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quinta-feira, 16 de fevereiro de 2012

16 de fevereiro de 2012 - VALOR ECONÔMICO



PRIMEIRA PÁGINA

Formalização e renda maior aumentam carga tributária
A carga tributária subiu de 32,72% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010 para 33,99% do PIB em 2011, puxada principalmente pela alta expressiva dos impostos ligados à renda, responsável por metade do avanço, segundo estimativas do economista Bernard Appy, ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda e diretor da LCA Consultores. Tributos relacionados à folha de salários e a bens e serviços também contribuíram para a elevação

Para o Brasil, Rio+20 não é só ambiental
A Rio+20 é uma conferência sobre desenvolvimento com pilares econômico, social e ambiental. "Não é uma conferência ambiental, é sobre desenvolvimento sustentável. Quem está tirando o foco da Rio+20 são eles [os europeus], colocando apenas o pilar ambiental na mesa". As afirmações são do embaixador André Corrêa do Lago, negociador-chefe do Brasil na Rio+20, que acontece em junho. Para ele, está claro o embate entre países ricos e emergentes sobre os limites do crescimento. "O que não se pode aceitar é que os países desenvolvidos considerem que nós temos que repensar o que é padrão de consumo de classe média, e eles não"

TJ-SP autoriza precatório como garantia
As empresas que discutem na Justiça débitos com o Fisco obtiveram um precedente importante no Tribunal de Justiça de São Paulo. A Corte autorizou uma empresa a oferecer como garantia, em uma ação de cobrança do Estado, um precatório no valor de R$ 600 mil. Para se defender nas chamadas ações de execução fiscal - movidas para a cobrança de tributos -, os contribuintes são obrigados a oferecer bens ou a fazer depósitos judiciais. Nesse caso, o Tribunal paulista, em decisão inédita, permitiu que um precatório substituísse os bens normalmente apresentados pelas companhias. Além disso, permitiu que a empresa use o título para pagar o débito, caso seja vencida no processo

EDITORIAL
Nova lei antitruste pode corrigir velhos problemas

Depois de sete anos de tramitação no Congresso, foi sancionada em novembro a nova legislação antitruste do Brasil, a Lei nº 12.529, que vai entrar em vigor a partir de maio. Idealizada para modernizar o Sistema Brasileiro de Defesa da Concorrência e equipará-lo às práticas internacionais, a nova lei quase foi por água abaixo porque não definiu um dos pontos mais importantes que pretendia corrigir: dar um limite de prazo para o julgamento das fusões e aquisições de empresas brasileiras. Essa omissão acaba de ser reparada. As operações que não forem julgadas em até 330 dias serão automaticamente aprovadas.
A lei reforçou os poderes do Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), agora apelidado de Supercade, concentrando funções antes compartilhadas com a Secretaria de Direito Econômico (SDE), do Ministério da Justiça, e com a Secretaria de Acompanhamento Econômico (Seae), do Ministério da Fazenda. O Cade é agora o único órgão responsável por analisar e julgar as fusões e aquisições, além de ser responsável pela prevenção e repressão às infrações contra a ordem econômica.
A principal mudança, porém, foi no sistema e nos prazos de avaliação das fusões e aquisições. O Brasil era um dos poucos países onde essas operações só eram analisadas após terem sido concluídas. Caso fosse constatada concentração de poder econômico, as operações teriam que ser desmontadas parcial ou totalmente, linhas de produção vendidas ou descontinuadas e empregados demitidos.
Daí derivava outro problema que muito contribui para o clima de insegurança das empresas: companhias insatisfeitas por terem as operações reprovadas anos depois que o negócio havia sido selado entravam na Justiça questionando a decisão do Cade. A Nestlé, por exemplo, discute há oito anos na Justiça o veto do Cade à compra da Garoto.
Agora, finalmente, o país se alinhou às práticas internacionais e as operações de fusões e aquisições terão que ser submetidas ao Cade antes de serem concretizadas e há um prazo máximo para o julgamento. O Cade terá 240 dias para analisá-las, prorrogáveis por mais 90 dias, totalizando 330 dias, ou 11 meses, prazo igual ao praticado nos Estados Unidos.
Os novos prazos representam um grande avanço, tendo em vista o histórico de atuação do Cade. A análise da compra da Sadia pela Perdigão levou aproximadamente o dobro desse tempo e foi considerada rápida para o padrão atual. A operação foi feita em 2009 e o Cade se pronunciou apenas em julho de 2011, determinando a suspensão de algumas marcas e de parte da capacidade de produção.
Ao sancionar a nova lei, a presidente Dilma vetou o artigo que determinava que a fusão ou aquisição estaria automaticamente aprovada, caso os prazos de avaliação não fossem cumpridos, porque sua redação era confusa. O artigo dava margem ao entendimento que mesmo procedimentos burocráticos como as 48 horas para o sorteio do relator seriam motivo para aprovação automática se não fossem cumpridos. A inexistência de um prazo final para a conclusão da avaliação era um grave problema, uma vez que a nova legislação também passou a estabelecer que uma fusão ou aquisição só pode ser concretizada depois de aprovada pelo Supercade.
A questão foi solucionada por despacho do procurador-geral do Cade, Gilvandro Araújo, estabelecendo que as fusões e aquisições não julgadas em 330 dias serão aprovadas automaticamente pelo Cade.
Restam ainda alguns detalhes a definir na nova lei. Um deles é quando deve ser notificada a fusão ou aquisição. Pela regra anterior, a data que conta é a do primeiro documento "vinculativo" entre as empresas. Mas não se define o que pode ser esse documento. Isso é importante porque, antes da aprovação, não poderá haver integração de operações, criação de sinergia ou atuação coordenada.
Como o prazo de avaliação ainda é longo, há o receio de que as condições de mercado possam mudar - premissas econômicas, financeiras e mercadológicas - a ponto de alterar as condições do negócio.
Outra preocupação é se o Cade terá estrutura para dar conta do aumento das tarefas. A equipe do Departamento de Proteção e Defesa Econômica (DPDE), atualmente ligada à SDE, será incorporada ao Cade e 200 novas vagas serão criadas. Esses são problemas de fácil solução. O importante é que um sério fator de insegurança jurídica promete sair da frente das empresas.

