EDITORIAL
O mensalão esvaziado
São cada vez mais sombrias as perspectivas para o processo que corre no Supremo Tribunal Federal sobre os desmandos dos envolvidos no que se convencionou chamar de mensalão. A denúncia feita contra 38 citados foi aceita pelo STF em 28 de agosto de 2007. Ao relatar o caso que resultou na abertura de processo, o ministro Joaquim Barbosa alertou na época que aquela era apenas a primeira etapa a ser vencida. A etapa derradeira, a do efetivo julgamento, a mais decisiva, a mais esperada pela sociedade, está ameaçada. Citado mais de 50 vezes na denúncia do Ministério público, o crime de formação de quadrilha pode ficar impune simplesmente porque, em agosto, estará prescrito.
São 22, entre os 38 denunciados, os que devem responder a esta acusação, relevante para que fique caracterizada a ação articulada de integrantes do alto escalão do governo no sentido de assegurar, de forma delituosa, parte da base de sustentação do governo. O provável desfecho, com o arquivamento das denúncias por decorrência do prazo legal, é frustrante em todos os sentidos. A CPI que investigou os crimes, em 2005, o trabalho primoroso do procurador-geral da República, Antonio Fernando de Souza, que citou os envolvidos, e o relatório detalhado e preciso do ministro Joaquim Barbosa criaram a expectativa de que, entre tantos casos de corrupção logo esquecidos, o mensalão teria uma resposta ágil e exemplar da Justiça.
Lembre-se que, quando da abertura do processo, o próprio Supremo encarregou-se de exaltar a agilidade da alta Corte, mesmo diante de questões tão complexas. O sentimento hoje é inverso. Sob o argumento de que há muita gente envolvida e é igualmente grandiosa a tarefa de reunir provas incriminadoras, o mensalão encaminha-se para juntar-se aos episódios marcados pela impunidade. É lamentável que o tempo tenha corroído o ímpeto inicial, enquanto os próprios envolvidos, a grande maioria ligada ao PT, partido de sustentação ao governo, retomavam atividades políticas, alguns de forma indireta, como o ex-ministro-chefe da Casa Civil José Dirceu, e outros com protagonismo no Congresso, como o deputado João Paulo Cunha, que assumiu a presidência da Comissão de Constituição e Justiça da Câmara. Há ainda réus com funções executivas dentro do próprio governo. O ex-presidente do PT José Genoíno foi nomeado como assessor especial do ministro da Defesa, Nelson Jobim.
A sociedade espera que os mensaleiros se submetam, como qualquer cidadão na condição de réu, ao julgamento isento da Justiça, para que assim se faça a reparação do que ocorreu. É importante, nesse sentido, que o Supremo ofereça mais uma vez ao país a sua comprovada capacidade de julgar, sem pressões políticas e sem protelações. Durante as investigações e até a etapa de acolhimento das denúncias, o mensalão consumiu a energia do Congresso, do Ministério Público e da Justiça e criou expectativas entre a população. Por tudo isso, um dos mais lamentáveis casos de corrupção do país, com repercussão internacional, não pode ser engavetado.
NOTAS
Manifesto
Sem referência direta à decisão do Exército de retirar a comemoração do 31 de março de 1964 de seu calendário oficial, os presidentes dos Clubes Militar, Naval e de Aeronáutica divulgaram ontem manifesto conjunto para lembrar os 47 anos do movimento que tirou do poder o presidente João Goulart e deu início ao regime militar que durou até 1985. A nota diz que relembrar “os acontecimentos” de 64, “sem ódio ou rancor, é, no mínimo, uma obrigação de honra”.
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