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segunda-feira, 28 de março de 2011

27 de março de 2011 - JORNAL O GLOBO


 ANCELMO GOIS

Alô, Dilma
Tem gente no Rio que sonha, em nome da paz, que as Forças Armadas, quando concluírem em junho os trabalhos no Complexo do Alemão e na Vila Cruzeiro, rumem para a Rocinha.
A ideia é que fiquem ali também sete meses, dando tempo para preparar a UPP da favela. Mas o Exército não gosta da ideia. É pena.

A reação militar
Os presidentes dos três clubes militares no Rio (Naval, Militar e da Aeronáutica) redigiram uma carta conjunta em que defendem a comemoração do 31 de março de 1964, abolida pelo Exército, como saiu aqui outro dia.
No texto, dizem que o golpe de 1964 foi "em defesa da democracia" e "contra a tomada do poder por um regime ditatorial comunista".

No mais...
Há controvérsias.



BIOGRAFIA
No diário de Sarney, a culpa foi sempre dos outros
Então presidente da República, ele soube do fracasso do Cruzado ouvindo conversa num banheiro, revela biografia

Maria Lima e Diana Fernandes

BRASÍLIA. Fortaleza que resiste nos centros de decisão do cenário político há 50 anos, como é apresentado na biografia autorizada lançada esta semana, o presidente do Senado, José Sarney (PMDB-AP), se revela um político e um ser humano atormentado pela depressão crônica, considera que foi um presidente da República fraco, que fez um governo marcado por erros e fracassos, e que, na maioria do tempo, não sabia o que estava se passando. A maior fonte de pesquisa da jornalista Regina Echeverria, autora de "Sarney, a biografia", é o diário em que ele faz suas catarses, com desabafos sobre seus medos, erros, fracassos e traições políticas.
Em depoimentos na primeira pessoa, ele relembra que entrou em pânico quando foi informado de que teria de assumir a Presidência no lugar de Tancredo Neves, em 1985. Sabia que não tinha legitimidade política e seria uma decepção para o povo que idolatrava o presidente de fato. Era, naquele momento, uma figura menor, que sequer tinha sido consultado sobre o Ministério que Tancredo anunciara na véspera de ser internado.
Nos anos que se seguiram, ainda permaneceu meio que alheio a muito do que se passava na cena política e econômica de Brasília. Cita erros e fracassos de seu governo, mas sempre culpa alguém ou diz que não sabia.
Conta que, pouco mais de três meses após o lançamento do Plano Cruzado - que o levou do céu ao inferno -, quando o governo enfrentava problemas de desabastecimento e greves, convocou reunião supersecreta da equipe econômica, comandada pelo ministro do Planejamento, João Sayad, na longínqua Carajás.
Queria, longe da imprensa, discutir saídas para o Cruzado. A reunião vazou, foi um desastre, e Sarney só ficou sabendo da gravidade da situação quando foi ao banheiro e ouviu uma conversa entre Sayad e o então presidente do IBGE, Edmar Bacha:
- O Plano foi para o espaço! - confessou Bacha.
Além do Plano Cruzado e do Cruzado I, Sarney lista vários "maiores erros" de seu governo: a escolha de Marco Maciel para chefiar a Casa Civil, o calote no pagamento da dívida junto ao FMI e até a briga pelo mandato de cinco anos.
Na revisão de sua história, reserva críticas aos presidentes que o sucederam e só alivia Itamar Franco. As maiores mágoas são de Fernando Collor e Fernando Henrique Cardoso. Nunca perdoou o tucano pela operação da PF que descobriu uma dinheirama na empresa Lunus, enterrando a campanha da filha Roseana à Presidência, em 2002.
Pesou a pena nos escritos sobre Lula também. Diz que em 1989, quando os 21 candidatos se voltaram contra seu governo, votou em branco no segundo turno entre Collor e Lula. Collor, porque "era um capitalista de Arapiraca". Lula, porque era "a velharia ideológica, um marxista caribenho sem ideias próprias e sem base filosófica".
Sobre a crise vivida pelo Senado em 2009, logo após ele assumir mais uma vez o comando da Casa, Sarney apresenta sua versão dos fatos - ou "pseudofatos", como diz no livro. Quanto às centenas de atos secretos do Senado, muitos editados com nomeações de parentes do próprio Sarney, ele diz: "Realmente fui alvo de uma grande injustiça, quando a imprensa quis associar-me aos tais atos secretos. Primeiro, foi a Fundação Getulio Vargas quem os descobriu e foi contratada por mim. Anulei todos eles, e o percentual dos meus mandatos foi de 1,81%".
