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segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

23 de janeiro de 2012 - ESTADO DE MINAS



PRIMEIRA PÁGINA

Na rota do crescimento
Nenhum outro estado concentra tantos municípios na lista das balanças comerciais mais positivas, como mostra levantamento do Estado de Minas com base em dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior. Em 2010, eram cinco: Itabira, Ouro Preto, Nova Lima, Varginha e Araxá. A eles se juntaram Brumadinho, Itabirito e São Gonçalo do Rio Abaixo. Destaque para esse último, que pulou do 105º para o 14º lugar no ranking, graças à Vale, que aumentou a produção local de minério de ferro, de 2,6 milhões para 16 milhões de toneladas

POLITICA
Parceria rompida no meio do caminho

Prefeitos e vices de cidades mineiras quebram a aliança política e vão tentar a sorte no pleito de outubro em lados opostos. Em alguns casos, união não sobreviveu ao primeiro ano de mandato
Na campanha que os elegeu, caminharam lado a lado, sorridentes, sintonizados, até demais, com troca de elogios. Mas, no exercício do poder, se desentenderam e deverão atuar em campos opostos na eleição de 2012. Esse é o roteiro das desavenças entre o prefeito e o vice-prefeito eleitos em 2008 e que hoje, ao fim de três anos de mandato, estão rompidos. A situação de Belo Horizonte, envolvendo o titular Marcio Lacerda (PSB) e o seu vice, Roberto Carvalho (PT), se repete em outras cidades mineiras.
Adversários no plano federal, tucanos e petistas se juntaram em Manhumirim, na Zona da Mata, em 2004, quando foram eleitos como prefeito e vice o padre Ronaldo Lopes (PT) e o empresário Sebastião Ribeiro (PSDB). A chapa foi reeleita em 2008. No entanto, a lua de mel se desfez no fim de 2010, quando o vice anunciou a ruptura. "Foram várias coisas que me levaram ao rompimento. A primeira delas foi o desprezo. O PSDB ocupava duas secretarias na administração. O prefeito tirou o nosso pessoal e colocou no lugar pessoas do PT. Isso para nós foi um chute no traseiro", alega Sebastião Ribeiro.
Ele lembrou que na campanha de 2010 também houve divisão na prefeitura, com um grupo (do prefeito) apoiando o então candidato a governador Hélio Costa (PMDB) e outro grupo (do vice) fazendo campanha para a reeleição de Antonio Anastasia (PSDB). O vice-prefeito disse que não vai se candidatar no próximo ano e que vai apoiar o nome do vereador Jesus Aguiar (PSDB) para disputar a sucessão municipal contra o candidato da atual administração.
O prefeito Ronaldo Lopes argumenta que foi o próprio PSDB, partido do vice-prefeito, que decidiu romper com sua administração. "Os dois vereadores do partido foram para a oposição", afirmou. O chefe do Executivo desmente que teria "desprezado" o vice. "Ele aparecia comigo em todas as solenidades e em fotos. Mas o problema é que ele tinha uma atitude de querer ser o prefeito. O vice tem sua função e seu valor, mas tem seus limites", afirmou.
O casamento na Prefeitura de Ipatinga, no Vale do Aço, também não deu certo. No fim de outubro, a vice-prefeita da cidade, a pastora Márcia Perozini (PSC), divulgou uma carta anunciando o seu rompimento com a administração do prefeito Robson Gomes (PPS), com o qual venceu a eleição extemporânea, em 30 de maio de 2010. A carta foi divulgada pela assessoria de comunicação da Igreja do Evangelho Quadrangular, da qual Márcia é coordenadora. No comunicado, a vice-prefeita alegou que decidiu romper com a administração municipal "por não compactuar com a displicência política existente".  "Acabei por observar que as divergências de ponto de vista exigiam o meu afastamento da administração."
Declarou ainda que o fato de assumir tal posição ocasionou a demissão de todos os funcionários de seu gabinete, impossibilitando-a de atender a população. "Confesso minha tristeza por ver tudo passar diante de mim sem poder contribuir para a execução de projetos que sempre defendi." Ainda no texto, ela diz que "aquele objetivo, que foi também objeto de campanha nas últimas eleições municipais, se perdeu ao longo do caminho." A reportagem não conseguiu contato com Márcia Perozini. Procurada, a assessoria da Prefeitura de Ipatinga informou por meio de nota que a administração municipal "não reconhece como oficial a carta distribuída pela Assessoria Metropolitana de Comunicação, justamente porque o prefeito Robson Gomes da Silva (PPS) considera a pastora Márcia Perozini como vice-prefeita eleita ao seu lado pelo voto do povo".
Ex-amigos Os desentendimentos políticos em Varginha, no Sul de Minas, acabaram com uma amizade de infância. Colegas desde o ensino fundamental, Eduardo Antônio Carvalho (PT) e Marcos Paiva Foresti (PPS), apesar de serem de partidos opostos no cenário nacional, se uniram na disputa do pleito de 2008 e saíram vencedores. Mas a relação dos dois mudou quando assumiram o comando da cidade. Segundo Marcos, o grupo de secretários petistas passou a dominar as ações na prefeitura e deixou de fora o "adversário político".
O clima ficou ainda mais tenso quando o vice-prefeito entrou na competição de votos com uma candidata a deputada estadual petista, nas eleições de 2010. "Há três anos Eduardo não tira férias para eu não assumir. Ele tirou 10 dias de folga este ano. De acordo com a legislação, eu só assumiria depois de 15 dias", reclamou Foresti. Nas eleições deste ano eles devem ficar de lados opostos no palanque, pelo menos essa é a pretensão do vice-prefeito. O prefeito não foi localizado pela reportagem no celular. A assessoria de imprensa informou que ele está em viagem.

