PRIMEIRA PÁGINA
Infraestrutura sustenta o investimento da indústria
A decisão do governo federal de acelerar o ritmo
das obras públicas em 2012 e os projetos de infraestrutura relacionados com a
Copa do Mundo e Olimpíada levam uma parte expressiva da indústria a planejar
aumento ou manutenção dos investimentos neste ano. Oito de nove setores
consultados pelo Valor - que representam 50% do valor da produção da indústria
de transformação - indicaram essa intenção mesmo após a desaceleração da
atividade fabril ao longo de 2011
País capta com a menor taxa da história
O Brasil, por meio do Tesouro Nacional, realizou
ontem a primeira operação em dólares do mercado internacional do ano, com a
reabertura do bônus de 10 anos, o Global 2021, e pagou a menor taxa da história
(3,449% ao ano), captando US$ 750 milhões. O prêmio da emissão, porém, ficou um
pouco superior ao da reabertura anterior do mesmo papel. Em julho de 2011,
foram captados US$ 550 milhões com esse bônus, com um "spread" sobre
o título americano de 105 pontos básicos. Ontem, o prêmio foi de 150 pontos. A
explicação é que hoje os prêmios de risco estão altos para todos os países e os
títulos do governo americano estão em patamares muito baixos. Além disso, o
Brasil tem conseguido as melhores taxas entre os emergentes
Pessoa física tira R$ 7,8 bi da Bovespa
Pelo terceiro ano consecutivo, os investidores
pessoas físicas tiraram mais dinheiro da Bovespa do que aplicaram. No ano
passado, o saldo líquido (compras menos vendas) da pessoa física encerrou
negativo em R$ 7,8 bilhões. Com isso, nos últimos três anos o total de recursos
retirados pelos pequenos investidores da bolsa soma R$ 25,2 bilhões. O número
de pessoas físicas na bolsa cresceu muito em 2006 e 2007, auge das aberturas de
capital. O mercado vivia uma fase de liquidez farta e era comum uma empresa
abrir capital e sua ação se valorizar já no primeiro dia de pregão. "Isso
atraiu muitos investidores oportunistas, que ganhavam dinheiro comprando
qualquer coisa", diz Paulo Levy, diretor do home broker da Icap. Agora,
"o que se vê são muitos desses investidores deixando o mercado
acionário"
Salário inicial na construção já bate o da indústria
O salário de admissão na construção civil já é hoje
mais alto que o da indústria, serviços, comércio e agropecuária. A reviravolta
se deve ao grande déficit de mão de obra no setor. De janeiro a outubro, o salário
médio do profissional que ingressa na construção foi 5,46% maior que o pago,
nas mesmas condições, na indústria de transformação, segundo o Ministério do
Trabalho. Foram criadas cerca de 250 mil vagas até outubro do ano passado no
setor, que, sozinho, representa 5,1% do PIB
OPINIÃO
Recuperação de 2012: cuidado, frágil
Martin Wolf
O que 2012 reserva para a economia mundial?
Comecemos por examinar os combalidos países de alta renda. Há algum motivo para
esperar recuperações saudáveis? Não exatamente. O desfecho na zona do euro
poderá ser um desastre que se disseminará pelo mundo inteiro. Mesmo a
recuperação dos Estados Unidos tende a ser frágil. A sombra lançada pelos fatos
anteriores a 2007 se dissipa lentamente.
O consenso de dezembro entre as previsões é
sombrio. As opiniões mais recentes sobre o possível crescimento neste ano estão
muito abaixo dos prognósticos de um ano atrás. Isso é especialmente verdade no
que se refere à zona do euro, cujas projeções apontam para um mergulho na
recessão. As economias da Itália e da Espanha deverão sofrer contração, enquanto
a da França e a da Alemanha produzirão um crescimento desprezível e o Reino
Unido ficará na mesma situação. Apenas o Japão e os Estados Unidos deverão
exibir algo que se aproxima de um crescimento econômico razoável este ano. No
caso dos Estados Unidos, seu crescimento foi projetado em 2,1% em dezembro,
superior ao 1,9% de novembro.
Ponhamos esse desempenho em contexto. No terceiro
trimestre de 2011, o Canadá era o único membro do G-7 cujo PIB estava acima de
seu pico do pré-crise. As economias dos Estados Unidos e Alemanha estavam
ligeiramente acima de seus picos do pré-crise, enquanto a da França estava
ligeiramente abaixo. Reino Unido, Japão e Itália estavam muito abaixo de seus
picos do pré-crise. Recuperação? Que recuperação?
Mas a taxa de juros mais alta agora adotada pelos
quatro bancos centrais mais importantes é a do Banco Central Europeu (BCE), de
apenas 1%. As demonstrações de resultados desses bancos centrais também se
expandiram drasticamente. Além disso, entre 2006 e 2013, a relação de dívida
pública bruta sobre o PIB vai dar um salto de 56 pontos percentuais no Reino
Unido, de 55 pontos no Japão, de 48 pontos nos EUA e de 33 pontos na França.
Por que medidas tão drásticas apresentaram resultados tão modestos?
Sobre isso grassam discussões revestidas de uma boa
dose de carga ideológica. O paradigma teórico dominante sustenta que uma crise
financeira não pode acontecer e não deve preocupar, se de fato acontecer, pelo
menos desde que não se permita que a base monetária em conceito amplo despenque.
Segundo esse ponto de vista, as únicas coisas que atualmente sustentam as
economias são os elementos de rigidez estrutural e as incertezas induzidas pela
política econômica. Na minha opinião isso é uma história da carochinha baseada
em teorias que reduzem o capitalismo a uma economia de escambo encoberta por um
diáfano véu monetário.
Muito mais convincentes, para mim, são as opiniões
que aceitam que as pessoas cometem erros relevantes. A grande divisão é entre
aqueles - os austríacos - que sustentam que os erros são cometidos pelos
governos, enquanto que a solução é deixar o distorcido edifício financeiro vir
abaixo, e aqueles - os pós-keynesianos - que sustentam que uma economia moderna
é intrinsecamente instável, enquanto que deixá-la vir abaixo nos levaria de
volta à década de 1930. Faço parte, decididamente, deste último grupo.
Em sua obra-prima presciente de 1986,
"Stabilizing an Unstable Economy" (""Estabilizando uma
Economia Instável", editado no Brasil em 2010), o falecido Hyman Minsky
formulou sua hipótese da instabilidade financeira. Janet Yellen,
vice-presidente do Federal Reserve (Fed, o BC americano), observou em 2009 que
"com a turbulência reinante no universo financeiro, a obra de Minsky se
tornou leitura obrigatória".
O que torna sua obra imprescindível é o fato de ela
vincular as decisões de investimento, orientadas por um futuro intrinsecamente
incerto, às demonstrações de resultados que as financiam e, portanto, ao
sistema financeiro. Na opinião de Minsky, a alavancagem e, portanto, a
fragilidade - são determinadas pelo ciclo econômico. Um longo período de
tranquilidade eleva a fragilidade: as pessoas subestimam os perigos e
superestimam as oportunidades. Minsky teria advertido de que a "grande
moderação" contém os germes de sua própria destruição.
Os anos que antecederam 2007 assistiram a um
extraordinário ciclo de crédito privado, notadamente nos Estados Unidos, Reino
Unido e Espanha, lastreado no aumento dos preços dos imóveis residenciais. O
estouro dessas bolhas levou a uma explosão dos déficits públicos, em grande
medida de forma automática, como previra Minsky. Esse foi um dos três
mecanismos de política econômica que evitaram um mergulho numa grande
depressão. Os outros foram as intervenções financeira e monetária. As economias
ainda estão enfrentando dificuldades para chegar a um ajuste pós-colapso. Com
as taxas de juros próximas a zero, os déficits públicos de soberanias idôneas
para fins de crédito oferecem três formas de ajuda - exigir, desalavancar e
elevar a qualidade dos ativos privados.
Em que medida a desalavancagem avançou? Nos Estados
Unidos, avançou bastante. No terceiro trimestre de 2011, a relação da dívida
bruta do setor financeiro sobre o PIB estava no nível registrado em 2001 e a
relação dívida das famílias sobre o PIB estava no nível registrado em 2003.
Além disso, observa o Goldman Sachs: "Acreditamos que o número de imóveis
residenciais com obras iniciadas provavelmente já chegou ao seu nível mais
baixo, enquanto os preços nominais desses imóveis deverão alcançar esse nível
no decorrer de 2012." Os Estados Unidos estão agora preparados para a
recuperação, embora limitada pelo prematuro aperto fiscal, pelo processo de
desalavancagem em curso, pelos riscos por que passa a zona do euro e, talvez,
pela alta dos preços do petróleo. A recuperação se sustentará sobre o que ainda
é uma economia em desequilíbrio.
Mas a fragilidade da zona do euro é maior. A
Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) prevê a
redução de 1,4% do PIB do déficit público estrutural da zona do euro entre 2011
e 2012, comparativamente à de apenas 0,2% prognosticada para o PIB nos Estados
Unidos.
Mas o grande perigo para as economias mais fracas
da zona do euro é que os setores público e privado tentarão cortar despesas simultaneamente.
Essa é a receita certa para colapsos profundos e prolongados. As soberanias não
idôneas para fins de crédito estão enredadas no esforço provavelmente fadado ao
fracasso de fortalecer sua posição fiscal na ausência de um setor privado e de fatores
de compensação externos adequados. Para esses países uma recessão da zona do
euro como um todo será uma calamidade: ela impedirá que realizem o ajuste
externo de que necessitam. Contra esse pano de fundo, a oferta do BCE de
financiamento barato de três anos a bancos que poderão reemprestar para
soberanias combalidas é pouco mais do que um paliativo - inteligente, mas
inadequado.
Os países de alta renda vêm realizando uma série de
experimentos fascinantes. Um foi com a desregulamentação do setor financeiro e
com o crescimento puxado pelo mercado de imóveis residenciais. Fracassou. Outro
foi com uma reação fortemente intervencionista à crise financeira de 2008.
