COISAS DA POLÍTICA
Mauro Santayana
A energia nuclear e Angra dos Reis
Divido hoje o meu espaço com o professor Ubirajara Brito, doutor em física nuclear pela Sorbonne, ex-membro da Comissão de Energia Nuclear da França e do Centro Nacional de Pesquisas do mesmo país. Tivemos, na tarde de ontem, demorada conversa sobre a situação dos reatores de Fukushima e o uso da energia termonuclear no Brasil. Brito é peremptório: o melhor, em nosso caso, é renunciar ao processo de produzir energia termoelétrica a partir da fissão nuclear. Bom seria que o mundo inteiro a isso renunciasse, e que todos os esforços da ciência e os recursos dos estados se aplicassem no emprego de outras fontes de energia.
A energia solar é ilimitada, e já existem os meios tecnológicos de domá-la, embora ainda a custo alto. Há também o enorme potencial da biomassa e dos gases.
Segundo Brito, o Japão perdeu uma excelente oportunidade, quando do terremoto de julho de 2007, de se livrar da energia nuclear. Com isso se descobriu que a empresa privada Tokyo Electric Power (Tepco), operadora das usinas japonesas, havia erigido a sua maior central termoelétrica, a de Kashiwasaki, sobre o topo de uma falha geológica. O tremor abalou seus alicerces, e um movimento de opinião pública levou a justiça a determinar seu fechamento. Ainda ontem, pela manhã, o site da Tepco trazia uma mensagem de seu presidente, Masataka Shimizu, editada antes do último terremoto, em que lamenta a decisão que a empresa foi obrigada a tomar, com o encerramento da que era a maior usina termonuclear do Japão. O presidente da empresa se queixa da queda dos lucros, e afirma sua confiança de que a Tepco continuará operando com segurança as suas usinas, e crescendo na ampliação da oferta de energia. Ao mesmo tempo, anuncia que pretende criar outras empresas no resto do mundo.
O Japão deveria, é a opinião do físico, ter aproveitado aquela oportunidade, a fim de buscar, com todos os seus recursos econômicos e vontade política do Estado, outras fontes de energia. Ao não fazê-lo, colocou seu povo na linha de grandes riscos. Seu território se encontra em um dos pontos mais perigosos da crosta terrestre, na junção de placas tectônicas que tendem a mover-se sempre e, provavelmente, com resultados cada vez mais graves.
Brito comentou a sugestão de Pingueli Rosa, de transferir as usinas de Angra para um ponto mais distante do litoral, a fim de prevenir acidentes nucleares que possam atingir a população. Segundo Brito, se as usinas fossem edificadas em vales estreitos, entre montanhas seguras – ou seja, sem a possibilidade de deslizamentos – os riscos seriam menores. Mesmo assim, a sua opinião é radical: o melhor é livrar-se da fissão nuclear.
Brito considera que as informações, até agora, são contraditórias, mas revelam uma falta de previsão, por parte da empresa operadora das usinas, para o caso de acidentes. Não houve cuidado em manter em situação segura geradores independentes de energia para, na falta de eletricidade, refrigerar os reatores. De qualquer forma, de acordo com as informações da imprensa internacional, as autoridades japonesas haviam deixado a responsabilidade pela segurança das usinas, do meio ambiente e da população vizinha à própria empresa operadora, o que foi leviana e equivocada decisão.
É preciso, diz Brito, distinguir um reator funcionando normalmente de um reator com acidente. No seu funcionamento normal, no coração do reator verifica-se, de forma contínua, a fissão nuclear. O invólucro do coração do reator é resfriado por água, esta é aquecida, produz vapor, que vai mover as turbinas. Esta água sofre efeito da radiação emitida pela fissão do combustível; esta radiação, porém, não transforma a água nem o vapor em substâncias radioativas. São essencialmente raios gama, com energia até 2 milhões de eletros-volt (MEV), que atingem a água e o vapor, alcançam a blindagem do reator e não alcançam o exterior, porque são absorvidos pela blindagem, equivalente a um metro de chumbo ou aproximadamente três metros de concreto.
Durante a fissão, porém, são produzidos praticamente todos os elementos existentes na natureza, com maior probabilidade para aqueles de massa próxima ao ferro, igual a 56, e outros próximos ao chumbo, de cerca de 200. Os elementos mais nocivos são o fósforo, que se fixa nos ossos; o enxofre, que atinge os testículos e os ovários; o cálcio, que chega aos ossos, assim como o estrôncio; o iodo, que prejudica a tireoide; o polônio, que se fixa nos rins; e o rádio, que também atinge o esqueleto. Entre os produtos de fissão, o criptônio é dos mais perigosos porque, sendo um gás, difunde-se com facilidade.