Armadilha do destino
"Eu nunca participei da administração dela. Desde quando assumiu a prefeitura, ela foi eliminando um a um", reclama Reinaldo César Guimarães (PMDB), ex-vice-prefeito e atual prefeito de Conceição do Mato Dentro, Região Central de Minas. Reinaldo se uniu a Nelma Carvalho (PR), no ano passado, para derrotar a família Costa, nas eleições extemporâneas. Eles venceram a primeira batalha, mas outra só estava começando na administração de Conceição. O fato é que o vice-prefeito, que se sentia rejeitado na administração, acabou saindo no lucro, já que Nelma foi cassada pela Câmara Municipal no início do mês por ato de improbidade administrativa e ele assumiu a cadeira do Executivo.
Ele diz que Nelma não cumpriu as promessas que fez para a sociedade, não o escutava e "acabou fazendo o mesmo que os adversários políticos". Já a ex-prefeita argumenta que foi Guimarães quem não quis assumir o seu lugar de vice. "Quando eu o procurei para que assumisse o gabinete do vice-prefeito ele disse: "Por favor não me faça de novo esse convite. Já tenho problema de sobra no meu escritório de advocacia"", conta Nelma.
As rixas políticas muitas vezes extrapolam os debates de interesse público e partem para a queda de braço que deságua em atitudes extremadas , como a proibição de acesso a gabinete e corte de salário. Em Montes Claros, de 362 mil habitantes, no Norte de Minas, o prefeito Luiz Tadeu Leite (PMDB) foi eleito ao lado da companheira de chapa, a dentista Cristina Pereira (PP), mulher do antigo adversário, o deputado estadual Gil Pereira, atual secretário estadual para o Desenvolvimento dos Vales do Jequitinhonha e Mucuri e do Norte de Minas. Mas a união durou somente até as eleições de 2010, quando o prefeito lançou como candidato a deputado estadual seu filho, Tadeu Martins Leite (PMDB), que foi eleito. Logo depois, a vice rompeu com o prefeito e se licenciou para fazer campanha para o marido.
Cristina Pereira alega que rompeu com o chefe do Executivo porque foi "obrigada" a isso. "Não fui eu que me afastei da prefeitura, mas o prefeito que me afastou. Teve um dia que fui trabalhar e encontrei a porta do meu gabinete trancada", afirmou. A vice-prefeita disse que, mesmo tendo direito aos subsídios, não recebe salário da prefeitura desde setembro de 2010. Por sua vez, Tadeu Leite alega que a vice, "por livre e espontânea vontade, parou de ir à prefeitura". Ele afirmou que está disposto a liberar os pagamentos dos salários atrasados da vice. "Mas ela tem que comparecer à prefeitura para assinar o empenho", assinalou. Tadeu Leite assegura que nunca trancou a porta do gabinete da vice. "A chave do gabinete estava com a própria vice-prefeita. Só que ela deixou a chave em casa", disse, acrescentando que a "a prefeitura está de portas abertas para Cristina Pereira para que ela possa ajudar a administrar a cidade".