Funcionou, mais ou menos. Outro ainda é com a desalavancagem do pós-crise e uma
volta a configurações fiscais e monetárias mais normais. Ainda não se chegou a
uma conclusão sobre esse esforço. Na zona do euro, no entanto, essa mudança
para a austeridade fiscal corre paralelamente a um experimento ainda maior: a
construção de uma união monetária em torno de um núcleo estruturalmente
mercantilista entre países dotados de solidariedade fiscal desprezível,
sistemas bancários frágeis, economias pouco flexíveis e graus divergentes de
competitividade. Boa sorte em 2012. Todos precisarão. (Tradução de Rachel
Warszawski)
Martin Wolf
é editor e principal comentarista econômico do FT.
COLUNAS
Daniel Rittner
Dez anos do colapso
Dez anos depois do colapso, duas histórias de
empreendedorismo mostram como a Argentina, graças ao empenho de sua gente e
apesar da fragilidade institucional do país, mudou desde a tarde nublada em que
um helicóptero encostou no teto da Casa Rosada para resgatar o então presidente
Fernando de la Rúa. O piloto sequer pôde pousar no heliponto do palácio
presidencial, tamanha a convulsão social na Praça de Maio e o risco à integridade
física do passageiro ilustre, que havia acabado de assinar sua renúncia. Era 20
de dezembro de 2001, e Sergio Kompel se lembra perfeitamente daquele dia, não
só pelos 38 mortos, pelas milhares de donas de casa que empunhavam
"cacerolas" como armas contra o governo, pelos 5 mil pontos de
risco-país e pelo índice de pobreza recorde de 54% da população.
Era justamente a data de inauguração do lava-autos
de Sergio Kompel, no estacionamento de um shopping center no charmoso bairro da
Recoleta, e dava para contar os clientes com os dedos de uma mão. Não podia
haver um dia pior. "Ainda por cima, chuviscava", recorda-se. Contra
todos os prognósticos dos amigos, Kompel e seu sócio, que apontavam o mau
momento para uma empreitada assim, perseveraram no negócio. Investiram em
inovação, criando um sistema ecologicamente correto de lavagem de carros, que
usa apenas cinco litros de água por vez e não deixa resíduos químicos. Hoje
parece banal, mas era novidade dez anos atrás, principalmente fora dos Estados
Unidos ou da Europa. Eles redirecionaram suas apostas e passaram a frequentar
feiras internacionais de franquias. Enquanto abriam suas primeiras lojas em
Buenos Aires, expandiam-se no exterior.
Hoje a ProntoWash tem 400 unidades e fatura US$ 50
milhões por ano, dos quais apenas 20% vêm da própria Argentina. São 50 lojas
nos Estados Unidos, 40 no Brasil (especialmente na região Sul) e franquias no
Kuwait, em Moçambique, na Moldávia e no Cazaquistão. "Os lava-autos sempre
foram um segmento muito informal e havia a oportunidade de construir algo mais
profissionalizado. Para a maioria das pessoas, lavar o carro é uma perda de
tempo. Para as mulheres, é um ambiente machista. Decidimos nos transformar numa
espécie de McDonald"s dos lava-autos", ensina Kompel.
Naqueles mesmos dias de dezembro, Inés Berton via
pela CNN e pela BBC as cenas de caos em Buenos Aires, com a sensação de que já
era hora de deixar para trás os sete anos em Nova York. Casualmente, ouviu
Caetano Veloso cantando "Vuelo al Sur" e decidiu que era hora de
voltar para estar perto de sua gente. Desembarcou no aeroporto de Ezeiza com
US$ 132 no bolso, enquanto muitos amigos seus faziam o caminho inverso e
emigravam da Argentina para os países ricos. Anos antes, quando havia
investigado os motivos de suas enxaquecas constantes, Inés descobriu que tinha
olfato hipersensível. No Guggenheim do Soho, onde trabalhava, tirou proveito
disso: ia com frequência à T Emporium, sala de chás instalada na parte de baixo
do museu, onde pedia combinações com ingredientes que ela mesma escolhia. Os
outros clientes eram atraídos por suas invenções e os donos se deram conta de
que vendiam mais quando ela estava por perto. Passou, então, a trabalhar lá até
voltar.
Em plena crise econômica, Inés alugou por US$ 200
um espaço na galeria do hotel Alvear, provavelmente o mais chique de Buenos
Aires. Abriu a Tealosophy, divulgando-a entre a clientela para a qual já vendia
seus chás, incluindo a Petrobras e a família Moreira Salles. Suas misturas
encantaram o Dalai Lama, Sofia Copolla e os reis da Espanha. Inés rodou o mundo
em busca de aromas autênticos. Achou inigualáveis a camomila do Egito, a
baunilha de Madagáscar, as clementinas da Itália e a verbena do sul da França.
Com ingredientes como esses, hoje ela exporta a 20 países, tem uma loja de 150
m2 em Barcelona e seus chás são servidos na Harrods, em Londres, e nos
restaurantes de Carla Pernambuco e Alex Atala, em São Paulo. "E nunca
gastamos um centavo com publicidade", diz.
Filhas do colapso de 2001, a ProntoWash e a Tealosophy
são microrretratos de um país que buscou a redenção. Nos últimos oito anos, o
crescimento médio do PIB chega a 8%, a taxa de investimento supera a brasileira
(tem ficado em torno de 23% do PIB) e os resultados em conta corrente são
permanentemente melhores do que os nossos. A pobreza baixou a menos de 20% da
população, segundo institutos independentes, e a menos de 10%, segundo o
governo. A inflação deve ficar em dois dígitos pelo sétimo ano seguido, e é o
principal dado negativo da economia argentina hoje, mas a oposição errou ao
concentrar seu discurso na alta de preços para conquistar votos nas eleições
presidenciais de outubro. Pelo simples fato de que 40% dos eleitores -
argentinos de até 40 anos - entraram no mercado de trabalho depois de 1991, quando
a hiperinflação deixou de ser um problema. É gente que não tem a maquininha de
remarcar preços na memória, mas sabe bem o que é recessão e coloca o desemprego
no topo de seus medos. Tolera, portanto, inflação anual de 25% - desde que
tenha trabalho e reajustes salariais na mesma proporção.
O "modelo K", política econômica do
kirchnerismo que ajudou a tirar a Argentina do calvário, já não é o mesmo. O
superávit primário, que atingiu 5% em 2003, hoje só existe graças a manobras
contábeis, como o lucro da Anses (o INSS argentino) após a estatização dos
fundos de pensão privados. O ano de 2011, além de ter sido o primeiro desde o
colapso com queda das reservas internacionais, pode ter fechado com déficit em
conta corrente. O câmbio, fundamental para a recuperação da indústria, não é
competitivo como antes, e a sensação de que o peso está barato só ilude os
brasileiros com reais no bolso.
A Argentina está longe de ser exemplo para seus
vizinhos, mas uma análise ampla sobre o país deve concentrar-se, hoje, mais na
sua precariedade institucional, nos arroubos de autocracia de Cristina
Kirchner, na duvidosa independência de uma parcela do Judiciário, na
dificuldade em credenciar-se como um interlocutor maduro na arena
internacional. E menos na percepção de que é um país em crise econômica, ou à
beira de estar.
Daniel
Rittner é repórter em Brasília. Excepcionalmente, deixamos de publicar hoje a
coluna de Cristiano Romero
POLITICA
Projeto cria Lei de Responsabilidade Sanitária
Por Caio Junqueira | De Brasília
O governo vai tomar a iniciativa de fazer avançar,
neste ano, a tramitação de projeto que cria a Lei de Responsabilidade
Sanitária, similar, na área de saúde, ao que a Lei de Responsabilidade Fiscal
representa para as finanças públicas. A proposta delimita responsabilidades e
relaciona punições à União, Estados, municípios e gestores que não cumprirem
seus dispositivos.
O projeto de lei tramita desde 2007 na Câmara dos
Deputados e já foi aprovado pelas comissões de Seguridade Social e do Trabalho,
mas a pressão de secretários municipais e estaduais de saúde impediu que ele
avançasse. O motivo eram os artigos que, segundo eles,
"criminalizavam" agentes públicos que não cumprissem os termos da
lei. A saída encontrada, por ora, foi a de flexibilizar a punição e estendê-la
também aos entes federados, por meio da limitação de transferências de
recursos.
Em geral, o projeto estabelece o cumprimento de
metas tendo por base os chamados "contratos organizativos de ação
pública" firmados entre União, Estados e municípios. Ali, estará previsto
o montante de recursos que os gestores devem aplicar, anualmente, em ações e
serviços públicos de saúde. Também consta a obrigatoriedade de comprovar essa
aplicação e demonstrar o grau de execução das ações programadas, além de
apresentar balanços financeiros, orçamentários, permitir a realização de
auditorias e dar transparência às informações pela internet.
O problema, contudo, estava nos trechos em que
determinava as punições a quem não cumprisse essas obrigações, assim
intitulados "crimes de responsabilidade sanitária". São alguns deles:
deixar de prestar de forma satisfatória os serviços básicos de saúde;
transferir recursos da conta de saúde para outra conta; dar às verbas de saúde
aplicação diversa da estabelecida em lei; deixar de executar ou interromper
injustificadamente as ações previstas e prestar informações falsas no relatório
de gestão.
O projeto diz que os gestores incorreriam em crime
"por ação ou omissão", se "concorreu com culpa ou dolo para a
sua prática, ou dela se beneficiou". Nesses termos, o recado que chegou ao
Ministério da Saúde pelo Conselho Nacional de Secretários Municipais de Saúde
(Conasems) e pelo Conselho Nacional de Secretários de Estado de Saúde (Conass)
foi de que haveria resistência dos gestores.
Assim, o relator do substitutivo do projeto na
Comissão de Finanças e Tributação, Rogério Carvalho (PT-SE), em negociações com
o líder do governo no Senado e autor de projeto semelhante, Humberto Costa
(PT-PE), ex-ministro da Saúde, decidiu se concentrar em algo mais consensual.
"Havia uma resistência à punição ser exclusivamente para a pessoa física.
Agora vamos avaliar o conjunto que define o objeto do contrato administrativo.
A responsabilidade pode ser tanto do ente federado quanto do agente. Não existe
uma escala de quem é punido primeiro, é tudo paralelo", afirma Carvalho,
que foi secretário de Saúde em seu Estado entre 2003 e 2010.