OPINIÃO
O público e seus problemas

Raghuram Rajan

Em recente visita à Europa, pude ver como economistas, jornalistas e empresários estão profundamente frustrados com seus políticos. Perguntam-se por que os políticos não conseguem ver o abismo à sua frente e não se unem para resolver de uma vez por todas a crise do euro?
Mesmo se não houver consenso sobre qual deveria ser a solução, será que eles não poderiam ao menos se encontrar e elaborar ponderadamente um plano que vá além das meias medidas que vêm sendo adotadas reiteradamente? Foi apenas graças à decisão arrojada do Banco Central Europeu (BCE) de emprestar aos bancos locais a longo prazo que pudemos ter algum alívio recentemente; ou é assim, pelo menos, que argumentam. Os políticos, em contraste, vêm decepcionando a Europa ao estar sempre atrasados em relação aos fatos. Por que eles têm tanta dificuldade em liderar o caminho?
Uma resposta que pode ser facilmente descartada é que os políticos simplesmente não entendem a gravidade da situação. Líderes políticos não precisam ser gênios da economia para compreender os conselhos que recebem e vários deles são tanto inteligentes como bem informados.
Uma segunda resposta - a de que políticos se preocupam com horizontes de curto prazo, em função dos ciclos eleitorais - pode guardar um pouco de verdade, mas é inadequada, porque muitas vezes as consequências adversas de medidas tímidas tornam-se visíveis bem antes que se candidatem para reeleger-se.
A melhor resposta que ouvi veio de Axel Weber, astuto observador político e ex-presidente do Bundesbank, o banco central alemão. Na visão de Weber, os políticos simplesmente não têm mandato público para antecipar-se aos problemas, especialmente problemas de caráter inédito e aparentemente pequenos de início, mas que quando não resolvidos resultam em custos potencialmente grandes.
Se o problema nunca foi visto antes, o público não está convencido dos custos potenciais da inação. E, se as medidas evitam as consequências do problema, o público nunca sofre a experiência da calamidade evitada; e os eleitores penalizam os líderes políticos pelos custos imediatos inerentes a essas ações. Mesmo quando os políticos têm plena noção do desastre que se aproxima caso nada seja feito, eles podem ver-se com pouca capacidade para persuadir eleitores sobre a necessidade de pagar os custos de curto prazo.
Falar é fácil e, na ausência de evidências em contrário, o "status quo" normalmente parece sentir-se suficientemente confortável. A capacidade de adoção de medidas corretivas pelos líderes, então, aumenta apenas com o passar do tempo, à medida que se sentem os custos da inação.
Hoje, uma calamidade ainda pode ser evitada, se houver uma escalada constante dos custos da inação. Os piores problemas, no entanto, são aqueles cujos "custos da inação" permanecem invisíveis por um longo período, mas que crescem de forma repentina e explosiva. No caso, quando o líder sente ter o mandato do público para agir, pode se tarde demais.
Exemplo clássico foram os alertas de Winston Churchill contra as ambições de Adolf Hitler. Os planos de Hitler estavam traçados em "Minha Luta - Mein Kampf" para que todos pudessem ler - e ele não os ocultava em seus discursos. Poucos na Grã-Bretanha, no entanto, lhes davam crédito e muitos pensavam que o comunismo era ameaça maior, especialmente nos anos sombrios da Grande Depressão.
O desmembramento da antiga Tchecoslováquia pelos nazistas em 1938 deixou claríssimo como havia sinceridade nas ambições de Hitler. Foi apenas depois da invasão da Polônia, no ano seguinte, no entanto, que Churchill foi indicado como Primeiro Lorde do Almirantado, cargo na época equivalente ao ministro da Marinha britânica. E ele se tornou primeiro-ministro apenas após a invasão da França em 1940, quando só a Grã-Bretanha restava de pé.
A Grã-Bretanha poderia muito bem ter se saído melhor se Churchill tivesse chegado ao poder antes, mas isso teria significado um dispendioso rearmamento, algo inaceitável enquanto houvesse a chance de que Hitler não passasse de um tigre de papel. E, é claro, teria significado confiar o destino da Grã-Bretanha a um político que, embora atualmente considerado um líder inquebrantável, na época era visto amplamente com desconfiança.
Os custos não lineares da inação são bem óbvios no setor financeiro. Ao mesmo tempo, os problemas do setor financeiro podem ser particularmente difíceis de resolver: se os políticos aventam a necessidade de medidas de forma muito enfática, para assim conseguir mandato para agir, podem acabar precipitando o próprio desmoronamento que buscam conter.
Entre a crise do Bear Stearns e a quebra do Lehman Brothers, o governo dos Estados Unidos pouco poderia ter feito para antecipar-se ao crescente problema (embora, é claro, as subscritoras de hipotecas Fannie Mae e Freddie Mac, com mandato governamental, tenham sido colocadas sob intervenção administrativa externa nesse meio-tempo). Foi necessário o pânico pós-Lehman Brothers para o Congresso autorizar a criação do programa governamental de recuperação de ativos problemáticos (Tarp, na sigla em inglês), oferecendo uma linha de socorro financeiro a bancos e à indústria automotiva, entre outros. E foram apenas as frenéticas medidas do Federal Reserve (Fed, banco central dos EUA) e do Tesouro americano (em conjunto com autoridades por todo o mundo) que evitaram um desastre sistêmico. O problema das hipotecas de baixa qualidade, que segundo as estimativas iniciais resultaria em perdas de algumas centenas de bilhões de dólares, acabou impondo custos muito maiores para todo o mundo.
Da mesma forma, os políticos da região do euro ganharam um mandato para adotar medidas mais ousadas apenas quando os mercados tornaram mais evidentes os custos da inação. Mesmo deixando de lado a tentativa compreensível da Alemanha de limitar quanto teria de pagar, é difícil ver como os políticos poderiam ter se antecipado ao problema.
Embora o BCE tenha comprado algum tempo para a região do euro, o efeito analgésico sobre os mercados pode ser uma faca de dois gumes. Será que os europeus vislumbraram o suficiente do abismo para tolerar medidas mais fortes de seus líderes? Talvez seja necessário que os mercados se deteriorem ainda mais.
Da mesma forma, com o rendimento dos bônus governamentais tão baixo como está agora nos EUA, o público tem pouca noção da urgência de seus problemas fiscais, embora alguns fatalistas venham esforçando-se ao máximo para despertá-lo. Espera-se que a aproximação da eleição presidencial dos EUA desencadeie um debate público mais esclarecido sobre a reforma tributária e dos programas de benefícios sociais. De outra forma, pode ser necessária uma rápida escalada dos rendimentos no mercado de bônus para que o público reconheça a existência de um problema; e para que os políticos tenham espaço de manobra para resolvê-lo.
Não culpem os líderes por parecerem indecisos e imediatistas; a culpa pode ser nossa, do público, por não dar ouvidos aos que mostram preocupação crônica. (Tradução de Sabino Ahumada)
Raghuram Rajan é professor de finanças na Booth School of Business, da University of Chicago, e autor de "Fault Lines: How Hidden Fractures Still Threaten the World Economy" (linhas de falhas: como fraturas ocultas ainda ameaçam a economia mundial, em inglês). Copyright: Project Syndicate, 2012.

COLUNAS
Cristian Klein

José Serra não será candidato. De si mesmo
De toda a barafunda e complexos cálculos políticos nos quais se enredou a disputa pela Prefeitura de São Paulo, um dos aspectos mais subestimados é como a dinâmica eleitoral desencandeou um processo no qual os nomes contam menos do que a formação de coligações. O que está em questão é a preservação e a expansão de grupos políticos.
Todas as atenções estão voltadas para a importante informação sobre se o ex-governador tucano José Serra, tal como uma "prima donna", entrará ou não no jogo. A participação de Serra, para o campo conservador, é vista como a redenção. O governador Geraldo Alckmin, seu adversário interno no PSDB paulista, já fez de tudo para rebaixá-lo. Agora, o procura de braços abertos e espera pelo seu sim.
Mas a presença de Serra pode ser menos determinante ou providencial do que se imagina. O arranjo se dá mais pela movimentação dos grandes blocos políticos do que pela vontade pessoal dos concorrentes.

Os nomes importam menos do que as alianças partidárias
Não faz muito tempo, o PT estava isolado, sem a adesão das legendas que lhe dão apoio no governo federal. Bastou que o PSD do prefeito Gilberto Kassab insinuasse uma coligação que o ex-ministro da Educação Fernando Haddad passasse à condição de favorito.
Não contam apenas os atores principais - as máquinas municipal (PSD), estadual (PSDB) e federal (PT). Um conjunto de siglas médias, como PSB, PDT, PTB, PCdoB e PR, ajudam a levar o pêndulo ora para um lado, ora para outro. Não é o ex-presidente Lula, com toda a sua popularidade, que muda o rumo dos ventos. É a estratégia, a política de alianças, de quem consegue agregar mais.
Os nomes importam menos do que as alianças partidárias. Os grupos sobrepõem-se aos indivíduos. Caso aceite participar, José Serra será talvez o exemplo mais cabal - ainda que às avessas - da velha máxima de que "ninguém é candidato de si mesmo". A expressão geralmente é utilizada por pretensos candidatos em busca de aval de seu grupo político para entrar numa disputa. Reflete a necessidade de uma rede de apoios, da qual o político, qualquer que seja, depende. O caso Serra reforça a lógica de maneira inversa. É impelido de todas as maneiras para que assuma uma candidatura que não deseja. Nada menos personalista. Ontem, 20 dos 22 deputados da bancada tucana na Assembleia Legislativa lançaram uma nota em que pediam o fim das prévias e o anúncio do ex-governador como candidato do partido.
Serra, como se sabe, gostaria de concorrer, pela terceira vez, à Presidência da República, em 2014. É uma meta cada vez mais distante. A bola da vez - e, de novo, são seus correligionários, entre eles o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, que mandam avisar - é o senador mineiro Aécio Neves. Resta-lhe contentar-se em ser uma espécie de salvador do PSDB em São Paulo, uma vez que o partido não tem candidatos de grande densidade eleitoral. Será um instrumento regional a serviço dos planos de Alckmin e de preservação nacional dos tucanos. Serra tornou-se uma peça pequena mas importante para a sustentação do PSDB e da oposição. Caso a capital caia nas mãos do PT, a reeleição de Alckmin está ameaçada. E se os petistas controlarem o maior Estado do país, além do governo federal, a partir de 2014, os tucanos e a oposição estarão de vez encurralados.
A candidatura Serra pode impedir que o prefeito Gilberto Kassab bandeie-se para o lado dos petistas. Kassab tem laços estreitos com Serra, de quem foi vice em 2004 e assumiu a prefeitura em 2006. É um impeditivo de ordem moral, mas não política. O comportamento do prefeito já mostrou sua inclinação a mudar de lado, num comportamento tão errático quanto maleável. Abandonou o DEM, fundou o PSD e foi o guia de um rebanho na travessia da oposição para o governismo federal e estadual.
Há uma lógica nacional da aproximação de Kassab com o PT. Aqueles que o acompanharam para o PSD o fizeram na intenção de fugir do estigma de oposicionistas. Desde 2002, ninguém encarna melhor o antipetismo do que José Serra. E, por isso, o ex-governador é muito inconveniente para Kassab.
Mas há uma lógica estadual, na qual os tucanos têm o controle do território, há quase 20 anos. O governismo em São Paulo chama-se PSDB. Que constrangimento Kassab teria em desagradar o PT, dada a reputação camaleônica que construiu, e se siglas da base federal, como PSB e PDT, já gravitam em torno da administração Geraldo Alckmin?
Entre uma lógica e outra, ambas governistas, Kassab tenta se equilibrar. O que mais importa para o prefeito é não perder a eleição, seja com quem for. É o sinal de vitória que precisa emitir para os que aderiram ao partido recém-formado, em sua primeira disputa eleitoral, e para manter a imagem de hábil articulador político.
O PSD já tem feito ou está aberto a alianças com o PT em várias capitais do país - em cerca de dois terços delas. Em São Paulo a aproximação carrega um simbolismo maior, pelo histórico de rivalidade entre as partes e a repercussão do acordo para o cenário nacional. Por intermédio de Lula, tão empenhado que está em eleger Haddad, Kassab tem a oportunidade única de quebrar as resistências do núcleo de militantes mais ideológicos do PT. Será que vai desperdiçar?
A expansão de seu grupo político no Estado depende de uma aliança com o PT ou com o PSDB. Serra também pode lhe ser útil, na medida em que o aproxima de Alckmin. Como seu desafeto, o governador criou sérios obstáculos para a criação do PSD em São Paulo, especialmente na conquista de prefeituras. Hoje, porém, passada a temporada de assédio de Kassab a prefeitos e outros quadros tucanos, Alckmin sabe que não pode continuar na mesma estratégia. Seu objetivo maior é a manutenção do espaço conquistado. Enquanto isso, PT e PSD têm a mesma meta: avançar sobre seus domínios. Facilitar essa união não é nada inteligente. Nem que para isso o governador reabilite José Serra.