Num dos comentários que faz da crise no livro, Sarney fala do que considera o grande erro da oposição no episódio: "Foram ineptos. Usaram a estratégia de guerrilha atingindo a todos com pseudofatos sem interesse público e, assim, construíram a derrota do seu candidato".
O livro traz a versão dele para fatos históricos como:
Doença de Tancredo: No capítulo sobre eleição do Colégio Eleitoral, posse e Nova República, Sarney expõe longamente sua total ignorância sobre o que se passava com a saúde de Tancredo às vésperas da posse, no dia 15 de março. Teve a última conversa com o presidente eleito no dia 14, de manhã. De nada desconfiou e de nada foi informado. Somente na tarde daquele dia foi avisado por um dos médicos da gravidade do caso. No fim da tarde, Sarney viu Tancredo numa missa, da qual ele saiu às pressas sem falar com ninguém. Por volta das 21h, o vice foi avisado de que Tancredo estava no hospital e seria operado de imediato.
Posse, resistência e depressão: Sarney relutou muito para tomar posse, com a alegação de que o povo esperava Tancredo e que ele seria uma grande decepção. Nas longas horas de apreensão, muitas consultas à Constituição e negociações políticas. O que mais crescia era a depressão de Sarney, uma doença que ele tentava dominar desde 1982 e que era mantida em segredo na família.
"Dentro de mim crescia um grande temor. (..) Ainda estava deprimido, maximizando todos os acontecimentos, construindo hipóteses trágicas, tendo uma leitura negativa de tudo o que acontecia comigo", lembra Sarney: "Era uma solidão que não passava, uma dor insidiosa na alma que me levava a pensar recorrentemente na morte e nas fontes da vida".
Plano cruzado: Na reunião de Carajás, Sarney soube, por acaso, que seu plano econômico, que tinha como eixo o congelamento de preços e salários por um ano, fracassara. Com esse plano, Sarney foi do céu ao inferno. Sua popularidade chegou na casa dos 80%. Menos de três meses depois, houve greves e protestos pelo congelamento dos salários. Sarney culpava PT, PDT e CUT pelas manifestações.
Num intervalo da reunião, como conta no livro, Sarney flagrou, no banheiro, uma conversa entre Sayad e o então presidente do IBGE, Edmar Bacha. "O plano foi para o espaço" - disse Bacha. Há quem diga que ele teria ouvido Bacha falando mal dele. Mas isso ninguém confirma nem está no livro de Sarney.
Logo depois veio o Cruzado II, que acabou com o congelamento e autorizou altos reajustes para a gasolina apenas seis dias depois da eleição vitoriosa do PMDB. Mais um erro admitido por Sarney no livro, mas que ele divide com seus ex-auxiliares: "O maior erro que cometi foi o Cruzado II . Eu preferia ter cortado a minha mão a ter assinado aquilo. Fiz porque acreditei neles".
Outro erro: moratória: Com a economia em frangalhos, no início de 1987, Sarney decretou o calote da dívida junto ao FMI por tempo indeterminado. Um ano depois, reconheceu que a moratória foi o maior erro de seu governo. Mais uma vez, diz que foi induzido ao erro pela equipe econômica.
O chefe do SNI: Durante seu isolamento no Planalto, e diante das dificuldades, Sarney gostava de dizer que tinha o apoio das forças armadas. Mas só depois que deixou o governo ficou sabendo que um dos seus mais fiéis escudeiros, o então chefe do SNI, general Ivan de Souza Mendes, no passado havia feito um dossiê com acusações envolvendo ele e pessoas de sua família. O relatório foi entregue a Ernesto Geisel em 1970, mas o então presidente da Petrobras não levou adiante investigações que poderiam complicar a vida de Sarney e até cassar-lhe o mandato de senador. No dossiê, o general dizia que Sarney tinha um apartamento cativo no Hotel Glória, mandava os filhos estudarem no exterior e que sua suplência de deputado era o resultado de uma fraude comandada por ele mesmo.
"Se a gente conseguisse provar esse troço todo e enfiasse um Ato 5 em cima dele, hein?", teria dito Geisel sobre a carta do general.
"Eu dormia com uma cascavel e não sabia. O que se depreende do documento é o caráter do general Ivan, que, tendo feito tudo isso contra mim, passou cinco anos como chefe do SNI ao meu lado. (...) Se eu fosse o que ele escreveu, jamais deveria ter trabalhado comigo. Foi uma grande decepção quando tive conhecimento dessa carta, pois sempre gostei e tive confiança nele", comenta Sarney.

