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terça-feira, 24 de janeiro de 2012

24 de janeiro de 2012 - VALOR ECONÔMICO


PRIMEIRA PÁGINA

Longe das metas, fundos de pensão assumem mais risco
Sem cumprir a meta atuarial no ano passado, de 12,44%, muitos fundos de pensão iniciaram 2012 propensos a trocar parte da carteira de títulos públicos por ativos de maior risco - e maior rentabilidade. A combinação de juros em queda e inflação acima do centro da meta de 4,5%, que frustrou os resultados das fundações em 2011, deve se repetir neste ano e forçá-las a deixar a comodidade proporcionada pelos papéis do governo. Nos últimos dez anos, os fundos de pensão não alcançaram a meta atuarial, de INPC mais 6%, em 2002, 2008 e 2011

Foster abre nova fase na Petrobras
A saída de José Sérgio Gabrielli e sua substituição por Maria das Graças Foster devem gerar mais mudanças na cúpula da Petrobras. Interlocutores da presidente Dilma Rousseff colocaram em dúvida a permanência do diretor financeiro, Almir Barbassa, e de Paulo Roberto Costa, diretor de abastecimento. O primeiro a deixar seu posto depois de Gabrielli, dizem fontes do PT, será Guilherme Estrella, diretor de exploração e produção

'Restos a pagar' em 2012 somam R$ 140 bilhões
O governo federal deixou para este ano R$ 140,9 bilhões em despesas de custeio e investimentos de exercícios anteriores, os chamados "restos a pagar". São quase 10% mais que os R$ 128,7 bilhões do começo de 2011, confirmando o gigantismo assumido nos últimos anos por essa rubrica, que vários economistas classificam como um "orçamento paralelo"

Turbinas apresentam defeito no Madeira
Pelo cronograma da obra, a hidrelétrica de Santo Antônio, no rio Madeira, já deveria ter duas turbinas em operação, com capacidade para produzir 150 megawatts. Mas a geração de energia foi adiada por mais de um mês em razão de falhas nos equipamentos instalados

EDITORIAL
Ganha forma na Europa taxa das operações financeiras

Está cada vez mais evidente que alguns países da zona do euro vão começar a taxar as operações financeiras nos próximos meses. A França é o país mais entusiasmado. Ciente do forte apelo que esse tipo de taxação tem no eleitorado, o presidente Nicolas Sarkozy prometeu que vai implantá-la antes das eleições presidenciais de abril, à frente de outros países da região. Para ele, novos adiamentos são inaceitáveis.
De fato, faz tempo que Sarkozy tenta convencer seus pares a taxar as transações financeiras. Neste início de ano, ele colocou o assunto novamente em pauta. Com a grande maioria dos países da zona do euro pressionada por um alto endividamento e pela necessidade urgente de reduzir seus déficits, qualquer medida que signifique mais arrecadação passa a ser vista de forma positiva.
Passada a primeira onda da crise internacional, alguns países aplicaram impostos extraordinários no setor financeiro até porque os bancos voltaram a apresentar lucros polpudos. O Reino Unido e a França, por exemplo, taxaram temporariamente em 50% os bônus pagos aos altos executivos do setor. Mas os valores arrecadados ficaram bem distantes do valor gasto para salvar os bancos. O custo fiscal do apoio dos governos do G-20 aos bancos na forma de injeção de capital e compra de ativos custou o equivalente a 2,7% do Produto Interno Bruto (PIB), chegando entre 4% e 6% nos mais afetados, calculou o Fundo Monetário Internacional (FMI).
Concebida inicialmente como instrumento de regulação e controle do setor financeiro, a taxação passou a ser encarada como instrumento de arrecadação. A ideia é que os bancos, grandes responsáveis pela crise, colaborem com o saneamento das finanças públicas.
Há propostas para taxar os bancos ou as operações financeiras. Os Estados Unidos pretendem taxar em 0,15% os bancos com ativos superiores a US$ 50 bilhões, anualmente, o que deve render de US$ 90 bilhões a US$ 117 bilhões em 10 a 12 anos, e esse imposto seria cobrado até cobrir o Troubled Asset Relief Program (Tarp). A Europa optou por taxar as operações financeiras. A Comissão Europeia sugere um imposto de 0,1% sobre os negócios com ações e títulos e de 0,01% sobre derivativos, o que renderia € 55 bilhões (cerca de US$ 70 bilhões), dos quais € 10 bilhões para a Alemanha e € 12,5 bilhões para a França.
Um dos mais ilustres defensores do imposto sobre as transações com títulos foi John Maynard Keynes, que já debatia o papel dessa tributação na contenção de bolhas especulativas e seu desestímulo à livre empresa. O segundo maior foi James Tobin, que em 1978 propôs uma taxa de 1% em todas as transações internacionais, para limitar o fluxo de capital que prejudica os esforços dos governos de regular a demanda agregada e o câmbio. Na década de 1990, a chamada "Tobin tax" ganhou o apoio do movimento antiglobalização.
Sarkozy já conseguiu o apoio da chanceler alemã Angela Merkel, o que é sinal inequívoco de que o projeto tem boas chances de virar realidade. Sob o comando de Silvio Berlusconi, a Itália havia mostrado resistência à taxação das operações financeiras; mas, com Mario Monti na presidência, a mudança foi substancial. Às voltas com uma das maiores dívidas da zona do euro, de € 1,9 trilhão, a Itália enfrenta também uma das maiores evasões fiscais da região, estimada em € 120 bilhões por ano pelo próprio governo e tem uma economia paralela equivalente a 17% do Produto Interno Bruto (PIB). Monti está implementando programa de recuperação de impostos não pagos que pretende pôr a mão em € 13 bilhões neste ano e, naturalmente, não rejeitaria os bilhões de euros obtidos do mercado financeiro. Além disso, já disse que essa arrecadação extra permitiria ao governo aliviar a carga das famílias.
Nem todos, no entanto, estão dispostos como Sarkozy a sair na frente e impor a taxação unilateralmente. Monti, que foi aluno de Tobin em Yale, por exemplo, preferiria que todos os 27 membros da União Europeia aplicassem a taxação. O partido da coalização de Merkel tem a mesma posição. Mas o Reino Unido já descartou veementemente o imposto e só o adotaria se fosse global. A sempre realista Merkel acha mais provável que a taxação emplaque nos 17 países da zona do euro.
Se for aplicada unilateralmente, a taxação irá encarecer as operações onde estiver em vigor, estimulando a sua transferência para praças livres do imposto. Isso não será problema em mercados mais abertos como os europeus. A questão é que essa arbitragem pode acabar esvaziando o poder de fogo da taxação.

OPINIÃO
Por que o FMI deve ficar longe da Europa

Wolfgang Münchau

O Fundo Monetário Internacional (FMI) alocou 91% de seus compromissos definitivos para programas na Europa. Mas existe agora sobre a mesa de negociações uma proposta que sugere que esse montante não é suficiente e deveria ser ampliado significativamente. Será justificado um aumento dos fundos do FMI para socorrer a zona do euro? Em especial, deveriam países fora da zona euro participar da captação desse novo capital? Penso que não.
O FMI está certo, é claro, em concluir que a crise da zona do euro é o principal risco com que agora se defronta a economia mundial. O mundo tem um forte interesse na solução da crise. Mas um envolvimento maior do FMI em programas específicos da União Europeia não é necessário, sendo, muito possivelmente, contraproducente.
O envolvimento não é necessário porque a zona do euro tem capacidade financeira para ajudar a si mesma. A região como um todo tem um pequeno superávit em sua balança corrente com o resto do mundo. Como resultado disso, a região não depende de financiamentos externos. A região tem seu próprio banco central, que pode, ao menos em tese, agir como um emprestador de última instância.
A zona do euro opera, como sabemos, sob limitações políticas e jurídicas, tais como as regras para déficits determinadas pelo tratado de Maastricht, a regra que proíbe socorros financeiros ou as regras que impedem o Banco Central Europeu de financiar governos.
No entanto, um observador externo teria razão em afirmar que essas regras são, todas, autoimpostas, e, portanto, reversíveis. A zona do euro deveria mudar suas regras, antes de rastejar até outros países, de chapéu na mão.
Considerando que a zona do euro é economicamente irrestrita e uma das regiões mais ricas do mundo, o pedido para envolvimento do FMI em hipotéticas operações de socorro futuro é moralmente repreensível. O que está acontecendo, nesse caso, é que os Estados membros da zona do euro têm dificuldade para comprometer fundos adicionais às operações de socorro e acreditam ser politicamente mais conveniente canalizar recursos por meio do FMI como uma forma de driblar parlamentos nacionais.
Mas, em minha opinião, existe um argumento ainda mais importante. A forma como os Estados membros da zona do euro têm lidado com a crise ampliou as chances de um resultado catastrófico. Uma extensão do engajamento do FMI muito provavelmente apoiará as políticas atuais.
A recessão em desenvolvimento é, em grande medida resultado de uma elevação prematura das taxas de juro pelo BCE, de uma resposta hesitante à crise, da não recapitalização do setor bancário após a crise financeira de 2008 e de uma reação instintiva em política fiscal pró-cíclica. O novo governo espanhol admitiu na semana passada não haver nenhuma possibilidade de que possa cumprir a meta de 4,4% do Produto Interno Bruto (PIB) para o déficit deste ano, estabelecida numa época em que as autoridades podiam fingir que a economia iria se recuperar. A Itália já apertou a política fiscal apesar da recessão e também a Espanha ficará sob pressão para fazê-lo. Todo mundo está seguindo os passos da Grécia.
Os erros acumulados de política econômica na zona do euro estão transformando um aperto de liquidez numa crise de solvência. E aqui reside um risco grave para o FMI. Se a Itália ficar enredada em uma recessão prolongada, crescerá significativamente a probabilidade de que não seja capaz de pagar sua dívida, atualmente em 120% do PIB. Notícias da Itália sugerem que o FMI está prestes a prever uma recessão de dois anos para o país, o que poderá muito bem resultar em um aumento da proporção da dívida em relação ao PIB. A solvência futura da Itália é inteiramente dependente das taxas de juro de mercado e da perspectiva de um retorno a um crescimento econômico forte e sustentável.
Tenho dificuldades para ver como isso pode ser feito sem uma união fiscal e um compartilhamento bem maior dos encargos.
Existem argumentos técnicos adicionais que favoreceriam um envolvimento mais cauteloso do FMI. Mario Blejer, ex-presidente do banco central da Argentina, argumentou recentemente que o status de credor preferencial do FMI poderia tornar-se um problema, pois um empréstimo do FMI subordinaria automaticamente todos os outros detentores de títulos. A probabilidade de um default envolvendo esses títulos possivelmente impagáveis é, portanto, significativamente maior. Além disso, a situação poderia tornar-se tão grave que a senioridade do FMI poderia não se sustentar, o que por sua vez colocaria em risco sua capacidade de emprestar a juros baixos.
Existem várias propostas na mesa sobre a forma de envolver o FMI de maneira inteligente. Mas todas estão sujeitas ao mesmo problema. Qualquer tipo de ajuda de liquidez externa incentivaria a zona euro a seguir em frente com as políticas que estão agravando a crise.
A melhor contribuição que o FMI poderia fazer, portanto, é não envolver-se em outros programas além daqueles com que já se comprometeu. Se tiver de se envolver, deveria ao menos tentar condicionar quaisquer engajamentos adicionais a mudanças fundamentais de política econômica, tanto em nível nacional como da zona do euro. Em particular, o FMI deveria insistir em um grau mínimo de gestão econômica coletiva na abordagem de algumas das questões básicas, como a fragilidade do setor bancário e as políticas visando eliminar a interdependência dos bancos nacionais com os governos nacionais. Seria imprudente o FMI envolver-se nesses debates. (Tradução de Sergio Blum)
Wolfgang Münchau é editor e escreve sobre economia europeia no FT.