Jorge Simino

2012: a revanche dos mercados dos países emergentes?
Em 2011, a tônica dos mercados de ações, principalmente na visão dos investidores estrangeiros, era um forte otimismo com as economias desenvolvidas - em especial com a americana - e uma preocupação que beirava a obsessão com o perigo inflacionário nos mercados emergentes. Conclusão: venda maciça de ações de todos os emergentes e compra de papéis nos mercados desenvolvidos.
Com o passar dos meses, tivemos o problema com a usina nuclear no Japão, o aprofundamento da crise na Europa e perda de otimismo com a economia americana. Esse conjunto de notícias negativas, porém, não foi suficiente para estancar a saída de recursos dos fundos de ações dos mercados emergentes (salvo um espasmo no mês de outubro, quando o Índice Bovespa subiu 11,49%).
Neste início de 2012, o comportamento tem sido exatamente o oposto: forte captação de recursos nos fundos de ações emergentes e uma fúria "aquisivista", como diria o personagem Odorico Paraguaçu (da obra de Dias Gomes, O Bem Amado), que se espraia por todo o espectro do Ibovespa: large caps, middle caps e small caps.
Uma explicação (e nesses tempos momescos sem qualquer atributo de originalidade) remete a quatro vetores: 1) o leilão do Banco Central Europeu sinalizando de forma implícita que nenhuma instituição financeira na zona do euro vai quebrar; 2) o acordo sobre a disciplina fiscal entre os países do euro; 3) as informações do mercado de trabalho americano e 4) os dados da economia chinesa reforçando a aposta no pouso suave (em números: PIB desacelerando da faixa dos 10% a.a. para algo como 8,5% a.a.).
O curioso é que alguns desses elementos já estavam presentes ao longo do mês de dezembro de 2011, mas a fúria compradora só apareceu em janeiro. Talvez, e reconheço que essa é uma hipótese de baixo teor científico, as luzes dos fogos de artifício, que comemoram a despedida do ano velho e a chegada do ano novo, tenham terminado por iluminar os corações e as mentes dos gestores e - voilá - vamos às compras! E, ao contrário do que se observou no começo do ano passado, os emergentes são claramente a bola da vez.
Agora, é necessário reconhecer que a velocidade da alta foi surpreendente e, desse modo, a pergunta mais difícil e necessária é: até que ponto a valorização é sustentável quando cotejada com os fundamentos, quais sejam: taxa de crescimento dos lucros, patamar de apreçamento (usando, por exemplo, o indicador preço/lucro) e risco sistêmico no cenário externo.
Comecemos pelo cenário internacional. Parece que nas últimas semanas nos afastamos bastante de um cenário de ruptura - seja um default soberano (calote de países) não negociado, seja a quebra de uma instituição financeira europeia - e isto tem um determinado valor. Tomemos como exemplo o Ibovespa: esse cenário de não ruptura vale algo como 8 mil ou 9 mil pontos a mais, então o indicador evoluiu de 56.754 pontos, em 30 de dezembro, para 65.500 pontos. Ocorre que nesse patamar o índice preço/lucro beira 11,4 vezes. A média histórica desse indicador com as informações coletadas pela área de pesquisa da Fundação Cesp gira em torno de 12 vezes.
Para sustentação da alta nos próximos meses, duas vertentes de análise se apresentam (e não são excludentes). Primeiro a possibilidade de um "re-rating", ou seja, passada a fase mais aguda da crise, seria razoável que o mercado de ações no Brasil tivesse múltiplos maiores que aqueles observados no passado recente, leia-se no fragor da crise. Há analistas que respeito, mas dos quais eu discordo, que imaginam o mercado brasileiro negociando num patamar de múltiplo de 13 vezes, por exemplo.
A segunda vertente de análise considera as projeções de crescimento de lucro para 2012. No nosso mapa de acompanhamento de empresas, a taxa de crescimento de lucros gira ao redor de 5%. Os dados de consenso indicam uma evolução de 7,5%.
Se existe uma variável que pode (atenção: o verbo é "pode" e não "deve") nos surpreender favoravelmente é essa. Assim, é aqui que o esforço de análise deve se concentrar nos próximos meses, para assegurar que 2012 seja o ano da revanche dos emergentes.
Jorge Simino é diretor de investimentos da Fundação Cesp e escreve neste espaço bimestralmente
Este artigo reflete as opiniões do autor, e não do jornal Valor Econômico. O jornal não se responsabiliza e nem pode ser responsabilizado pelas informações acima ou por prejuízos de qualquer natureza em decorrência do uso destas informações.

POLITICA
PT já busca alternativa à aliança com Kassab

Por Cristiane Agostine, Vandson Lima e Carmen Munari | De São Paulo

O PT mudou a estratégia na disputa pela Prefeitura de São Paulo e já trabalha com a possibilidade de ir às urnas sem o apoio do PSD do prefeito Gilberto Kassab. A sinalização de que o ex-governador José Serra (PSDB) pode concorrer ao governo municipal e que o PSD o seguiria colocou em alerta a cúpula petista, que passou a desconfiar da fidelidade prometida pelo PSD ao governo da presidente Dilma Rousseff.
A direção do PT dá como certa a candidatura de Serra e o consequente apoio de Kassab ao tucano, apesar de líderes do PSD garantirem nos bastidores que o prefeito paulistano "não voltará atrás" em relação à aliança em torno do pré-candidato petista Fernando Haddad.
Para minimizar os atritos, Kassab reuniu-se ontem com a presidente Dilma, em Brasília, em um encontro marcado em cima da hora (ver reportagem nesta página). Na segunda e na terça-feira, o prefeito procurou a direção do PT paulista e disse não acreditar na candidatura de Serra, pois o tucano não teria lhe contactado.
A cúpula petista, no entanto, não acreditou no argumento do prefeito e começou a articular uma nova estratégia para a campanha de Haddad. Ontem, o assunto foi discutido em reunião da Executiva estadual da sigla.
O PT mostra-se preocupado com a possibilidade de o tucano vencer a disputa municipal, fato que levaria o PSD da base governista para a oposição ao governo federal. O partido tem uma das maiores bancadas da Câmara, com 47 deputados federais e, junto com o PSDB, com 52 deputados, e o DEM, com 27 parlamentares, formaria um bloco de oposição com 126 deputados, um quarto da Casa. "Mudaria tudo no Brasil", comentou um líder petista.
O PT classifica a relação de Kassab com Serra como "umbilical". O prefeito foi vice do tucano na disputa pela capital, em 2004, e assumiu a prefeitura em 2006, quando Serra deixou o cargo para disputar o Estado. Kassab chama sua gestão de "Serra-Kassab".
Dentro da legenda, o PT se dividiu em duas frentes que tentam influenciar os rumos do partido na capital e mesmo a opinião de Haddad sobre a conveniência de uma aliança com o PSD. De um lado, os favoráveis à parceria com Kassab alegam que a parceria seria estratégica, pois desarticularia a oposição e abriria caminho para a vitória na disputa estadual em 2014 - o PSDB governa o Estado desde 1995. Defendem essa tese o prefeito de São Bernardo do Campo e ex-ministro do Trabalho, Luiz Marinho, o presidente estadual do partido Edinho Silva e os deputados federais Cândido Vaccarezza e Vicente Cândido.
Já o grupo contrário à aliança - que conta com os deputados federais Carlos Zarattini, Paulo Teixeira, Ricardo Berzoini, o deputado estadual e presidente nacional Rui Falcão e boa parte do diretório municipal - enumera uma série de motivos pelos quais a aproximação com Kassab seria prejudicial ao partido.
Oposição ao governo Kassab durante toda sua gestão, esses petistas alegam que o partido ficaria sem um discurso consistente para oferecer à população na eleição, pois teriam de defender um governo que sempre criticou e está mal avaliado. Como a disputa municipal é uma eleição de contato mais próximo com os eleitores, a militância precisaria atuar com disposição nos bairros, ainda mais para vender um candidato desconhecido do grande público, e só faria isso se concordasse com o projeto. No mais, Haddad é visto no PT como um bom nome para conquistar um público mais conservador e de classe média, mas precisaria do apoio firme da senadora Marta Suplicy para adentrar as classes mais baixas. E Marta já declarou não querer "acordar de mãos dadas com Kassab".
Outro aspecto temido por vereadores petistas é que uma eventual coligação se estenda às candidaturas proporcionais. O PSD tem pelo menos 14 bons nomes para a vereança e poderia atrapalhar o plano dos petistas, que pretendem eleger algo como 15 vereadores. Se os dois partidos estivessem na mesma chapa, a conta ficaria prejudicada e o número de petistas eleitos seria menor.
Na manhã de ontem, Haddad esteve no sindicato dos Comerciários de São Paulo. Apesar de estar na companhia do presidente da central União Geral dos Trabalhadores (UGT), Ricardo Patah, - filiado ao PSD - Haddad seguiu a linha de raciocínio dos petistas contrários à aliança e afirmou que já trabalhava com essa hipótese. "Desde sempre colocávamos esse como o cenário mais provável. Kassab tinha hierarquizado suas prioridades e colocou Serra como sua primeira opção", disse.
Ao comentar a apresentação de propostas para a cidade durante a campanha, Haddad aproveitou para alfinetar Serra, referindo-se à campanha presidencial de 2010. "Tivemos algumas eleições recentes que deixaram uma marca ruim na política. Quem não consegue fazer uma campanha positiva não deveria nem entrar [na disputa]. Nós não faremos isso, preservaremos a biografia dos nossos concorrentes", afirmou.
Terminado o evento, Haddad seguiu para uma reunião com o publicitário João Santana, cotado para fazer sua campanha.
Governo quer que pequenas empresas consigam "selo ético" para exportar