Seu substitutivo será apresentado em fevereiro, tão
logo comece o ano legislativo no Congresso. "Em caso de descumprimento das
metas, o Estado ou município deixa de receber recursos de transferências e o
agente passa a ter uma gestão supervisionada", afirma. A ideia é que ele
chegue à Comissão de Constituição e Justiça da Casa ainda neste semestre e vá a
plenário até o fim do ano. A participação de Costa nas negociações também se
deve à tentativa de que o projeto chegue ao Senado sem a necessidade de
alterações pelos parlamentares, para evitar que o projeto tenha que retornar à
Câmara.
O projeto faz parte de um conjunto de iniciativas
que o governo pretende tomar na área de saúde para tentar, aos poucos, superar
os problemas de gestão, ali identificados, que mantêm o serviço entre os piores
apontados pelos cidadãos em pesquisas de opinião.
Segundo o assessor especial do Ministério da Saúde,
Fausto Pereira dos Santos, o esforço é para que o substitutivo seja de fato o
mais próximo do que defende o governo e as entidades que reúnem os secretários
de saúde de Estados e municípios. E que o importante é que haja a previsão de punições.
"Para fazer um contrato organizativo de ação pública, tem que ter sanções.
Um contrato sem penalidade não necessariamente vai ser cumprido."
Luizianne encerra mandato em baixa
Por Do Recife
Em baixa com a população - e também com o
governador do Ceará, Cid Gomes (PSB) -, a prefeita de Fortaleza, Luizianne
Lins, disse recentemente estar preparada para "eleger até um poste sem
luz" para sua sucessão, que será disputada em outubro.
Tal confiança, segundo assessoria da prefeita, está
baseada em uma administração que "teve como mote melhorar o acesso da
população aos serviços públicos", com destaque para a área da saúde. A
população parece não compartilhar da mesma percepção. Na última pesquisa Ibope,
divulgada no jornal da Band em dezembro, apenas 30% dos entrevistados avaliam a
administração Luizianne como ótima e boa.
Em sete anos à frente do município, Luizianne
entregou 164 consultórios odontológicos e cinco postos de saúde, além de ter
contratado 5 mil profissionais da área, entre médicos, enfermeiros e agentes de
saúde.
Na educação, a assessoria da prefeita contabiliza a
ampliação de 239 escolas e a abertura de 80 novas, totalizando 900 novas salas
de aulas e 228 bibliotecas. "Em 2004, não existia transporte escolar e
hoje há 84 ônibus que atendem 11 mil alunos por dia. Há sete anos, apenas 184
alunos com deficiência física conseguiam estudar. Hoje, são mais de 2,5
mil", informou, por e-mail, a equipe de Luizianne.
Outros destaques mencionados foram os investimentos
em habitação, com a entrega de 5 mil moradias, e a criação de uma tarifa social
de ônibus, bem como um incremento na política de atração de turistas para a
capital cearense, que segundo pesquisas, já teria superado Salvador no posto de
destino mais procurado do Nordeste.
O crescimento no número de visitantes é reconhecido
até mesmo pelos poucos vereadores que fazem oposição a Luizianne na Câmara
Municipal. Segundo João Alfredo (PSOL), um dos mais combativos, a prefeita fez
o dever de casa na área do turismo. Ele também reconhece alguns avanços na
saúde, mas pondera: "O investimento foi razoável, mas a gestão deixou
muito a desejar", afirmou ele, instado a avaliar os sete anos de
Luizianne.
Um dos principais problemas apontados pelo vereador
foi a manutenção de um modelo de gestão que a própria prefeita criticava.
"Ela manteve uma relação extremamente fisiológica com a Câmara, recebendo
apoio até de vereadores do PSDB e do DEM", afirmou Alfredo, que também
criticou a apatia na relação com empresários de setores delicados como coleta
de lixo e transporte coletivo.
Outra crítica contumaz a Luizianne, admitida por
ela própria, é a demora na entrega de alguns projetos, como a revitalização do
Estádio Presidente Vargas. Em entrevistas à imprensa cearense, a prefeita já
disse que deixará de estipular prazos para a entrega das obras, que sempre
acabam atrasando em função da burocracia. "Ela também manteve uma relação
extremamente conflituosa com os professores", lembrou-se o vereador
oposicionista.
Cidade-sede da Copa de 2014, inclusive com um jogo
da Seleção Brasileira, Fortaleza se comprometeu a investir R$ 251 milhões em
melhorias em cinco grandes avenidas da cidade. O orçamento do município para
2012 prevê receitas totais de R$ 5 bilhões, alta de 12% em relação a 2011.
Segundo a prefeitura, não haverá remanejamento de recursos de outras áreas para
investimentos referentes ao mundial de futebol.
Os problemas de infraestrutura urbana, sobretudo os
cada vez maiores congestionamentos, estão entre os principais motivos da
insatisfação com Luizianne. No entanto, colocações como a promessa de eleger o
poste também explicam a rejeição por boa parte dos fortalezences. "Muitas
vezes o excesso de altivez acaba se confundindo com arrogância. Não tenho
dúvida de que isso também explica a popularidade baixa", avaliou o vereador
do PSOL. (MC)
BRASIL
Uso da capacidade instalada recuou na maioria dos setores
Por De São Paulo
O ritmo de produção em franca desaceleração ao
longo de 2011 reduziu o uso da capacidade instalada em 11 de 15 setores
industriais até dezembro do ano passado, em comparação com igual período de
2010. Para parte da indústria, essa folga adicional reduziu a pressão por novos
investimentos, mas para outros ela apenas devolveu certa tranquilidade. Na
comparação com a média histórica, contudo, apenas cinco ramos da indústria
chegaram a dezembro operando abaixo do padrão. Ainda assim, a avaliação de
alguns representantes do setor industrial ouvidos pelo Valor é de que a atual
capacidade é adequada para atender a demanda em 2012.
Para Humberto Barbato, presidente da Associação
Brasileira da Indústria Elétrica e Eletrônica (Abinee), a queda de produção do
setor em 2011 deve ficar em 2% para produtos elétricos e 1% para eletrônicos, o
que não pressiona o uso de capacidade instalada e nem cria necessidade imediata
de investimentos em expansão.
O mesmo raciocínio se repete para a maioria dos
setores consultados pelo Valor. Para a Associação Brasileira das Indústrias do
Mobiliário (Abimóvel), o segmento está atualmente com bom uso da capacidade
instalada, "embora tenhamos alguma ociosidade nas linhas de
produção", segundo o presidente da entidade, José Luiz Diaz Fernandez.
"Cremos que para 2012 necessitaremos de poucos investimentos para
atendimento da demanda", afirmou.
A Associação Nacional de Fabricantes de Veículos
Automotores (Anfavea) considera os números para o setor "excelentes",
mas afirma que está operando com certa folga. Em 2011, foram produzidos 3,42
milhões de veículos, e para 2012 a estimativa é que sejam fabricadas 3,49
milhões de unidades, um aumento de 2%.
A indústria química, segundo Fátima Ferreira,
diretora de economia e estatística da Associação Brasileira da Indústria
Química (Abiquim), trabalha atualmente com ociosidade bastante elevada. Como o
setor é de produção intensiva, o ideal é que o uso de capacidade fique entre
85% e 90%, patamar no qual a luz amarela acende e é preciso acelerar investimentos.
Em média, segundo Fátima, o setor utilizou em 2011 apenas 80% da capacidade. Em
dezembro, segundo a Sondagem Conjuntural da Indústria da Transformação da
Fundação Getulio Vargas (FGV), o indicador estava em 84,1%, levemente abaixo da
média histórica, de 84,4%.
O setor calçadista também se declarou confortável
com o atual nível de utilização da capacidade. "Terminamos o ano com uso
abaixo de 80%, antecipando férias coletivas", afirmou Milton Cardoso,
presidente da Abicalçados. "O setor passou por um ano muito difícil, a
produção caiu muito e a produtividade recuou ainda mais", afirmou,
enfatizando o argumento da indústria em geral de que o principal culpado por
esse cenário são os produtos importados.
Para Jorge Braga, coordenador técnico da Sondagem
da FGV, a situação é de fato confortável em termos de utilização da capacidade,
e o atual nível de incerteza no cenário internacional tende a segurar o nível
de investimento.
Braga ressalta que a confiança do setor industrial
caiu por 10 meses seguidos para então ficar estagnada em novembro e subir 1,1%
em dezembro. "Enquanto o cenário no ambiente externo não evoluir, é
difícil que essa situação melhore. E um baque na confiança afeta muito o nível
de investimento", afirmou. (TM)
Salário inicial da construção civil fica acima do pago
pela indústria em 2011
Por Carlos Giffoni | De São Paulo
O déficit de mão de obra na construção civil causou
um efeito novo no salário de admissão pago pelo setor em 2011. No acumulado de
janeiro a outubro, o salário médio do profissional que entra na construção
civil, que ficou em R$ 993,33, foi 5,46% maior que o salário pago, nas mesmas
condições, na indústria de transformação no Brasil, de R$ 941,83, segundo o
Ministério do Trabalho e Emprego.
A construção civil também está à frente do salário
de admissão no setor de serviços (2,82%), comércio (24,31%) e agropecuária
(42,01%). Foram criadas cerca de 250 mil vagas até outubro do ano passado no
setor, que, sozinho, representa 5,1% do Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro
e 21,2% do PIB da indústria.
A situação vista no ano passado ano é nova. Em
2010, a remuneração média dos empregos formais na construção civil (R$
1.425,41) era 18,1% menor que a remuneração média na indústria de transformação
(R$ 1.740,58). "Nesse setor ocorre algo diferente. Há escassez de mão de
obra não porque as pessoas não estudaram, mas porque elas estudaram e não
querem carregar cimento", diz Marcelo Neri, diretor do Centro de Políticas
Sociais da Fundação Getulio Vargas (FGV).
A Direcional Engenharia, construtora de moradias
voltada para o segmento de baixa renda e que possui investimentos no programa
Minha Casa, Minha Vida, lida com o problema de escassez de mão de obra na
tentativa de contratar uma média mensal de mil pessoas. "Temos uma
dificuldade enorme de encontrar serventes. Para ocupar essa vaga, não há
nenhuma exigência, basta ter carteira de trabalho. A capacitação, a gente faz
dentro da empresa", diz Ana Carolina Huss, diretora de recursos humanos da
empresa. "Por isso os salários oferecidos estão sempre aumentando."
Desde 2003, o percentual de trabalhadores na
construção civil com carteira assinada passou de 25,5% para 39,9% em novembro
de 2011. Já os sem carteira assinada diminuíram em um terço no mesmo período,
sendo, hoje, 16,2% do total. O restante está distribuído entre trabalhadores
por conta própria (38,5%) e empregadores (5,2%).