COLUNAS
Raymundo Costa
Um vice e sua circunstância

A relação do pemedebista Michel Temer com Dilma Rousseff é boa, mas a relação do PMDB com Dilma vai mal e pode piorar na retomada dos trabalhos no Congresso. Em síntese, esse foi o recado levado pelo próprio Temer a Dilma, antes das reuniões temáticas da presidente com os ministros e da troca de comando nos ministérios da Educação e da Ciência e Tecnologia, formalizada hoje.
O PMDB esperava melhor sorte na reforma do ministério, anunciada como tal em setembro pela ministra Ideli Salvatti (Relações Institucionais), mas que a presidente, semana passada, disse a Temer só existir na imaginação da imprensa. A presidente classifica as mudanças em curso como pontuais. Ela vai ainda movimentar algumas peças, segundo contou a Temer e Temer contou aos pemedebistas numa tentativa de acalmar os grupos do partido que esperavam muito mais das mudanças.
Ainda na semana passada o presidente em exercício do PMDB, senador Valdir Raupp, disse que o partido avalia que está sub-representado no governo. A conversa de Dilma com Temer foi um balde de água fria nas pretensões dos pemedebistas. A conta, naturalmente, agora está sendo cobrada do vice-presidente da República.
Na realidade, Temer apresentou as faturas do partido para a presidente da República. Dilma deu de ombros. Para ser mais exato, a presidente prometeu "pensar", o que, na prática, equivale a dizer que tudo continua como dantes. Entre os grupos pemedebistas, o problema é a falta de prestígio do vice com a presidente. Prova disso é que ela esteve no início do mês em São Paulo, visitou o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva e comemorou um convênio com o governador tucano Geraldo Alckmin, mas nem sequer telefonou para Temer, que à época havia se submetido a uma cirurgia na vesícula.
Na realidade, Dilma telefonou duas vezes no dia 3. Na primeira, Temer estava sedado; na segunda, sentia náuseas e também não pode atender. Depois disso é que ela foi a São Paulo. O vice já estava despachando em seu escritório, depois de dormir duas noites no hospital. Ao contrário de seus críticos, Temer acha que são muito boas suas relações com a presidente tanto no que se refere às políticas interna e externa (nos dois casos, cumpriu missões para a presidente) como no que diz respeito à administração.
"Com o vice do PMDB ela está extremamente bem", disse aos visitantes que o procuraram ontem em sua volta a Brasília, depois da cirurgia. Mas ele também reconhece a inquietação partidária. O vice tenta por panos numa crise que, por enquanto, é apenas presumida. A extensão da insatisfação no PMDB, um partido habituado a fazer emboscadas, somente será avaliada no mercado futuro das votações na Câmara e no Senado.
O argumento de Temer para acalmar os pemedebistas é que o modelo Dilma de governar é esse mesmo, ela prefere o técnico ao partidário. Como exemplo cita o Ministério de Cidades. A presidente deve substituir o atual ministro Mário Negromonte por outro nome indicado pelo PP, mas preferiria nomear o ex-ministro Márcio Fortes ou um outro técnico da área. A mesma situação do Ministério do Trabalho, que será ocupado novamente por um nome do PDT.
Outro argumento usado por Temer para acalmar os pemedebistas: na prática, até agora, as mudanças diminuíram o espaço do PT. O partido do governo, por exemplo, planejava botar o deputado federal Newton Lima, ex-reitor da Universidade Federal de São Carlos, no lugar do senador Aloizio Mercadante no Ministério da Ciência e Tecnologia. Ganharia duplamente, pois manteria o MCT com o PT e abriria espaço para o ex-deputado José Genoino, primeiro suplente, assumir uma vaga na Câmara. Dilma, no entanto, preferiu o nome técnico, Marco Antônio Raupp, presidente da Agência Espacial Brasileira (AEB).
Na avaliação feita por Temer aos pemedebistas, o mesmo ocorreu com a mudança de comando na Petrobras: Maria das Graças Foster, nova presidente, foi escolhida mais por sua condição de técnica e mulher que por eventuais ligações com o PT. "É uma pessoa dela". Sérgio Gabrielli, o presidente de saída, tem projeto político claro: já disputou o governo da Bahia e concorrerá de novo em 2014, na sucessão do amigo Jaques Wagner.
Outro exemplo: o Ministério dos Transportes. Embora o ministro Paulo Passos seja filiado ao PR, as bancadas da sigla no Congresso o reconhecem como seu legítimo representante. E vai ficar assim mesmo.
O PMDB pode até ser compensado com cargos "infraministeriais", segundo expressão pemedebista, o que também não é garantido. Até agora, mesmo considerando-se sub-representado, o PMDB foi um aliado incomodo mas fiel. As eleições e os cortes no Orçamento podem apimentar a insatisfação com a falta de ministérios com verbas gordas. Com aprovação recorde, Dilma está à vontade para pagar pra ver.
O ex-presidente do Banco Central Henrique Meirelles descarta a possibilidade de ser candidato a vice-prefeito nas eleições de outubro na capital de São Paulo, como tem sugerido o prefeito Gilberto Kassab em conversas eleitorais com o PT. Meirelles, segundo diz, se filiou ao PSD para ter um espaço para atuar no debate político e econômico. Ele está escrevendo o capítulo referente à economia do programa do PSD. Ele resume a isso suas atividades políticas em 2012. Nem mesmo uma eventual candidatura a prefeito estaria em seus planos, na hipótese de o PSD resolver concorrer com nome próprio. O ex-presidente do BC não descarta eventuais projetos políticos no futuro, mas por enquanto sua atenção estaria integralmente voltada a projetos na iniciativa privada, sobre os quais prefere não falar. Meirelles o Conselho Público Olímpico, cargo que não o impede de assumir projetos na área privada.
Raymundo Costa é repórter especial de Política, em Brasília. Escreve às terças-feiras

POLÍTICA
Despedida de Haddad pode ter presença de Lula

Caio Junqueira | De Brasília

As cúpulas do PT e do governo Dilma Rousseff colocaram em prática estratégia para alavancar a candidatura a prefeito de São Paulo do ministro da Educação, Fernando Haddad. A vitória do petista no principal colégio eleitoral do país, onde os petistas só saíram vitoriosos em duas ocasiões (em 1988, com Luiza Erundina, e em 2000, com Marta Suplicy), é a prioridade política do governo nas eleições municipais deste ano. O objetivo é derrotar o PSDB e fortalecer o PT para a disputa em 2014 do governo de São Paulo, Estado que o partido nunca governou.
Sob a justificativa de apresentar um balanço ou cumprir um rito formal de transmissão de cargo, o governo programou dois eventos oficiais no Palácio do Planalto para dar exposição a Haddad. Ontem, uma cerimônia para celebrar a concessão de um milhão de bolsas do ProUni; hoje, uma solenidade de transmissão de cargo do Ministério da Educação, com a presença do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
A participação de Lula marca o início dos trabalhos em 2012 do marqueteiro João Santana. Responsável pelo marketing das campanhas de reeleição do ex-presidente em 2006 e de eleição da presidente Dilma Rousseff em 2010, Santana ainda não foi confirmado para a campanha de Haddad à Prefeitura de São Paulo, mas já aconselha o passo-a-passo do ministro nesta pré-campanha.
Levar Lula a Brasília hoje, por exemplo, foi ideia dele. O ex-presidente passa por uma sessão de radioterapia pela manhã e, havendo liberação dos médicos, embarca na sequência para a capital federal. Para concretizar a viagem, porém, outros avais foram necessários. Santana contatou o secretário-geral da Presidência da República, Gilberto Carvalho, para que avaliasse com Dilma essa possibilidade. Também idealizou um evento programático antes da despedida oficial. Isso ocorreu ontem, na cerimônia em comemoração a um milhão de bolsas de estudo no ensino superior pelo Programa Universidade para Todos (Prouni).
A avaliação é de que o ministro vinha se desgastando desde o fim de 2011 com o noticiário negativo do Enem e que era necessário "mostrar antes de ele sair que o Ministério da Educação não é só o Enem", segundo as palavras de petistas ligados ao ministro. Para gerar um contraponto a isso, o Palácio encampou a ideia. Haddad ganhou, então, palanques oficiais para defender sua gestão.
Ontem, falou de Prouni, mas também sobre a duplicação das matrículas no ensino superior nos últimos dez anos - seis dos quais esteve à frente do MEC. Recebeu elogios de Dilma, que lhe desejou "boa sorte", e do presidente da UNE, Daniel Iliescu. E saudou dois deputados fundamentais para a definição de seu nome como candidato petista: o líder da bancada federal, Paulo Teixeira (PT-SP), e o vice-líder do governo, Jilmar Tatto (PT-SP).
Não esqueceu da senadora Marta Suplicy (PT-SP), cujo empenho na campanha é tão necessário quanto incerto. Citou a experiência adquirida em seu governo em São Paulo (entre 2001 e 2004), quando foi chefe de gabinete da Secretaria de Finanças e Desenvolvimento Econômico. No evento de hoje, o tom político-eleitoral deve se repetir.
A organização da campanha de Haddad avalia que ele precisa desse empurrão inicial e que a fórmula de juntar Lula e Dilma em um mesmo ato, como esperado hoje, é a ideal. Nas pesquisas internas do PT, a aprovação de Lula e Dilma supera as médias históricas de votações de candidatos petistas na capital paulista, sempre em torno de 30%. O objetivo é fazer o ministro, que hoje tem entre 3% e 4% das intenções de voto, ter avaliação semelhante a do ex e da atual presidente.
O problema é que há uma diferença na postura de ambos. Enquanto Lula está disposto a mergulhar na campanha municipal a partir da segunda quinzena de março, Dilma não deu sinais de que fará o mesmo. Por isso buscou-se articular para que os dois estivessem juntos hoje, na troca de comando do MEC.
A oposição reagiu. O senador Agripino Maia (DEM-RN), presidente nacional do Democratas, disse que se trata de uma "overdose de exposição e de uso da máquina pública". O deputado Roberto Freire (PPS-SP), declarou não acreditar que "Dilma vai se preocupar em ter compostura para eleger Haddad".
Amanhã, a presidente irá a São Paulo para ser condecorada pelo prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab (PSD), com a medalha 25 de Janeiro. Ela também será concedida ao governador Geraldo Alckmin (PSDB). Cogitou-se a possibilidade de Haddad acompanhar Dilma neste evento, mas o ministro disse que precisa cuidar da sua mudança para São Paulo. Além disso, é seu aniversário também. Confirmou, então, apenas presença na reunião do conselho político da campanha neste sábado. Em pauta, a aliança com Kassab e o calendário da pré-campanha. (Colaborou Fernando Exman)