Por Juliano Basile | De Brasília

O governo quer incentivar as pequenas e médias empresas exportadoras a adotar um selo de boa governança e padrões éticos no mercado. O objetivo é prepará-las para vender para países em que há leis de combate à corrupção corporativa. "As empresas brasileiras devem estar preparadas para atender o que prevê a legislação nos países em que elas atuam", disse a diretora de Prevenção da Corrupção da Controladoria-Geral da União (CGU), Vânia Vieira.
Segundo ela, há um descompasso legislativo quanto ao tratamento contra a corrupção para as empresas no Brasil e no exterior. No Brasil, não há uma legislação específica para punir diretamente as empresas com multas por eventuais subornos de seus funcionários a órgãos públicos. Nos Estados Unidos, na Inglaterra e no Chile, essa prática é coibida com penas equivalentes a dezenas de milhões de dólares. "As leis nesses países são muito rigorosas com a corrupção e uma empresa brasileira que atua nesses mercados se sujeita às legislações locais", avaliou.
Desde que o selo ético foi criado, em 2010, mais de 50 empresas pediram para ter o atestado de boas práticas no mercado. Mas apenas oito companhias conseguiram o benefício. São: AES Sul, EDP Energias do Brasil, AES Tiete, Johnson Controls Building Efficiency, AES Eletropaulo, CPFL Energia, Infraero e Siemens.
Dessas oito empresas, cinco são companhias de energia. Essa maioria não partiu de nenhuma orientação da CGU e sim um acaso do mercado. Como a primeira companhia a obter o selo foi a AES Sul outras empresas do setor também buscaram ter o mesmo reconhecimento.
"Nós não conseguimos identificar uma razão específica para essa preferência das empresas do setor de energia", admitiu Vânia. Mas o fato de serem de um setor que é regulado desde os anos 1990 e com tradição no mercado aberto pode ter peso nesse sentido. "Todas estão na Bolsa de Valores e, portanto, adotam padrões de responsabilidade corporativa", avaliou a diretora. O prazo para as empresas conseguirem o selo termina no dia 12 de março.
A CGU tem uma parceria com a Apex para incentivar as exportadoras a requisitarem o selo. Mas, receber o atestado ético não é uma tarefa fácil. Para obtê-lo, a empresa precisa responder a 65 perguntas sobre a implementação de medidas de integridade e anticorrupção. Não basta apenas uma carta de boas intenções. A empresa tem que encaminhar informações e documentos mostrando que cumpre os requisitos questionados pela CGU.
Exige-se, por exemplo, que a empresa faça investimentos em várias medidas de transparência, como a criação de um canal para recebimento de denúncias de seus funcionários, a divulgação das contribuições que faz para campanhas políticas, a publicação de relatórios periódicos e de manuais de prevenção de conflitos de interesse com o setor público.
As empresas devem obter uma resposta satisfatória em 29 questões, que são consideradas medidas de adoção obrigatória. Nas demais 36 questões, a empresa deve cumprir as metas em 18 itens. Essas são as medidas consideradas desejáveis, como, por exemplo, a realização de um curso específico para treinar funcionários em medidas anticorrupção, ou a implementação de uma política de prevenção e gerenciamento de casos de fraude. Ou seja, das 65 perguntas, a CGU exige que a empresa tenha resposta satisfatória em pelo menos 47. Tudo isso para obter uma vantagem de imagem.
O selo ainda não traz consequências práticas diretas às empresas. Hoje, elas obtêm apenas a divulgação de que conseguiram um atestado ético. Mas, se for aprovado o projeto de lei que está no Congresso e cria novas punições às empresas que se envolvem em casos de corrupção, o selo vai dar às companhias um ponto a mais nas licitações públicas. Com isso, ser ético vai pesar diretamente no bolso e a lista que, hoje, está com pouco mais de 50 pedidos, deve aumentar bastante.

Preços de alimentos sobem menos e provocam recuo de IGP em fevereiro

Por Francine De Lorenzo | De São Paulo

Os preços dos alimentos, que vinham sendo a principal fonte de pressão sobre a inflação, devem atuar em sentido contrário neste mês, revertendo o movimento de alta do Índice Geral de Preços (IGP), da Fundação Getulio Vargas (FGV). A expectativa dos economistas consultados pelo Valor é que o indicador se situe próximo a zero em fevereiro, podendo até mesmo voltar a ficar negativo.
A desaceleração já foi captada pelo IGP-10, o primeiro indicador da família dos IGPs a ser divulgado a cada mês, que subiu 0,04% em fevereiro. No mês anterior, o IGP-10 havia avançado 0,08%. O ritmo de aumento se acentuou no decorrer de janeiro, chegando a 0,25% no IGP-M e a 0,30% no IGP-DI.
A trajetória descendente que começa a ser desenhada reflete principalmente a queda de 0,19% no Índice de Preços ao Produtor Amplo (IPA) - recuo de 0,36% no preço dos produtos industriais e forte desaceleração dos agropecuários. Entre a divulgação do IGP-DI de janeiro e a do IGP-10 de fevereiro, o IPA agropecuário registrou desaceleração de 1,07% para 0,29%.
"Não esperávamos descompressão tão acentuada em um período tão curto de tempo", diz Thiago Curado, da Tendências Consultoria. Diante desse comportamento, Curado espera deflação nos produtos agropecuários no atacado já no IGP-M. "Além disso, os alimentos processados, que têm participação significativa no IPA industrial, continuarão caindo."
Entre o IGP-DI de janeiro e do IGP-10 de fevereiro, a retração nos preços dos alimentos processados se aprofundou, passando de 0,28% para 2,15%. "Isso é reflexo da queda nas carnes", explica Curado. Os preços das aves no atacado recuaram 11,25% neste mês, enquanto a carne bovina ficou 5,34% mais barata.
Os dois itens estão entre os que mais contribuíram para a desaceleração do IPA, que responde por 60% dos IGPs. Com isso, o efeito das altas de 8,33%, no milho, e de 22,27%, no feijão, em fevereiro, decorrentes das secas no Sul, foram minimizadas.
"Início de ano é um período típico de pressão sobre alimentos, mas como as carnes têm grande peso no IPA, teremos deflação", diz Fabio Romão, da LCA Consultores, que projeta retração de 0,15% nos preços agropecuários no IGP-M. "A transmissão dessa queda ao varejo será rápida", observa Flavio Serrano, do BES Investimento.
Os aumentos nos preços dos alimentos no varejo já perderam força - passaram de 0,47% no IGP-DI para 0,17% no IGP-10. A desaceleração, segundo Serrano, é reflexo da deflação nos produtos agropecuários no atacado em dezembro, que só agora chega ao consumidor. "No final do ano passado, os produtos que mais caíram foram soja, trigo e milho, que influenciam toda a cadeia alimentícia, com uma certa defasagem."
O movimento de desaceleração dos preços dos alimentos, avalia Curado, acontecerá este mês e, a partir de março, haverá uma acomodação. "Não há nada que indique uma nova rodada de pressão sobre os alimentos", afirma.
Para Serrano, até maio os alimentos devem contribuir para uma inflação menor. "A partir daí, teremos a sazonalidade de inverno." O economista, entretanto, alerta para a falsa sensação de queda da inflação no período. "Os núcleos de inflação, que desconsideram os preços dos alimentos, mostram que a inflação continua pressionada, devido aos serviços. É preciso lembrar que os alimentos são voláteis, podendo subir ou cair rapidamente."
A partir de meados do ano, Serrano avalia que os indicadores de preços deverão voltar a subir, com a menor contribuição dos alimentos para segurar a inflação e a expectativa de maior pressão sobre os serviços.

