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quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

04 de janeiro de 2012 - ESTADO DE SÃO PAULO


PRIMEIRA PÁGINA

Dilma reage a ministro que fez uso político de verba antienchente
A presidente Dilma Rousseff ordenou ontem a adoção de critérios técnicos na distribuição de recursos do Ministério da Integração para o combate a enchente, no dia em que o Estado revelou que 90% dessa verba estava sendo canalizada para Pernambuco, Estado de origem do ministro Fernando Bezerra Coelho. A pedido de Dilma, a ministra Gleisi Hoffman (Casa Civil) interrompeu suas férias no Paraná para convocar a reunião com técnicos do ministério e da Defesa Civil. Dilma não procurou Bezerra, que vai suspender as férias e deve se pronunciar hoje. Até expoentes do PT pernambucano avaliam que o ministro exagerou na politização do uso das verbas antienchente

Imóveis sobem 26% em 2011, mas ritmo de alta é menor
O preço dos imóveis residenciais subiram em média 26% em 2011, mas o ritmo de alta é cadente desde maio, segundo o índice FipeZap, que acompanha o valor médio do metro quarado de apartamentos prontos em seis capitais (São Paulo, Rio, Belo Horizonte, Recife, Salvador e Fortaleza) e no Distrito Federal. Em dezembro, a alta de 1,1%, a menor do ano, após pico de 2,7% em abril. A atividade econômica mais fraca no segundo semestre ajuda a explicar a evolução dos preços

EDITORIAL
Um sopro de otimismo

O ano começou com boas notícias e algum otimismo nos principais mercados, apesar da crise europeia ainda sem solução e da perspectiva de uma dura disputa eleitoral nos Estados Unidos. O bom humor avançou do Oriente para o Ocidente na terça-feira, com sinais de maior animação em várias grandes economias. A primeira boa novidade foi a elevação do índice da Federação Chinesa de Logística e Compras - um dado positivo sobre a atividade industrial. No Reino Unido um indicador do mesmo tipo veio melhor que o previsto. Na Alemanha, o governo informou a redução do desemprego para 6,8%, o menor nível desde 1998. Nos Estados Unidos, indicadores de produção industrial e de encomendas subiram de novembro para dezembro, com variação melhor que a projetada pelos analistas. Os gastos com a construção também surpreenderam positivamente e, além disso, a Ford noticiou novo recorde de vendas no mercado americano, com mais de 2 milhões de veículos comercializados em 2011.
Bolsas subiram na Ásia, na Europa e nos Estados Unidos e a Bovespa acompanhou o movimento. A reação foi positiva também nos mercados de commodities, com valorização dos metais e do petróleo (neste caso, com alguma influência da crise na região do Golfo Pérsico). Curiosamente, o otimismo dominante durante a maior parte do dia foi acompanhado de preocupação quanto às condições de algumas economias pesadamente endividadas. Os governos da Bélgica e da Holanda venderam títulos públicos sem dificuldade, com juros menores que os de leilões anteriores, mas os compradores foram mais cuidadosos em relação aos papéis da França e da Espanha. Os juros dos títulos dos dois países subiram no mercado secundário.
No caso da Espanha, a desconfiança aumentou porque o governo reconheceu um déficit superior a 8% do Produto Interno Bruto em 2011. A meta era 6%. Será necessária uma política mais dura para a correção do desvio. Menos de uma semana antes havia sido anunciado um pacote de ajuste de 15 bilhões. Na segunda-feira, o ministro da Fazenda, Cristóbal Montoro, prometeu medidas mais severas. O novo pacote envolverá um aperto de 40 bilhões. Na semana passada, o primeiro-ministro, Mariano Rajoy, já havia mencionado novo aumento de impostos - uma notícia assustadora para um país em recessão.
Em relação à França, o temor é de rebaixamento da dívida pública. Essa possibilidade foi anunciada recentemente pela agência de classificação Standard & Poor"s. O corte da nota poderá atingir outros 14 países da zona do euro e o mercado espera, neste momento, novidades sobre as próximas ações da agência. Enquanto não se divulgam novos detalhes, os mercados mantêm a cautela e impõem custos mais altos para a rolagem da dívida, embora a situação fiscal da França seja obviamente mais confortável que a da maior parte dos outros países da União Europeia.
Boas e más notícias continuarão motivando a oscilação nos mercados no dia a dia, enquanto se esperam mudanças mais significativas no quadro geral. A Comissão Europeia ainda terá muito trabalho para coordenar os ajustes indispensáveis aos países mais endividados e para implantar novos padrões de responsabilidade fiscal. Ao mesmo tempo, será preciso combinar as políticas de austeridade em alguns países com estímulos ao crescimento nas economias em melhores condições. Essas deverão funcionar como locomotivas do conjunto. Sem isso, a recuperação será muito mais lenta e mais penosa. Não há espaço para muito otimismo, disse na terça-feira um porta-voz da Comissão, Olivier Bailly. Segundo ele, a economia do bloco só deve crescer 0,5% este ano, pelas previsões atuais.
Nos Estados Unidos, a reativação pode ser comprometida pelo acirramento da campanha eleitoral. O governo terá muito trabalho para vencer a resistência republicana às medidas de estímulo à economia. O presidente Barack Obama terá a vantagem, no entanto, de não precisar negociar uma nova elevação do teto da dívida pública. Isso lhe dará algum espaço para conduzir sua política. Quanto mais rápida a recuperação da maior economia do mundo, melhor para todos.