O país passa por um momento em que há excesso de
demanda no setor, a começar pelas ações governamentais que visam entregar casas
populares à população de baixa renda, mas também pelos desafios de
infraestrutura que vieram junto à Copa do Mundo de 2014 e à Olimpíada, no Rio
de Janeiro, em 2016. Por outro lado, a disponibilidade de mão de obra menos
qualificada - que ergue, literalmente, os projetos do setor - está se
reduzindo.
"O salário é a medida que melhor reflete o
excesso de demanda. De um lado, temos procura por causa do Minha Casa, Minha
Vida, dos grandes eventos esportivos, do déficit habitacional brasileiro, do
Plano de Aceleração do Crescimento, no governo de Luiz Inácio Lula da Silva...
O mercado tropeça é na óptica da oferta. As pessoas não querem se ofertar para
a construção civil. Hoje, o filho de um pai pedreiro tem mais anos de estudo e
não quer exercer a mesma profissão", afirma Neri.
Somada a esses fatores está a flutuação típica dos
salários no setor. De acordo com o economista, quando o salário cai na
construção civil, ele cai acima da média. Quando sobe, a recuperação ocorre com
fôlego ainda maior. Por isso, em momentos de grande otimismo como agora, é
natural esse movimento de ascensão. "O salário está crescendo na base, por
causa da escolarização. E o preço dos imóveis ainda reflete a escassez de
moradia", diz Neri.
Para Ana Maria Castelo, coordenadora da FGV de
Projetos de Construção, o crescimento das empresas do setor tem relação direta
com o aumento dos salários. "As empresas estão produzindo mais, crescendo
em tamanho e formalizando esse mercado de trabalho, o que influi na
remuneração. Não tenho dúvida que a formalização é grande responsável pelo
aumento dos salários", diz.
O Índice Nacional de Custo da Construção - M
(INCC-M) mostra que, entre janeiro e novembro de 2011, a mão de obra foi o item
mais inflacionado, com variação positiva de 10,20% na comparação com o mesmo
período do ano anterior. Essa alta vale também para o trabalhador menos
qualificado. Em novembro de 2011, o custo de um pedreiro cresceu 0,75% frente a
outubro, o que representa uma taxa anualizada de 9,38%.
Apesar de a maré favorável à construção civil não
ter prazo de validade, o cumprimento dos eventos esportivos no Brasil deve
trazer o nível de atividade do setor para um patamar menos acelerado, na
opinião de Carlos Aguiar, gerente da consultoria empresarial Millennium RH.
"À época da bolha da internet, surgiram dezenas de empregos ligados ao
assunto. Hoje, no Brasil, o ciclo da construção está muito aquecido, mas isso
deve durar três ou quatro anos."
O consultor acredita que a valorização do salário
das pessoas que ocupam cargos mais técnicos - e recebem mais - tem puxado para
cima a média de remuneração, tanto no momento da contratação como do setor em
geral. "É fácil repor o "peão de obra". A sua rotatividade é
grande. Às vezes, troca-se de emprego por R$ 15 a mais. Nos cargos mais
qualificados, de mestre de obras para cima, a valorização salarial tem mais
peso."
O resultado desse cenário pode ser observado na
movimentação dos salários. De acordo com a Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) referente a novembro de
2011, o rendimento médio real habitualmente recebido na construção civil cresceu
3,4% na comparação entre novembro e o mesmo mês de 2010. Na indústria,
considerando, inclusive, a extrativa - que paga salários maiores que a de
transformação - o avanço foi de 1,9%, e o total da população ocupada foi de
0,7% em igual comparação.
Minas decreta emergência em 52 cidades por causa das
chuvas
Por De São Paulo
Minas Gerais tinha ontem 52 municípios em situação
de emergência por causa da chuva, com mais de 9 mil desalojados e cerca de 400
desabrigados. Quatro pessoas morreram, segundo a Defesa Civil, e uma está
desaparecida.
Na madrugada de ontem a rodoviária de Ouro Preto
foi atingida por um grande deslizamento de terra e parte da estrutura desabou.
Dois taxistas que estavam dentro de carros foram soterrados e um deles morreu.
Na segunda-feira, a chuva causou inundações em
diversos municípios mineiros. Pelo menos duas cidades da região metropolitana
de Belo Horizonte ficaram alagadas. Em Itabirito, o rio que tem o mesmo nome da
cidade transbordou e, em Brumadinho, o nível do rio Paraopeba subiu, atingindo
várias localidades.
Diversas cidades na região da Zona da Mata também
foram atingidas pela chuva. Em Guidoval, houve aumento dos níveis dos córregos
e rios, inundando grande parte do município. A rede de telefonia foi toda afetada,
deixando os moradores sem comunicação. Em Ubá, os bairros centrais ficaram
alagados e os deslizamentos de encostas afetaram parte do sistema de
abastecimento de água.
As chuvas em Minas não preocupam apenas as
autoridades do Estado. Também causam medo nos moradores das regiões norte e
noroeste do Rio de Janeiro. É que o rio Muriaé, que nasce em Minas, está
transbordando em municípios fluminenses. Segundo a assessoria de imprensa da
Secretaria de Estado da Defesa Civil e Corpo de Bombeiros, por causa da cheia
do rio, a cidade de Laje do Muriaé, no noroeste do Estado do Rio, já tem 2 mil
desalojados e 200 desabrigados. A secretaria também confirmou a morte de dois
homens.
Outras cidades também sofrem com a cheia do rio
Muriaé, como Itaperuna, com 800 desalojados, Italva e Cardoso Moreira. Em Santo
Antônio de Pádua, o rio Pomba, que também nasce em Minas, transbordou e causou
transtorno para os moradores, mas ainda não há estatísticas oficiais de número
de desabrigados e desalojados. Os municípios que estão em estado de alerta
máximo por causa das chuvas são Itaperuna, Italva, Cardoso Moreira, Santo
Antônio de Pádua, Duque de Caxias, Nova Iguaçu e São João de Meriti.
A Secretaria de Estado de Defesa Civil já
contabilizou três mortes em 19 cidades. No total há 3.108 desalojados, 707
desabrigados e 84 residências destruídas. Na região serrana do Estado do Rio,
Nova Friburgo, que chegou a registrar 300 desabrigados, com 15 comunidades com
riscos de desabamento, está atualmente fora de risco, embora esteja constantemente
monitorada pela secretaria.
Em Santa Catarina, o problema é oposto do
enfrentado por Minas e Rio. A Defesa Civil está monitorando os 37 municípios
que decretaram situação de emergência por estiagem. Segundo balanço divulgado
no começo da tarde de ontem, cerca de 335 mil pessoas foram afetadas pela falta
de chuvas.
O governo federal, segundo informou ontem o
secretário de Defesa Civil, Ivan Ramos, dispõe de R$ 450 milhões no fundo para
catástrofes naturais. Mas só Estados e municípios em situação de emergência
podem ter acesso aos recursos. (Agências noticiosas)
INTERNACIONAL
De olho na reeleição, Chávez aumenta os gastos públicos
Por Fabio Murakawa | De São Paulo
O presidente da Venezuela, Hugo Chávez, aposta nos
recursos advindos do petróleo para bombar os programas sociais e conseguir um
novo mandato nas eleições presidenciais de 2012. Com mais dinheiro circulando
no país, e o baixo estímulo do setor privado para produzir em um ambiente
econômico e político cada vez mais hostil, analistas ouvidos pelo Valor preveem
um ano de elevação de gastos públicos e alta inflação na nação sul-americana,
membro da Opep (Organização dos Países Exportadores de Petróleo).
O cenário de fundo para o aumento de gastos está no
barril de petróleo cotado acima de US$ 100 - o maior nível da história - e nos
US$ 17 bilhões em títulos emitidos pelo governo e pela estatal Petroleos de
Venezuela SA (PDVSA), que ajudaram também a turbinar a economia venezuelana.
Dados divulgados pelo Banco Central do país apontam para uma expansão de 4% do
PIB em 2011, após contrações de 1,49% e 3,20% registradas em 2010 e 2009,
respectivamente.
A tendência de mais gastos para este ano deverá
puxar o crescimento para até 5%, prevê o Bank of America em um relatório
publicado no apagar das luzes de 2011.
O lançamento em dezembro de uma série de programas
sociais chamados de "missões", destinados a fornecer habitação e
distribuir dinheiro para famílias pobres, deu uma ideia da estratégia de Chávez
para agradar seu eleitorado e conquistar os indecisos.
"Eleições na Venezuela, sob condições normais,
têm de 35% a 40% de antichavistas sólidos e 40% a 45% de Chavistas sólidos. Os
demais estão sem pender para um campo ou outro", diz Daniel Linsker,
analista-chefe para América Latina da Control Risks. "O que se pode
esperar para este ano é que o gasto público suba, buscando ganhar o voto desses
últimos."
Chávez deu início à campanha à reeleição em julho,
com o anúncio de um câncer na região pélvica. As implicações da doença ainda
não estão totalmente claras, apesar de uma evidente melhora de seu estado de
saúde nas mais recentes aparições televisivas. Desde que tornou pública a
doença, Chávez surgiu mais de 160 vezes na mídia, segundo levantamento da
empresa de medição TVRadio, e trocou a cor da tradicional camisa vermelha pelo
"amarelo-esperança".
Em meio a sessões de quimioterapia em Cuba, e
enquanto médicos e políticos venezuelanos questionavam se o presidente teria
saúde para chegar ao fim de um novo mandato, Chávez incorporou fé e religião ao
seu discurso. O slogan "Pátria, socialismo ou morte" desapareceu para
dar lugar ao "Viveremos e venceremos". A ideia era, a começar pela
retórica, afastar a hipótese de morte do presidente.
"A doença de Chávez pode ser um tema sumamente
importante nas eleições. Com o controle que exerce sobre a mídia, ele conseguiu
dar a mensagem de que está curado", diz Natália Brandler, professora do
curso de Ciências Políticas da Universidade Simón Bolívar. "Chávez se
fortalece por dizer que foi curado milagrosamente."