Setor espera investimentos de R$ 100 bilhões em 20 anos

Por Eduardo Belo e Roberto Rockmann | Para o Valor, de Brasília

Os investimentos em defesa, incluindo compra de equipamentos e a instalação de novos sistemas, podem superar R$ 100 bilhões em 20 anos. A estimativa, extraoficial, foi discutida em conversas reservadas por executivos do setor presentes ontem ao 2º Seminário Estratégia Nacional de Defesa, realizado na Câmara dos Deputados. Uma cifra mais precisa dos investimentos em defesa deve estar disponível dentro de dois meses, quando for concluído o Plano de Articulação e Equipamento (Paed) de cada uma das três forças. Só o Sistema de Monitoramento de Fronteiras Terrestres (Sisfron), que deverá ser implementado ao longo de dez anos, está orçado em cerca de R$ 12 bilhões.
Para concretizar esse volume de investimentos, será preciso ampliar os recursos dos ministérios da Defesa e da Ciência e Tecnologia, manter a programação de projetos de longo prazo e evitar o contingenciamento de verbas. Militares e parlamentares demonstraram preocupação com a parte da Defesa no corte anunciado ontem, de R$ 3,3 bilhões.
"É preciso avançar na definição de um orçamento mais robusto para as Forças Armadas", defendeu o deputado Carlos Zarattini (PT-SP), presidente da Frente Parlamentar de Defesa Nacional. Para ele, o orçamento teria de ser reforçado por outras fontes de recursos - ideia já corrente entre os meios militares e na indústria de armamentos e sistemas de defesa. Os royalties do pré-sal e da mineração são os principais alvos do setor.
O governo tem procurado estabelecer uma política de defesa, compras governamentais e legislação adequada, disse o ministro da Defesa, Celso Amorim. Ele mencionou a aprovação da Medida Provisória 544, por unanimidade, na Câmara dos Deputados na terça-feira. A MP prevê tratamento especial para a indústria brasileira estratégica de defesa, fixa um volume de conteúdo nacional mínimo nas compras do governo no setor - a ser definido - e estabelece um novo regime tributário para a área. Antes da MP, as indústrias nacionais de armamentos e sistemas podiam ser taxadas em até 40% de imposto, contra tributação zero para a maioria de componentes e equipamentos importados. A estratégia do governo consiste em aumentar a participação do conteúdo nacional no setor.
O presidente da Finep (Fundação de Investimento e Pesquisa), Glauco Arbix, demonstrou preocupação com a competitividade da indústria nacional. Segundo ele, 57% das empresas do setor de defesa no Brasil têm até 40 empregados. Mesmo sendo companhias que trabalham com pessoal altamente especializado, isso representa uma fragilidade em relação à economia de escala e aos concorrentes internacionais. Ele disse que a Finep está propondo uma alteração em seus estatutos para que possa financiar operações de fusão e aquisição em áreas consideradas prioritárias, como a de defesa.
Arbix disse ainda que o setor de defesa requer investimentos muito elevados e que o orçamento das Forças Armadas não comporta os investimentos necessários. Segundo o presidente da Finep, seria necessário colocar os investimentos em defesa no Programa de Aceleração do Crescimento. A Finep liberou para o setor perto de R$ 1 bilhão em 2011, quase 40% do total desembolsado pela agência.
A maior parte do orçamento de defesa - cerca de 80% dos R$ 60 bilhões - é reservado para a folha de pagamento, segundo o pesquisador Vitélio Brustolin, da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Brustolin frisa que a parte de investimento e custeio das forças representa menos de 15% do total.
Luiz Carlos Aguiar, presidente da Embraer Defesa e Segurança, também defendeu o desenvolvimento de conteúdo local como forma de expandir a indústria nacional e criar uma plataforma exportadora de países de alto valor agregado. Uma das formas de possibilitar esse desenvolvimento é buscar o chamado "uso dual", em que a tecnologia militar é também passível de uso civil.
O ministro da Ciência e Tecnologia, Marco Antônio Raupp, propôs a cooperação entre os setores - indústria, governo, academia e centros de pesquisa - em busca da "autonomia tecnológica" do país. O governo, diz ele, investiu R$ 1,5 bilhão em defesa de 2007 a 2011, valor que deve "aumentar substancialmente" em quatro anos.
"É preciso haver aglutinação de recursos", afirmou Manuel Antônio Nogueira, representante da Odebrecht Defesa e Tecnologia no evento. O executivo disse considerar necessária a aproximação entre a academia, as empresas, os centros de pesquisa e as Forças Armadas para desenvolvimento de projetos conjuntos.

INTERNACIONAL
Argentina pune a YPF e eleva pressão sobre setor

Por César Felício | De Buenos Aires

O aumento da pressão do governo argentino sobre a petroleira YPF, controlada pela espanhola Repsol, derrubou ontem as ações da empresa nas bolsas de Buenos Aires e Madri, horas depois da divulgação de uma autuação fiscal da Afip, a receita argentina. Nos dois países as cotações da YPF puxaram para baixo o mercado de capitais. Na Espanha, a queda dos papéis da empresa foi de 1,29%, enquanto o índice IBEX35 foi negativo em 0,35%. Na Argentina, a ação da YPF caiu 4,06% e o índice Merval recuou apenas 0,01%.
A empresa ficou com as suas operações externas na Argentina suspensas até o pagamento de uma multa de US$ 8 milhões, segundo a agência governamental Telam. De acordo com a agência, a YPF é uma entre 300 empresas que estão sendo punidas pela Afip nos últimos dias.
A punição de ontem em si foi vista como pouco relevante por analistas, mas indicativa de uma ofensiva contra a companhia. "Para uma empresa como a Repsol, esta é uma autuação muito baixa, de pouco impacto operacional. O que fica claro é que o governo admite a existência de um problema concreto da Argentina na área energética e busca nas empresas um bode expiatório", afirmou o consultor Daniel Montamat, que foi presidente da YPF entre 1988 e 1989, quando a empresa ainda era estatal. A YPF foi privatizada em 1992.
O governo pressiona a YPF para que amplie seus investimentos na exploração do campo de petróleo e gás não convencional de Vaca Muerta, na Província de Neuquén, na Patagônia argentina. Segundo fato relevante divulgado pela própria YPF nas bolsas de Madri e de Buenos Aires na semana passada, a reserva potencial de Vaca Muerta é equivalente a 22,8 bilhões de barris de petróleo, sendo 13,5 bilhões na área da concessão explorada pela empresa. É a terceira maior reserva não convencional do mundo, e no comunicado a YPF a compara ao pré-sal brasileiro em termos de impacto na economia. A empresa calculou um dispêndio de US$ 28 bilhões para perfurar 2.000 poços e aumentar em 50% a produção de petróleo do país, mas não fixou o tempo para realizar a despesa. Mencionou apenas que ela seria feita "nos próximos anos".
Com um déficit comercial na conta de energia previsto para US$ 6 bilhões neste ano, caso o PIB do país cresça apenas 2%, o governo da presidente Cristina Kirchner tem pressa em tentar reverter a queda de reservas e acena com a possibilidade de encampar as áreas de exploração. Na semana passada, os governadores das Províncias produtoras de petróleo deram um ultimato a todas as petroleiras do país (universo em que a YPF detém 60% do mercado) para que estabeleçam metas de produção para as áreas de exploração. Na Argentina, o poder de concessão cabe aos governos regionais, e não ao nacional, mas a ação dos governadores contou com a orientação do ministro do Planejamento, Julio de Vido.
"O governo usa as Províncias para acenar com o fantasma da expropriação, mas o que busca na realidade é que a YPF mude a sua política estratégica de uso dos lucros", opinou um executivo de uma empresa do setor.
A YPF mudou a sua composição acionária em 2008, quando um sócio argentino, o grupo Petersen, adquiriu em dois momentos 25% do capital da empresa. Por um acordo de acionistas, o novo sócio paga a aquisição aos vendedores usando os dividendos sobre os lucros da empresa, o que reduz a capacidade de investimento da YPF. No entanto, a empresa enviou um fato relevante às duas bolsas em que cotiza, anunciando ter investindo em 2011 13,3 bilhões de pesos argentinos no país, o que equivale a cerca de US$ 3 bilhões.
O governo intensificou também a pressão sobre a YPF na área de distribuição de combustíveis. Em janeiro, o vice-presidente Amado Boudou acusou as cinco empresas que dividem o mercado argentino de prática de cartel nas vendas de óleo diesel no mercado atacadista, um segmento em que a YPF é amplamente a empresa dominante. Ao responder, alguns dias depois, a YPF divulgou uma nota em que rechaçava a acusação do governo. Procurada por este jornal, a assessoria de imprensa da YPF informou que a empresa não iria se pronunciar no dia de ontem.