Ameaça de chibata leva a fim da união 
Em Buritizeiro, 26,2 mil habitantes, separada de Pirapora pelo Rio São Francisco, a vice-prefeita Edna Salgado (PCdoB) se distanciou do prefeito Salvador Raimundo Fernandes (PT) ainda no primeiro ano de mandato. "O prefeito me acusou de ter participado de uma negociação para receber propina, coisa que nunca fiz. Ele chegou a declarar que ia me esperar no gabinete com uma chibata. Não dava para continuar com uma pessoa dessas", relata Edna. Durante cinco meses (de setembro de 2010 a fevereiro de 2011), ela esteve no comando da prefeitura, por causa do afastamento do prefeito, motivado por denúncia de irregularidade em licitações. O titular retornou ao cargo graças a uma liminar concedida pelo Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG).
Edna Salgado afirma que queria "contribuir com a administração municipal", sobretudo na área de educação, já que é professora universitária. "Mas sou proibida de entrar na prefeitura. Me ofereci para trabalhar, mas o prefeito mandou dizer que era para eu ficar em casa", disse a vice, acrescentando que está "decepcionada" com a política. A reportagem, por várias vezes, tentou contato com o prefeito de Buritizeiro para ouvir sua versão, mas não conseguiu localizá-lo.
Janaúba, 65,3 mil habitantes, é outro município onde prefeito e vice não sentam à mesma mesa desde o primeiro ano de mandato. "Fiquei somente dois meses e 20 dias na prefeitura. Vi que o plano de governo era uma coisa e, na prática, tinha outro rumo", conta o vice-prefeito Valério Dias (PPS), que chegou a exercer o cargo de secretário municipal de Obras no curto período. O vice afirma que se distanciou do prefeito José Benedito Nunes (PT) "por ele não cumprir os compromissos firmados com a população durante a campanha". Dias reclama que não tem acesso a informações da administração e entrou com uma ação na Justiça para conseguir dados de licitações realizadas nos últimos dois anos. Por outro lado, o vice anuncia que vai disputar a prefeitura no ano que vem, devendo enfrentar o próprio Benedito, provável candidato à reeleição. O prefeito não foi localizado pela reportagem.
Também no Norte de Minas, titular e vice andam às turras em Mato Verde, de 12,7 mil habitantes. O vice-prefeito Antonio Pinheiro Teixeira (PP), o "Tone de Leobino", se distanciou da prefeita Beatriz Fagundes Alves (PT) oito meses depois da posse. "Rompi por discordar da maneira com que ela vinha conduzindo a administração e, principalmente, por causa das denúncias de corrupção", sustenta Teixeira. Ele ficou à frente da prefeitura entre o fim de junho e o fim de outubro enquanto a titular esteve afastada por causa de denúncia de desvio de verbas por intermédio de empresa fantasma, apresentada pelo Ministério Público estadual. Beatriz Fagundes, que retornou ao cargo por força de liminar concedida pelo TJMG, não foi localizada pela reportagem.

