência.
— Eu acho que 10% são um percentual extremamente factível. Agora, parte desses royalties tem que ficar vinculada a um  fundo, para ser  utilizada em ações de emergência — afirmou. — A  lição do Japão  precisa ser compreendida. É preciso prevenir.

Deputado quer união da bancada fluminense
No Congresso, o parlamentar defende a união da bancada  fluminense em  torno do tema,  já que é no Estado do Rio que se concentra a produção nuclear brasileira:
— Nós, do Rio, independentemente do partido, precisamos agir em conjunto.
No Congresso, o parlamentar defende a união da bancada  fluminense em  torno do tema,  já que é no Estado do Rio que se concentra a produção nuclear brasileira:
— Nós, do Rio, independentemente do partido, precisamos agir em conjunto.
Na divisão dos  royalties, o projeto do deputado Fernando  Jordão  (PMDB-RJ) destina menos  recursos ao Rio que a proposta de Sérgio Cabral. O projeto do atual governador previa que 30% do bolo fosse só para o governo fluminense. Jordão reduziu o volume, fixando 20% para serem divididos entre os 26 estados e o Distrito Federal.


DOS LEITORES

A verdade e o mensalão
Tão importante quanto a aprovação pelo Congresso Nacional da Comissão da Verdade, criada para apurar violações de direitos humanos cometidas durante o regime militar, conforme a presidente Dilma Rousseff declarou em entrevista a uma emissora portuguesa de  televisão, seria a constituição de uma outra comissão para apurar a verdade sobre o mensalão. Este processo se arrasta a caminho da prescrição. Roubar o suado dinheiro dos altos impostos pagos pela população é um grave atentado contra os direitos do povo brasileiro, merecendo os mentores serem castigados, e o dinheiro, ressarcido aos cofres públicos.
ELIZIO NILO CALIMAN - Brasília, DF

Ex-cabos anistiados
Somos 2.530 ex-cabos anistiados da FAB por ato de exceção da portaria 1.104. Anistia de fato e direito concedida pelo Ministério da Justiça, que continua reconhecendo nossos direitos. Está a nossa anistia sendo contestada pelo Ministério da Defesa e pela Advocacia Geral da União, com  factoides por eles criados, mudando assim a interpretação há mais de seis anos entendida e ratificada pelo Ministério da Justiça e tribunais..Estamos amparados pela lei da decadência, também contestada. Somos idosos, temos mais de 65 anos, com famílias, alguns doentes, já com a vida socioeconômica estruturada com base nos valores que recebemos. Pedimos ajuda à presidente Dilma, que sofreu como nós a perda do seu trabalho e dignidade, cerceada pelo regime militar.
JOSÉ ALBERTO DE QUEIROZ - Rio
OPINIÃO
A base da integração

Mauro Marcondes Rodrigues

Pouco difundida no Brasil, a ação dos governos dos doze países sul-americanos para integrar fisicamente a região está caminhando, e uma primeira etapa de trabalho foi concluída ao final de 2010.
Criada em Brasília no ano 2000 pelos presidentes do subcontinente, a Iniciativa para Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana (IIRSA) avançou muito na identificação e execução de projetos de estradas, ferrovias, hidrovias, gasodutos, redes de transmissão elétrica e ações no setor das comunicações. São mais de 500 projetos de infraestrutura, somando investimentos de US$96 bilhões que facilitarão a integração do Brasil aos seus vizinhos e vice-versa.
Quase a metade das obras está em execução ou concluída e em algumas regiões os projetos de integração já estão criando novas perspectivas para as populações e economias locais. Este é o caso, para ficar em um exemplo, da integração do Noroeste do Brasil com o Peru. Com a ponte sobre o Rio Acre construída pelo governo brasileiro na fronteira do Acre com Madre de Diós, no Peru, e a construção da estrada que faz a ligação de selva, serra e costa peruanas pela concessionária Conirsa, liderada pela empresa Odebrecht, estão surgindo oportunidades para brasileiros e peruanos, em função da complementaridade produtiva das economias dos dois países e da expansão do turismo na região.
Nestes dez anos de atividades da IIRSA, a formação de uma rede de funcionários governamentais dos países da região, os Coordenadores Nacionais da IIRSA, tem permitido grande agilidade no intercâmbio de informações e conhecimentos sobre as infraestruturas existentes e projetos previstos em cada país, facilitando a coordenação de ações que organizam a integração dos territórios sul-americanos. Essa rede é um ativo de grande importância para o desenvolvimento regional.
A nova etapa que se inicia com a incorporação da IIRSA ao Conselho de Ministros de Infraestrutura e Planejamento no âmbito da União de Nações Sul-Americanas (Unasul) apresenta grandes desafios, e o Brasil, que assumiu sua Presidência pró-tempore, pode ser, como o foi no lançamento da IIRSA em 2000, o promotor de um salto de qualidade para potencializar a integração regional.
A agenda necessita avançar para um novo patamar, onde não basta focar os esforços na conclusão das infraestruturas planejadas, mas também investir nos processos que facilitam a integração dos países e regiões. Vale dizer, os países sul-americanos devem buscar realizar suas conexões territoriais e, ao mesmo tempo, impulsionar sua operação de maneira eficiente para alcançar os resultados e os benefícios esperados. A construção de bons projetos é a base, mas adequar as normas e regulações entre os países e investir na logística necessária para operar o sistema de forma integral e otimizado são fundamentais. Estes dois últimos componentes não demandam recursos financeiros substantivos, mas determinação política para superar entraves burocráticos e as idiossincrasias das diferentes instâncias do aparelho de Estado dos doze países da América do Sul.
MAURO MARCONDES RODRIGUES foi coordenador da Iniciativa para Integração da Infraestrutura Regional Sul-Americana no Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID).

 FONTE: JORNAL O GLOBO

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