Recentes pesquisas de intenção de voto mostram um
equilíbrio entre Chávez e a oposição, que deve escolher um candidato único em
fevereiro. Mas, para Luis Vicente León, diretor da consultoria Datanalisis, o
presidente ainda é favorito. "Mesmo em condições de igualdade numérica
[nas pesquisas], o governo ainda controla o petróleo e os meios de comunicação.
A oposição, para vencer, tem que estar muito mais forte."
Na mesma linha, Alberto Ramos, economista para a
América Latina do banco Goldman Sachs em Nova York, resume o atual quadro
eleitoral: "A oposição está galvanizada, mais organizada, vai eleger um
candidato de consenso e tem mais chances do que nunca de vencer as eleições.
Mas Chávez deve ganhar, pois sua capacidade de usar fundos públicos e outros
instrumentos aumenta as chances".
O crescimento da violência e da inflação, temas que
incomodam o eleitorado, estará presente na campanha. Mas nem isso deve minar a
possível vitória chavista.
Os preços ao consumidor tiveram uma guinada de
27,6% em 2011 no país, em comparação com a alta de 27,2% registrada em 2010. A
desvalorização do bolívar e a escassez de produtos podem explicar isso, diz o
Banco Central.
Uma das apostas do presidente para conter a
inflação foi a criação, em novembro, da Superintendência de Custos e Preços
Justos. O novo órgão passou a fiscalizar a contabilidade de empresas de
diversos setores, a começar pelos setores de saúde, higiene pessoal e limpeza.
Na opinião de analistas e empresários, porém, a medida pode levar à escassez de
produtos. Isso pode anular o impacto inicial da fiscalização sobre o controle
dos preços.
Para Ramos, outro efeito de medidas como essa é o
desestímulo ao investimento privado, o que reduz a eficiência da economia, cada
vez mais dependente do petróleo e das importações. "As condições vão
piorar no curto prazo. O governo vai aumentar os gastos enormemente neste ano e
estimular as importações", afirma. "Com as políticas agressivas em
relação ao setor privado, qualquer tipo de demanda bate no limite da capacidade
[de produção] e gera inflação." Ramos prevê que a inflação superará a casa
dos 30% em 2012.
Mundo precisa criar 64 milhões de empregos
Por De Genebra
A Organização das Nações Unidas (ONU) estima que
2011 terminou com déficit de 64 milhões de empregos globalmente. Esse é o
numero de empregos necessários para restaurar o nível de antes da crise e
absorver as pessoas que entram no mercado de trabalho.
A ONU lançará neste mês o seu relatório anual sobre
a economia global, insistindo que o alto desemprego, a crise da dívida da zona
do euro e austeridade fiscal prematura estão jogando a economia mundial em nova
recessão. Nota que EUA e União Europeia, as duas maiores economias do mundo,
estão profundamente interligados e seus problemas podem alimentar as
dificuldades em geral.
Já pesquisas sobre produção industrial de dezembro,
divulgadas ontem, sugerem que a economia americana continuou a resistir à
desaceleração na Europa. Algumas consultorias apontam crescimento econômico de
2,5% para a economia americana em base anualizada no quarto trimestre de 2011,
enquanto o PIB da zona do euro teria já contraído em taxa similar.
Embora a expansão dos EUA possa diminuir neste ano,
analistas acham que a divergência entre as duas grandes economias persistirá em
2012 e 2013. Por exemplo, a taxa de desemprego nos EUA caiu de 9,2% no verão
para 8,6% em novembro, enquanto na zona do euro aumentou para 10,3%.
Por sua vez, a ONU avalia que, entre os países em
desenvolvimento, o crescimento de China e Índia continuará "robusto".
Mas Brasil e México podem sofrer maior "visível desaceleração". (AM)
EMPRESAS & TECNOLOGIA
Vinícolas ajudarão Receita a checar selo fiscal em vinhos
Sérgio Ruck Bueno | De Porto Alegre
As vinícolas brasileiras vão colocar um pequeno
exército nas ruas para ajudar a Receita Federal a fiscalizar a aplicação do
selo fiscal em todos os vinhos e espumantes nacionais e importados vendidos no
varejo e no atacado a partir de agora. O controle é obrigatório desde o dia 1º
deste mês, exceto para os produtos adquiridos pelo comércio até 31 de dezembro
de 2010 com a data da compra confirmada por nota fiscal, e é visto pelos
produtores nacionais como um forte aliado no combate ao contrabando, ao
descaminho (crime que caracteriza importação ou exportação sem pagamento de
impostos) e aos produtos brasileiros ilegais.
Os fabricantes nacionais aplaudem a medida, mas
importadores foram à Justiça contra a nova instrução da Receita Federal. A
Associação Brasileira de Exportadores e Importadores de Alimentos e Bebidas
(Abba) obteve liminar no Tribunal Regional Federal de Brasília para não
estampar o selo de controle fiscal nos vinhos importados, diz o diretor
executivo do Instituto Brasileiro do Vinho (Ibravin), Carlos Paviani. Mas a
Procuradoria Geral da Fazenda Nacional já recorreu e, segundo o presidente da
União Brasileira de Vitivinicultura (Uvibra), Henrique Benedetti, a expectativa
do setor é que a medida seja revertida em breve.
Conforme Paviani, as equipes comerciais das 800
vinícolas que produzem vinhos e espumantes engarrafados no país (das quais 500
no Rio Grande do Sul) somam cerca de 3 mil pessoas, que visitam regularmente os
pontos de venda e podem checar eventuais irregularidades. "Vamos prestar
informações à Receita, nosso papel é este", diz Paviani. As indústrias já
são obrigadas a aplicar o selo em seus produtos desde 1º de janeiro de 2011,
assim como as importações feitas a partir da mesma data.
"Os vendedores transformam-se em fiscais e o
próprio consumidor vai passar a exigir o selo", diz Daniel Salton,
presidente da Salton, uma das maiores vinícolas nacionais, com produção de 21,6
milhões de garrafas de vinho e espumante em 2011. A ideia é compartilhada pelo
enólogo Dirceu Scottá, da Dal Pizzol, que elaborou 300 mil garrafas no ano
passado. "Haverá um autocontrole do setor".
Segundo o superintendente-adjunto da Receita
Federal no Rio Grande do Sul, Ademir de Oliveira, a fiscalização está preparada
para começar o trabalho "imediatamente". Sem dar detalhes sobre a
estratégia montada para coibir as vendas irregulares, ele conta, além da equipe
de fiscais (o número de agentes não foi revelado), com as denúncias dos
consumidores e das empresas que operam legalmente para agir contra a sonegação
e a "concorrência desleal".
Quem for apanhado com produtos irregulares em
estoque sofrerá punição severa. As mercadorias serão tributadas, apreendidas, o
responsável receberá uma representação fiscal e responderá a processo penal,
explica Oliveira.
Paviani calcula que mais de 20 milhões de garrafas
de vinho e espumante (equivalentes a 15 milhões de litros) entram
irregularmente no país todos os anos. "O problema não será resolvido de
uma hora para outra, mas os efeitos positivos do selo fiscal serão sentidos nos
próximos dois a três anos", acredita. De janeiro a novembro de 2011, segundo
a Uvibra, o mercado doméstico legal alcançou 83,7 milhões de litros de vinhos
finos e 15,8 milhões de litros de espumantes, entre nacionais e importados.
"Com o selo saberemos qual é o tamanho real do
mercado", diz o presidente da Uvibra, Henrique Benedetti. Para ele, por
exemplo, boa parte dos 54 milhões de litros de vinho importados pelo Paraguai
da Argentina e do Chile em 2010 acabou entrando ilegalmente no país.
"Naquele ano o Brasil, com quase 200 milhões de habitantes, dez vezes mais
do que o Paraguai, comprou legalmente 45 milhões de litros dos dois países.
A introdução do selo fiscal obrigatório em vinhos e
espumantes, a exemplo do que já ocorre com as bebidas "quentes" como
uísque e vodka, é um processo que começou em abril de 2010. Na época, a Instrução
Normativa (IN) 1.026 da Receita Federal estabeleceu janeiro de 2011 como data
para a indústria e os importadores começarem a aplicar o selo e janeiro de 2012
para o varejo e o atacado iniciarem as vendas apenas de produtos controlados,
depois de um ano para liquidar os estoques anteriores.
Em agosto de 2011, porém, o prazo para adequação do
comércio foi estendido até janeiro de 2015, mas alguns dias depois, sob pressão
das vinícolas, outra IN restabeleceu a data de janeiro de 2012. O último
capítulo foi escrito dia 29 de dezembro, quando a Instrução Normativa 1.230
permitiu a venda, a partir de agora, de produtos sem selo adquiridos pelo
varejo e pelo atacado antes de janeiro de 2011.
Segundo o Ibravin, cada selo, impresso pela Casa da
Moeda, custa R$ 0,023, mas o valor pode ser compensado no recolhimento do PIS e
da Cofins pelas empresas. A aplicação da estampa custa, em média, de R$ 0,01,
caso o processo seja mecanizado, até no máximo R$ 0,03, quando a colocação é
manual, calcula Paviani. Para Scottá, da Dal Pizzol, são "valores
irrisórios" diante dos benefícios gerados pelo maior controle.
Conforme o enólogo, a vinícola faz a aplicação
manual e deslocou um funcionário para reforçar a equipe de duas pessoas que
colava o rótulo e agora coloca também o selo. Já a Salton investiu 100 mil
euros em uma seladora no início de 2011, sem contar a nova linha de envase
adquirida em meados do ano por R$ 8 milhões e que já incluía equipamento para
selagem. Antes da automatização da operação, a empresa começou a selar os
produtos manualmente em dezembro de 2010 com 30 funcionários temporários.
Importadores vão à Justiça para não adotar medida
Letícia Casado | De São Paulo
A crise na Europa e nos Estados Unidos fez com que
a oferta de vinhos ficasse acima da demanda, e o Brasil se tornou um dos alvos
para desovar os estoques. Aliado a isso, a cotação do dólar durante o ano
permitiu aos importadores comprar grandes quantidades de vinhos de qualidade e
preço baixo. Agora, a indústria nacional faz lobby para impor medidas
protecionistas e favorecer a produção local. O selo fiscal é o resultado. É
assim que associações de importadores e supermercadistas descrevem a questão da
obrigatoriedade do selo fiscal em todos os vinhos e espumantes vendidos no
varejo e no atacado.