China já emprestou US$ 75 bi à América Latina

Por John Paul Rathbone | Financial Times, de Londres

Bancos estatais chineses emprestaram mais de US$ 75 bilhões à América Latina desde 2005 - e em 2010 emprestaram mais que o Banco Mundial, o Banco Interamericano de Desenvolvimento e o americano ExImBank juntos -, segundo um relatório que sublinha a crescente influência da China no rápido crescimento da região.
"No lado positivo, é claro que a China é uma nova e crescente fonte de financiamento para a América Latina", nota o relatório "New Banks in Town: Chinese finance in Latin America". "Dito isso, e ao contrário de muitos comentários sobre o assunto, os países latino-americanos, de modo geral, têm de pagar um prêmio mais elevado para aceitar empréstimos chineses."
A China já passou à frente dos americanos, tornando-se o maior parceiro comercial do Brasil e do Chile. Além disso, muitos políticos americanos temem que Pequim esteja se valendo de empréstimos a juros baixos para "comprar" influência nos governos de esquerda latino-americanos que são hostis aos interesses ocidentais e que Pequim se vale de financiamento barato para assegurar suprimentos de commodities no longo prazo.
Por exemplo, o China Development Bank, responsável pela maior parte dos empréstimos da China aos latino-americanos, concedeu crédito de US$ 10 bilhões à Argentina em 2010 cobrando a Libor mais 600 pontos base. No mesmo ano, o Banco Mundial emprestou à Argentina US$ 30 milhões à mesma Libor mais 85 pontos base.
"Alguns, na esquerda, dizem que crescente importância da China na America Latina é motivada por um desejo ideológico de reforçar os laços Sul-Sul. Outros, à direita, dizem que a China está comprando influência com dinheiro barato", diz Kevin Gallagher, da Universidade de Boston, um dos coautores do relatório. Mas, como os empréstimos, embora aprovados pelo Partido Comunista em Pequim, são processados por bancos estatais com foco estritamente comercial, "nenhuma das opiniões reflete exatamente a verdade."
Empréstimos em troca de petróleo, como o financiamento de US$ 20 bilhões firmado com a Venezuela em 2010, também baseiam-se em juros de mercado.
Além disso, embora esses empréstimos estejam entre os mais controvertidos - pois os recursos podem ser gasto em larga medida naquilo em que quiser o governo tomador -, assegurar o suprimento de commodities com crédito de longo prazo e apoio tecnológico não é novidade: o Japão firmou acordos semelhantes nos anos 70. "Agora os chineses estão usando o mesmo formato empregado pelos japoneses na América Latina. Deu certo para eles", disse Gallagher.
Na terça-feira, os EUA e a China concordaram em iniciar negociações sobre a definição de um balizamento para a concessão de crédito destinado ao financiamento de exportações, o que poderá fazer com que Pequim passe as respeitar as regras utilizadas pelos países membros da OCDE.
Os empréstimos chineses à América Latina, que representam mais de metade do crédito externo concedido por Pequim, aceleraram-se, em 2009, quando a China aproveitou a seca das fontes alternativas de crédito durante a crise financeira mundial para projetar sua influência no exterior.
Em 2009, os empréstimos à América Latina chegaram a US$ 18 bilhões - contra menos de US$ 1 bilhão antes de 2008 -, e chegaram a US$ 36 bilhões em 2010. O fluxo total líquido de crédito à região totalizou US$ 63 bilhões em 2009 e US$ 143 bilhões em 2010, segundo dados divulgados paralelamente pelo Instituto de Finanças Internacionais.
A China revelou-se uma fonte alternativa de crédito especialmente valiosa para países inadimplentes, impossibilitados de acessar os mercados de capitais internacionais, como a Argentina e o Equador, que, ironicamente, estão entre os maiores críticos da globalização.

Campanha eleitoral na França ameaça os bancos com taxas e mais controle

Por Fabio Benedetti-Valentini | Bloomberg

Com a aproximação das eleições, o BNP Paribas (BNP), o Société Générale (SocGen) e o Crédit Agricole - os maiores bancos franceses -, são cada vez mais alvo das críticas dos políticos do país.
Após um ano em que suas ações sofreram as maiores quedas desde 2008, os bancos estão sendo culpados por pelo menos parte da crise econômica europeia pelos principais concorrentes na disputa presidencial francesa, cujas eleições serão realizadas em 22 de abril e 6 de maio. O socialista François Hollande e o presidente Nicolas Sarkozy comprometeram-se a conter os bancos com impostos e controles, apelando para o sentimento antifinanceiro do eleitorado.
Independentemente de quem vencer, os bancos franceses provavelmente serão obrigados a pagar impostos sobre transações - mesmo em seu trading de alta frequência -, e a um maior controle sobre opções de compra de ações e remuneração de gestores e tetos sobre dividendos. Espelhando a reação do movimento "Ocupar Wall Street" contra as empresas financeiras, os candidatos franceses estão competindo para mostrar quem é mais duro com os bancos.
"Meu inimigo é o sistema financeiro", disse Hollande, atual favorito nas pesquisas, no mês passado, qualificando-o de "inimigo sem nome e sem rosto". Ele disse que, se eleito, obrigará os bancos a separar as operações varejistas das centradas em investimento "especulativo", e prometeu um imposto sobre todas as transações, um aumento de 15% na tributação sobre os lucros e a proibição à concessão de opções de compra de ações a executivos.
"Se o sistema financeiro "não tem rosto", a condenação de seus excessos está se tornando mais visível a cada dia!", escreveu Didier Le Menestrel, presidente da parisiense "Financiere de l"Echiquier", em boletim de 3 de fevereiro distribuído a seus clientes. No fim de 2011, o fundo administrava 4,2 bilhões de euros (US$ 5,6 bilhões) para 4,5 mil clientes.
Sarkozy, que ontem oficializou sua candidatura, pretende impor unilateralmente um imposto de 0,1% sobre transações financeiras a partir de agosto. O imposto será aplicado sobre a compra de ações, inclusive ao trading de alta frequência e aos swaps de risco de crédito. "Não há nenhuma razão para que o desregulamentado mercado financeiro, que nos levou à situação atual, não possa participar do saneamento de nossas contas", disse em 29 de janeiro.
Os bancos franceses estão envolvidos na crise europeia devido a seu portfólio de € 620 bilhões de dívida privada e pública dos países em dificuldades na região - Grécia, Portugal, Irlanda, Itália e Espanha -, segundo dados do fim de setembro divulgados pelo Banco de Compensações Internacionais.
O BNP Paribas, Société Générale e Crédit Agricole estão revertendo suas posições, enxugando seus ativos em cerca de € 300 bilhões e cortando pelo menos 5.600 postos de trabalho para cumprir regras internacionais de capitais, enquanto contabilizam os prejuízos decorrentes de sua exposição à Grécia.
No fim de setembro, os três bancos, juntamente com Groupe BPCE, quarto maior banco francês, haviam assumido € 5,4 bilhões em baixas contábeis relacionados à sua exposição à Grécia. Tanto o Société Générale como o Crédit Agricole operam redes de agências não lucrativas em Atenas.
O governo francês, que socorreu os bancos do país após o colapso do Lehman Brothers em 2008, não os ajudou na atual crise - está debilitado por sua própria dívida, de € 1,69 trilhão, ou 85% de seu Produto Interno Bruto (PIB). No mês passado, pela primeira vez, a Standard & Poor rebaixou a classificação de crédito AAA da França.
Por seu turno, Sarkozy tem defendido que os bancos, beneficiados por um alívio em seus problemas de financiamento - quando o Banco Central Europeu lhes concedeu empréstimos a 1% por três anos -, ajudem os governos usando parte do dinheiro para comprar dívida soberana da zona euro.
Os quatro maiores bancos franceses poderão registrar uma queda em torno de 10% em seus lucros em 2013, como impacto potencial do programa econômico de Hollande, segundo estimativas de Jean-Pierre Lambert, analista londrino na Keefe Bruyette & Woods.
Os bancos BNP Paribas, Société Générale, Credit Agricole e Natixis, uma subsidiária do BPCE, poderão sofrer um impacto negativo combinado de € 1,7 bilhão em seus lucros devido às propostas de Hollande, do qual cerca de € 700 milhões devido ao imposto sobre transações, segundo estimativas.
O imposto planejado por Sarkozy não se aplicaria a negócios com títulos nem a operações mais complexas envolvendo produtos estruturados, que constituem a maior parte das receitas de trading dos bancos franceses.
De modo geral, o imposto sobre transações financeiras produzirá "um impacto desprezível" no lucro dos bancos e provavelmente custará menos do que € 150 milhões para cada um dos quatro maiores bancos franceses de capital aberto, estima Mateus Czepliewicz, um analista em da Collins Stewart Hawkpoint em Londres. "O impacto negativo sobre o ânimo do investidor poderá ser bem maior", disse ele.