SEGURANÇA NUCLEAR
As lições do inimaginável
Tragédias na Região Serrana e no Japão aumentam as precauções nas usinas de Angra

Carla Rocha e Paulo Motta

Atragédia na Região Serrana, em que as montanhas escorreram matando quase mil pessoas, tem tanto a ensinar para a melhoria da segurança das usinas atômicas de Angra dos Reis quanto a crise nuclear em Fukushima, no Japão. É que o inimaginável - que, no caso japonês, foi um poderoso terremoto, seguido de uma gigantesca tsunami - também pode ocorrer por aqui. De intensidade jamais vista, as chuvas de janeiro mostraram que, no Rio, o risco vem dos deslizamentos. A Eletronuclear, empresa responsável por Angra 1 e 2 e pelas obras de Angra 3, já criou uma comissão para estudar o assunto, e uma consultoria externa será contratada para reavaliar a segurança das encostas no entorno da central.
- Nós estamos sempre monitorando e reavaliando cada trecho de encosta. Às vezes, identificamos a necessidade de fazer uma nova obra ou refazer alguma antiga. Mas os últimos acontecimentos mostraram que o inimaginável pode acontecer. Queremos uma segunda opinião. Não basta nossa certeza, queremos o parecer de pessoas da academia, que podem analisar a questão de forma independente - afirma o gerente de engenharia civil e estruturas metálicas da Eletronuclear, Diógenes Salgado Alves. - Não fabricamos salsicha. O nosso negócio nos obriga a avaliações constantes.

Área já teve grande deslizamento
Em 1985, um grande desastre mostrou que o inimaginável não é tão inimaginável assim. Uma enxurrada provocou um gigantesco deslizamento exatamente na face oposta da montanha do local onde está Angra 1, abrindo uma cratera na Rodovia Rio-Santos, soterrando o Laboratório de Radioecologia da Eletronuclear e quase fechando a saída de água da refrigeração da usina. A avalanche destruiu ainda a marina e os barcos de funcionários, formando uma onda tão grande que cobriu uma ilha em frente.
O complexo de usinas de Angra é cercado por montanhas que formam um U. Em frente está o mar. Por baixo da densa cobertura, as rochas são basicamente de granito e gnaisse, e a evolução geomorfológica da região está ligada ao tectonismo terciário, típico da Região Sudeste, com seus patamares escalonados, como degraus sucessivos, que garantem os belos recortes da Serra do Mar. O conhecido histórico de deslizamentos ao longo de toda a Rio-Santos, rodovia que passa pela usina, dá a dimensão do desafio imposto pela natureza do lugar.
No momento, os técnicos da Eletronuclear trabalham em duas intervenções, que parecem cirurgias de alta complexidade. Num pedaço de encosta está sendo feita uma contenção com berma (em que pedras sobrepostas são usadas para melhorar a estabilidade do morro). Tudo porque foi detectada uma movimentação de dois milímetros por mês no local, o que representa pouco mais de dois centímetros por ano. Num outro trecho, antigos tirantes (cabo de aço para prender os muros de concreto à rocha) com sinais de ferrugem estão sendo substituídos. Células de carga, que medem o peso suportado pelos tirantes, foram instaladas para saber se, ao longo dos anos, o que é muito incomum, houve alguma mudança significativa que leve à utilização de um número maior de tirantes. Um preciosismo: milímetro a milímetro, miligrama a miligrama.
- Há oito pontos que foram apontados como mais críticos num grande estudo geotécnico feito em todo o Sítio de Itaorna e que são constantemente vigiados - explica o engenheiro geotécnico José Evaldo Soares, responsável por todo o monitoramento das encostas próximas às usinas.
Ao contrário do que se imagina, os reatores nucleares - onde a energia é gerada - não são os maiores focos de preocupação em se tratando de intempéries. Aqui, como em todo o resto do mundo, eles - assim como os rejeitos do combustível utilizado (varetas de urânio) - ficam dentro de prédios blindados, capazes de resistir a terremotos ou tsunamis, por margem de segurança, em intensidade muito superiores às médias dos fenômenos calculadas para cada local. As usinas de Angra foram feitas para resistir a terremotos de até 7 graus na escala Richter e a ondas de até seis metros - há diques que podem ser vistos da praia.
Outras instalações também merecem atenção. Os depósitos de rejeitos de média e baixa atividade - roupas usadas pelos operários, equipamentos que tiveram contato com material radioativo, entre outros - ficam em depósitos iniciais. Há ainda os geradores a diesel, para manter o funcionamento da usina em caso de desligamento do reator, e as torres de energia do sistema interligado no terreno.
O diretor de operações da Eletronuclear, Pedro Figueiredo, diz que, depois do Japão, as usinas do mundo inteiro estão revendo seus protocolos.