Abrir o contêiner com mil garrafas, tirar uma por
uma da embalagem, selar, esperar secar e empacotar de novo. Para a Associação
Brasileira de Exportadores e Importadores de Alimentos e Bebidas (Abba), que
representa 130 importadoras de vinho, o trabalho de selagem será penoso,
oneroso e não vai evitar a falsificação do vinho. A Abba obteve um mandado de
segurança no Tribunal Regional Federal de Brasília que desobriga seus
associados de estamparem o selo de controle fiscal em suas mercadorias. E sua
presidente-executiva, Raquel Salgado, está disposta a ir até o Supremo Tribunal
Federal na disputa.
A presidente-executiva da Abba rebate as
justificativas dadas pelas produtoras nacionais. Diz que existe uma indústria
de falsificação de selo, que já imita os que são colados em bebidas quentes,
principalmente uísques; afirma que a polícia precisa controlar as fronteiras
para evitar o contrabando; e que o custo real do selo fiscal não é zero.
"Até conseguir isso é um parto. E a logística?
E o funcionário? Tem que cortar [o selo] com tesoura, mandar para
guilhotina", diz ela, acrescentando que a outra opção é comprar uma
seladora, como fizeram os grandes produtores. "A Ibravin fala isso porque
são indústrias com maquinários. Quanto custa a máquina de selagem? Será que o
pequeno produtor e importador têm dinheiro para investir?"
A Associação Brasileira de Supermercados (Abras) se
dá por satisfeita com a proteção dos estoques (com vinhos comprados antes de 1º
de janeiro de 2011). Sussumu Honda, presidente da entidade, diz que seria
absurdo ter que selar todas as garrafas que estão guardadas. "A Receita
fez a mudança, a questão foi condicionada e regularizou-se a situação."
Para ele, o consumidor vai arcar com a mudança, uma
vez que o vinho pode custar mais caro por causa da mão de obra empregada na
selagem. Uma das soluções, diz o executivos, é comprar o produto selado na
origem. Quem fornece o selo é a Receita Federal do Brasil.
Na avaliação de Raquel, da Abba, este processo não
compensa, pois implica em burocracia e risco muito altos e pouca agilidade. Ela
diz que primeiro a empresa tem pedir os selos ao governo, que analisa a
documentação e, se autorizada, publica no Diário Oficial da União.
Depois, a importadora tem duas semanas para mandar
os selos para a produtora no exterior. "Se o malote é extraviado, a
empresa tem que arcar com as consequências", afirma. A importação deve
então ser feita em até 90 dias. "Mandar selar na origem faz você perder a
agilidade comercial", diz a executiva.
FINANÇAS
Tesouro capta pela menor taxa da história
Por Fernando Travaglini | De São Paulo
Sem depender das captações externas para financiar
a dívida - como ocorria no passado - e com as contas fiscais em ordem, o
governo brasileiro tem se destacado no segmento de dívida soberana. Ontem, o
Tesouro Nacional realizou a primeira operação em dólares do mercado
internacional do ano, com a reabertura do bônus de 10 anos, o Global 2021, e
pagou a menor taxa da história (3,449% ao ano) para um papel já emitido pelo
Tesouro.
O prêmio da emissão, no entanto, ficou um pouco
superior à reabertura do mesmo papel feita no ano passado. Em julho de 2011, o
governo brasileiro captou US$ 550 milhões com esse mesmo bônus, pagando um
"spread" sobre o título americano de mesmo vencimento de 105 pontos
bases. Desta vez, o prêmio foi de 150 pontos.
A justificativa é que hoje os prêmios de risco
estão mais altos para todos os países e os papéis do governo americano estão em
patamares muito baixos, devido à política de afrouxamento monetário do país.
Além disso, na comparação com outros emergentes, o Brasil tem conseguido as
melhores taxas. O México, por exemplo, também realizou uma operação de 10 anos,
ontem, mas pagando um prêmio superior ao brasileiro (180 pontos básicos de
spread).
O desempenho dos bônus nacionais nos mercados
secundários também tem sido positivo. O retorno para o investidor (yield) do
bônus de 10 anos brasileiro - Global 2021 - caiu de 4,6%, no início do ano,
para 3,38% hoje. Vale lembrar que o cupom desse título (remuneração de face) é
de 4,875% ao ano.
A estratégia do governo brasileiro tem sido a de
aproveitar janelas de mercado para fechar operações pontuais, mas na melhor
condição possível. Com isso, o Tesouro tem feito lançamentos com taxas sempre
decrescentes, conseguindo reduzir seu custo de captação de 10 anos no exterior
em mais de 100 pontos básicos ao longo de 2011, mesmo com a piora da crise
financeira internacional.
A consequência indireta dessa estratégia é a
melhora da condição de captação também para as empresas. Afinal, as condições
de captação do Tesouro servem de referência também para operações do setor
privado.
A queda do prêmio sobre os papéis brasileiros
contrasta com o custo pago pelas grandes economias europeias. A Itália, por
exemplo, tem emitido dívida soberana com juros próximos a 7% ao ano para
títulos de dez anos, enquanto a reabertura do bônus da República do Brasil com
vencimento em 2021, ontem, pagou metade disso.
A transação superou as expectativas. Na abertura do
negócio, na manhã de ontem, o Brasil pretendia captar US$ 500 milhões, pagando
um spread em torno de 160 pontos básicos. A emissão foi liderada pelos bancos
BNP Paribas e Itaú BBA, com coliderança da BB Securities.
A demanda pelo papel brasileiro também surpreendeu
e chegou a US$ 3,6 bilhões. Ainda assim, o Tesouro Nacional preferiu captar
apenas US$ 750 milhões para garantir a qualidade da operação e ter um melhor
desempenho dos papéis do secundário - importante para garantir que empresas
brasileiras aproveitem o momento para também captar a taxas baixas.
Durante a madrugada, o Brasil realizará uma nova
rodada no mercado asiático (green shoe), que deve atingir o total esperado de
mais 10% do volume já captado (US$ 75 milhões), levando o total captado para
US$ 825 milhões.
Essa estratégia é possível pois o país não depende
desses recursos para financiar sua dívida. A necessidade de financiamento no
exterior está atrelada apenas ao papel institucional de abrir mercados e
estabelecer patamares de juros (a chamada curva de juros) para balizar
operações de empresas brasileiras. As obrigações do Tesouro no mercado externo
somam menos de US$ 50 bilhões, com vencimentos neste ano bastante reduzidos, da
ordem de US$ 2,8 bilhões.
O governo se beneficiou ontem, também, de um dia
bastante positivo para os mercados, com forte alta das bolsas e queda do dólar
frente as moedas internacionais. A menor aversão ao risco foi puxada por dados
melhores do que o esperado da atividade das principais economias do mundo:
Estados Unidos, China e Alemanha.
Nesse ambiente e com o sucesso da captação
brasileira, a expectativa é de que as companhias nacionais aproveitem o atual
momento de otimismo do mundo para buscar recursos no exterior, antes que novas
notícias negativas elevem novamente a aversão ao risco. Entre as candidatas
estão a Petrobras e a Vale, além dos grandes bancos brasileiros. Emissões de
países emergentes também são esperadas para os próximos dias, como Colômbia,
Peru, Rússia e Filipinas.
Mas a janela continua restrita, a exemplo do que
aconteceu no segundo semestre do ano passado, às empresas de primeira linha e
ainda limitado ao apetite de risco dos investidores internacionais. Os
investidores iniciaram o ano bastante desalavancado, depois de um fim de ano
bastante negativo e a atual janela deve se prolongar pelos próximos dois dias,
na expectativa dos dados de novas contratações da economia americana (payroll),
que será divulgado na sexta-feira. Se os dados saírem positivos como apontam os
analistas, o período de estabilidade pode se estender por mais uma semana.
Cooperativa quer conta de servidor
Por Murilo Rodrigues Alves | De Brasília
As cooperativas de crédito também entraram na
disputa para receber as contas-salários de cerca de 13 milhões de servidores
públicos. Desde ontem, eles podem escolher livremente qual instituição
financeira desejam receber seus salários.
Como os bancos, as cooperativas também apostam as
fichas para conquistar esse público - que ganha 43% a mais do que a média dos
salários brasileiros. Para fazer com que os funcionários públicos prefiram se
associar a uma das 1.370 cooperativas de crédito em vez de transferir a conta para
outro banco, o Sistema de Cooperativas de Crédito do Brasil (Sicoob) promete
tarifas muito mais atrativas e atendimento diferenciado.
"As cooperativas de crédito oferecem
atendimento diferenciado aos seus associados, exigindo menos garantias nas
liberações de crédito", disse o diretor de Desenvolvimento Organizacional
do Sicoob, Abelardo Sobrinho. "Além de conhecerem bem os cooperados, estes
também são donos das cooperativas, tendo direito a voto nas decisões das
instituições", completou.
De acordo com Abelardo, as cooperativas de crédito
oferecem taxas abaixo da média pratica pelos bancos comerciais. No crédito
pessoal, pelos números do diretor, as cooperativas cobraram, em média, 2,2% ao
mês em 2010, enquanto os bancos comerciais tiveram taxas por volta de 4,6% ao
mês. A taxa mensal do cartão de crédito no mesmo ano foi de 7% nas entidades
cooperativas, contra 10,5% em média pagos pelos clientes dos bancos, diz
Abelardo, que ainda não fechou as comparações referentes a 2011.
Para transferir o salário para outra conta
diferente da aberta pelo empregador, é preciso fazer o pedido por escrito à
instituição financeira, que é obrigada a aceitá-lo dentro do prazo de até cinco
dias úteis. Os recursos devem ser transferidos para o banco escolhido pelo
empregado no mesmo dia do depósito do salário, até às 12 horas. O empregador ou
empregado não precisam pagar nenhuma tarifa extra pela transferência.
Os servidores públicos foram os últimos a ter
acesso ao benefício de portabilidade, obrigatório aos funcionários da
iniciativa privada desde janeiro de 2009. A conta-salário, destinada a receber
salários, proventos, soldos, vencimentos, aposentadorias, pensões e similares,
não admite outro tipo de depósito além das remunerações e não pode ser
movimentada por cheques.
INVESTIMENTOS
Latinos querem corrigir balanços
Fernando Torres | De São Paulo
Logo na primeira oportunidade em que os países latino-americanos
se organizaram para apresentar propostas para reformulação do padrão contábil
internacional IFRS, apareceu entre as prioridades um tema que é mais do que
conhecido na região: o efeito da inflação nos balanços.