Reajuste em discussão

Amanda Almeida

O prefeito de Belo Horizonte, Marcio Lacerda (PSB), pode anunciar hoje aos vereadores qual será sua posição sobre o reajuste de 61,8% no salário dos eleitos para a próxima legislatura da Câmara Municipal, aprovado no apagar das luzes do ano passado. Depois de dizer que a promulgação da lei – quando o Executivo não sanciona nem rejeita a proposição – era uma das opções, ele recuou e disse que não ficará em cima do muro. O aumento no contracheque dos parlamentares foi mais uma vez alvo de protesto ontem. O músico Gabriel Guedes escolheu a Praça do Papa, um dos cartões-postais da capital: "Os vereadores deveriam prestar mais atenção na população do que no bolso deles".
Foram convocados para a reunião o líder de governo, Tarcísio Caixeta, o presidente em exercício, Alexandre Gomes (PSB), e o secretário-geral da Mesa, Cabo Júlio. Conforme o Estado de Minas antecipou, Lacerda caminha para um veto técnico, alegando inconstitucionalidade dos termos em que o reajuste foi votado. Segundo equipe técnica da PBH, o Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG) estabeleceu que a lei sobre o reajuste deve fixar o valor do salário, e não apenas a vinculação de 75% ao subsídio dos deputados estaduais, como registra o projeto.
Ao som de Beethoven, Gabriel atraiu curiosos na Praça do Papa, que acabaram se tornando também manifestantes. "Estou acompanhando esse aumento dos vereadores com uma imensa sensação de impotência. Prefiro acreditar que é melhor tentar fazer barulho do que ficar calado. Vamos ver se eles mudam de ideia ou o Lacerda rejeita a proposta", afirmou o estudante de administração Felipe César Viana, de 22 anos.

ECONOMIA
São as exportações, uai
Produção e valorização de bens minerais e do café colocam oito cidades mineiras no ranking das 20 mais do país em saldo comercial. Três entraram na lista no ano passado

Paula Takahashi e Frederico Bottrel

Nem a valorização do dólar muito menos o cenário recessivo da economia na Zona do Euro foram suficientes para impedir que Minas Gerais registrasse, em 2011, o maior número de cidades na lista das 20 brasileiras com melhor saldo na balança comercial. Foram oito, contra cinco em 2010. Além da conquista inédita, nenhum outro estado concentra tantos municípios na lista como mostra levantamento do Estado de Minas a partir de dados do Ministério do Desenvolvimento, Indústria e Comércio Exterior (MDIC).
Se juntaram a Itabira, Ouro Preto, Nova Lima, Varginha e Araxá – que já estavam entre as que exportam mais do que importam – as cidades de Brumadinho, Itabirito e São Gonçalo do Rio Abaixo. Um dos grandes destaques fica por conta dessa última, que em 2010 ocupava a 105ª posição no ranking e hoje aparece em 14º, entrando para o top 10 mineiro. Boa parte do resultado é conferido ao desempenho da mineradora Vale, que elevou a produção de 2,6 milhões de toneladas para 16 milhões no município.