Reforma da CPTM

Às vésperas de completar 20 anos, a Companhia Paulista de Trens Metropolitanos (CPTM) tem recordes a comemorar e grandes desafios a enfrentar. Herdeira de uma malha de 260 quilômetros de trilhos sucateada, transportava diariamente, em seu primeiro ano de funcionamento, 800 mil passageiros, recolhidos em poucas e decadentes estações e espremidos em velhas composições. Hoje, 3 milhões de moradores de 22 municípios da região metropolitana de São Paulo lotam seus trens, um movimento maior do que o de sistemas metroferroviários de cidades como Londres e Paris. Uma parte deles embarca em estações modernas e viaja em confortáveis vagões climatizados; outra é obrigada a disputar espaço em acanhadas plataformas e em velhas e barulhentas composições.
Para alcançar a meta de transformar a CPTM na operadora de trens mais moderna do Brasil, com a revitalização de toda a sua infraestrutura, será preciso mais do que novos investimentos em suas linhas, estações e trens. A construção do ferroanel metropolitano é fundamental para que a malha da companhia sirva apenas ao transporte de passageiros e, assim, consiga cumprir integralmente o seu papel na melhoria da mobilidade urbana na Grande São Paulo.
Para vencer o desafio de alcançar nas mais antigas o mesmo padrão de atendimento das novas linhas, a CPTM colocará em prática, entre 2012 e 2020, o maior plano de ampliação e modernização da sua história. Duas linhas serão construídas, com pelo menos seis paradas, e as seis linhas existentes no sistema ganharão mais dez estações. Conforme o Plano Plurianual do Governo do Estado, R$ 39,4 bilhões deverão ser investidos até 2015 para aumentar a integração entre as modalidades metroferroviárias, dar continuidade às obras já iniciadas, melhorar a eficiência do que hoje está em operação e expandir a rede. Daquele total, R$ 9,4 bilhões serão destinados à CPTM.
Nos últimos cinco anos, 105 trens foram comprados pela companhia, dos quais 62 já foram entregues. Até 2013, os outros 43 novos trens começarão a circular. Em licitação, está a aquisição de mais 55 composições. Cada uma delas, de oito carros, é equipada com sistema de monitoramento por câmeras e ar-condicionado. Novos sistemas de sinalização, controle de tráfego, telecomunicações, energia e rede aérea também receberam significativos investimentos nos últimos anos, para reduzir o intervalo entre os trens e, assim, aumentar a oferta, atingindo o almejado "padrão metrô".
Esse padrão de eficiência é necessário para uma companhia que, somente em 2011, recebeu 1 milhão a mais de passageiros por dia. A integração tarifária entre ônibus e o transporte metroferroviário é a principal causa desse boom, seguida pela queda no desemprego e o aumento do número de estações para baldeações. Até 2014, é esperado o aumento de pelo menos mais 500 mil passageiros por dia no sistema.
O esforço do governo estadual, no entanto, tem de ser complementado pela atuação da Agência Nacional de Transportes Terrestres, que precisa, de uma vez por todas, tirar do papel o ferroanel metropolitano. No início de dezembro, o diretor-geral da agência, Bernardo Figueiredo, assegurou que em janeiro o projeto do trecho norte do anel ferroviário estará pronto. Com a conclusão da obra, prevista para 2015, o transporte de carga deixará de usar a malha da CPTM, o que compromete a eficiência do transporte de passageiros. Essa é uma obra já prevista no PAC, de 2007, mas não mereceu até agora a devida atenção. O investimento estimado é de R$ 1,5 bilhão.
O anúncio é bem-vindo, mas surpreendeu alguns especialistas em transporte, que esperavam a construção do trecho sul em primeiro lugar, porque ele permitirá a circulação de cargas rumo ao Porto de Santos. O trecho norte deve melhorar a ligação do interior paulista com o Rio de Janeiro. O mais importante, porém, é que o projeto não seja fragmentado, o que faria a discussão sobre cada trecho atrasar ainda mais uma obra esperada há seis décadas.

Comércio exterior não terá o sucesso do ano passado

Em 2011 as exportações brasileiras apresentaram aumento de 26,8% e as importações, um crescimento de 24,5%. O saldo comercial aumentou 47,8%. Esse resultado ainda não reflete um ano de crise nos países ricos, mas é preciso levar em conta que os produtos básicos foram responsáveis por 60% do aumento das exportações, ante 18,0% dos semimanufaturados e 22,0% dos manufaturados.
Essa predominância de produtos básicos nas exportações levanta certa preocupação quando se constata que em dezembro, em relação ao mês anterior, num total de 18 produtos básicos exportados, 12 tiveram reduções de preços variando de 0,8% a 7,0%, sendo que, no caso do minério de ferro, que em 2011 gerou a maior receita de exportação, a queda de preços em dezembro foi de 6,6%. Isso afetou as receitas totais de exportação, cuja média diária, em dezembro, foi a menor desde abril.
As exportações para regiões que estão passando por uma recessão não parecem ter sido afetadas: para a União Europeia, o crescimento em 2011 foi de 22,7%, para os EUA foi de33,3%, enquanto nossas vendas para a China cresciam 43,9% - o que mostra que qualquer recuo no crescimento das exportações para este país nos afetaria sensivelmente.
As mudanças nas importações foram mais significativas. Pela média diária, as importações de bens de capital foram as que menos aumentaram (16,5%), com queda nos últimos meses do ano, um fato negativo para a indústria brasileira, que assim se moderniza menos. As importações de matérias-primas e de bens intermediários aumentaram 21,6%, e esses produtos são os mais importantes em nossa pauta de compras no exterior. O aumento nas importações de bens de consumo duráveis foi de 29,7%, com peso maior nas de automóveis, que aumentaram 39,2%, um sinal do processo de desindustrialização. No entanto, o aumento mais intrigante foi o de petróleo bruto, de 39,4%, que certamente reflete atraso na produção da Petrobrás, especialmente de produtos leves.
O Brasil ocupa posição razoável nas exportações, embora com crescimento inferior ao da Índia (45% de aumento nos dez primeiros meses), da Rússia e da Austrália. No ano que começa, só as commodities agrícolas continuarão a ter bom preço, e medidas de incentivo à exportação serão bem recebidas.
No entanto, a atividade econômica deve continuar fraca nos países desenvolvidos, com crédito difícil, acirramento da concorrência e a continuidade da guerra cambial.