CUT cobra decisão rápida sobre fim do imposto sindical

João Villaverde | De Brasília

O movimento sindical está a um passo de uma cisão sem precedentes em seis anos. A Central Única dos Trabalhadores (CUT), a maior dentre as seis centrais sindicais, enviou uma carta ao presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Cezar Peluso, solicitando "celeridade" na votação de ação sobre a extinção do imposto sindical. A atitude isola a CUT no movimento sindical, uma vez que as demais centrais, capitaneadas pela Força, são favoráveis à manutenção do imposto, tal qual as entidades patronais.
Na carta, a que o Valor teve acesso, a CUT afirma que "o atual modelo de financiamento dos sindicatos, baseado no imposto sindical deve ser mudado, para que tenhamos organizações mais representativas e fortalecidas". A tese da CUT é antiga - ao receber os recursos repassados pela União, que no ano passado totalizaram cerca de R$ 1,2 bilhão ao movimento sindical, os sindicatos não são incentivados a atuar em prol dos trabalhadores, uma vez que os recursos são garantidos.
Arrecadado de maneira compulsória de todos os trabalhadores formais desde 1943 (que contribuem com o equivalente a um dia de salário), o imposto sindical é dividido entre sindicatos (que ficam com 60% do total), federações (15%), confederações (5%) e, desde 2008, com as centrais sindicais (10%). O restante vai para o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT).
A CUT defende a substituição do imposto sindical por uma "taxa negocial", definida por cada sindicato em assembleia com a categoria. O fim do imposto sindical também pode abrir caminho para o fim da unicidade sindical, bandeira antiga da CUT - assim, uma mesma categoria em um único município pode ser representada por vários sindicatos.
A tese da CUT, contrária ao imposto sindical desde sua fundação, em 1983, foi esquecida pela central, ligada ao PT, quando o então presidente Luiz Inácio Lula da Silva permitiu o repasse dos recursos, por meio da Lei 11.648, de abril de 2008. Pela lei, as centrais, então excluídas do repasse do imposto sindical (que contemplava, desde sua criação no governo Getúlio Vargas, apenas sindicatos, federações e confederações), passaram a receber os recursos e, de quebra, ficaram desobrigadas a prestar contas ao Tribunal de Contas da União (TCU). Apenas no início do ano passado, depois de embolsar mais R$ 70 milhões entre 2008 e 2010, a CUT voltou a defender sua extinção.
Desde 2008 tramita no STF uma ação direta de inconstitucionalidade (Adin), que propõe o fim do repasse do imposto sindical às centrais. A Adin foi proposta pelo DEM, partido de oposição aos governos Lula e Dilma Rousseff, fortemente apoiados pela CUT, que é ligada ao PT. "A vontade [da CUT] de se isolar é tão grande que fez, por linhas tortas, o PT apoiar uma tese do DEM. Como dizia [Leonel] Brizola, "o PT é a UDN de tamancos"", criticou um dirigente da Força Sindical, segunda maior central do país, e ligada ao PDT, partido fundado por Brizola em 1980.
A CUT, no entanto, não quer colar sua crítica ao imposto sindical à política do DEM. A Adin ajuizada pelo DEM prevê, também, que o reconhecimento dado às centrais em abril de 2008, junto ao repasse do imposto sindical, seja anulado. Em declaração oficial ao site da CUT, o secretário-geral da central, Quintino Severo, afirma que "iremos lutar para que apenas o imposto caia e dê lugar a uma forma de sustentação [do movimento sindical] de fato democrática. Não faz sentido modificar [o reconhecimento], apenas o imposto".
Em compasso de espera no STF há dois anos, quando o ministro Carlos Ayres Britto pediu vistas, a votação sobre a Adin está empatada. Três ministros já se declararam favoráveis ao fim do imposto sindical (Joaquim Barbosa, Cezar Peluso e Ricardo Lewandowski), enquanto três são contrários (Marco Aurélio Mello, Cármen Lúcia e Eros Grau). Além de Ayres Britto, restam ainda os votos de Gilmar Mendes, Luiz Fux e Rosa Maria Weber. Rosa Maria votará pois a ministra que ocupava o assento no Supremo quando a votação foi iniciada - Ellen Gracie - não chegou a votar. Já o ministro José Antonio Dias Toffoli declarou-se impedido de votar. "O STF precisa ser rápido, porque o repasse de 2012 já vai começar, e se quisermos cortar essa conta milionária ainda em 2013, a votação precisa ser concluída neste primeiro semestre", afirma um líder da CUT nacional, que preferiu não se identificar para evitar "maiores discussões com o movimento sindical".
Desde o fim de 2006, quando o então presidente Lula transferiu o Ministério do Trabalho do PT e da CUT para o PDT e a Força Sindical, e iniciou o debate sobre a política de valorização do salário mínimo (mantida pela presidente Dilma), o movimento sindical está unido nas principais questões políticas. O auge da união entre as seis (CUT, Força, UGT, CTB, NCST e CGTB) aconteceu nas eleições presidenciais de 2010, quando Dilma recebeu o apoio explícito das seis centrais.

TSE convoca especialistas para testarem urnas

Juliano Basile | De Brasília

O objetivo dos testes é que os especialistas consigam detectar falhas nas urnas. Com isso, o TSE identifica possíveis problemas no sistema de votação eletrônica e faz aperfeiçoamentos antes das eleições municipais de outubro.
As sessões de ataques às urnas vão acontecer entre 20 e 22 de março. O edital público para convocar os técnicos será divulgado hoje.
Na última vez em que o TSE fez testes, em novembro de 2009, Sérgio Freitas, um especialista em informática, conseguiu quebrar o sigilo do voto com um rádio de pilha. Com o rádio, Freitas captou ondas emitidas pelo teclado da urna enquanto o número do candidato era digitado. Como ele conseguiu essa captação somente a cinco centímetros da urna, o TSE concluiu que a prática não era um risco para a eleição, pois as urnas ficam isoladas e sob vigilância. Mas, o teste identificou uma vulnerabilidade e serviu para aperfeiçoar o sistema. Freitas ganhou R$ 5 mil por ter ajudado a contribuir com o aperfeiçoamento das urnas.
Ao todo, 37 especialistas participaram da última rodada de testes nas urnas. Equipes da Marinha e do Superior Tribunal de Justiça (STJ) tentaram atacar o cartão de memória. Um especialista da Information Systems Security Association, um órgão internacional da área de segurança da informação, tentou mostrar que uma pessoa poderia votar em duas seções, mas não obteve êxito.
Para os testes deste ano, haverá uma novidade: o TSE vai colocar à disposição o código fonte. Esse código é importante, pois é através dele que o funcionamento do sistema eleitoral é transmitido para o computador.
Serão feitos ataques aos sistemas de software e de hardware. No caso do software, o ataque será bem sucedido quando o técnico conseguir quebrar o sigilo ou alterar a destinação do voto, sem deixar rastros. Em relação ao hardware, os técnicos vão tentar instalar um dispositivo entre o teclado e o processador da urna para ver se é possível identificar as teclas e alterar o voto que foi digitado.
Antes de participar, os técnicos fazem planos de ataques, nos quais podem pedir mais de uma urna e especificar se elas devem ser lacradas ou não. Os planos costumam ser aprovados, salvo algumas exceções, como o caso de um especialista que queria jogar ácido na urna e teve o teste negado.
Nova secretaria vai reestruturar funcionamento dos ministérios