ESPECIAL
Renda puxa carga tributária para 34% do PIB

Por Sergio Lamucci | De São Paulo

A carga tributária subiu de 32,72% do Produto Interno Bruto (PIB) em 2010 para 33,99% do PIB em 2011, puxada principalmente pela alta expressiva dos impostos ligados à renda, responsável por metade desse salto, segundo estimativas do economista Bernard Appy, ex-secretário de Política Econômica da Fazenda e diretor da LCA Consultores. Também subiram os tributos relacionados à folha de salários e a bens e serviços.
Para Appy, o processo de intensa formalização da economia - tanto de trabalhadores como de empresas - é fundamental para explicar o movimento, assim como os ganhos expressivos de rendimento do trabalho e de lucros das companhias. Ele acredita que a tendência de maior formalização deve continuar nos próximos anos, especialmente no mercado de trabalho, segmento em que a informalidade ainda é grande.
O peso dos impostos sobre a renda subiu de 6,02% do PIB em 2010 para 6,65% no ano passado, e se deu tanto no caso dos tributos ligados à pessoa física quanto à pessoa jurídica (nessa rubrica, há também impostos referentes a não residentes e de outras fontes) No caso do primeiro, passou de 2,3% para 2,46% do PIB. A alta reflete, para Appy, tanto o impacto da maior formalização como do avanço do rendimento. "Há mais gente pagando imposto, e parte delas muda de faixa de renda."
A tributação da renda das empresas também teve um salto significativo, de 2,57% para 2,81% do PIB, ainda que inferior aos 3,23% do PIB de 2008. Entram aí o Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL). Além da alta dos lucros das companhias, Appy diz que há também um processo de formalização das empresas. O ritmo mais forte de crescimento dos últimos anos leva um número maior delas a sair da informalidade, assim como uma fiscalização maior da Receita Federal, avalia.
O especialista em contas públicas Amir Khair nota que parte da alta forte dos impostos ligados à renda das empresas se deve ao bom desempenho da economia em 2010, quando o PIB cresceu 7,5%. Para um grupo de empresas, os bons lucros daquele ano se refletiram em elevado pagamento de tributos no ano passado.
Os impostos que incidem sobre a folha de salários também aumentaram significativamente de 2010 para 2011, passando de 8,55% para 8,83% do PIB. Em 2004, o número era de apenas 7,49% do PIB. Nesse caso, o aumento da formalização do mercado de trabalho tem um grande peso, destaca o economista. Mesmo em 2009, quando houve queda considerável da carga tributária total, um reflexo da desaceleração da economia em função da crise e as desonerações tributárias para combatê-la, a fatia desses tributos como proporção do PIB cresceu.
Em 2004, apenas 43,5% da população ocupada nas seis principais regiões metropolitanas tinha carteira assinada, número que subiu para 53,6% em 2011. Apesar do aumento forte nos últimos anos, fica claro que ainda há muitos trabalhadores na informalidade, o que explica a aposta de Appy na perspectiva de crescimento da formalização nos próximos anos.
Khair também destaca o avanço da formalização, observando que a massa salarial continuou a ter um crescimento expressivo em 2011, a despeito de o PIB ter crescido provavelmente menos de 3%. A produção industrial ficou estagnada, o varejo perdeu algum fôlego, mas o mercado de trabalho manteve-se robusto, observa.
O economista Sérgio Mendonça, do Departamento Intersindical de Estatísticas e Estudos Socioeconômicos (Dieese), tem citado alguns fatores que, além do crescimento mais forte da economia, impulsionam a formalização nos últimos anos. Para ele, a entrada em vigor da Lei Geral da Micro e Pequena Empresa, em 2007, também ajudou nesse processo, ao tornar mais barata a contratação de funcionários com carteira por empresas de menor porte.
O fato de a Cofins ter se tornado um imposto não cumulativo em 2003 também contribuiu para o processo, diz Mendonça. Companhias grandes pressionam os fornecedores de menor parte a se formalizar, para ter direito aos créditos tributários, uma vez que o tributo passou a ser cobrado pelo valor agregado.
A arrecadação de impostos ligados a bens e serviços também teve alta significativa. Pulou de 15,89% do PIB em 2010 para 16,19% do PIB no ano passado. Nessa rubrica, destacam-se o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) e o Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI).
Appy explica que estimou os tributos federais com base nos dados de receita administrada, divulgados pela Receita. Os números para o ICMS foram projetados com base na variação da receita acumulada de janeiro a novembro. Para os demais tributos, ele considerou crescimento proporcional ao PIB. "Ou seja, os dados de 2011 são apenas uma estimativa preliminar."
A carga tributária de 2010 ficou em 32,72% do PIB, e não nos 33,56% do PIB divulgados no ano passado pela Receita, porque Appy a recalculou com base no novo valor do PIB nominal, que saiu depois da divulgação do Fisco.
Nas contas de Appy, o recorde da carga tributária continua sendo o de 2008, de 34,1% do PIB. Em 2009, houve uma queda razoável, para 32,58% do PIB, refletindo o mau momento da economia - o PIB teve queda de 0,3% - e as reduções de alíquotas de impostos para estimular a demanda. Em 2010, a economia deslanchou, com crescimento de 7,5%, mas ainda havia muitas desonerações tributárias em curso, como diz Appy. Khair observa ainda que o mau resultado das empresas em 2009 se refletiu em ganhos de renda mais modestos.
Ele estima um aumento mais forte da carga tributária neste ano, para 34,42% do PIB. A diferença se dá porque Appy e Khair avaliam de formas diferentes o impacto das receitas obtidas por meio do Refis, o programa de renegociação de dívidas tributárias.

Ganho extra pode bancar investimento

Por De São Paulo

O avanço da formalização na economia deve continuar nos próximos anos, contribuindo para o aumento da carga tributária mesmo sem o governo ter que lançar mão da elevação de alíquotas ou criação de novos impostos, acredita Bernard Appy, ex-secretário de Política Econômica da Fazenda e diretor da LCA Consultores. Para ele, essa perspectiva abre espaço para uma estratégia que leve a uma expansão sustentada do investimento público e privado e ao crescimento da poupança doméstica - desde que a elevação da carga não seja usada só para bancar o avanço das despesas correntes.
Um dos fins nobres para essa sobra fiscal seria aumentar o investimento público em infraestrutura, algo que ajudaria a melhorar a competitividade da economia, diz Appy. Desonerações tributárias que incentivem as empresas a investir mais também lhe agradam, assim como um esforço para reduzir mais rápido a dívida pública - com aumento do superávit primário em momentos de expansão mais forte da economia. "Essas medidas ajudariam a reduzir ainda mais os juros e a aumentar as perspectivas de crescimento de longo prazo", afirma ele.
O especialista em contas públicas Amir Khair diz preferir que a sobra fiscal seja usada em desonerações tributárias que estimulem o consumo e incentivem o investimento privado. Ele vê com ceticismo a capacidade do setor público investir, por questões de falta de competência e das amarras institucionais que seguram o investimento do governo. "Acho melhor que se façam concessões para o setor privado investir."
Já o professor Nelson Marconi, da Escola de Economia de São Paulo da Fundação Getúlio Vargas, vê com bons olhos usar a folga fiscal para aumentar o investimento, insistindo na importância de segurar as despesas correntes (como pessoal, aposentadorias, custeio da máquina). "Há muito espaço para controlar esses gastos", afirma ele, que também considera que desonerações tributárias, desde que bem estudadas, podem ser uma saída interessante. (SL)

EMPRESAS & TECNOLOGIA
Eaton planeja ir além das autopeças

Por Eduardo Laguna | De São Paulo

Uma indústria automobilística forte é essencial para o crescimento da empresa, mas nos últimos anos o grande desafio da Eaton no Brasil tem sido diversificar sua atuação para ir além do negócio de componentes automotivos, pelo qual é mais conhecida no país.
Por fatores como a necessidade de robustos investimentos em infraestrutura, a expansão do mercado imobiliário, o potencial de crescimento na demanda por carros e o alto custo da energia - forçando empresas a buscar cada vez mais soluções de gerenciamento energético -, a Eaton tem motivos de sobra para acreditar no crescimento de sua operação brasileira. Dentro da estratégia, o último grande passo foi a abertura de uma fábrica de componentes elétricos em Jundiaí, no interior de São Paulo, onde instalou linhas de equipamentos - como painéis eletrônicos de média e baixa tensão - para sistemas de distribuição e controle de energia.
"É uma oportunidade enorme para uma empresa como a Eaton porque muitos produtos nossos são usados em infraestrutura", diz o presidente global da empresa, Alexander Cutler, mais conhecido como Sandy Cutler. A meta traçada para a filial brasileira é de praticamente dobrar o faturamento nos próximos anos, saindo de US$ 1 bilhão atualmente para US$ 1,9 bilhão até 2015.
Mas também existem obstáculos a serem superados - entre os principais deles, o aumento de custo decorrente de aumentos salariais superiores à inflação e a taxa de câmbio desfavorável para a indústria nacional. "Vimos uma grande mudança nos últimos cinco anos, quando o Brasil era uma nação muito competitiva para se exportar. Hoje, não é mais barato produzir no Brasil", avalia Cutler, acrescentando que a saída para mitigar esses custos é melhorar a produtividade.
A empresa tem atualmente sete fábricas e 4,7 mil funcionários no país, em negócios que também incluem a fabricação de produtos de aplicação hidráulica - entre motores, bombas, válvulas e mangueiras. Esse itens são destinados à máquinas e equipamentos utilizados por setores em expansão como as indústrias petroleira e de mineração, além do agronegócio.
Em outra frente, está entrando no mercado de equipamentos para aeronaves, no qual já atende a Embraer por meio de operações nos Estados Unidos e na China. Cutler diz que as operações de componentes hidráulicos e elétricos, assim como o segmento aeroespacial, - setores nos quais a companhia avalia ter presença ainda modesta no Brasil - vão avançar mais do que a divisão de autopeças, tida como mais consolidada. "Esses negócios começarão a crescer mais rápido a partir de agora", adianta o executivo americano.