ESPAÇO ABERTO
Agentes da impunidade nos três Poderes :: José Nêumanne

jornalista e escritor, é editorialista do "Jornal da Tarde"

Há algo em comum e, da mesma forma, uma grande diferença entre o militante petista Waldomiro Diniz e seu adversário político José Roberto Arruda, desalojado do governo do Distrito Federal e do partido pelo qual fora eleito, o DEM, além do fato de este ser um partido de oposição ao governo do PT.
Em fevereiro de 2004, a revista semanal Época revelou a existência de um vídeo no qual o citado Waldomiro, encarregado do relacionamento entre a chefia da Casa Civil do presidente Luiz Inácio da Silva, que havia celebrado um mês antes um ano em seu primeiro mandato, e o Congresso Nacional, achacava um empresário da jogatina, Carlos Augusto Ramos, vulgo Carlinhos Cachoeira, para financiar campanhas eleitorais de aliados do grupo no poder federal nas eleições estaduais de 2002. Seus beneficiários seriam Rosinha Matheus, que tinha passado pelo PSB e, à época do achaque, estava no PMDB; Benedita da Silva, do PT, ambas no Estado do Rio; e o petista Geraldo Magela, do Distrito Federal. O, digamos, "bingueiro" foi escolhido para a abordagem porque o militante ocupava, à época, a presidência da Loteria do Estado do Rio de Janeiro (Loterj) e lhe oferecia em troca da propina favorecimento em concorrências.
O achacado não se fez de rogado, gravou e filmou o encontro, tendo o vídeo chegado às mãos dos jornalistas da revista, que reproduziu seu conteúdo e ainda obteve do denunciado confissão cabal do delito cometido. Waldomiro Diniz foi demitido de seu posto e despejado do gabinete que ocupava no Palácio do Planalto a reduzida distância de seu chefe, o então todo-poderoso titular da Casa Civil José Dirceu, e do superior hierárquico dos dois, Luiz Inácio Lula da Silva. A reportagem está para completar o sexto ano de sua publicação e, embora afastado das prerrogativas e benesses do poder na República, o indigitado continua gozando plena liberdade, numa prova viva e circulante de que o Brasil oficial merece o apodo do título do livro do jornalista paraibano Sebastião Barbosa: "o país da impunidade". Por incrível que pareça, desde então a Polícia Federal (PF), partindo de uma gravação inequívoca e de uma confissão que não deixa dúvidas, não conseguiu produzir um inquérito que pudesse ser aceito como válido pelo Ministério Público Federal (MPF).
Numa dessas circunstâncias que podem até ser assustadoras, mas não são surpreendentes, essa é exatamente a justificativa que o Ministério Público dá para outra efeméride. Quatro anos depois do escândalo na Casa Civil de Lula, caso bastante similar explodiu no gabinete do então governador José Roberto Arruda. Sua Excelência foi filmada e teve sua voz gravada recebendo explicitamente pacotes de dinheiro de seu ex-secretário Durval Barbosa, que fez o vídeo por ele produzido com o flagrante chegar às mãos da mesma PF em troca de delação premiada. Ao contrário de Waldomiro, contudo, e aí está a primeira diferença entre os dois, Arruda não foi pilhado sozinho com a boca na botija. O deputado distrital Leonardo Prudente também o foi e guardou a propina na meia.
Tal como Waldomiro, Arruda perdeu seu valioso emprego público, obtido, no caso dele, por sufrágio universal, secreto e soberano da população do Distrito Federal. Mas, da mesma forma como o adversário e antecessor em recebimento flagrado de suborno, até agora não se viu obrigado a responder pelo delito perante a Justiça. Para tanto, ambos não precisaram de álibis nem padrinhos fortes no Judiciário. Assim como ocorreu no escândalo quatro anos mais velho, a investigação do "mensalão do DEM" foi prejudicada, segundo o MPF, pela falta de "vários documentos" no relatório encaminhado pela PF. De acordo com a Procuradoria, sem esses documentos seria "impossível o oferecimento da denúncia por causa da técnica própria da ação, que obriga o membro do Ministério Público Federal a apresentar as provas dos fatos que afirma". Essa conclusão impediu que o procurador-geral da República, Roberto Gurgel, cumprisse a promessa de que denunciaria o ex-governador e seus cúmplices "sem falta" no ano passado, feita logo após a sabatina a que foi submetido para ser reconduzido ao cargo, em agosto. Agora ele pediu mais tempo para evitar delongas no processo judicial e, assim, apresentar uma denúncia que chamou de "robusta". "Embora seja frustrante a demora, seria ainda mais frustrante a precipitação de oferecer uma denúncia que acabasse por não estar à altura da gravidade daquela situação", disse ele. Em 2006 a Procuradoria levou dez meses para denunciar o esquema do mensalão federal do PT, revelado em 2005.
Mas como a impunidade no Brasil tem muitos agentes nos três Poderes, convém anotar que de pouco serviu a presteza do procurador-geral há cinco anos, que é louvável, já que o esquema que o ex-chefe de Waldomiro, José Dirceu, é acusado de comandar tornou réus do Supremo Tribunal Federal (STF) 38 políticos, doleiros e empresários. Pois desde 2006 e em via de chegar ao sexto ano, só agora o relator do caso, ministro Joaquim Barbosa, entregou a seus pares seu parecer a respeito do episódio, às vésperas da eventual prescrição dos principais crimes de que são acusados os denunciados como chefes do esquema, o de formação de quadrilha. E o revisor do processo, Ricardo Lewandowski, avisou que vai levar um bom tempo para tomar conhecimento de um caso do qual qualquer cidadão brasileiro conhece praticamente tudo o que ocorreu, e isso, por si só, levanta dúvidas quanto à punição dos eventuais culpados.
Waldomiro, Arruda e os mensaleiros, bem como os ditos "aloprados", que produziram um dossiê falso contra o tucano José Serra na eleição paulista de 2006, têm-se beneficiado da impunidade que, pelo visto, depende da incúria da PF, que, assim, não seria tão "republicana" quanto se proclama, ou do MPF, que, então, não seria a palmatória do mundo que garante ser.