Por Luciana Otoni | De Brasília

O governo vai reestruturar o funcionamento de todos os ministérios. Em uma ampla reformulação a ser iniciada este ano, secretarias poderão ser extintas e outras criadas, conforme o parâmetro de eficiência que está sendo definido pelo Executivo. Além disso, o governo vai estabelecer parâmetros para o controle dos gastos de custeio.
A reformulação estará a cargo da Secretaria de Gestão Pública do Ministério do Planejamento, instituída ontem pela presidente Dilma Rousseff, por meio do decreto 7.675, no dia da primeira reunião ministerial deste ano.
A nova secretaria, que vai definir indicadores de controle das despesas de custeio e avaliar os procedimentos administrativos de cada ministério, resultou da fusão de outras duas (de Gestão e de Recursos Humanos), que foram extintas. Ela será chefiada por Ana Lúcia Amorim e terá sete departamentos.
A fusão, que conferiu um caráter de supersecretaria ao novo órgão, vai impor novos padrões de eficiência à Esplanada dos Ministérios. "Não foi mera junção de departamentos", ressaltou o secretário-executivo adjunto do Ministério do Planejamento, Valter Correia.
Entre as modificações, Correia informou que a nova secretaria reunirá uma equipe de 14 gestores encarregada de formular procedimentos para aperfeiçoar a atuação dos órgãos federais. É essa equipe que definirá quais ministérios terão que ser reestruturados.
Um projeto piloto de revisão de procedimentos que está em curso nos ministérios da Justiça e da Saúde será replicado em escala maior nas demais pastas. Entre as avaliações que estão sendo feitas, os gestores monitoram, por exemplo, como é feita a compra de medicamentos pelo Ministério da Saúde.
"Acabamos de contratar uma consultoria para melhorar processos de trabalho nos ministérios da Justiça e da Saúde e isso será gerenciado pelo Ministério do Planejamento", informou o secretário-adjunto. "Vamos redesenhar todo o processo de trabalho", disse.
Segundo ele, serão feitos diagnósticos e as etapas de trabalho que não agregam valor serão eliminadas. "É um projeto-piloto e a ideia é fazermos isso em outra escala", completou Correia.
Além da reformulação na forma de atuação dos ministérios, a Secretaria de Gestão Pública está encarregada de idealizar indicadores de acompanhamento dos gastos do governo com o custeio da máquina. "Temos um programa vinculado à Secretaria de Orçamento Federal de eficiência do gasto. Isso foi implantado em alguns órgãos, ainda em 2010, e agora queremos fazer de forma mais geral na Esplanada dos Ministérios", informou.
Entre as ações relacionadas ao melhor uso das verbas constam a revisão dos procedimentos para contratação de serviços terceirizados, despesas com passagens aéreas, uso de material de escritório e consumo de energia elétrica. "Isso é para melhorar o custeio. Agora temos condições de medir isso", explicou.
Valter Correia citou como exemplo o maior rigor sobre a despesa com diárias e passagens aéreas. Esse desembolso passou de R$ 2,3 bilhões em 2010 para R$ 1,3 bilhão em 2011. A meta do Ministério do Planejamento é fazer com que reduções desse tipo com custeio não sejam pontuais, mas permanentes.
Ao comentar que até agora faltavam indicadores para medir esse tipo de gasto, o secretário-adjunto disse que o Ministério do Planejamento finaliza mecanismos que permitirão a mensuração das despesas com a manutenção da máquina administrativa.
Segundo ele, a Secretaria de Gestão Pública treinará equipes para dar capilaridade a esse controle. Um dos exemplos citados é o consumo de energia. O Ministério do Planejamento já possui um acompanhamento sobre gastos com energia em alguns prédios públicos e busca agora definir metas de redução dessa despesa nos vários órgãos da administração federal.
A implantação da Secretaria de Gestão Pública foi acompanhada da criação da Secretaria de Relações do Trabalho. Idealizada pelo secretário de Recursos Humanos, Duvanier Paiva - morto na quinta-feira em consequência de um infarto do miocárdio -, essa nova divisão ficará encarregada de negociar com os representantes do funcionalismo público.
A secretaria, que será chefiada interinamente por Marcela Tapajós, não possui departamentos, mas coordenadorias em uma configuração que privilegia uma estrutura enxuta destinada a conferir agilidade e rapidez às negociações sobre reajuste salarial e reestruturação de carreiras.
As demais atribuições relativas ao funcionalismo público, como a administração da folha de pagamento, realização de concursos públicos e estruturação da força de trabalho serão executadas pela Secretaria de Gestão Pública.

Indústria deve crescer menos que 3%, diz Focus

Por Arícia Martins | De São Paulo
Pela primeira vez no ano, o mercado espera que a produção industrial cresça menos de 3% em 2012. O Boletim Focus divulgado ontem mostra que os analistas revisaram para baixo pela segunda semana consecutiva suas projeções para a produção industrial, cuja mediana caiu de 3,31% para 2,94% entre a leitura da semana passada e a atual. Para o sócio-diretor da RC Consultores, Fabio Silveira, as estimativas dos economistas consultados pelo Banco Central ainda têm espaço para redução.
"Há muitos fatores prejudicando o dinamismo da indústria, sendo os principais para 2012 o enfraquecimento do mercado doméstico e do mercado internacional", afirma Silveira, que recentemente alterou de 1,5% para 1% sua projeção para o avanço da produção este ano. Segundo o economista, sem medidas adicionais do governo para estimular a economia e mais cortes na taxa básica de juros, a Selic, o crescimento da indústria em 2012 pode ser igual ao de 2011, próximo de zero.
Os analistas voltaram a reduzir, pela oitava semana consecutiva, a projeção de inflação deste ano do Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA). Agora, a expectativa é que o indicador encerre 2012 em 5,29%, ante aposta de 5,30% na semana passada. O mercado também baixou sua previsão sobre o fechamento da taxa anual do IGP-M, da Fundação Getulio Vargas, e do IPC, da Fipe, para 5% e 5,22%, respectivamente. A projeção para o saldo da balança comercial foi elevado de US$ 19,10 bilhões para US$ 19,60 bilhões.

INTERNACIONAL
Alta do turismo ajuda as economias ibéricas

Victor Mallet e Peter Wise | Financial Times, de Madri e Lisboa

Malcolm Campbell, um bronzeado orientador vocacional da remota região de Pilbara, no noroeste da Austrália, nunca havia ouvido falar Museu do Prado até ele e sua esposa praticamente tropeçarem na mais famosa coleção de arte da Espanha, em Madri.
"Viemos à Espanha para ver uma cultura diferente", afirmou na semana passada o turista de 55 anos, no início de férias prolongadas de três meses, um pouco mais acessíveis para seu bolso graças à força do dólar australiano.
As economias ibéricas podem estar em depressão, afetadas pela crise das dívidas soberanas da região do euro, mas nunca antes o "triângulo dourado" de museus de arte de Madri havia dado boas-vindas a tantos visitantes, tanto próximos quanto longínquos.
O Prado, o Reina Sofia (lar de "Guernica", de Picasso, que mostra o bombardeio da cidade em 1937, durante a guerra civil) e o Thyssen-Bornemisza receberam em 2011 um número recorde de visitantes, em meio ao crescimento do setor de turismo espanhol: 2,9 milhões, 2,7 milhões e 1,1 milhão, respectivamente.
Os setores bancário e de construção estão atolados na crise e na recessão, mas o número de turistas que chegaram à Espanha subiu 8% em 2011 e somou quase 57 milhões, de acordo com o Ministério de Indústria, Energia e Turismo do país. O aumento deve-se em parte aos levantes políticos no norte da África, que dissuadiram turistas que, de outra forma, teriam visitado a Tunísia ou o Egito, em busca de sol.
Lisboa, a capital da vizinha Portugal, também vem lucrando com o fluxo de turistas culturais atraídos por seu clima quente, estabilidade política, baixos índices de criminalidade e preços competitivos - um voo de ida e volta saindo de Munique, com quatro noites em hotel, custa a partir de € 300.
Visitantes da Europa e dos EUA aproveitavam o sol de ontem nas muralhas do Castelo de São Jorge, enquanto gozavam das vistas de Lisboa e do rio Tejo, a atração turística mais popular da cidade. Cilla Lundberg, de Innsbruck, na Áustria, disse que encontrar um país "politicamente seguro" para visitar havia sido um critério importante levado em consideração quando buscou na internet um destino ensolarado para as férias.
De acordo com a empresa de consultoria Roland Berger Strategy, Lisboa é a segunda capital europeia, atrás de Amsterdã, com maior crescimento no número de pernoites nos últimos cinco anos. Também é a capital com maior número de pernoites em relação à população, 6,2 milhões em 2010 para cerca de 1 milhão de habitantes.
Embora se estime que a economia portuguesa tenha se contraído 1,6% em 2011, e se projete uma nova retração, de 3,1%, para este ano - o que representa a maior recessão dos últimos 50 anos no país -, o número de visitantes estrangeiros a Lisboa cresceu 9,1% nos dez primeiros meses de 2011, em comparação ao mesmo período do ano anterior.
O Mosteiro dos Jerónimos, outra das principais atrações, e o Museu do Chiado registraram aumentos de 7,4% e 26,1% na visitação, na comparação entre os mesmos períodos.
Mais de três anos de crise econômica, no entanto, começam a cobrar seu preço. Miguel Zugaza, diretor do Prado, controlado pelo governo espanhol, diz que os subsídios estatais para o museu e sua grande coleção de obras de Velázquez, Goya e Rubens, entre outros, terá sido cortada em 30% entre 2010 e 2013, como parte dos esforços de maior austeridade por todo o país.
Mesmo com seus quase 3 milhões de visitantes anuais, a maioria deles estrangeiros, Zugaza afirma que precisa encontrar formas de cobrir o orçamento anual do museu, de € 42 milhões. Metade desse valor é coberta pelo governo.
"A única resposta é gerar mais atividade", disse Zugaza, que acaba de cancelar o tradicional fechamento do museu às segundas-feiras, com o que agora o local fica aberto sete dias por semana. "Abrir todos os dias não é algo surpreendente para britânicos ou holandeses, mas para nós é novidade."
Do lado de fora, um grupo de estudantes sul-coreanos, em excursão de um mês como mochileiros na Europa, classificou o Prado como uma das três maiores atrações, entre os museus, no continente europeu, ao lado do Louvre, em Paris, e da National Gallery, em Londres. "Adoro a Espanha", disse Kim Seung-su, estudante de 20 anos, que estava na entrada do Prado. "As pessoas têm paixão."

Em discurso, Obama deve dar hoje tom de confronto à campanha

Alex Ribeiro | De Washington

O presidente Barack Obama vai se vender como o defensor da classe média contra a concentração de renda nos EUA, em um importante discurso que fará hoje à noite. Os adversários republicanos já preparam o contra-ataque, acusando Obama de estimular a "luta de classes" no país.
O chamado "Estado da União", discurso anual ao Congresso visto por cerca de 50 milhões de americanos, ganha ares de palanque este ano devido às eleições presidenciais de novembro, em que Obama disputa um segundo mandato.
Ao contrário da eleição de 2008, quando Obama se comprometeu a levar a Washington um estilo conciliatório, agora ele deve assumir uma postura de confronto, indicando que as mazelas econômicas que afetam o país são causadas por políticas defendidas pelos republicanos, como corte de impostos e redução da regulação econômica.
O porta-voz da Casa Branca, Jay Carney, disse ontem que Obama vai se inspirar num discurso feito por ele em Kansas, em dezembro, no qual defendeu "uma economia em que trabalho duro e responsabilidade sejam recompensados, em que cada um tenha a sua parte justa e em que todos sejam responsabilizados pelo que fazem".
Na ocasião, Obama culpou as elites econômicas de Wall Street pela crise que atinge o país desde 2007 e que deixou um legado de baixo crescimento e alto desemprego. "Cada vez menos pessoas se beneficiam do sucesso da economia", disse Obama. "Os que estão bem no topo ficaram mais ricos."
A mensagem é dirigida sobretudo à base de seu Partido Democrata, que está menos motivada a ir votar neste ano do que em 2008 (o voto é facultativo nos Estados Unidos), quando a campanha de Obama envolveu os eleitores americanos com um discurso de mudança.
A retórica é muito semelhante à adotada pelo movimento Ocupem Nova York, um grupo que acampa em praças públicas em protesto contra o enriquecimento das elites. Os EUA, de fato, passam por um processo de concentração de renda. De fins da década de 70 para cá, a fatia do 1% mais ricos na renda nacional saltou de 8% para 18%. Há ainda uma frustração por ter se rompido o sonho americano de cada geração viver melhor do que a anterior. Em 2010, um trabalhador homem médio ganhava US$ 47.715 por ano, não muito acima dos US$ 47.550 recebidos em 1972, corrigidos pela inflação.
O desafio da campanha de Obama, que ainda é o favorito para vencer as eleições, será montar uma narrativa que, ao mesmo tempo, mobilize os eleitores democratas e não afaste os eleitores independentes, que em geral gostam do discurso moderado. As acusações aos republicanos dizem pouco a esse segmento, que ora vota num partido, ora no outro.
A campanha promete ser radical dos dois lados. A oposição republicana deu uma guinada à direita com o surgimento do movimento ultraconservador Tea Party. Isso empurrou à direita candidatos mais moderados que disputam as previas do partido, como o ex-governador de Massachusetts Mitt Romney. Também abre espaço para candidatos mais conservadores, como o ex-presidente da Câmara dos Deputados Newt Gingrich.
Obama começou a adotar uma retórica mais à esquerda no segundo semestre de 2011, após sua tentativa fracassada de negociar com os republicanos no Congresso, que levou à queda de sua popularidade. À época, ele enviou um pacote de US$ 500 bilhões ao Congresso, rejeitado pelos republicanos, que previa mais investimento público, corte de impostos para a classe média e taxação maior para os ricos.