Esses elementos, pondera Brito, só escapam para o exterior, quando a blindagem do reator sofre avarias com fissuras. A terceira possibilidade de acidente no reator é a de o calor subir muito, aumentando a pressão, devido à falha no resfriamento, e as varetas de urânio se fundirem. A temperatura subirá ao ponto de a blindagem não suportar a pressão. Rompe-se, então, a blindagem, e os produtos da fissão se espalham no exterior.
Na primeira hipótese, havendo vazamento apenas de vapor, é preciso proteger-se contra os raios gama que passam pelas fissuras da blindagem. Neste caso a evacuação deve ser feita para além de 10 km, que é a distância a ser alcançada pela radiação, tendo em vista a densidade do ar, que é aproximadamente de 1 milésimo da densidade da água. Se houver saída dos produtos de fissão, isto é, elementos radioativos, a distância para evacuação é determinada em função das condições atmosféricas. Nunca deve ser menor de 100 quilômetros, e as pessoas devem ficar abrigadas, pois os ventos e a chuva poderão conduzir facilmente os radionuclídeos.
– Não sei – disse Brito – se, no caso em que a Tepco fosse empresa pública, a situação seria diferente. A crise econômica dispor que tem passado o Japão leva o público a se confundir com o privado, irresponsavelmente, em busca do crescimento econômico. A preocupação com o PIB e o medo da sua vizinha China estão levando os japoneses a esquecer Hiroshima e Nagasáki. Mas estou convencido de que o povo brasileiro pode ser bem feliz sem energia nuclear. Temos outras fontes, abundantes, sem esses riscos. Brito conclui que a dose limite de radiação que o corpo humano suporta durante uma semana é da ordem de 300 micro Curies (C). Um C equivale a 3,7 x 1010 desintegrações por segundo. Para que se tenha uma ideia, 10 milicuries (mlC) de Estrôncio 90, ou 30 milicuries de Césio 137, são fatais para o ser humano.
A conclusão, clara, é a de que, mesmo com o preço de se deter o desenvolvimento econômico, dentro do modelo tecnológico que o mundo adotou há 160 anos, baseado na energia e na velocidade, é preciso pensar em nova ordem política, que não a do neoliberalismo, que, ao colocar o lucro como seu único fim, determina a construção de usinas termonucleares sobre falhas geológicas, entre elas as da ilha de Honshu – a maior do arquipélago japonês.
Novo Iraque
Fechávamos esta matéria quando foi decidida, pelo Conselho de Segurança, ação militar contra a Líbia, com a zona de exclusão aérea e “todas as medidas necessárias para a proteção dos civis”. É um eufemismo para definir o início da invasão militar do país, e uma nova aventura dos norte-americanos e seus aliados. Correrá mais sangue, como ocorreu no Iraque e no Afeganistão, e como no Afeganistão e no Iraque a imensa maioria dos mortos será de civis inocentes e pobres. Ainda bem que o Brasil se absteve de apoiar essa medida insana.
EDITORIAL
Enfim, os julgamentos num tribunal completo
A chegada do 11º ministro para completar o quadro de magistrados do Supremo Tribunal Federal (STF) se efetivou na quarta-feira, quando Luiz Fux, nome escolhido pela presidente Dilma Rousseff para ocupar a vaga, proferiu seu primeiro voto, por sinal, vitorioso. Espera-se agora que o Supremo possa, enfim, voltar às suas atividades normais, já que a longa ausência de um ministro fez questões importantes, como a validade da Lei da Ficha Limpa, ficarem até hoje sem solução definitiva.
Julgar nunca foi tarefa das mais fáceis. Além do mais, julgamentos tendem a ser quase sempre subjetivos: prova disso é a necessidade de um colegiado, no caso do STF, para decidir as questões. Portanto, não é o caso de se avaliar a decisão da presidente em relação à escolha de Fux mas, sim, de comemorar o fato de que, a partir de agora, temos um colegiado completo, do qual se espera equilíbrio e frieza suficientes para analisar as importantes questões que já estão aí, além das que virão.
Temas polêmicos como o aborto de anencéfalos, a própria validade da Ficha Limpa, o mensalão, a questão das cotas raciais e a da união estável entre homossexuais aguardam pela decisão dos, agora, 11 ministros.
Que a tão esperada nomeação do juiz que faltava marque também o início de uma era de conquistas do Judiciário brasileiro – Poder tão necessário e, infelizmente, ainda não muito bem visto por parte da população. Boa sorte aos 11.
DIPLOMACIA
Brasil quer relação de igual para igual com Estados Unidos, diz Patriota
Brasília - O ministro das Relações Exteriores, Antonio Patriota, afirmou hoje (17) que a visita ao Brasil do presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, no próximo fim de semana deve representar, sobretudo, o estabelecimento de um novo patamar nas relações entre os dois países. Ele disse que o Brasil quer uma relação de igual para igual, sem confrontação.