POLÍTICA
Dilma manda Casa Civil cuidar de verbas antienchente e ordena critérios técnicos

CHRISTIANE SAMARCO /BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo

Insatisfeita com a canalização de verbas federais quase que exclusivamente para Pernambuco, Estado de origem do ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra Coelho (PSB), a presidente Dilma Rousseff interveio e ordenou a adoção de critérios técnicos na distribuição de recursos da pasta para combate e prevenção de desastres naturais - enchentes e desmoronamentos.
A medida foi tomada após o Estado revelar que cerca de 90% das verbas antienchente da Integração foram aplicadas em Pernambuco, a despeito dos estragos provocados pelo verão chuvoso em outros Estados. Em reunião convocada às pressas ontem, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffman, que interrompeu a semana de férias no Paraná, a pedido da presidente, voltou ao Palácio do Planalto para tratar da questão com técnicos do ministério e da Defesa Civil.
Dilma conversou por telefone com Gleisi logo cedo, mostrando-se preocupada com as chuvas e com a ação do governo. Àquela altura a presidente já havia telefonado a Antonio Anastasia (PSDB), governador de Minas Gerais, onde há 52 municípios em situação de emergência.
Minas. Anastasia evitou críticas ao ministro Fernando Bezerra e disse que ele foi "extremamente amigo" de Minas, "trazendo convênios e obras importantes". "O governo federal está sensível. Tenho certeza que os ministérios vão nos ajudar. Foi o que a presidente me disse hoje.".
O telefonema da presidente ao governador tucano não foi o único sinal da disposição do Planalto de impor limites à prática já tradicional da distribuição paroquial das verbas antienchente, em que ministros privilegiam sua base eleitoral. No governo Lula, foi o ministro baiano Geddel Vieira Lima (PMDB) quem concentrou na Bahia a grande maioria dos e investimentos.
Como chefe da Casa Civil, Gleisi foi escalada para fazer a mediação técnica com o ministério neste ano de eleição municipal. A presidente preferiu deixar tudo nas mãos de sua ministra. Não se deu ao trabalho de procurar sequer Bezerra para questioná-lo sobre suas escolhas de investimentos. O ministro permanecia de férias, em Pernambuco, canceladas na noite de ontem.
Antes de embarcar para Brasília, Gleisi encarregou seu secretário executivo Beto Vasconcellos de organizar a reunião com técnicos da Integração, Defesa Civil e Ciência e Tecnologia. Em seguida, telefonou ao governador do Rio, Sérgio Cabral (PMDB), para saber como estava a situação no Estado que sempre figura no topo da lista dos mais atingidos pelas chuvas.
Rio. "A presidente Dilma está completamente comprometida com essa reconstrução. Não temos o que falar do governo federal, a não ser agradecer", afirmou Cabral, que desconversou ao ser questionado sobre o direcionamento político de verbas.
Até expoentes do PT pernambucano, partido aliado, avaliam que o ministro exagerou na politização do uso das verbas antienchente. Ontem, não faltou quem criticasse o "provincianismo e o clientelismo" de Bezerra, que dias antes surpreendera o prefeito petista do Recife, João da Costa, com a transferência de seu domicílio eleitoral de Petrolina para a capital pernambucana.
Ligado ao governador Eduardo Campos, Bezerra aplicou em seu Estado R$ 25,5 milhões do total de R$28,4 milhões pagos em obras autorizadas em 2011 para prevenção de desastres naturais. Deixou apenas R$ 2,9 milhões ao restante do País. / COLABORARAM LISANDRA PARAGUASSU, MARCELO PORTELA e FELIPE WERNECK

Chuvas e estragos demoram a abalar férias do ministro

Só ontem à noite, depois de as chuvas terem causado estragos por vários dias, especialmente em Minas e no Rio de Janeiro, o ministro da Integração Nacional, Fernando Bezerra, interrompeu suas férias em Pernambuco para retornar a Brasília. Seu plano inicial, até ontem à tarde, era ficar em Pernambuco até dia 9.
Ontem de manhã, a ministra da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, já havia interrompido as dela e discutia as chuvas no Planalto, com a assessoria de Bezerra. Este não era, até ontem, o único ausente no ministério. O secretário executivo, Alexandre Navarro Garcia, e o de defesa civil, continuavam fora. Quem respondia pela área era Ivan Ramos. / LISANDRA PARAGUASSU

Governador diz que ele e Dilma definiram verbas

MONICA BERNARDES , ESPECIAL PARA O ESTADO / RECIFE - O Estado de S.Paulo

O governador de Pernambuco, Eduardo Campos (PSB), saiu em defesa de seu afilhado e correligionário, o ministro Fernando Bezerra, e negou que ele tenha privilegiado o Estado no repasse de verbas para prevenção de desastres naturais. Segundo ele, do total de recursos liberados pela pasta em 2011, R$ 25 milhões foram definidos e acordados com a presidente Dilma Rousseff.
"Nunca houve nenhuma priorização para Pernambuco por parte do ministro. Em 2010, quando o Ministério da Integração era comandado pelos ministros ligados ao PMDB da Bahia, Pernambuco recebeu R$ 275 milhões da pasta. Isso representa 22,5% do total de repasses feitos pela União ao Estado. Em 2011, recebemos R$ 62,6 milhões. Recebemos menos com Fernando à frente da pasta", argumentou.
"Em março, na noite em que a enxurrada atingiu a Mata Sul, destruindo cidades inteiras, a presidente me ligou e perguntou como poderia ajudar. Tínhamos os projetos das barragens. Sabia que a União não teria como arcar com tudo, por isso fiz a proposta de bancarmos a metade e o governo federal a outra metade."
CNJ vai manter apuração em SP, mesmo com investigação interna