EMPRESAS & TECNOLOGIA
Falha em turbinas de Santo Antônio atrasa geração

Por Josette Goulart | De São Paulo

Uma falha nas primeiras turbinas que entrariam em operação na usina hidrelétrica de Santo Antônio, no Rio Madeira, em dezembro, está deixando apreensivos os sócios do mega-empreendimento que vai consumir mais de R$ 13 bilhões em investimentos. Pelo cronograma da obra, aprovado pela Agência Nacional de Energia Elétrica, a usina já deveria ter neste momento duas turbinas em operação com capacidade de gerar 150 megawatts (MW). Mas a geração de energia foi adiada por mais de um mês e é grande a expectativa para o novo teste dos equipamentos, que deve acontecer na próxima semana.
Segundo fontes próximas ao empreendimento, os engenheiros do consórcio fornecedor liderado pela Alstom, e que é formado ainda pela Voith e Andritz, entendem que o problema ocorreu por uma falha em uma peça de fixação do mancal, que circunda o eixo da turbina. Quando a água passou pela primeira vez, a turbina chegou a funcionar 100%, mas logo o mancal se chocou com o eixo e gerou superaquecimento pelo atrito das duas peças que não podem se encostar. Se o problema detectado for de fato somente a peça de fixação, em fevereiro as duas turbinas devem entrar em operação normalmente. Se for o mancal, o atraso será bem maior.
A sombra de preocupação entre alguns sócios se deve ao fato de as turbinas que estão sendo usadas em Santo Antônio serem de uma tecnologia relativamente nova no mundo. Elas são do tipo bulbo, próprias para geração chamada a fio d"água, e do tamanho específico solicitada para a usina, de 75 MW cada, é uma das únicas no mundo. O consórcio fornecedor é todo europeu, com fábricas no Brasil, e juntos têm um contrato de mais de R$ 3,5 bilhões.
Os prejuízos contabilizados ainda são pequenos, mesmo para os fornecedores das turbinas. Como se tratava de uma antecipação do cronograma estabelecido quando a usina foi leiloada, os sócios e o consórcio fornecedor e construtor por enquanto estão apenas deixando de ganhar. Segundo fontes, os contratos de energia só foram negociados com consumidores livres a partir de março. "Mas o fato é que tínhamos toda uma publicidade pronta para capitalizar em torno de uma antecipação de um ano de uma das obras mais importantes do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC)", diz um sócio do empreendimento. "E agora estamos nas mãos das turbinas".
A sociedade é formada por Odebrecht, que aumentou na semana passada sua participação na usina, Cemig, Andrade Gutierez, FI FGTS e Furnas. O consórcio construtor é liderado pela Odebrecht e tem ainda a participação da Andrade Gutierrez.
Apesar de a obrigação assumida em leilão ser de iniciar a geração somente em dezembro de 2012, a confiança na antecipação era tamanha que a Santo Antônio Energia registrou, já em meados do ano passado, o novo cronograma e por isso agora a usina aparece com o status de atrasado nos relatórios de fiscalização da agência. Quando estiver pronta, a hidrelétrica terá capacidade de gerar 3.150 MW de energia, com 44 turbinas instaladas. Somente para este ano a previsão é de já ter instalado turbinas suficientes para gerar 1.070 MW.
Tecnicamente, o assunto não está sendo tratado abertamente pela Santo Antônio Energia, que assumiu a comunicação de qualquer tema envolvendo o início de geração, proibindo fornecedores e o consórcio construtor de se manifestarem. Em nota, a empresa informou apenas que vem realizando ininterruptamente testes, desde dezembro de 2011, e que a previsão é que duas turbinas entrem em funcionamento simultaneamente em fevereiro de 2012.
"O comissionamento é uma etapa que tem o objetivo de ajustar e confirmar parâmetros mecânicos e elétricos esperados, visando assegurar o desempenho de turbinas, geradores e sistemas associados, portanto, parte prevista no processo de geração. Para as duas primeiras unidades geradoras da UHE Santo Antônio, que abriga as maiores turbinas Bulbo do mundo, está prevista a realização do comissionamento em prazo de até 90 dias".
O que a empresa não informou é que esse comissionamento já teve início, segundo dados da Aneel, em outubro. A Cemig chegou a informar ao mercado o início da geração e teve que mandar uma retificação dizendo que havia se enganado. "Fomos pegos de surpresa com a falha, por isso estamos preocupados", disse um dos sócios.
Algumas fontes dizem que apenas a primeira turbina falhou e a segunda não foi sequer testada. Já outras dizem que as duas primeiras foram testadas e falharam e que na semana que vem a terceira turbina é que vai entrar em operação. "Tem usina que só tem quatro turbinas, então os fornecedores não podem ter tantas turbinas falhando, mesmo que tenhamos 44 no nosso projeto", diz uma fonte.

Família Gradin tentou acordo com os Odebrecht

Por Cristine Prestes e Mônica Scaramuzzo | De São Paulo

A família Gradin, que por meio da Graal Participações disputa na Justiça a validade do exercício de opção de compra de uma fatia de 20,6% das ações da Odbinv (Odebrecht Investimento), tentou no fim do ano passado um acordo com os membros do grupo Odebrecht para pôr fim à maior disputa societária envolvendo dois dos mais importantes clãs de empresários do país. A tentativa de reaproximação partiu da família Gradin, que não confirma qualquer tipo de negociação. O Valor apurou, no entanto, que houve conversa entre as partes nesse sentido no fim do ano passado, conforme fontes próximas às duas famílias.
Uma das grandes barreiras a um possível acordo decorre do fato de que, ao negociar a quitação do valor devido pela participação de 20,6% dos Gradin, os Odebrecht dariam a eles um tratamento diferenciado em relações aos demais acionistas minoritários que venderam sua participação pelo preço proposto em 2010 pelo grupo.
A disputa entre as duas famílias teve início em dezembro de 2010, quando a Graal pediu a instauração de um procedimento arbitral para julgar a validade do exercício de opção de compra feito pela Kieppe, que representa os membros da família Odebrecht. Ao receber o processo, a juíza Maria de Lourdes Oliveira de Araújo, da 10ª Vara Cível de Salvador, marcou uma audiência entre as partes para a instauração da arbitragem. Mas a Kieppe recorreu argumentando que a arbitragem era apenas uma das alternativas previstas no acordo de acionistas assinado por ambas em 2001.
Em 2011 as duas partes ingressaram com diversos recursos no TJ baiano, julgados ao longo dos meses. No fim do ano passado, a Kieppe ingressou com três novos recursos, pedindo a remessa do caso ao Supremo Tribunal Federal (STF) e ao Superior Tribunal de Justiça (STJ). O TJ, no entanto, negou a subida dos processos à Brasília, abrindo caminho para que a juíza da primeira instância remarque a audiência, inicialmente marcada para março de 2011, mas que acabou não sendo realizada. Ontem, o TJBA negou os últimos três recursos que impediam a realização dessa audiência, que definirá qual será a forma de solução do conflito entre ambos.
A Kieppe afirma que vai recorrer diretamente ao STJ para que a corte superior avalie o caso. Segundo o advogado Francisco Bastos, que defende a empresa, a arbitragem não é a única alternativa para resolver o conflito entre as duas famílias. Ele acredita que a cláusula do acordo de acionistas que cita a arbitragem não é compromissória, mas sim alternativa.
O advogado Modesto Carvalhosa, que defende a Graal, afirma que desde o início da disputa o TJ baiano foi unânime no sentido de que ela deve ser solucionada por conciliação ou arbitragem. "Agora o TJ exauriu sua jurisdição, cabe à juíza de primeira instância designar a audiência." Carvalhosa diz ainda que em breve entrará com medidas judiciais para cobrar R$ 20 milhões em dividendos relativos a 2010, devidos pela Odbinv à Graal e ainda não pagos.
De outro lado, Francisco Bastos afirma que a primeira parcela referente à opção de compra exercida pela Kieppe, de R$ 800 milhões, já está disponível e que em agosto outros R$ 400 milhões. Em 2013, mais outros R$ 400 milhões serão colocados à disposição da Graal.

FINANÇAS
Selic deve cair a ritmo menor

Por Daniela Machado | De São Paulo

O Banco Central deve cortar a taxa básica de juro novamente em 0,50 ponto percentual em março, mas reduzir o ritmo para 0,25 ponto na reunião de abril do Comitê de Política Monetária (Copom), colocando a Selic em 9,75% ao ano, segundo projeções do mercado compiladas pelo próprio BC.
A coleta diária de dados para confecção do boletim Focus mostra que, na última segunda-feira, houve mudança na mediana das estimativas - que, até então, era de novo corte de 0,50 ponto em abril.
Ainda assim, não houve alteração na expectativa da Selic para o encerramento deste ano, que continua sendo de 9,50%. Isso indica que, após abril, outro corte de 0,25 ponto é projetado pelo mercado.
Os dados da coleta diária mostram um cenário ainda a ser consolidado, com projeções que variam dia a dia para os meses seguintes e ainda não são visualizados no boletim Focus divulgado semanalmente.
A fotografia do momento é de manutenção do juro em 9,75% na reunião do Copom em maio e uma divisão do mercado sobre as apostas para o encontro de julho (com a mediana das projeções em 9,63%). A mediana mostra que o juro básico cairia para 9,50% em agosto.
As projeções coletadas na última sexta-feira também mostram que a Selic poderia subir para 10% em fevereiro do ano que vem.