Escolados no assunto, os países da América Latina
consideram inapropriada a regra atual do IFRS sobre esse assunto.
Representantes do Grupo Latino Americano de Normas
de Informação Financeira (Glenif) defenderam mudanças nessa regra há três
semanas em Londres, onde fica a sede do Conselho de Normas Internacionais de
Contabilidade (Iasb, na sigla em inglês), órgão que edita as IFRS. Integrantes
do Glenif, Brasil, México e Argentina também manifestaram de forma independente
suas preocupações com o tema.
No Brasil, havia correção monetária integral dos
balanços até 1995, ano seguinte à criação do Plano Real. A inflação acumulada
desde então atinge 172%.
Editada em 1989, a norma atual do IFRS sobre
contabilidade de inflação, chamada de IAS 29, permite a correção de contas no
balanço somente em economias consideradas hiperinflacionárias. E um dos itens
da regra diz que isso seria caracterizado quando a inflação atinge 100% num
período de três anos. Outra característica que evidenciaria a hiperinflação,
segundo esse pronunciamento, é o uso generalizado pela população de um país de
uma moeda estrangeira estável para dar preço a bens e produtos.
O Comitê de Pronunciamentos Contábeis (CPC), órgão
responsável pela edição das normas IFRS no Brasil, nem chegou a traduzir o IAS
29 para o português, diante das características previstas no pronunciamento -
que não se aplicariam ao Brasil de hoje -, e por conta do tempo apertado
durante o processo de transição do padrão contábil.
Em documento enviado ao Iasb em resposta a um
processo de consulta sobre quais devem ser as prioridades do órgão global nos
próximos anos, o CPC disse, a respeito desse tema, que "a experiência
passada no Brasil revela que uma inflação em um nível muito menor (por exemplo,
de 3% a 5% ao ano) produz impacto significante no retorno do investimento, na
posição financeira e na performance de uma entidade".
O Glenif foi na mesma linha e pediu tanto a
retirada dessa referência aos 100% como a possibilidade de se corrigir os
balanços caso os usuários das informações financeiras "considerem que a
perda do poder de compra de uma moeda foi relevante durante determinado
período".
Atualmente, entre os países da América Latina,
apenas a Venezuela se enquadra na característica prevista no IAS 29.
Sem correção dos balanços em um país que vive com
inflação relativamente alta, o patrimônio líquido das empresas tende a ficar
subavaliado, o que distorce indicadores que usam essa conta como referência,
como as métricas de retorno e de endividamento. Outra distorção se refere ao
imposto sobre o ganho de capital quando da alienação de um investimento, que
usa o patrimônio como base de cálculo.
A apresentação do Glenif em Londres foi feita por
Ricardo Lopes Cardoso, professor da FGV e da Universidade Estadual do Rio de
Janeiro (UERJ), que foi coordenador do primeiro grupo técnico do Glenif, que
tratou exatamente da apresentação de sugestões para a agenda futura do Iasb.
Como ouvintes estavam o presidente do Iasb, Hans
Hoogervorst, além de outros três membros da diretoria do órgão, formada por 15
pessoas.
"O Iasb tem conhecimento de que diversos
países com histórico de inflação relevante não estão contentes com o
pronunciamento atual", afirmou Cardoso.
Ele conta, no entanto, que notou, na sessão de
perguntas e respostas, que o Iasb não quer soluções prontas, que poderia ser o
caso apenas se não existisse uma norma em vigor sobre o tema. "Eles querem
que a gente deixe claro quais os problemas do IAS 29 e quais as alternativas,
partindo da regra que já existe", disse.
A visão do Glenif, diz Cardoso, é de que não basta
baixar o sarrafo dos 100% de inflação em três anos. "É preciso também
melhorar a metodologia (de correção). Mas como cada país desenvolveu
domesticamente sua solução, talvez cada um queira crer que sua saída é melhor
que a do outro."
AGRONEGÓCIOS
Cacau recua abaixo do custo no Brasil
Por Fabiana Batista | De São Paulo
Os produtores de cacau do Brasil estão vendendo a
amêndoa a preços abaixo dos custos de produção, o que não acontecia desde 2008.
Depreciadas por projeções de superávit mundial e por movimentos especulativos,
as cotações internacionais da commodity estão em baixa desde outubro.
Nas principais regiões produtoras do Brasil, em
especial em Ilhéus (BA), os preços médios recuaram abaixo de R$ 70 por arroba
no fim de novembro e não se recuperaram mais. Esse patamar de preços já é
suficiente para comprometer a rentabilidade da maior parte dos produtores,
segundo Thomas Hartmann, da TH Consultoria, de Salvador. Segundo o
especialista, é muito difícil estimar o custo médio de produção no país, uma
vez que o segmento é heterogêneo.
Quanto ao comportamento dos preços, lembra
Hartmann, o mercado doméstico costuma acompanhar as cotações internacionais.
"Na safra passada, a 2010/11, o mundo teve um superávit grande, de 350 mil
toneladas, volume que ainda exerce influência no mercado", afirma.
O atual quadro baixista resiste mesmo com a
previsão de déficit para o novo ciclo mundial iniciado em outubro da maior
parte dos analistas. As estimativas sinalizam que esse déficit em 2011/12 pode
variar de 100 mil a 165 mil toneladas da amêndoa. "Ainda que a oferta seja
menor que a demanda, o volume estimado até agora não deve ser suficiente para
motivar a alta dos preços", avalia. E, segundo ele, há um pequeno grupo de
especialistas que acredita em um superávit de cerca de 60 mil toneladas.
O próprio Hartmann, um dos raros analistas
independentes desse mercado no país, prevê que a produção mundial de cacau
ficará entre 4,1 milhões e 4,2 milhões de toneladas em 2011/12. As divergências
também envolvem o aumento do consumo mundial da amêndoa, cujas estimativas para
a temporada variam de 2,5% a 5%.
"Uma ala do mercado acredita que a crise não
afeta o consumo de chocolate. Outra, aposta que haverá impactos. O que ocorre é
que neste ano há incertezas nunca vistas", afirma Hartmann.
O fato é que, como não é baseada em contratos
futuros, a comercialização brasileira da atual safra foi beneficiada por preços
na casa dos R$ 80 a arroba apenas no mês de setembro passado. De lá para cá -
apesar dos preços máximos estarem acima de R$ 70 - os preços médios recuaram e,
desde 30 de setembro estão abaixo do custo de produção em Ilhéus e Itabuna,
segundo a Central Nacional de Produtores de Cacau. As cotações médias internas
chegaram a atingir R$ 63 em 12 de dezembro, e nesta semana fecharam a R$ 66,33.
Hartmann acredita que esses preços baixos vão
redundar em redução dos tratos culturais no cacau, que vinha de um movimento de
recuperação das lavouras, quase dizimadas na década de 80 pela
vassoura-de-bruxa. "Esse é um efeito não desejado, pois a indústria
processadora de cacau quer ampliar sua capacidade de produção, mas ainda
esbarra justamente no baixo crescimento da oferta da amêndoa no Brasil",
afirma o secretário-executivo da Associação das Indústrias Processadoras de
Cacau (AIPC), Walter Tegani.
A safra principal do país, iniciada em setembro e
que segue até abril, deve ter uma produção entre 175 mil e 180 mil toneladas,
em torno de 10% a 12% menor do que a anterior, segundo Hartmann.
Commodities deverão cair, diz Graziano
Por Assis Moreira | De Genebra
A desaceleração da economia mundial vai derrubar os
preços das commodities agrícolas em 2012, mas essa queda não será drástica no
curto prazo, afirmou ontem o brasileiro José Graziano da Silva, dois dias
depois de assumir o cargo de diretor-geral da FAO, o braço da ONU para
agricultura e alimentação.
Para Graziano, os preços não aumentarão "no
sentido que têm aumentado nos últimos dois anos, mas tampouco se espera uma
redução como a de 2009". Ele também chamou a atenção para a persistente
volatilidade nos mercados de commodities, e atribuiu o movimento a três razões
principais:
Em primeiro lugar, disse, a situação econômica
global causa mais instabilidade também no mercado de divisas, "e cada vez
que o dólar americano se mexe, o preço das commodities também se move".
Segundo: os principais países produtores,
especialmente de cereais, foram afetados por desastres naturais que tiveram
impacto tanto nas safras que estavam sendo plantadas como nas futuras, de forma
que o equilíbrio entre produção e consumo segue apertado.
E ele acredita, finalmente, que os baixos estoques
seguirá a alimentar especulações. "Se não formos capazes de aumentar a
produção, o estoque baixo vai continuar e a especulação pode tornar a situação
pior".
Dados da FAO mostram que os preços globais dos
alimentos tiveram um pico de alta em fevereiro de 2011, mas começaram a
declinar desde junho no rastro de melhores colheitas de vários produtos. Os
altos preços elevaram a inflação em vários países, e deram peso político a
revoltas populares, inclusive no Oriente Médio.
Graziano assumiu o cargo na FAO na segunda-feira,
no lugar do senegalês Jacques Diouf. E estima que a crise econômica global vai
aumentar o número de famintos, mas não como em 2008, quando mais de 1 bilhão de
pessoas enfrentaram essa condição.
De um lado, porque a crise é sobretudo em países
desenvolvidos; de outro, porque mais nações em desenvolvimento adotaram planos
de combate à fome. Na FAO, Graziano terá um orçamento regular de US$ 1 bilhão,
a metade do que dispunha como ministro no Brasil para o Programa Fome Zero.
LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
Certidão trabalhista entra em vigor a partir de hoje
Bárbara Pombo e Juliano Basile | De São Paulo e Brasília
Entra oficialmente em vigor hoje a lei que exige a
apresentação da Certidão Negativa de Débito Trabalhista (CNDT) pelas empresas
que querem participar de licitações públicas. O Tribunal Superior do Trabalho
(TST), entretanto, concedeu 30 dias para as companhias com dívidas trabalhistas
regularizarem a situação sem que sejam imediatamente afetadas pela medida. Pelo
Ato do TST nº 01, publicado ontem, os devedores terão um mês para quitar ou
justificar a falta de pagamento antes de serem "negativadas". "É
prudente a concessão de prazo razoável para que o devedor interessado, após
inscrito no banco de dados, adote as providências necessárias para a correção
de eventuais inconsistências ou a satisfação do crédito em execução",
afirma o presidente do TST, ministro João Oreste Dalazen.