- É para a nossa própria tranquilidade e a do público. Os próprios fabricantes de equipamentos, depois de Fukushima, estão avaliando vulnerabilidades - afirma o diretor, observando que o procedimento é comum após eventos de grande magnitude.
Para o presidente da Associação Brasileira de Energia Nuclear (Aben), o especialista em segurança Édson Kuramoto, o monitoramento de Angra é extremamente cuidadoso:
- A questão da segurança é parecida com o que acontece na aviação. A diferença é que a operação de uma usina sofre uma fiscalização ainda mais rígida de órgãos internacionais, como a Associação Mundial de Operadores de Usinas Nucleares e a Agência Internacional de Energia Atômica.
Responsável por consultorias para a Eletronuclear no Sítio de Itaorna, o pesquisador da Coppe Willy Alvarenga prega que, a cada dez anos, toda encosta - mesmo após obras geotécnicas - seja reavaliada:
- A encosta que se move está sob controle. As outras estão longe. Houve obras de estabilização dentro da usina que já foram revistas e algumas refeitas na década de 90. Mas é prudente, pelo menos a cada década, fazer um amplo diagnóstico. Em princípio, toda encosta é vulnerável. A rocha se transforma em solo, e o solo, que é mais fraco, com o tempo escorrega. Há dez mil anos o Brasil esteve sujeito a chuvas muito fortes e algumas encostas escorregaram. Várias planícies de São Paulo e do Rio foram formadas nessa época porque escorregaram das montanhas e continuam escorregando em menor intensidade.


DOS LEITORES

Infraero
Acho que o presidente da Infraero deveria andar um pouco mais pelos aeroportos brasileiros antes de fazer declarações como as de sexta-feira. Embora concorde que o aeroporto de Brasília parece estar às moscas na hora do almoço, o mesmo não acontece em outros horários.
O mesmo padrão se repete no Galeão, no Rio de Janeiro, já não sendo assim em Congonhas, Santos Dumont e Guarulhos. Afirmar que se a Copa fosse hoje não haveria problemas é acreditar em contos de Carochinha. Semana passada, desembarcando de Maceió, às 17h10m, no Galeão, levamos cerca de uma hora e quarenta minutos do pouso ao ponto de táxi.
O avião pousou dez minutos antes do previsto e não havia finger disponível no Terminal 1. Parou em remoto e aguardamos cerca de 20 minutos pela escada. Ao chegarmos na esteira, havia dois voos para retirada de bagagens. Pegamos o táxi às 18h45m. É esse o padrão esperado pela Infraero?
Nélio Henriques Lima - Rio


 INTERVENÇÃO MILITAR
Para diplomatas brasileiros, falta clareza em resolução
Professor lembra que posição do país em relação à missão na Líbia não está isolada

Eliane Oliveira

BRASÍLIA. Parece combinada a resposta dada por diplomatas brasileiros ao serem indagados sobre a resolução do Conselho de Segurança das Nações Unidas que abriu caminho para a intervenção militar na Líbia: não há respostas suficientes para tantas perguntas. Qual o mandato do relator? Quais são os objetivos da missão? Pode-se ou não matar Muamar Kadafi? Se o ditador sair, quem vai organizar sua sucessão? E se a Líbia se dividir em dois países?
Reservadamente, avalia-se que a situação é inusitada. O último confronto do gênero ocorreu quando os Estados Unidos decidiram, unilateralmente, atacar o Iraque. Desta vez, a comunidade internacional, e não esse ou aquele país, tem uma grande responsabilidade em suas mãos. Para o governo da presidente Dilma Rousseff, não foram esgotadas todas as possibilidades de diálogo.
- Não de pode encurralar um país, é perigoso - advertiu um experiente diplomata brasileiro.
Segundo Eugênio Aragão, especialista em direito internacional, a resolução é dúbia tecnicamente. Ao mesmo tempo, deixa claro que tudo e todos os meios são possíveis para garantir a segurança da população civil.
Para o Itamaraty, os interesses políticos são os grandes fatores para propor intervenções militares em determinados países. Aragão, todavia, ressalta que a situação na Líbia se tornou diferente, a partir do momento em que Kadafi declarou guerra aos rebeldes e passou a usar artilharia contra os manifestantes.
- A Líbia tratou de transformar um conflito doméstico em uma guerra civil - disse o especialista, acrescentando que a situação na Síria também começa a piorar acentuadamente.
O professor de Relações Internacionais da Universidade de Brasília, Virgílio Arraes, acredita que o posicionamento do Brasil é de cautela. Lembrou que o posicionamento do Brasil não foi isolado. Alemanha, China, Índia e Rússia também se abstiveram.
- A vida dos brasileiros não será afetada por causa da Líbia, ao contrário de França e Itália, que dependem do petróleo daquele país. Sem contar que os atuais líderes europeus enfrentam crise de popularidade - afirmou Arraes.
FONTE: JORNAL O GLOBO

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