Fundos do PanAmericano também tinham fraude

Por Cristine Prestes | De São Paulo

A venda de carteiras de crédito sem a devida baixa no balanço do PanAmericano - chamada pelos ex-diretores da instituição como cessão "sem financeiro" - não ocorreu apenas nas operações realizadas com outros bancos. A fiscalização do Banco Central (BC) e a auditoria interna promovida pela nova administração da instituição encontraram carteiras cedidas aos fundos de investimentos em direitos creditórios (FIDCs) Autopan e Masterpan, mas que já haviam sido contabilizadas como prejuízo no balanço do banco.
Agora denominados Caixa Master CDC Veículos e Caixa CDC Veículos, os fundos Masterpan e Autopan eram administrados pela subsidiária PanAmericano DTVM até o fim de fevereiro do ano passado, quando foram transferidos para a Caixa Econômica Federal (CEF). Ambos destinam-se à aquisição de direitos creditórios decorrentes de financiamentos de veículos realizados pelo PanAmericano.
O relatório de fiscalização do BC, datado de 31 de março de 2010, faz parte do inquérito aberto pela Polícia Federal para apurar indícios de fraudes contábeis e crimes contra o sistema financeiro nacional, supostamente praticados pela antiga diretoria do PanAmericano. Conforme o documento, o banco "manteve cedidas e registradas no ativo dos FIDCs operações que já havia levado a prejuízo no banco, fazendo registros em duplicidade nessas operações de crédito". Além disso, o relatório aponta que algumas operações de crédito, em que parte das parcelas foi cedida aos fundos e outra parte ficou na carteira do banco, não eram "classificadas conforme o nível de risco apropriado".
Os problemas na cessão de créditos e na avaliação do risco das carteiras não foram os únicos encontrados nos dois fundos. O relatório de auditoria interna, concluído em março do ano passado pela nova diretoria do PanAmericano e também incluído no inquérito da Polícia Federal, apontou diversas falhas em controles internos. Ao todo, a nova administração do PanAmericano encontrou em ambos 14 irregularidades - 11 delas consideradas de alto risco. Segundo o documento, "praticamente todas as rotinas contêm deficiências que deixam o administrador dos fundos FIDCs, a PanAmericano DTVM, vulnerável não somente a fraudes, mas também a penalizações por parte da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e do BC".
De acordo com a auditoria interna, o fundo Masterpan mantinha, em 31 de dezembro de 2010, 502 parcelas de 11 contratos cancelados no valor de R$ 139,9 mil, além de 895 parcelas de 56 contratos liquidados que somavam R$ 422,8 mil. Já o Autopan incluía 96 parcelas de 2 contratos cancelados no valor de R$ 16,6 mil e 153 parcelas de 15 contratos liquidados que somavam R$ 107,2 mil.
O relatório aponta como agravantes, na administração dos FIDCs pelo PanAmericano, a possibilidade de o sistema permitir a cessão de parcelas de contratos vencidos e de seus usuários poderem intervir nos repasses. Na prática, o sistema permitia a manipulação do fluxo de recursos aos fundos pelos seus usuários. Ou seja, interferir no repasses de parcelas dos empréstimos pagas pelos clientes relativas a carteiras de crédito cedidas aos fundos. Isso permitia ao banco, além de reter os valores recebidos para gerar fluxo de caixa, dissimular o rating das carteiras de crédito que compunham os FIDCs.
Outras falhas apontadas no relatório são a ausência de documentação relativa a transferências de créditos e a falta de auditoria no exercício de 2010. Ainda de acordo com o relatório, faltavam também informações relevantes nos cadastros dos clientes - como documentos de identificação e endereços -, o que implicaria risco de "investimentos em nome de "laranja" (falsos aplicadores utilizando-se do mecanismo financeiro para a lavagem de dinheiro)", conforme o texto do documento. E, em pelo menos uma oportunidade, o banco teve que ressarcir um investidor em R$ 1,1 milhão por ter feito o resgate indevido de R$ 16 milhões aplicados por um cotista.
Após a transferência para a Caixa, os fundos do PanAmericano vêm operando normalmente. Procurada pelo Valor, a Caixa informou, por meio de sua assessoria de imprensa, que, como administradora dos FIDCs desde 28 de fevereiro do ano passado, contratou a Ernst & Young Terco para fazer a auditoria dos fundos. Segundo a nota enviada à reportagem, "os procedimentos típicos de auditoria, tais como revisão de papéis de trabalho de auditorias anteriores, cartas de circularização enviadas ao Banco PanAmericano e ao Sistema Especial de Liquidação e Custódia (Selic), análise dos termos de cessão, análise da carteira de crédito e informações da movimentação financeira dos fundos, vêm sendo realizados desde então". O banco estatal informou ainda que, desde que assumiu a administração dos fundos, "vem cumprindo as disposições normativas aplicáveis aos FIDCs e, neste sentido, tomando as providências subjacentes às atividades de administração e gestão".

Carlyle tenta barrar processos de acionistas

Por Miles Weiss | Bloomberg Businessweek

O Carlyle Group, firma de investimentos em participações que se prepara para abrir o capital neste ano, pretende impedir os futuros acionistas de entrar com ações judiciais coletivas ou individuais. A empresa revisou a documentação da oferta inicial de ações em 10 de janeiro e informou que os compradores das ações terão de entrar em acordos judiciais em qualquer reclamação contra a Carlyle por meio de arbitragens em Wilmington, Delaware. Isso poderia limitar a capacidade dos acionistas de ganhar grandes indenizações por infrações das leis de valores mobiliários, como em fraudes, por exemplo, segundo vários advogados.
Nos últimos anos, a Suprema Corte dos Estados Unidos chegou a vários veredictos sustentando o direito das empresas de exigir o uso de arbitragens para resolver disputas com consumidores. O Carlyle, cuja sede fica em Washington, capital dos Estados Unidos, busca estender esse conceito aos acionistas, o que poderia bater de frente com um princípio fundamental das leis de valores mobiliários dos EUA - o poder dos investidores de buscar reparações nos tribunais federais. "Isso que estamos falando aqui é legalmente um território inexplorado", diz Donald C. Langevoort, professor de direito na Georgetown University, em Washington, que já trabalhou na Securities and Exchange Commission (SEC, a Comissão de Valores Mobiliários dos EUA). "Ficaria surpreso se os tribunais permitissem que qualquer companhia impedisse inteiramente os direitos dos acionistas de entrar com processos sob as leis federais de valores mobiliários."
Christopher W. Ullman, porta-voz da Carlyle não quis comentar o assunto.
O que está em jogo são provisões das leis de valores mobiliários dos EUA que impedem os investidores de abrir mão de seu direito de buscar indenizações. Depois de a Suprema Corte ter determinado no fim dos anos 80 que essas provisões se aplicavam apenas a direitos substantivos não aos processuais, as corretoras começaram a incluir cláusulas obrigatórias de arbitragem nos contratos com os clientes, segundo informe de 2006 do órgão independente Comissão sobre a Regulamentação dos Mercados de Capitais. A comissão destacou que a Suprema Corte ainda não julgou se litígios sobre valores mobiliários contra empresas de capital aberto podem ser levados a arbitragens. "Se isso realmente pudesse ser colocado em prática, veríamos todas as empresas de capital aberto fazendo isso, o que não se vê", diz Kevin LaCroix, vice-presidente executivo da OakBridge Insurance Services, uma firma de Bloomfield (Connecticut) que assessora empresas em seguros de responsabilidade pessoal de diretores e funcionários.
O Carlyle, cofundado por David M. Rubenstein, William E. Conway Jr. e Daniel D"Aniello, é, pelo menos, a quinta firma de "private equity" a ter aberto o capital desde fevereiro de 2007, quando o Fortress Investment Group promoveu oferta pública inicial de ações. Blackstone Group, KKR e Apollo Global Management também abriram o capital desde então. O Carlyle seria a primeira a colocar a exigência de arbitragem, segundo cópias dos acordos de sociedade limitada dessas firmas em seus sites ou nos documentos apresentados à SEC.
A SEC precisa aprovar o pedido de registro do Carlyle antes de a firma de investimentos em participações poder lançar suas ações. Florence Harmon, porta-voz da SEC, não quis comentar a questão. A agência historicamente se recusa a permitir ofertas públicas de empresas cujos estatutos exijam arbitragens e proíbam ações coletivas, segundo o professor John C. Coffee Jr., da Columbia Law School, em Nova York, informou em e-mail. A SEC impediu a oferta pública inicial de ações, em 1990, de uma instituição de poupança da Filadélfia que havia incluído a cláusula de arbitragem para os acionistas em seu estatuto, de acordo com Carl E. Schneider, ex-advogado especializado na área que representava a empresa. Coffee, no entanto, diz que a SEC pode considerar o Carlyle como sendo um caso diferente por se tratar de sociedade limitada. "Será um precedente complicado de conter se a SEC permitir isso."