FELIPE RECONDO / BRASÍLIA - O Estado de S.Paulo

A decisão do novo presidente do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), Ivan Sartori, de apurar supostos pagamentos antecipados a um pequeno grupo de desembargadores da corte não deve interferir na investigação iniciada pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Todos os dados da folha de pagamentos do TJ já foram repassados para a Corregedoria Nacional de Justiça. A apuração interna prometida por Sartori correrá paralelamente à investigação comandada pela corregedora nacional de Justiça, ministra Eliana Calmon.
A investigação do CNJ, que desencadeou a crise no Judiciário, só estará prejudicada se o Supremo Tribunal Federal (STF) entender que houve violação do sigilo fiscal de magistrados durante a investigação feita por Eliana Calmon ou se limitar a atuação do conselho a revisar processos abertos pelas corregedorias dos tribunais locais.
Neste último caso, o STF poderia pronunciar que o CNJ não poderia ter aberto por conta própria essa investigação. Mas isso só será decidido quando o Supremo voltar do recesso, no início de fevereiro.
Parcela única. Conforme informações preliminares, 17 desembargadores receberam de uma só vez aproximadamente R$ 1 milhão referente ao pagamento atrasado de auxílio-moradia. Os demais desembargadores, ao contrário, recebem parceladamente o benefício.
O presidente da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), Ophir Cavalcante, viu com certa desconfiança o anúncio feito anteontem pelo presidente do TJ. Na sua avaliação, uma investigação como essa poderia servir apenas de satisfação para a opinião pública, sem que as irregularidades fossem de fato apuradas pelo tribunal paulista. "Vamos dar um voto de confiança, mas o histórico das corregedorias dos tribunais mostra que algumas investigações são para inglês ver", afirmou Ophir.
Representantes das entidades de classe da magistratura - autoras das ações que questionam os atos da Corregedoria Nacional de Justiça e alegam que quase 217 mil juízes e servidores do Judiciário e seus parentes teriam tido os sigilos de dados violados - não viram como novidade a decisão do presidente do TJ paulista de apurar possíveis irregularidades na folha de pagamento do tribunal. Ao contrário, o vice-presidente da Associação Nacional dos Magistrados da Justiça do Trabalho (Anamatra), Paulo Schmidt, afirmou que a apuração interna deve ser corriqueira. "Para nós, esse tipo de apuração não é nenhuma novidade, porque as contas da Justiça do Trabalho são todas abertas", disse.
Dever de ofício. O presidente da Associação dos Juízes Federais (Ajufe), Gabriel Wedy, afirmou que a decisão do desembargador Ivan Sartori simplesmente cumpre um dever que todo administrador público tem. "Todos os órgãos da administração pública, seja do Executivo, do Legislativo ou do Judiciário, devem fiscalizar constantemente seus próprios atos", avaliou Wedy. "Quanto maior transparência, melhor para o País", acrescentou.
No entendimento do presidente da Associação dos Magistrados Brasileiros (AMB), Nelson Calandra, a decisão do novo presidente do TJ não denota que as administrações anteriores foram coniventes com pagamentos irregulares. "O ex-presidente (José Roberto Bedran) deveria entender que não havia fato concreto para fazer uma investigação", ponderou Calandra. "Se o presidente (Ivan Sartori) tem alguma dúvida, nada obsta que ele busque se assenhorear desses dados", acrescentou.

Acervo de Prestes inclui lista de torturadores

WILSON TOSTA / RIO - O Estado de S.Paulo

Um documento clandestino de fevereiro de 1976 acusando 233 integrantes do regime militar de serem torturadores integra o acervo do líder comunista Luiz Carlos Prestes (1898-1990), doado ontem por sua família ao Arquivo Nacional, no Rio.
Entregue a Prestes, então exilado em Moscou, na segunda metade dos anos 70, por emissários do Partido Comunista Brasileiro (PCB), o "Relatório da IV Reunião Anual" do organismo revela algumas surpresas. Uma delas: denúncias de tortura foram repassadas por militares dissidentes, que continuavam nas Forças Armadas, mas discordavam da ditadura de 1964. As 32 páginas datilografadas são apenas parte da documentação que era mantida por Prestes, catalogada pela família em sete pastas e cujo conteúdo será digitalizado e colocado na internet, à disposição de pesquisadores.
"Eu já vinha acumulando este acervo havia alguns anos. Depois da morte do Prestes, doei a maioria dos documentos para a Unicamp. E tem também um museu em Tocantins, onde eu mesma levei a escultura e montamos um museu. Fiquei três meses lá, pesquisando as cidades onde a Coluna (Prestes, movimento revolucionário da segunda metade dos anos 20) passou e ainda recolhendo muitos materiais de 1924, manifestos, jornalzinho, panfletos de quando a Coluna passou. Isso está tudo lá no museu", relatou Maria do Carmo Ribeiro, viúva do líder comunista. A lista com os supostos torturadores foi divulgada na segunda metade dos anos 70, pela imprensa alternativa, de oposição.
De acordo com Luiz Carlos Prestes Filho, o material doado tem documentos relativos à intensa militância internacional do seu pai, que mesmo exilado viajou por países do antigo bloco comunista e da Europa ocidental, denunciando a ditadura e pregando a redemocratização do Brasil. Um deles, de 1979, já em exposição no Arquivo Nacional, dirigido ao "companheiro Fidel Castro Ruz", então chefe de Estado de Cuba, pouco antes da Anistia encaminhava proposta de agenda para conversas entre delegações do PCB e do Partido Comunista Cubano, em março daquele ano, em Havana.
"É um material muito forte nos anos 70, do exílio", disse Prestes Filho. "Depois, tem coisas da volta dele, da última época em que atuou politicamente, do rompimento com o PCB e da atuação ao lado de (Leonel) Brizola (1922-2004). E tem o lado não político, com cartas de todos os filhos e netos e de papai para eles." Um dos pontos importantes do material pessoal, contou Prestes Filho, são cartas trocadas pelo líder comunista com o filho do primeiro casamento de Maria Ribeiro, que Prestes considerava como se fosse seu filho biológico. Morador, nos anos 70, em Cuba, Pedro - morto em 2011 - era porta-voz do comunista brasileiro junto a Fidel. O acervo também tem fotos do líder, como em uma reunião de família, em que aparece empunhando um violão, em 1984, e outra, tomando sol na Praia do Futuro, no Ceará, em 1989.
A divulgação dessa última imagem na imprensa irritou a historiadora Anita Leocádia Prestes, filha do primeiro casamento do líder comunista, com Olga Benário, comunista alemã entregue pelo Brasil, nos anos 30, aos nazistas. Olga morreu em um campo de concentração. A pesquisadora afirmou que seu pai não concordaria com a exposição pública de sua foto na praia, o que teria sido um "desrespeito" à memória e à vontade do líder comunista, "pois todos que com ele conviveram sabem que Prestes jamais concordaria com tal divulgação", afirmou em e-mail ao jornal O Globo. Maria Ribeiro reagiu. "A Anita não é dona do Prestes. Ela é uma estudiosa, uma professora dedicada à história, já fez vários livros sobre a Coluna, com depoimentos do Prestes e tudo. Ela não é dona dele. Tenho uma família com nove filhos, vivi com ele 40 anos, ela não pode se apossar de uma pessoa com quem nunca conviveu."