A certidão será emitida a partir das informações
contidas no Banco Nacional de Devedores Trabalhistas (BNDT), que, até ontem,
tinha cerca de um milhão de empresas inscritas. A lista de inadimplentes passa
a ser divulgado hoje pelo tribunal. Foram cadastrados no banco mais de 1,5
milhão de processos que aguardam execução. O documento poderá ser impresso gratuitamente
pelo site do TST.
A inclusão de nomes de empresas na lista de
devedores será automática. De acordo com as regras que foram aprovadas pelos
ministros do TST, em agosto, basta que a dívida seja confirmada pelos Tribunais
Regionais do Trabalho (TRTs) para que conste o nome da empresa como devedora.
Pela norma do TST, a empresa será negativada a
partir do 31º dia se não honrar a dívida ou esclarecer o motivo do não
pagamento. O tempo concedido é considerado importante porque muitos advogados
já verificaram erros no banco durante a consulta pública aberta às empresas no
fim do ano passado. "Há clientes que já quitaram o débito e continuam
inscritos e outros que eram responsáveis solidários e ainda estão como
inadimplentes mesmo tendo o devedor principal já feito o pagamento",
afirma Otávio Silva, sócio da área trabalhista do Siqueira Castro Advogados.
Silva afirma que entrou com despachos nos plantões
judiciais de vários tribunais para conseguir a exclusão de grandes empresas da
área de mineração e construção civil. "Juntos eles possuem mais de 300
processos em execução pelo país. Muitos deles consegui retirar do banco",
diz.
No Maranhão, advogados ainda não conseguiram
confirmar se há processos incluídos indevidamente. De acordo com Pollyana
Letícia Nunes Rocha, do Ulisses Sousa Advogados Associados, a listagem dos
devedores no Estado começou apenas em dezembro por causa da greve dos
servidores, que suspendeu o atendimento ao público. "Por isso, ainda não
confirmamos dados concretos sobre a inclusão de processos já quitados, pois nos
andamentos do site do TRT da 16º Região constam apenas inclusão, exclusão,
alteração, não sendo específico qual das três foi realizada", diz.
De acordo com advogados, é possível entrar com
mandado de segurança na Justiça caso a empresa adimplente não consiga a
exclusão. Segundo Eliane Ribeiro Gago, do escritório Duarte Garcia, Caselli
Guimarães e Terra Advogados, esta seria a última alternativa. "O
procedimento mais adequado e rápido seria a elaboração de uma petição endereçada
ao juízo da execução juntando o comprovante de quitação do débito", diz.
O sistema de identificação de devedores foi criado
para resolver uma situação constrangedora na Justiça do Trabalho. Atualmente,
de cada cem pessoas que ganham uma ação trabalhista, apenas 31 recebem. São
cerca de 2,5 milhões de processos em fase de execução. Para Dalazen, isso
significa que a taxa de congestionamento da execução trabalhista brasileira
atinge "o preocupante patamar de 69%".
Para resolver esse problema, o presidente do TST
defendeu a aprovação da norma no Congresso com a criação do Banco de Devedores
e de três certidões. A primeira é a Certidão Negativa de Débitos Trabalhistas.
Ela indica as empresas que não têm dívidas com a Justiça do Trabalho. A segunda
é a Certidão Positiva de Débitos. Essa última mostra quem são os devedores. Há
ainda a Certidão Positiva com efeitos de negativa para a empresa que foi citada
a executar a dívida, mas que ainda questiona algum aspecto do pagamento.
O projeto enfrentou a oposição de entidades
empresariais no Congresso, mas foi aprovado e sancionado pela presidente Dilma
Rousseff, em 7 de julho de 2011, quando se transformou na Lei nº 12.440.
Para a Confederação Nacional da Indústria (CNI), a
lei aumenta a burocracia e os custos para as empresas. Na opinião do presidente
do conselho de assistência sindical da Federação do Comércio de São Paulo
(Fecomercio-SP), Ivo Dall"Acqua, a medida pode ter um efeito inverso do
esperado. Isso porque as empresas dependentes de licitações públicas poderiam
ter problemas em resolver pendências trabalhistas por falta de dinheiro.
"Elas deveriam continuar fornecendo e ter parte do valor faturado
amortizado pelos débitos", diz.
Para o desembargador Nelson Nazar, presidente do
Tribunal Regional do Trabalho (TRT) de São Paulo (2ª região), o maior do país,
a certidão será uma forma eficaz de pressionar as empresas a quitarem seus
débitos. "O documento vai atuar na parte mais sensível das empresas que é
a conquista de mercado", diz.
A Certidão será um mecanismo importante que servirá
à efetividade da prestação jurisdicional, afirma Renato Henry Sant"Anna,
presidente da Associação Nacional dos Magistrados da justiça do Trabalho
(Anamatra), entidade que defendeu a aprovação da lei. "As obrigações
trabalhistas devem ser prioritárias, assim como as questões tributárias e
previdenciárias, já que o crédito trabalhista é privilegiado", enfatizou
Sant"Anna..
Benefícios do Simples para a advocacia
Ulisses César M. Sousa
Ao tratar dos benefícios que os escritórios de
advocacia e profissionais do setor teriam com sua inclusão no sistema do
Simples Nacional, é necessário, primeiro, falar sobre os prejuízos causados à
advocacia pela sua não inclusão nesse sistema. Recentemente foi publicada a Lei
Complementar nº 139, de 2011, que trata do Simples. Esperava-se - e a OAB
trabalhou por isso - que, na oportunidade, no bojo da lei referida fosse
alterada a regra contida no artigo 17, da Lei Complementar nº 123, de 2006, que
diz: "Não poderão recolher os impostos e contribuições na forma do Simples
Nacional a microempresa ou a empresa de pequeno porte (...) que tenha por
finalidade a prestação de serviços decorrentes do exercício de atividade
intelectual, de natureza técnica, científica, desportiva, artística ou
cultural, que constitua profissão regulamentada ou não, bem como a que preste
serviços de instrutor, de corretor, de despachante ou de qualquer tipo de
intermediação de negócios".
Essa expectativa dos advogados foi frustrada. A
mudança tão sonhada ainda não foi realizada. Por consequência, as sociedades de
advogados ainda não poderão recolher tributos e contribuições na forma prevista
na Lei Complementar 123.
As regras de tributação pelo Simples Nacional
alcançam, hoje, 72% de todas as pessoas jurídicas do país, responsáveis por 59%
dos empregos com carteira assinada. A maior vantagem decorrente da mudança aqui
defendida certamente seria a desburocratização, que, certamente, facilitaria,
em muito, a rotina das pequenas sociedades de advogados no que toca ao
atendimento das exigências do Fisco.
Uma das vantagens decorrentes do exercício da
advocacia através de sociedades de advogados é a possibilidade de uma
tributação inferior a que é lançada sobre aqueles que exercem a profissão de
forma autônoma. As sociedades de advogados (como os contribuintes brasileiros
em geral) sujeitam-se a uma escorchante carga tributária, que equivale a algo
situado entre 15% e 20% das receitas, dependendo do regime de tributação.
Enquanto isso, os advogados autônomos, se somados os valores pagos a título de
INSS, Imposto de Renda e ISS, recolhem ao fisco quase 40% do que recebem. Um
absurdo.
Certamente, a inclusão das sociedades de advogados
no Simples Nacional afastaria da informalidade muitas associações de advogados.
Tal tratamento tributário diferenciado seria justificado em razão das
dificuldades enfrentadas pelas sociedades de advogado de menor porte, com as
inúmeras obrigações acessórias impostas ao contribuinte.
A inclusão da advocacia dentre as atividades
possíveis de tributação pelo Simples hoje é objeto, no Senado Federal, do
Projeto de Lei Complementar nº 467, de 2008, de autoria da senadora Ideli
Salvatti. O projeto referido tem como relator o senador José Pimentel (PT-CE) e
se encontra em análise na Comissão de Assuntos Econômicos do Senado. Pelo
projeto é proposta a alteração do parágrafo primeiro do artigo 17 da Lei
Complementar 123, incluindo-se, no inciso XXXIV, a expressa previsão de que as
sociedades de advogados não estariam alcançadas pelo artigo 17 da referida Lei
Complementar, que hoje as impede de recolher tributos e contribuições na forma
do Simples Nacional.
A exclusão das sociedades de advogados do Simples
Nacional parece não ser compatível com a regra do artigo 179 da Constituição
Federal: "A União, os Estados, o Distrito Federal e os municípios
dispensarão às microempresas e às empresas de pequeno porte, assim definidas em
lei, tratamento jurídico diferenciado, visando a incentivá-las pela
simplificação de suas obrigações administrativas, tributárias, previdenciárias
e creditícias, ou pela eliminação ou redução destas por meio de lei."
Não há razão que justifique negar às sociedades de
advogados de pequeno porte a possibilidade do recolhimento de tributos e
contribuições pelo sistema do Simples Nacional. Essa discussão, ainda na
vigência da lei nº 9.317, de 1996, foi levada ao Supremo Tribunal Federal (STF)
que, por maioria, concluiu pela inexistência de inconstitucionalidade. Acredito
que, no julgado referido, o STF não decidiu com o costumeiro acerto. Nada
justifica, face ao disposto no inciso II do artigo 150 da Constituição Federal,
que se estabeleça tratamento desigual entre contribuintes que se encontram em
situação assemelhada. Não se pode estabelecer tal distinção unicamente em razão
da atividade exercida pelas sociedades de advogados. Essa distinção não tem
suporte na Constituição Federal. Negar às sociedades de advogados, ainda que
enquadradas nas definições de microempresas ou empresas de pequeno porte, o
direito de recolher tributos pelo Simples somente se justifica pela conhecida voracidade
do Fisco.
A burocracia fiscal brasileira é uma realidade. O
Leão é guloso, mas não é eficiente. Os contribuintes têm enormes dificuldades
não só para pagar os pesados tributos a que estão sujeitos, mas também para
cumprir as inúmeras obrigações acessórias a que estão submetidos.
Ulisses César Martins de Sousa é conselheiro
federal da OAB, sócio de Ulisses Sousa Advogados Associados
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do
jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser
responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza
em decorrência do uso dessas informações
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