“O Brasil quer uma relação de igual para igual. As circunstâncias no mundo de hoje favorecem isso”, afirmou o chanceler. “O Brasil se consolidou como democracia”, acrescentou, lembrando que as fontes renováveis no Brasil são 45% da matriz e que os brasileiros estão envolvidos em vários temas de interesse global.
Patriota disse que o governo do Brasil participa de várias frentes de articulação na América Latina, na África, no Oriente Médio e nos países desenvolvidos. “Estamos em articulação com os nossos vizinhos e com o mundo em desenvolvimento, que oferecem frentes múltiplas de cooperação. Queremos multipolaridade da cooperação, não da rivalidade, do protagonismo e da confrontação”, afirmou.
"Queremos multipolaridade da cooperação, não da rivalidade, do protagonismo e da confrontação”, disse Patriota
Segundo o chanceler, a expectativa é que Obama sinalize favoravelmente à reforma do Conselho de Segurança das Nações Unidas e ao ingresso do Brasil como membro permanente. Ele reconheceu, no entanto, que apenas a sinalização não resolverá o impasse que há no órgão em decorrência da divergência interna – dos favoráveis e dos contrários à reestruturação do conselho.
“Uma manifestação dos Estados Unidos não vai afetar dramaticamente os acontecimentos, pois envolve entendimentos nas Nações Unidas, a aprovação da maioria de dois terços [dos 15 integrantes do conselho, ou seja, o apoio de dez países] e a ratificação dos cinco membros permanentes. [Mas] um discurso dos Estados Unidos é um dado significativo”, disse Patriota.
O ministro ressaltou que Obama, em 2009, já havia indicado que tinha interesse em conhecer o Brasil. Segundo ele, esta é a nona visita de um presidente norte-americano ao Brasil e ocorre na melhor fase vivida no país.
“Dos nove presidentes americanos que visitaram o Brasil, esta será a ocasião em que um presidente norte-americano encontrará o país em melhores condições econômicas, políticas e com um perfil internacional elevado, uma diplomacia muito ativa, um alcance verdadeiramente global da diplomacia”, afirmou.
DESASTRE NO JAPÃO
Alimentação elétrica da central de Fukushima não foi restabelecida
Agência AFP
TÓQUIO - Os trabalhos prosseguirão nesta sexta-feira para tentar restabelecer de forma parcial a alimentação de energia elétrica da central nuclear de Fukushima-1, com o objetivo de retomar o funcionamento das estações de bombeamento de água, segundo a agência de notícias Kyodo.
As equipes técnicas da empresa que administra a central, Tokyo Electric Power (Tepco), trabalharam boa parte desta quinta-feira para reativar as estações de bombeamento que abastecem com água o sistema de resfriamento dos reatores e enchem as piscinas de armazenamento de combustível usado. A Tepco não conseguiu concluir a operação nesta quinta-feira, como era esperado inicialmente.
O terremoto de 8,9 graus de magnitude e o tsunami de 11 de março afetaram os motores que permitem o funcionamento das estações de bombeamento. Sem o sistema de resfriamento, os funcionários da central utilizaram diversos meios para encher as piscinas de resfriamento das barras de combustível usadas.
Mais cedo, a Tokyo Eletric Power (Tepco) informou que o lançamento de água do mar nos reatores superaquecidos, a partir de helicópteros militares, também não apresentou os resultados pretendidos pelos técnicos. Segundo a Tepco, os níveis de radiação não diminuíram em Fukushima.
O nível de radiação ao redor da central, onde estão alguns trabalhadores, é de 3 mil microsievert por hora, frente aos 1 mil microsievert por ano que se consideram seguros para a saúde humana.
Os helicópteros lançaram água de uma altura de 90 metros, quando o nível de radiação se situava em 4,13 milisievert por hora, segundo o ministro de Defesa japonês, Toshimi Kitazawa.
A crise nuclear no Japão teve origem no corte de energia após o tsunami de sexta-feira passada, que paralisou, inclusive, os geradores de emergência da usina de Fukushima 1, derrubando o sistema de refrigeração dos reatores atômicos.
A queda no sistema de resfriamento provocou a evaporação da água e o risco de exposição do material radioativo nos reatores, onde já ocorreram quatro explosões de hidrogênio e dois incêndios, em meio a crescentes níveis de radiação. A Tepco está reparando as linhas de energia da Tohoku Electric Power Co. que abastecem a região, para ligá-las ao sistema de transmissão elétrica em Fukushima.
"Com o trabalho completo, teremos a capacidade de ativar várias bombas elétricas e jogar água nos reatores e nas piscinas de combustível nuclear usado", destacou o porta-voz.
FONTE: JORNAL DO BRASIL
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