INVESTIMENTOS
Seabras dá largada às emissões de 2012

Graziella Valenti e Fernando Torres | De São Paulo

A Seabras, empresa de serviços para exploração marítima de petróleo, deu a largada para as captações com ações de 2012. A companhia pretende levantar até R$ 1,68 bilhão na BM&FBovespa. O sucesso da operação será um termômetro sobre o potencial do ano. A expectativa é que a Brasil Travel, companhia que reúne agências e operadoras de turismo, também inicie hoje sua operação e ajude a compor melhor esse cenário.
Embora ninguém se arrisque a fazer previsões de valores, o humor geral indica que o ano deve ser melhor que o segundo semestre de 2011, uma vez que a primeira metade do ano passado concentrou as colocações. Mas ainda há muito ceticismo, especialmente por parte dos investidores. Para aplicar, eles devem continuar pedindo preços atrativos.
A colocação da Seabras, liderada pelo BTG Pactual, é a primeira em ações desde outubro, quando a TIM Participações fez uma operação de R$ 1,71 bilhão. Contudo, já se vão seis meses desde a última abertura de capital, feita pela Abril Educação, numa oferta inicial de R$ 370 milhões.
Desde que o mercado de capitais foi revitalizado, em 2004, o maior intervalo sem uma oferta de ações foi de oito meses e ocorreu após o agravamento da crise financeira global, com a quebra do Lehman Brothers, entre o fim de 2008 e o começo de 2009. Também nessa época, a bolsa paulista ficou um ano sem registrar nenhum estreia. "O mercado de capitais é realidade no país. É natural que existam ofertas. O crescimento da economia passa por isso", resumiu o diretor de um dos mais ativos bancos de investimentos.
O início desta semana é um dos momentos finais para que as companhias possam dar a largada no processo de oferta de ações e ainda utilizar os balanços dos primeiros nove meses de 2011 no prospecto. Na prática, isso significa que, para aproveitar essa janela, a empresa precisaria ter garantido seu lugar na fila ainda no ano passado, encaminhando seu pedido de registro à Comissão de Valores Mobiliários (CVM). A lista de ofertas em análise na autarquia, além da Seabras e da Brasil Travel, só conta com a Isolux, do setor de infraestrutura.
Quem começar esse processo agora, pedindo registro ao regulador, terá de estar com o balanço de 2011 fechado. Por conta disso, a expectativa é que a sequência de ofertas demore um pouco a continuar, com as empresas ainda se preparando.
Segundo o Valor apurou, a companhia de turismo CVC, que chegou a entrar com pedido de oferta inicial de ações no ano passado, mas depois desistiu por conta das condições de mercado, retomaria sua oferta agora se estivesse com a operação em análise na CVM.
O bom humor dos banqueiros tem como ingredientes o acúmulo de caixa dos fundos de investimento, que retraíram as apostas em função da falta de visibilidade sobre a economia global, mas que precisam ir em busca de retorno para os cotistas. Além disso, as perspectivas pouco animadoras para a Europa também devem promover uma redistribuição das apostas, direcionando mais recursos para mercados emergentes- ao menos, é o que se espera. "Dinheiro não vai faltar", disse um deles ouvido pelo Valor.
Há uma soma de indicadores positivos que dão fôlego para a crença de que 2012 tem potencial para ser um bom ano. O primeiro, e mais óbvio, é o andamento do mercado. O Índice Bovespa acumula valorização de 10% neste início do ano. O fluxo de investimento estrangeiro estava positivo em R$ 3,5 bilhões, até o dia 18.
Além disso, o índice Vix, que mede a volatilidade das opções na bolsa americana e é visto como um termômetro do medo do mercado, caiu abaixo de 20 nos últimos dias, o que não ocorria desde julho de 2011. Segundo um banqueiro de investimentos, leituras abaixo de 30 nesse indicador já são suficientes para viabilizar um lançamento de ações.
Para esse executivo, o mercado queria muito mais ver a poeira baixar do que uma solução definitiva para os problemas na Europa. A dúvida é se a calmaria atual vai resistir por muito tempo.
Para um advogado especialista na área, que tem uma visão menos otimista, a percepção que ele teve quando viu o anúncio da oferta da Seabras é que "ela pode ser aquela andorinha que não será capaz de fazer o verão".
A lista de companhias que pretendiam listar suas ações na BM&FBovespa no ano passado tem nomes como a empresa de agronegócios Los Grobo, a InBrands (do setor de moda, que decidiu no fim do ano passado levantar R$ 250 milhões com debêntures), além de Camil, Copersucar, Cimentos Liz e das empresas da indústria de óleo e gás Petrorecôncavo e Perenco.
Com a paralisação das operações na segunda metade do ano, o acumulado das ofertas de ações em 2011 só foi maior do que o visto nos anos de 2004 e 2005, com um total de R$ 18 bilhões captados, em 11 ofertas iniciais e 11 subsequentes. Excluída a capitalização da Petrobras de R$ 120 bilhões em 2010, o melhor ano para o mercado foi disparado o de 2007, com um total de R$ 70 bilhões movimentados.

Ofertas devem levar mais fornecedores da indústria de petróleo à BM&FBovespa

De São Paulo

O início da negociação com as ações da Seabras está previsto para 13 de fevereiro na BM&FBovespa. A companhia pertence ao grupo norueguês Seadrill, listado nas bolsas de Oslo e Nova York e que no ano passado teve receita líquida de US$ 4 bilhões.
A companhia iniciou ontem as apresentações aos investidores. O intervalo de preço sugerido para as ações vai de R$ 20 a R$ 26. As intenções de investimento serão recebidas até 8 de fevereiro. A reserva de papéis para os interessados começa no dia 30. Além do BTG Pactual, Morgan Stanley e Citigroup estão na lista dos coordenadores.
A nova versão do prospecto preliminar diz que US$ 350 milhões, ou 58% do ponto médio previsto para a captação, serão utilizados pela companhia para pagar a controladora Seadrill pelos ativos em operação que ficarão com a subsidiária brasileira - juntos eles tiveram receita de R$ 854 milhões de janeiro a setembro do ano passado, segundo balanço não auditado.
A Petrobras é atualmente a única cliente do grupo no Brasil. No entanto, a empresa afirma que pretende buscar novos contratos.
A chegada da Seabras à BM&FBovespa confirma a expectativa de banqueiros e investidores de que, com o pré-sal, muitas empresas do ramo de óleo e gás devem acessar o mercado brasileiro, especialmente os fornecedores das companhias de exploração como Petrobras, OGX, HRT e outras.
Esse deve ser o setor com as maiores ofertas, dado o grande volume de recursos que movimenta. A crença de que a expansão desse ramo passa por capitalização com ações está no modelo utilizado pelo governo brasileiro, que dará prioridade ao conteúdo nacional.
Os banqueiros dizem que companhias com demanda determinada pelo mercado doméstico continuarão tendo um apelo de investimento mais interessante. Daí a aposta nesse ramo, assim como nos segmentos relacionados com infraestrutura e logística. (GV)

AGRONEGÓCIOS
Estoque elevado faz preço do etanol cair em plena entressafra

Fabiana Batista | De São Paulo

Com uma demanda por etanol 30% menor do que há um ano, as usinas do Centro-Sul iniciaram 2012 com os estoques cheios do biocombustível - tanto de anidro, que é misturado à gasolina, quanto de hidratado, que abastece diretamente os veículos. O resultado é que em vez de subir, como usualmente ocorre na entressafra, o preço do biocombustível na indústria está caindo vertiginosamente. Somente na semana passada, o recuo foi de mais de 6%. Mas, por enquanto, pouco dessa queda chegou ao consumidor final.
A estimativa do mercado é de que em 1º de janeiro havia em estoque no país 5,7 bilhões de litros (2,7 bilhões de litros de anidro e 3 bilhões de litros de hidratado). Se forem considerados os volumes de etanol importado que estão prestes a desembarcar nas próximas semanas, o número sobe em mais 200 milhões de litros.
"Os estoques estão semelhantes aos registrados em janeiro de 2011. A diferença é que naquela época o consumo mensal era de 2,1 bilhões de litros e agora está, no máximo, em 1,4 bilhão", diz o diretor-técnico da União da Indústria da Cana-de-Açúcar (Unica), Antônio de Pádua Rodrigues.
Durante 2011, os preços elevados do hidratado inibiram a demanda dos motoristas brasileiros, que migraram para a gasolina. E, em outubro o governo federal reduziu de 25% para 20% a mistura do anidro na gasolina, o que significará até o fim desta safra, em 31 de março, uma demanda 1 bilhão de litros menor.
O resultado é que os preços estão caindo e continuam com viés de baixa. Na semana passada, o indicador Esalq/BM&F para o etanol hidratado acumulou queda de 6,08% a R$ R$ 1.172 o m3. O anidro também caiu.
Nos postos, essa redução ainda não chegou, pelo menos não na mesma velocidade. Segundo levantamento divulgado ontem pela Agência Nacional de Petróleo (ANP), o preço do hidratado permaneceu praticamente estável na maior parte dos Estados brasileiros entre 14 e 21 de janeiro. Apenas no Estado de São Paulo houve redução mais significativa. O preço nos postos paulistas foi, em média, de R$ 1,887 o litro, 1,20% menor do que na semana anterior.
Mas isso não significa, ainda, que já compense ao motorista, do ponto de vista econômico, trocar a gasolina pelo etanol. Isso porque o preço do litro do biocombustível nos postos equivaleu, na semana passada, a 71,39% do valor da gasolina. Em média, é considerado vantajoso ao consumidor final abastecer com etanol quando este custa, no máximo, 70% do preço do combustível fóssil.
No Brasil, a relação é mais vantajosa no Estado de Goiás (70,17%). Mas, na capital paulista, a forte concorrência entre postos, está fazendo o menor preço na usina ser repassado mais rapidamente ao consumidor. Por isso, essa relação atingiu semana passada 69,68%.
O presidente-executivo do sindicato que representa as distribuidoras de combustíveis do país (Sindicom), Alísio Mendes Vaz, explica que esse ritmo mais lento de repasse de preços ao consumidor final se explica pelo próprio consumo menor de etanol. "O preço está há muito tempo desvantajoso e a demanda muito retraída. Assim, os postos não vendem etanol, logo não precisam repor estoques. O produto não está andando ao longo da cadeia", afirma.
O diretor-executivo da entidade que representa as usinas do Centro-Sul (Unica), Antônio de Pádua Rodrigues, contesta. "Há um giro mensal de 700 milhões de litros. Dá para baixar mais", diz.
A questão é que agora a indústria produtora de etanol tem que desovar esse estoque até o início da próxima safra, em 70 dias. De acordo com Martinho Seiiti Ono, presidente de uma das maiores comercializadoras de etanol do país, a SCA Trading, o movimento de transformar estoques de anidro em hidratado (adição de água) já começou em janeiro, em pequena escala, mas deve se intensificar.
O diretor da Unica vê risco de faltar anidro para misturar na gasolina até abril, caso as distribuidoras não contratem antecipadamente o volume que vão misturar nesta safra. "O anidro existe, mas se não for vendido, será transformado em hidratado. Depois a usina é que vai "pagar a conta" de novo se faltar produto", reclama Pádua.