ECONOMIA
Especialistas não arriscam dizer quando o mercado vai se estabilizar
Mas, para a maioria dos analistas ouvidos pela reportagem, há pouco espaço para maior valorização dos imóveis

ROBERTA SCRIVANO - O Estado de S.Paulo

Os preços dos imóveis continuarão altos. A velocidade do aumento dos valores, no entanto, deve ser cada vez mais lenta, até que haja uma acomodação. Ninguém se arrisca a prever quando essa estabilização ocorrerá. Mas especialistas explicam que, diante dos atuais patamares de preço, não há mais muita margem para novas valorizações.
O cenário traçado por especialistas conclui duas coisas. A primeira é que adquirir imóveis como investimento já não é mais tão vantajoso. A segunda tem a ver com quem quer comprar a casa própria. Os integrantes deste grupo, portanto, têm de colocar os atuais preços no planejamento financeiro, uma vez que esperar para ver se os valores caem pode não adiantar.
A menor velocidade no ritmo de alta, como já foi constatado pelo índice FipeZap no decorrer de 2011, deve continuar sobretudo pela retração na demanda.
José Augusto Viana, presidente do Conselho Regional de Corretores de Imóveis de São Paulo (Creci-SP), cita que no ano passado já houve um encolhimento no volume de negócios fechados, tanto em imóveis novos quanto nos usados. "Foram vendidos 26% menos usados e quase 40% menos imóveis novos", calcula.
Para ele, esse é um sinal claro de que o mercado precisa se adequar à renda do comprador, ou verá seus negócios minguarem. "Queda de preço é algo que eu não creio que ocorrerá. Mas o mercado precisa estabilizar os preços", completa o presidente do Creci-SP.
Os preços médios dos imóveis prontos no País subiram 26% no ano passado na comparação com os valores de 2010, segundo o índice FipeZap. A valorização é muito mais expressiva do que qualquer outra aplicação financeira no País.
O ouro, por exemplo, que foi a modalidade de investimento que mais rendeu no ano passado, teve alta de 15,85%. "As altas no mercado imobiliário têm sido muito expressivas. Diante disso, há uma lógica de que os aumentos tendem a diminuir", insiste Fábio Colombo, administrador de investimentos, que atua no mercado há mais de 20 anos. "E como as vendas estão caindo, há uma expectativa de que os preços caiam ou, pelo menos, se ajustem. Mas não dá para dizer se isso já começa em 2012", emenda Fábio Braga, diretor da Porto Seguro Consórcio.
Embora Fábio Colombo concorde que a alta nos preços não tem mais muita margem para continuar, ele pontua que as reduções que devem ser promovidas na taxa básica de juros (Selic) ao longo de 2012 deixarão os imóveis para locação mais atrativos como investimento, na comparação com as modalidades de aplicação da renda fixa (como a caderneta de poupança, CDBs, fundos DI e de renda fixa). "O imóvel é uma alternativa para investidores conservadores e moderados", detalha o especialista. Comprar um imóvel agora, esperar a valorização para depois vendê-lo, no entanto, não é recomendado por Colombo.
Descompasso. Samy Dana, PhD em finanças e professor da Fundação Getúlio Vargas de São Paulo (FGV-SP), no entanto, é enfático ao dizer que há uma valorização forçada nos imóveis, sobretudo em São Paulo e no Rio de Janeiro.
"E, para piorar, os aluguéis não acompanharam a alta no valor do imóvel", emenda o acadêmico. Dana afirma até, com base em cálculos, que há fortíssimo risco de bolha imobiliária no País justamente por esse descompasso na evolução do preço do ativo imóvel e do aluguel nos últimos anos no País.

G-7 e Brics têm de pagar US$ 7,6 trilhões este ano

Japão é o primeiro da lista com dívida de US$ 3 trilhões; Rússia é o último do ranking