Mas este não é o único caso de destaque. Nova Lima, que saltou do 12º lugar para a terceira posição no país em saldo comercial – atrás apenas de Parauapebas (PA) e Angra dos Reis (RJ) –, praticamente triplicou o valor das exportações no período. Drummond já sabia: se mineiro tem "oitenta por cento de ferro nas almas", a valorização do minério foi a locomotiva para expansão dos valores exportados pelos municípios. No ano passado, o preço médio da tonelada ficou em US$ 167,59, 14% superior à média de US$ 146,71 em 2010.
A tendência iniciada em 2010, porém, não deve ser mantida em 2012. "No fim do ano passado já verificamos certa retração nos preços, o que deve se confirmar este ano, com a questão da crise econômica nos EUA e na Europa. Do jeito que está, caminhamos para preço mais estabilizado", projeta Alexandre Brito, consultor de negócios internacionais da Federação das Indústrias do Estado de Minas Gerais (Fiemg).
Mas não é só o preço que explica o desempenho extraordinário de São Gonçalo do Rio Abaixo. Segundo o prefeito Raimundo Nonato Barcelos (PDT), a mina da Vale na região é relativamente nova, com operações iniciadas em 2007. "Ela pode ter atingido no ano passado o pico da produção já que é considerada a maior mina a céu aberto do mundo", pondera. O reflexo está na arrecadação de royalties que pulou de R$ 56 milhões para R$ 90,8 milhões entre 2010 e 2011, alta de 62%.
Em nota, a Vale informou que "não houve variações significativas nos volumes produzidos e exportados entre os municípios mineiros onde possui operação de 2010 para 2011" como mostra o relatório do MDIC. A explicação para o sobe e desce das cidades que sediam unidades da mineradora pode estar no fato de que, no ano passado, houve "uma equalização do cadastro de todos os municípios na Secretaria de Comércio Exterior, de forma a retratar a realidade da participação de cada um no total de minério exportado", afirma a empresa.
Diversificação Na avaliação de Brito, a mineração é o carro-chefe das exportações não apenas da nova integrante do ranking, como também das demais – à exceção de Varginha, impulsionada pelo café. O que pode ser bom em anos como 2011, mas buscar a diversificação é essencial para manter a posição favorável no saldo. Ele chama a atenção para o caso de Nova Lima, que tem a pauta mais diversificada.
O prefeito Carlos Roberto Rodrigues (PT), confere atenção especial para as empresas de tecnologia da informação (TI) instaladas no Bairro Vila da Serra. Em São Gonçalo, medidas já estão sendo tomadas neste sentido. "Tentamos diversificar e hoje já estamos discutindo a instalação de outras empresas de serviços e também uma fábrica de tecidos", pondera Raimundo.
O desafio, na avaliação do secretário de Fazenda de Brumadinho, Hernane Abdon, escapa da esfera municipal: "Enquanto não houver reforma tributária para incentivar a instalação de empresas que beneficiem aqui o produto retirado do subsolo, não vamos enriquecer de fato. O minério passa aqui na minha porta todos os dias e vai virar produto na China", lamenta. O país asiático reafirmou sua posição como principal parceiro econômico do estado, para onde as exportações subiram 43%.