Seca faz preço do boi bater recorde nos EUA e reduz a oferta de carne

Marshall Eckblad e Mark Peters | The Wall Street Journal

Os preços do gado bovino subiram a níveis recordes com a seca nas planícies do Sul dos EUA que está começando a reduzir a oferta de carne bovina no país.
Enfrentando a pior seca desde 1930, pecuaristas de Estados como Texas e Oklahoma reduziram seus rebanhos no ano passado porque não tinham dinheiro para comprar ração e água suficientes para substituir pastos e bebedouros secos. Eles venderam gado jovem para o confinamento, onde os animais são engordados antes de serem abatidos.
O efeito dominó dessas decisões já está sendo sentido no mercado. O Departamento de Agricultura dos Estados Unidos (USDA) informou sexta-feira que 1,68 milhão de cabeças de gado foram vendidas para confinamento em dezembro, uma queda de 6% em 12 meses. "Simplesmente não há gado suficiente para todos", disse John Roberts, diretor de marketing do grupo Pecuaristas de Nebraska.
Consumidores já estão assistindo a esse aumento de custos: o preço de varejo da carne bovina subiu mais do que o de qualquer outra categoria de alimentos importantes dos EUA em 2011, em torno de 10%, de acordo com estimativas do USDA, que equivale, nos EUA, ao ministério do setor. O departamento espera que os aumentos sejam mais moderados neste ano, em torno de 4,5%.
Os preços da carne bovina estão subindo, em parte, porque o custo de produção da pecuária subiu mais do que o preço do boi, deixando muitos pecuaristas com pouco incentivo para expandir a produção. O preço do milho, o principal alimento do gado no país, mais do que dobrou no ano passado e está 66% mais alto que há dois anos, e os custos do feno também dispararam.
"Os preços do boi terão que subir para que os produtores tenham lucro e decidam expandir", disse David C. Nelson, estrategista mundial do Rabobank, banco holandês que faz financiamentos agrícolas nos EUA.
Menos gado em confinamento geralmente implica menor oferta de carne no atacado a partir de quatro a seis meses. As preocupações já estão aparecendo em mercados onde os frigoríficos compram animais vivos. Processadores de carne bovina pagaram preços mais altos na semana passada devido às expectativas de que a oferta vá ficar reduzida no segundo trimestre.
Uma forte demanda global também tem contribuído para a alta. A população de países em desenvolvimento, particularmente na Ásia, está aumentando seu consumo de proteína. As exportações de carne bovina dos EUA aumentaram 23% nos primeiros 11 meses de 2011, em comparação com o mesmo período de 2010. Mas embora a demanda por exportações dos EUA esteja forte, a concorrência está aumentando. O Canadá anunciou sexta-feira que sua carne bovina não mais enfrenta restrições de importação pela Coreia do Sul, que havia instituído barreiras nove anos atrás.
É claro que se houver alguma queda na demanda isso poderia reduzir os preços do boi. E alguns analistas alertam que uma alta recorde é difícil de se sustentar nesta época do ano, depois das festas de fim de ano e quando o clima no Hemisfério Norte ainda é frio demais para churrascos no quintal. "Estamos vendo uma desconexão estrutural entre oferta e demanda", disse o economista do Departamento de Agricultura Richard Volpe. "Os estoques estão muito escassos e mesmo assim a demanda está forte."
A seca nas planícies do Sul atingiu o coração da indústria de carne bovina dos EUA. Texas, Oklahoma e Novo México são os Estados mais afetados. Mas outros, como Kansas e Missouri, têm sofrido também.
Os produtores reagiram reduzindo o tamanho de seus rebanhos e mantendo menos novilhas para reprodução. Isso significa que a base da cadeia de abastecimento da carne bovina encolheu, e sua reconstrução vai demorar bem mais de um ano. (Colaboraram Scott Kilman e Mirmala Menon.)

LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
STF julgará ação contra lista suja do trabalho escravo

Maíra Magro | De Brasília

O Supremo Tribunal Federal (STF) pode julgar a qualquer momento, após o fim do recesso forense, uma ação da Confederação Nacional da Agricultura e Pecuária (CNA) contra a lista suja do trabalho escravo, divulgada pelo Ministério do Trabalho e Emprego (MTE). O relator do processo no Supremo, ministro Carlos Ayres Britto, liberou o caso para julgamento no fim de novembro.
O cadastro de empregadores flagrados explorando mão de obra análoga à de escravos foi criado em 2004 pelo MTE, para combater esse tipo de prática. Atualmente, 294 empresas e pessoas físicas estão incluídas na lista - um número recorde desde a sua criação. Entre os infratores estão madeireiras, grupos sucroalcooleiros, construtoras e empresários. Inserido no cadastro, o infrator fica impedido de obter empréstimos em bancos públicos e passa a sofrer uma série de restrições comerciais. Segundo o ministério, a lista tem sido uma forma importante de combate ao trabalho escravo no Brasil.
Mas a medida desagradou a CNA. Na ação direta de inconstitucionalidade (Adin) que tramita há quase oito anos, a entidade questiona a Portaria nº 540, editada em 15 de outubro de 2004 pelo Ministério do Trabalho para criar o cadastro. Para a confederação, a portaria fere o artigo 22 da Constituição Federal, segundo o qual a competência para legislar sobre direito do trabalho é exclusiva da União. O assunto demandaria a publicação de uma lei, aprovada pelo Congresso Nacional, ao invés de uma portaria ministerial.
Ao defender a lista no STF, a Advocacia-Geral da União (AGU) irá argumentar que a portaria simplesmente regulamenta questões definidas em lei. Portanto, não haveria violação às regras da Constituição. "A Portaria 540 não estabelece punição para os empregadores responsáveis por reduzir trabalhadores à condição análoga à de escravo, tampouco confere ao ministro de Estado do Trabalho e Emprego competência para julgar imotivadamente quem quer que seja", diz a AGU. "Antes, limita-se a criar cadastro de empregadores faltosos."
Outro argumento da CNA é de que a lista suja violaria a presunção da inocência, ao incluir nomes de pessoas sem que haja um processo judicial prévio. A inclusão do nome no cadastro é feita depois de concluído um processo administrativo referente ao processo de fiscalização conduzido por auditores do trabalho.
Diversas empresas entraram com ações na Justiça dizendo que seus nomes só poderiam ser divulgados nessa lista após uma decisão judicial definitiva. "Embora o combate ao trabalho escravo tenha que ser feito, ninguém pode ser considerado culpado antes de decisão judicial transitada em julgado", diz o advogado trabalhista Daniel Chiode, do escritório Fleury Malheiros, Gasparini, De Cresci e Nogueira de Lima Advogados. Para ele, a portaria confere direitos excessivos aos auditores, abrindo margem para excessos e inclusões com motivações políticas ou econômicas. Os processos que correm na Justiça do Trabalho estão suspensos aguardando posicionamento do Supremo.
Diversas entidades pediram para serem incluídas na ação da CNA, para defender seus pontos de vista no STF. Uma delas é a Confederação Nacional do Comércio. As associações dos magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), dos procuradores da República (ANPR) e dos juízes federais do Brasil (Ajufe) defenderão a legalidade da portaria. Um dos argumentos é que o cadastro não pode ser considerado ilegal porque não cria direitos nem obrigações - teria caráter meramente informativo. "A lista somente torna público o resultado decorrente de processo administrativo com decisão final, e esses processos não são sigilosos", afirma o vice-presidente da Anamatra, Paulo Schmidt.
A Conectas Direitos Humanos, que também entrou como parte interessada na ação, argumenta que não é necessária uma decisão judicial definitiva para incluir um nome na lista suja do trabalho escravo. "As pessoas não vão parar nesse cadastro arbitrariamente", diz o advogado Oscar Vilhena, diretor da escola de direito da FGV em São Paulo, que atuou na defesa da Conectas. "E quando a Constituição diz que todos têm garantia à presunção da inocência, ela se limita ao processo penal. Mas essas pessoas não estão sendo punidas na esfera penal."

Cartório poderá exigir certidão

De Brasília

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) pretende ampliar a exigência da Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas (CNDT), tornando-a obrigatória também para todas as transferências de imóveis e partilhas de bens em separações e divórcios. O objetivo é evitar que pessoas e empresas com dívidas na Justiça do Trabalho pratiquem fraudes à execução - transferindo bens a terceiros com a intenção de impedir que sejam usados para quitar esses débitos.
Assim, se o vendedor de um imóvel estiver inadimplente com a Justiça do Trabalho, o comprador ficará ciente disso. Caso insista na transação, será informado de que ela pode vir a ser anulada judicialmente, para garantir o pagamento da dívida. Se isso ocorrer no futuro, o comprador não poderá alegar que pagou pelo imóvel de boa-fé, já que estava ciente dos riscos envolvidos na compra. O mesmo ocorrerá na partilha de bens resultante de divórcios ou separações. O imóvel transferido por um devedor ficará sujeito a ser usado, no futuro, para quitar o débito.
Na semana passada, o secretário-geral da Presidência do tribunal superior, juiz Rubens Curado Silveira, discutiu o assunto com juízes auxiliares da Corregedoria Nacional de Justiça, vinculada ao Conselho Nacional de Justiça (CNJ). O TST se comprometeu a entregar uma proposta mais detalhada, que será avaliada pela corregedoria. A CNDT passaria a ser exigida pelos próprios cartórios, por determinação do CNJ.
Atualmente, a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas é exigida das empresas que queiram participar de licitações públicas. O documento atesta a ausência de dívidas com a Justiça do Trabalho. A CNDT foi criada pela Lei nº 12.440, que entrou em vigor em 4 de janeiro. O documento pode ser impresso gratuitamente pelo site do TST.
O sistema de identificação de devedores foi criado para resolver uma situação constrangedora na Justiça do Trabalho. Atualmente, de cada cem pessoas que ganham uma ação trabalhista, apenas 31 recebem. São cerca de 2,5 milhões de processos em fase de execução no país. O objetivo do TST é criar incentivos para o pagamento de débitos trabalhistas. (MM)

THE WALL STREET JOURNAL AMERICAS
A economia emergente do crack no Brasil

John Lyons | The Wall Street Journal, de São Paulo

A onda de uso de crack no Brasil é um reflexo de tendências internacionais no mercado de drogas ilegais, com os traficantes penetrando em novos mercados à medida que enfrentam mais dificuldades para vender drogas nos Estados Unidos.
Em São Paulo, decidir o que fazer com as centenas de viciados na Cracolândia se tornou primordial para as eleições municipais deste ano. Mas prefeitos de outras regiões, que vão do Rio de Janeiro até locais remotos na fronteira amazônica, também estão às voltas com a onda de crack.
O Brasil exemplifica uma tendência global. Traficantes de cocaína estão explorando novos mercados, para compensar o acentuado declínio do uso de cocaína nos EUA nos últimos anos. Embora os EUA ainda sejam o maior mercado mundial da cocaína, sua participação está encolhendo, como resultado de maiores gastos do país na prevenção, a aplicação mais vigorosa da lei e os usuários que mudam para outras drogas, segundo autoridades.
Enquanto o tráfico da cocaína se modifica segundo os progressos dos EUA em combatê-lo, a produção de cocaína está migrando da Colômbia, aliada próxima dos EUA na luta contra a droga, para o Peru e a Bolívia, onde líderes populistas têm menos interesse em combatê-la.
Até 80% da cocaína do Brasil vem da Bolívia, segundo a Polícia Federal. Esta agora trabalha em estreita colaboração com a agência antidrogas dos EUA, a Drug Enforcement Administration, ou DEA, desenvolvendo estratégias para diminuir os fluxos da droga.
Nos EUA, os usuários consumiram cerca de 165 toneladas de cocaína em 2008, menos que as 267 toneladas de 1998. Os traficantes procuram, cada vez mais, atuar em países emergentes.

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