SÍLVIO GUEDES CRESPO - O Estado de S.Paulo

As principais economias do mundo terão de enfrentar dívidas de US$ 7,6 trilhões neste ano, segundo um levantamento da agência de notícias Bloomberg. Esse é o valor total dos títulos públicos dos países do G-7 (sete economias mais poderosas do mundo) e do Brics (Brasil, Rússia. Índia, China e África do Sul) que vencem em 2012.
O Japão aparece em primeiro da lista, com uma dívida de US$ 3 trilhões a ser paga ou rolada neste ano. Os EUA estão em segundo lugar, com US$ 2,8 trilhões. Ambos estão bem à frente do terceiro lugar, a Itália, cuja dívida para 2012 é de US$ 428 bilhões. A Rússia é o último do ranking de 11 países, com apenas US$ 13 bilhões que vencem neste ano.
Nesse quesito, o Brasil está melhor do que a maior parte dos mercados desenvolvidos (só perde para o Reino Unido) e pior do que os demais emergentes do Brics . No total, o País tem dívidas de US$ 169 bilhões com vencimento em 2012 (veja o ranking completo no blog Radar Econômico - http://blogs.estadao.comn.br/radar-economico).
Dívida por trabalhador. O número referente ao Brasil equivale a 6,5% do Produto Interno Bruto (PIB) projetado para este ano pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Essa conta custaria, em média, US$ 1.690 para cada um dos 99,5 milhões de trabalhadores ativos. No entanto, isso não ocorre porque os países não pagam toda a dívida; eles rolam grande parte dela.
Custo. Apesar de apresentarem os números mais altos da lista, EUA e Japão têm mais facilidade que outros países para rolar a dívida. Os EUA porque estão endividados na própria moeda. O Japão tem reservas de US$ 1,2 trilhão em moeda estrangeira.Com isso, os dois oferecem aos investidores retorno de menos de 2% ao ano para contrair uma dívida por uma década. Já o caso da Itália é mais complicado. No mês passado, investidores começaram a cobrar retorno de 7% para comprar títulos italianos.

VIDA&
Criosfera 1 manda primeiros sinais ao País

Dados meteorológicos da Antártida foram transmitidos no primeiro dia do ano

Cientistas do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), em São José dos Campos, no interior paulista, começaram o ano com um presente especial, recebido via satélite, do interior da Antártida: os primeiros dados meteorológicos enviados pelo módulo de pesquisa Criosfera 1, instalado a 670 quilômetros do Polo Sul Geográfico.
"Terminamos de instalar os painéis solares e geradores eólicos, que produzem energia para o módulo, e assim foi possível estabelecer o link com o satélite e fazer o primeiro teste de transmissão", disse ao Estado, por telefone (também via satélite), o engenheiro do Inpe e coordenador técnico do projeto, Marcelo Sampaio. Ele é um dos dez integrantes da equipe que está instalando o Criosfera 1 no oeste da Antártida, a temperaturas que dois dias atrás chegaram a -20 °C, com sensação térmica de -40 °C.
As informações, que incluem dados básicos de meteorologia, como velocidade do vento e umidade do ar, foram transmitidas no dia 1.º, depois de os pesquisadores comemorarem um réveillon a plena luz do dia – já que nesta época do ano o Sol não se põe nunca na Antártida. "Aqui temos, basicamente, cinco meses de noite e cinco meses de dia, com dois meses de transição", explica Sampaio.
Mais instrumentos entrarão em operação nos próximos dias. Uma vez 100% operacional, o Criosfera 1 transmitirá dados meteorológicos da Antártida para o Brasil, automaticamente, a cada três horas, que é o tempo de órbita dos satélites.
Sete instituições brasileiras e duas chilenas participam do projeto, que tem importância estratégica global para o estudo das mudanças climáticas na Antártida. O Criosfera 1 será a primeira estação permanente de pesquisa meteorológica no interior oeste do continente, que passa por um processo acelerado de aquecimento – bem diferente do que ocorre na região leste.
"Uma parte do continente está resfriando e acumulando gelo, outra parte está aquecendo e perdendo gelo", diz Heitor Evangelista da Silva, da Universidade do Estado do Rio de Janeiro. O motivo dessa dicotomia climática, e as consequências dela para o futuro do gelo antártico, são mistérios que os cientistas esperam ajudar a solucionar com o Criosfera 1. O plano é que o módulo fique na localização atual, a 84 graus de latitude sul e quase 1,3 mil metros de altitude, por pelo menos dois anos. Depois disso, poderá ser deslocado para outras posições, conforme a necessidade das pesquisas.
Testemunhos de gelo.Como complemento aos dados meteorológicos que serão registrados pelo módulo, os cientistas trarão de volta da Antártida dois cilindros de gelo escavados do mesmo local: um com 40 metros e outro, com 120 metros de comprimento. Como não há dados do passado para comparar com o que está acontecendo no presente, esses chamados "testemunhos de gelo" serão usados como uma espécie de registro fóssil do que estava acontecendo na atmosfera antártica entre 200 e 400 anos atrás.
O glaciólogo Jefferson Simões, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, líder da expedição, estava escavando o segundo testemunho quando o Estado falou com a expedição por telefone, ontem à tarde. "O de 40 metros já está pronto e o de 120 metros está pela metade", disse Silva.
Outro ponto importante de pesquisa do projeto é a relação entre o buraco na camada de ozônio que se forma anualmente sobre a Antártida e as mudanças climáticas que estão em curso no continente. Até alguns anos atrás, acreditava-se que uma coisa não tinha nada a ver com a outra. Mas hoje sabe-se que o buraco influencia, sim, o clima da região. "O Criosfera 1 nos ajudará a entender melhor como funciona essa relação", afirma Silva.
Os cientistas devem voltar ao Brasil por volta do dia 25. Depois disso, o módulo será operado à distância.

INTERNACIONAL
Cirurgia de Cristina, hoje, deixa política do país em suspenso
Presidente argentina deve ficar 20 dias afastada após cirurgia para retirada de tumor na glândula tireoide

ARIEL PALACIOS, CORRESPONDENTE / BUENOS AIRES - O Estado de S.Paulo

A presidente argentina, Cristina Kirchner, será operada hoje de um tumor na tireoide no Hospital Austral, na cidade de Pilar, na zona noroeste da Grande Buenos Aires, onde dezenas de apoiadores fazem vigília. A operação - que consiste na remoção de um carcinoma papilar no lóbulo direito dessa glândula - deve durar de uma hora e meia a três horas.
Apesar da ausência de metástase, segundo explicaram os porta-vozes presidenciais, e das perspectivas otimistas dos médicos, segundo os quais o tumor tem de 90% a 95% chances de cura, há desconcerto entre os aliados do governo, pois as decisões políticas estão centralizadas na presidente.
Cristina não faz reuniões de gabinete. Prefere se reunir separadamente com cada um de seus ministros. Essa missão de coordenação unilateral caberá ao vice-presidente, Amado Boudou, que a partir de hoje será o presidente interino do país durante os 20 dias que Cristina terá de afastamento segundo previsão inicial dos médicos (alguns especialistas afirmam que a licença poderia passar dos 40 dias).
A doença da presidente levou a uma trégua com diversos setores que estavam confronto com Cristina. A oposição manteve silêncio nos últimos dias e sinais de apaziguamento também vieram da Confederação-Geral do Trabalho. A maior central sindical do país, tradicionalmente peronista, que nos últimos meses passou de aliada a crítica, deixou de lado as reclamações salariais que estava fazendo.