34,8% de voos atrasados

O radar secundário da torre de comando do Aeroporto Internacional Tancredo Neves, de Confins, na Grande Belo Horizonte, passou, ontem, por manutenção entre as 8h15 e as 11h55. Os pousos seguiram a programação das companhias, mas as decolagens foram afetadas. De acordo com informações da Empresa Brasileira de Infraestrutura Aeroportuária (Infraero), as autorizações para as aeronaves levantarem voo tiveram de ser dadas em velocidade mais lenta, o que explica os atrasos registrados no período. Não houve, porém, paralisação completa das operações. Até as 18h de ontem, 32 dos 92 voos programados para partir de Confins saíram além do horário previsto, o equivalente a 34,8% do total. Outros dois voos foram cancelados. Logo que a manutenção terminou, às 11h55, os aviões iniciaram sequenciamento de embarque em intervalos de cinco minutos. Segundo a Infraero, em uma hora as decolagens já haviam sido normalizadas.

Um basta aos maus-tratos
Um basta aos maus-tratos Em 184 cidades do país, pessoas foram às ruas com seus bichos pedir mais rigor na punição contra esses crimes. Entidades começaram a colher assinaturas para propor lei nesse sentido

Em Belo Horizonte, uma das atrações foi a cadela cadeirante Vitória, abandonada pelos antigos donos depois de atropelada
Milhares de donos e defensores dos direitos dos animais foram ontem às ruas em 184 cidades brasileiras e quatro do exterior – Londres (Inglaterra), Nova York, San Diego e Miami (EUA) – protestar contra os recentes casos de abusos e maus-tratos aos bichos e pedir uma punição rigorosa a quem pratica esse tipo de crime. Entidades protetoras iniciaram o cadastro de eleitores favoráveis à futura Lei Lobo – proposta de legislação de iniciativa popular que está sendo elaborada e dependerá de 1,3 milhão de assinaturas para tramitar – cuja campanha de adesões será lançada em abril. Na Praça da Liberdade, em Belo Horizonte, cerca de 300 pessoas compareceram com seus animais e pediram o fim dos maus-tratos.
O movimento "Crueldade nunca mais" ocupou pontos simbólicos de capitais e outras cidades na manhã de ontem, de forma simultânea. Em caminhadas com cartazes e animais de estimação, os protetores pediram o fim de casos como o de Lobo, cão rottweiler que, em novembro, foi amarrado pelo dono no para-choque do carro e arrastado por 11 quilômetros. O animal acabou morto em Piracicaba, no interior de São Paulo. O episódio da enfermeira Camila Corrêa, de 22 anos, que espancou seu yorkshire até a morte na frente da filha de 1 ano – ela foi indiciada por maus-tratos e constrangimento de criança –, também foi lembrado.
Conforme a legislação de crimes ambientais (Lei 9.605/98), quem pratica abuso, maus-tratos, fere ou mutila animais está sujeito a pena de três meses a um ano e multa. A pena é aumentada de um sexto a um terço se o agredido morrer. Punição que os defensores de animais consideram branda e pouco aplicada. "Temos que mobilizar a população pela criação de uma lei federal para punir com o rigor necessário os maus-tratos", defendeu a integrante do Movimento Mineiro pelos Direitos dos Animais Adriana Cristina Araújo. Os termos da proposta de lei mais rigorosa ainda não foram divulgados.
No ato em Belo Horizonte, as entidades recolheram assinaturas pela criação de uma delegacia estadual de proteção animal. Também cadastraram os interessados para aderir à petição de lei popular quando ela for lançada em abril. "O primeiro passo é ter delegados e policiais preparados para essa função", disse a coordenadora do "Crueldade nunca mais" na capital mineira, Stênia Couto. O segundo é melhorar a lei. "Hoje a pessoa praticamente não fica presa. Se houver uma lei mais severa, a pessoa pensa duas vezes antes de praticar maus-tratos", disse.
adoção Em meio a tantos cães, uma "cadeirante" chamou a atenção. A vira-lata Vitória, de 10 anos, foi "protestar" com o dono, o advogado Rafael Henrique Lima, de 31. Ela foi adotada há cerca de oito anos, depois de ser abandonada para o sacrifício pelos antigos donos. O motivo é que a cadela tinha sido atropelada. Em seguida, foi picada por um escorpião e sobreviveu, mas anda com um aparelho adaptado, por não ter os movimentos das patas traseiras. Tanto empenho para salvar o bichinho encontrado na sociedade protetora agora se transforma em revolta para o criminalista, que pediu mais rigor na punição aos agressores de animais. "A punição pequena contribui para os maus-tratos. Conseguir uma lei de iniciativa popular talvez seja mais difícil, mas creio que com a sociedade mobilizada a classe política compre nossa briga, ainda que seja em busca de votos", prevê.
Para a administradora bancária Kátia Gontijo, de 42, dona da schnauzer Nina e do poodle Frederico, a mobilização para a proteção dos animais devia ter começado há mais tempo. "Essa covardia e crueldade já existiam, só que isso não era divulgado e parece que só agora as pessoas resolveram lutar para defendê-los", afirmou.
Na Avenida Paulista, em São Paulo, cerca de 7 mil pessoas, conforme a Polícia Militar, participaram do ato em defesa dos animais. Elas fizeram uma caminhada que saiu do Masp e seguiu sentido Rua da Consolação. No Rio de Janeiro, a Praia de Copacabana, na Zona Sul, foi o cenário da manifestação. Em ambas as cidades, o discurso de que a legislação atual é branda foi repetido pelos participantes.


Uma nova Barraginha à beira do precipício
Duas décadas após a tragédia, sobreviventes estão condenados a conviver com o fantasma de novo desastre na Vila Itália, onde foram erguidas pelo município, com verba internacional, centenas de casas em área hoje considerada de alto risco pela própria Defesa Civil de Contagem

Flávia Ayer

Difícil encontrar quem não fique com a voz embargada e chore ao se lembrar do 18 de março de 1992, quando uma avalanche de lama engoliu mais de 300 barracos, matou 36 pessoas e deixou 1,4 mil desabrigados na Região Metropolitana de Belo Horizonte. Lá se foram 20 anos da tragédia da Vila Barraginha, em Contagem. Mas o tempo ainda não foi capaz de cicatrizar as feridas daqueles que sentem a dor de tantas perdas, guardam na memória o cenário de devastação e, duas décadas depois, ainda temem que a história se repita. Por mais que os fatos pareçam desafiar os limites da realidade, vítimas de um dos maiores desastres da história de Minas Gerais se veem mais uma vez no centro de um campo minado prestes a explodir.
Por decisão da prefeitura, na época parte das famílias remanescentes do desastre foi levada para a Vila Itália, região hoje considerada de alto risco de deslizamento de encosta e inundação pela própria Defesa Civil de Contagem. Sobram na vila, no Bairro Fonte Grande, barrancos desmoronando, casas trincadas e áreas interditadas, que se multiplicam no período chuvoso. Quem ficou na Barraginha também continua refém do perigo. Quase nada mudou desde o acidente, apesar de estudos – o último em 2007 – confirmarem que a comunidade está exposta a novos riscos, por causa do solo formado de camada de argila mole.
Terra mole e preta que a diarista Ricardina Rodrigues Fagundes, a Dina, de 49 anos, nunca mais viu desde 1992, mas que jamais vai esquecer. Ex-moradora da Vila Barraginha, ela suplicou para que debaixo do lamaçal, onde imaginava estar a casa em que morava, achassem a sua Fernanda, a Nanda, de 9 anos. Encontraram. Mas era tarde demais. Dez dias depois, foi um dos últimos corpos resgatados. Os filhos Marcelo, de 5, e Ricardo, de 8, se salvaram, mas a sogra, Anália, que tinha 73, também morreu. "Você não sente seus pés no chão", resume Dina, que trabalhava na hora do acidente e correu até se deparar com tudo revirado onde devia estar sua casa.
A mãe não contém lágrimas ao falar daquele dia, quando parte de sua alegria ruiu, e confessa que o choro guarda novas angústias. "Tiraram a gente de uma tragédia e nos levaram para outra", resume. Depois de três meses em abrigos, a família de Dina, hoje avó de três netos, foi uma das primeiras a receber uma das 154 casas construídas pela prefeitura na Vila Itália para vítimas da Barraginha, com verba de US$ 300 mil doada pelo governo italiano. O que surgiu como esperança aos poucos se mostrou outra armadilha: cinco dias antes do último Natal, um barranco atrás da casa de Dina veio abaixo. Quase atingiu o quarto de um dos filhos.
O laudo da Defesa Civil aponta, em letras garrafais, "risco muito alto de acidente" e orienta moradores a "isolar a área dos fundos e contratar profissional qualificado para avaliar e realizar as devidas intervenções de forma a restabelecer a segurança do local". Um dos quartos já está interditado. "Se continuar chovendo, a casa da vizinha de trás vai cair em cima da minha. Fico olhando a noite toda para a janela", afirma Dina, questionando por que o poder público levou as famílias para nova área de risco. "Pensei que nunca mais teria que passar por isso", desabafa a moradora.
SEM SOSSEGO Na semana passada, o comunicado de que terá que ir para uma casa de aluguel chegou às mãos da dona de casa Izabel Cristina Soares, de 46, até hoje dependente de remédios por causa da tragédia da Barraginha. Perto do despenhadeiro atrás de sua casa, uma das 154 doadas no fatídico ano de 1992, ela conta que o lugar já foi um espaçoso quintal. "Achava que estava num lugar seguro. O medo é demais, pois a gente já sabe o que é passar por isso", diz. Não faltam trincas no chão e nas paredes da casa de Izabel, que já chama a Vila Itália de "nova Barraginha".
"Há previsão no Orçamento Participativo para a construção de muros de contenção aqui, mas até hoje nada foi feito. Será que estão esperando outra tragédia?", questiona. Na casa da vizinha, Maura do Socorro Francisco da Costa, de 43, que perdeu a mãe no desastre, o barracão nos fundos do lote também já foi condenado pela Defesa Civil. Antes construído no meio do quintal, ele, agora, está à beira do precipício. "Meu marido trabalhou tanto para arrumar aqui", lamenta Maura, que não consegue afastar o medo de que a história se repita.