METRÓPOLE
PM ocupa a cracolândia por um mês
Três pessoas foram presas ontem em operação que pretende coibir o tráfico de drogas; uso de crack no centro, porém, não parou

ADRIANA FERRAZ, NATALY COSTA - O Estado de S.Paulo

A Polícia Militar ocupou ontem a região conhecida como cracolândia, no centro de São Paulo. Cem policiais e 30 guardas civis metropolitanos permanecerão 24 horas nas ruas dominadas por traficantes e usuários de crack pelo menos até o fim de janeiro. O objetivo, segundo a corporação, é sufocar o crime e permitir a ação de agentes comunitários que circulam diariamente pela região com mais segurança. Três pessoas foram presas.
Quem passar pelo local hoje, no entanto, vai ver que os "noias" continuam lá. A ação começou ontem às 9 horas nas proximidades da Rua Helvétia e, por volta do meio-dia, o entorno da Praça Júlio Prestes, um dos principais pontos de concentração de usuários, estava quase vazio. Mas a migração para outras ruas do centro foi imediata - até vias comerciais, como a Santa Ifigênia, foram tomadas por usuários de droga (leia mais ao lado). Pouco a pouco, voltaram às imediações da Estação Júlio Prestes.
Quando foram inicialmente surpreendidos pela polícia, alguns responderam com violência, atirando pedras e paus contra viaturas - chegaram a atingir alguns carros estacionados e colocaram medo nos pedestres que passavam pelo local, principalmente crianças.
Outros confrontos foram registrados quando funcionários da Prefeitura iniciaram a limpeza da região, recolhendo objetos deixados pelo caminho. Por volta do meio-dia, No fim da tarde, no entanto, os mesmos grupos de usuários que fugiram da polícia de manhã já consumiam crack na praça, na frente de policiais militares, que só observavam, sem interferir.
De acordo com a capitã da PM Leandra Pontes Dabagui, coordenadora operacional do 13.º Batalhão, responsável pelo policiamento na região, a operação não visa a expulsar os dependentes químicos da área, mas coibir o tráfico e a ação de criminosos. "A questão do usuário é um problema de saúde pública, não de polícia. Mas se algum usuário solicitar a ajuda de um policial militar será prontamente atendido", disse. A reportagem do Estado também flagrou a venda de drogas no local.
Tráfico. Segundo a Prefeitura, a operação pretende intensificar o trabalho de identificação de traficantes e criminosos infiltrados na região da Luz e evitar a chegada e a venda de drogas na área. "A ação da PM ocorre no momento em que a Prefeitura coloca em prática o novo sistema de coleta de entulho, limpeza de bueiros e varrição, o que reforça os serviços de zeladoria na cidade", afirmou, em nota oficial. Ontem mesmo, caminhões-pipa lavaram as ruas da cracolândia.
Balanço divulgado no início da noite registrava a apreensão de um radiocomunicador, duas metralhadoras de brinquedo, dez carcaças de moto e cachimbos improvisados para o consumo de crack. Prédios e becos usados como esconderijo de drogas serão revistados durante a ação.

Presença da PM pode acabar com cracolândia?

SIM. Esse tipo de operação, desde que não seja contra o usuário de drogas, mas contra o traficante, pode ajudar. A presença constante da Polícia Militar deve coibir o tráfico, além de facilitar a ação de todo mundo que trabalha com essa população. São cerca de 2 mil dependentes que circulam pela cracolândia todo dia. Eles não podem ficar esquecidos. Essa venda de drogas tem de ser combatida no local, com ações de revista inclusive em prédios abandonados que servem de esconderijo. Mas, além das operações policiais, há necessidade de se ampliar a atuação médica, assistencial e do Judiciário para viabilizar o tratamento desses usuários. E não são só internações compulsórias. Algumas são necessárias, mas a maioria pode ser trabalhada de outra forma. Agora, um alerta: qualquer que seja a operação, não pode ter um caráter higienista disfarçado. Não precisamos limpar as ruas, mas tratar as pessoas. Por isso, ficaremos de olho.
* Antônio Carlos Malheiros, desembargador e coordenador da Infância e Juventude do Tribunal de São Paulo
NÃO. Acho que é só perfumaria. Já vi inúmeras ações como essa. Quando José Serra (PSDB) assumiu a Prefeitura, por exemplo, ocorreu uma ação semelhante na região. E, no final, o resultado foi só ampliar o espaço de uso dos viciados, já que eles migraram para as ruas onde a PM não estava. É claro que se deve fazer alguma coisa, que não se pode deixar a cracolândia como está. Mas é muito difícil que esse tipo de operação dê resultado a médio ou longo prazo. O efeito é só imediato: funciona na hora, mas depois os usuários voltam ao mesmo local onde estavam antes. O que é preciso é convencer essa população de que precisam se tratar. Mas essa parte é a mais difícil de fazer. O "noia" não quer sair de lá. E, mais ainda, é preciso combater o narcotráfico, que abastece os pequenos traficantes da cracolândia. Isso sem falar na prevenção. Para mim, essa ação só visa a melhorar a questão urbana, ou seja, esconder pessoas e limpar ruas.
* Guaracy Mingardi, doutor em Ciência Política pela USP e pesquisador em Direito da Fundação Getúlio Vargas

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