MEMÓRIA
300 casas engolidas

Eram 14h de 18 de março de 1992 quando dois estrondos na Vila Barraginha, no Bairro Cidade Industrial, em Contagem, anunciaram uma das maiores tragédias de Minas Gerais, que ganharia repercussão internacional. O rompimento de um aterro de 15 metros de altura por 100 de extensão destruiu quatro dos sete hectares ocupados pelo aglomerado, formado a partir da década de 1950, nos arredores de indústrias e grandes empresas, como noticiou o Estado de Minas à época. O desespero foi tamanho que os bombeiros começaram o resgate cavando a terra com as mãos. Era muito pouco para enfrentar a lama, que engoliu mais de 300 barracos. Trinta e seis pessoas morreram, a maioria crianças; 74 ficaram feridas e mais de 1,4 mil perderam a moradia, quase a metade da população da Barraginha. Além da ocupação imprópria da área e do excesso de chuva, a causa apontada para o acidente foi um aterro feito pela empresa M. Martins Engenharia e Comércio Ltda., vendida em 2008, para aumentar o pátio que mantinha ao lado da comunidade. A movimentação interferiu na estabilidade da bacia de argila mole sobre a qual as casas estavam assentadas. A Justiça condenou dois diretores e funcionários da construtora a pagar o equivalente a R$ 4 mil a cada família desabrigada e R$ 15 mil àquelas que perderam parentes, após acordo judicial. O primeiro registro de escorregamento de argila na Barraginha ocorreu em 1968. Em 2000, houve outra tragédia, quando quatro pessoas morreram em desabamento. O muro da Tecelagem Santa Elizabeth não suportou a força da chuva e ruiu sobre duas casas.

Fome ameaça 1 milhão de crianças

Dacar – Pela terceira vez na última década, a seca retornou ao árido Oeste da África, levando a fome para milhões de pessoas. Agências de ajuda internacional alertam que, se nenhuma ação for tomada agora, a região conhecida como Sahel deve entrar em crise. Mais de 1 milhão de crianças em oito países afetados devem enfrentar neste ano níveis de desnutrição que ameaçam suas vidas, de acordo com o Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef). A região afetada engloba Senegal, Mauritânia, Mali, Níger, Burkina Faso, o Norte da Nigéria, Camarões e o Sul do Chade.
A região ainda não se recuperou da seca dos últimos dois anos e muitas famílias perderam seus rebanhos, o que significa que não terão recursos para comprar comida. Trabalhadores das agências de ajuda também se preocupam com a possibilidade de os doadores pensarem que se trata de uma situação rotineira, já que a crise do Oeste da África ocorre apenas seis meses depois que a capital da Somália recebeu o título de zona de fome. "Acho que existe um risco real de as pessoas pensarem que esse tipo de coisa simplesmente acontece todos os anos", disse o gerente regional de campanha da Oxfam para o Oeste da África, Stephen Cockburn.
Cockburn afirma que pode haver mais esperança para a região do Sahel, já que os alertas sobre a crise foram detectadas mais cedo. "Os alarmes soaram em novembro e dezembro. Todos os países da região e todos os seus presidentes reconheceram o fato e pediram ajuda externa", declarou. Os primeiros sinais da fome em Sahel foram detectados no fim do ano passado, de acordo com relatório da Oxfam e da Save the Children.
Para o porta-voz do Unicef, Martin Dawes, as consequências da seca são especialmente trágicas para as crianças. "Nesse tipo de crise, os adultos sofrem, mas as crianças morrem", disse. Ele explica que a deterioração das condições de nutrição tem impacto nas crianças porque certos tipos de alimentos necessários para o desenvolvimento simplesmente não estão disponíveis na região, tornando necessária a ajuda externa.
No início da semana, agências de ajuda revelaram que milhares de pessoas morreram sem necessidade no Chifre da África, porque os doadores demoraram demais para reagir. Os sinais de alerta existiam desde agosto de 2010, mas a ajuda não aumentou antes de julho de 2011. "Dezenas de milhares de pessoas morreram por causa desse atraso", disse Cockburn. De acordo com relatórios de agências humanitárias, a crise alimentar matou entre 50 mil e 100 mil pessoas no Chifre da África este ano, mais da metade crianças com menos de 5 anos. As organizações temem que isso possa se repetir na região do Sahel.

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