Por Cibelle Bouças | De São Paulo

A Polycom vai reforçar Expansão da Polycom tem foco em emergentes
investimentos em países emergentes para acelerar o seu processo de expansão global. Especializada na oferta de equipamentos e serviços de teleconferência e videoconferência, a companhia americana encerrou 2011 com US$ 592 milhões em caixa. Com isso, os planos são para investir 8% (US$ 47 milhões) desse valor nos países do Bric (Brasil, Rússia, Índia e China), neste ano.
No Brasil, a companhia fez um aporte de US$ 2,5 milhões para instalar um centro de experimentação tecnológica em São Paulo, no ano passado. Na unidade, os clientes podem testar as tecnologias da Polycom e avaliar o desempenho dos softwares quando operados em conjunto com tecnologias da Avaya, Microsoft, Hewlett-Packard (HP), Juniper, Broadsoft, Siemens e IBM. A Polycom já mantinha centros semelhantes em Londres, Paris, Madri, Pequim e Santa Clara (Califórnia, Estados Unidos).
A companhia prevê investir US$ 10 milhões entre 2011 e 2013 no Brasil para reforçar as operações da subsidiária. Em sua primeira visita ao país, Hansjoerg Wagner, presidente da Polycom para as regiões Ásia-Pacífico, Caribe e América Latina, afirmou que a operação brasileira é uma das que mais crescem no mundo. Por conta das perspectivas de crescimento econômico nos próximos anos, o executivo estima que os negócios no país continuarão em ritmo acelerado.
Wagner afirmou ao Valor que o novo centro permitirá à companhia aproximar-se mais dos clientes, o que poderá ajudar na rápida expansão. A carteira de clientes da Polycom no Brasil é formada, em sua maioria, por pequenas e médias empresas, e governos, mas a companhia tem como meta fechar mais contratos com grandes companhias, sobretudo nas áreas de educação, petróleo e gás, energia e saúde.
A Polycom não divulga resultados e projeções por país. Wagner afirmou apenas que a demanda no Brasil e nos demais membros do Bric cresce em ritmo mais acelerado que a média global. E isso não se deve apenas ao fato de esses países apresentarem economias aquecidas. Brasil, Rússia, Índia e China possuem dimensões continentais e, por essa razão, tendem a adotar mais as tecnologias de telepresença. "Esses mercados tornaram-se significativos para a companhia e têm o maior potencial de crescimento nos próximos cinco anos", disse o executivo.
De acordo com o balanço de 2011, divulgado em janeiro, a receita da Polycom nas regiões Ásia-Pacífico e América Latina (onde estão os Bric) aumentou 40% no ano passado e representou 30% da receita mundial da companhia, ante 17% no ano anterior. A expectativa de Wagner é que as regiões mantenham esse mesmo ritmo de crescimento neste ano.
No mundo, a Polycom encerrou 2011 com receita global de US$ 1,5 bilhão, resultado 23,8% superior ao registrado um ano antes. O lucro líquido no período cresceu 60,9%, para US$ 213,2 milhões.
Wagner associou os ganhos de receita e rentabilidade à decisão da companhia de investir em serviços que podem ser acessados remotamente por internet (na chamada nuvem) e em softwares que permitem aos clientes empresariais realizar teleconferências e videoconferências usando smartphones e tablets da Apple, da Samsung e da Motorola. Os serviços da Polycom na nuvem registraram crescimento de vendas de 45% no quarto trimestre de 2011 em comparação ao mesmo período do ano anterior.
A companhia também integrou novos serviços de telepresença com o software Lync, da Microsoft, que reúne serviços de mensagens pela internet, chamadas por vídeo e de voz. Esses serviços apresentaram crescimento em vendas de 135% no ano passado. "Esses serviços foram lançados na China e na América Latina no ano passado e devem contribuir para o crescimento acelerado nessas regiões também neste ano", diz Wagner.
A aposta da Polycom em serviços na nuvem e que podem ser acessados em dispositivos móveis segue uma tendência global no mercado de telepresença que ganhou corpo no ano passado, com a entrada de redes sociais nesse segmento. O Facebook lançou o serviço de videoconferência, em parceria com a Skype Technologies, adquirida pela Microsoft, no mesmo mês em que o Google lançou uma oferta semelhante para a sua rede social Google +.
Segundo a consultoria IDC, o mercado mundial de videoconferência e telepresença cresceu 20% em 2011, para US$ 2,6 bilhões. A Polycom é a 2ª maior do setor, com 19,4% de participação, após a Cisco, que detém 35,2%, conforme a IDC.

Austrália impõe fim da logomarca no maço

Por Christopher Thompson e Neil Hume | Financial Times, de Londres e Sidnei

A Austrália tem uma das menores taxas de consumo de tabaco do mundo, de menos de uma a cada cinco pessoas, mas será o principal campo de batalha para a indústria do fumo em 2012.
Desde dezembro, sob as leis antifumo mais rígidas do mundo, as companhias de tabaco terão que vender seus produtos em pacotes insípidos e idênticos, sem logomarcas, mas com imagens gráficas de doenças relacionadas ao fumo. Os nomes das marcas continuarão aparecendo, mas em um tipo de letra padrão, na parte frontal de cada maço.
A indústria tabagista lançou um contra-ataque agressivo contra a lei dos maços modestos. As restrições ao mercado tabagista australiano, que movimenta US$ 9,5 bilhões por ano, não representam uma grande ameaça aos lucros. Mas a maior preocupação é que, assim como aconteceu com a proibição dos cigarros em locais públicos, que se espalhou da Califórnia para o mundo, a decisão tomada pela Austrália possa se espalhar para o mercado da União Europeia, que movimenta US$ 161 bilhões, e outros lugares.
Analistas levantam a possibilidade dos mercados emergentes aprovarem leis parecidas, deixando as grandes empresas do setor com um dilema maior. "Obviamente há a possibilidade de outros países fazerem o mesmo", diz Michael Prideaux, diretor de assuntos corporativos da British American Tobacco (BAT).
Uma pessoa a par das discussões na Philip Morris International, a segunda maior fabricante de cigarros de capital aberto do mundo, disse: "Isso é o princípio e o fim para as companhias de tabaco".
A União Europeia está considerando a implementação do maço simples entre as revisões propostas nas leis para o tabaco esperadas para este ano. No Reino Unido, o Departamento de Saúde deverá publicar no terceiro trimestre os resultados de sua consulta pública sobre as embalagens simples.
No Reino Unido, a Imperial Tobacco, a BAT e a Japan Tobacco ajudaram a formar um grupo de campanha partidário da doutrina do livre-arbítrio conhecido como Hands Off Our Packs (algo como "Tirem as Mãos dos Nossos Maços). Ele vem exortando seus apoiadores a dizer não a "mais imposições do Estado controlador".
"Nosso principal argumento é que as pessoas são informadas e assim deveriam poder fazer uma escolha adulta", diz Paul Williams, diretor de assuntos corporativos da Japan Tobacco. "A proibição poderá se estender para o álcool e a obesidade."
A JTI, a PMI e os braços australianos da BAT e da Imperial entraram na justiça contra a lei dias depois de sua aprovação, em novembro, pelo parlamento federal em Camberra.
As companhias afirmam que a lei do maço simples viola a constituição, custará bilhões de dólares aos contribuintes em perda de receitas com impostos de consumo, e será uma benção para os contrabandistas de cigarros. Elas dizem que não há evidências de que a medida ajudará a reduzir o consumo de cigarros. A Suprema Corte da Austrália deverá examinar os casos em abril.
Mas, entre quarto paredes, todas as companhias de Tabaco estão se preparando para a via após os maços simples e padronizados. Em especial, elas estão considerando como vão comercializar marcas de cigarros diferentes que se parecem.
"A divulgação boca a boca passará a ser mais importante", diz Prideaux. "Teremos que diferenciar os produtos de uma maneira diferente da do passado... provavelmente mais no sabor, para dar aos consumidores algo sobre o qual eles queiram falar."
Há uma preocupação crescente entre as grandes fabricantes de tabaco, de que guerras de preços possam se suceder. "Sem as marcas, como você compra por um prêmio?", pergunta Peter Nixon, vice-presidente de comunicações da PMI. "Assumimos que no futuro a escolha das marcas envolverá o preço... veremos uma queda nos preços, de modo que deveremos ter uma queda nas receitas."
No ano passado a PMI publicou um estudo interno, ao qual o "Financial Times" teve acesso, em que ela projetava uma queda de até 19% no preço médio dos cigarros se a lei do maço simples fosse implementada, uma vez que as companhias iriam competir mais nos preços.
O custo seria maior nos mercados emergentes, onde as companhias estão tentando convencer os consumidores da classe média a mudar para marcas mais caras.
Jonathan Fell, um analista do Deutsche Bank, diz que embora não esteja preocupado com uma redução das taxas de consumo de tabaco no curto prazo, a capacidade das fabricantes de cigarros de conseguir preços maiores será questionada.
"Certamente isso é algo que deixará os investidores preocupados se for implementado", afirma Fell. "Acredito que não há uma diferença enorme entre as economias desenvolvidas e emergentes em termos de regulamentação. Assim como países como o Brasil e a África do Sul fizeram no passado, elas normalmente são muito rápidas em acompanhar e implementar o que outros países fizeram."
Publicamente, as companhias confiam que vão vencer sua ação legal nas cortes australianas. Se os tribunais forçarem o governo a recuar, eles esperam que isso seja um exemplo para outros governos que estudam a implementação de leis de simplificação dos maços de cigarros.
Alan Parsons, diretor de comunicações corporativas da Imperial Tobacco, diz não acreditar que haverá um efeito dominó imediato. "Acho que os outros vão esperar para ver como a coisa vai se desenrolar na Austrália", acrescenta ele.

Brasileiro vai comandar a GM coreana

Por Marli Olmos | De Indaiatuba

Em 87 anos de história no Brasil, a direção da General Motors jamais escalou um executivo nascido no próprio país para presidir a operação brasileira. As recentes mudanças de comando na companhia são prova, porém, da habilidade de certos talentos da equipe local para assumir tais responsabilidades. A partir de março, a filial da montadora na Coreia, que produz quatro vezes mais que a brasileira, passará a ser dirigida pelo paulista Sérgio Rocha. Com 32 dos 52 anos de idade dedicados à companhia, esse engenheiro passou a maior parte do tempo envolvido no processo de globalização dos veículos, uma indicação de que a ascensão na carreira poderá leva-lo a voos mais altos.
Rocha não é o único brasileiro da GM que cruzará a fronteira para assumir uma posição de comando no próximo mês. É justamente da antiga equipe comandada por ele que saiu a paranaense Isela Costantini, a executiva que vai presidir a GM na Argentina, em substituição, aliás, ao próprio Sérgio Rocha, que presidiu a operação no país vizinho nos dois últimos anos.
Esta não será a estreia de Rocha na Coreia. Há cinco anos, ele foi escalado para compor o grupo que criaria os veículos GM na Coreia, depois que a montadora adquiriu a falida Daewoo. São dessa época projetos como o utilitário esportivo Captiva (produzido no México e vendido no Brasil), e o Cruze, sedã fabricado no Brasil.
O aumento da participação coreana no processo de desenvolvimento mundial de veículos da General Motors representa o maior desafio de Rocha. Na presidência da GM Coreia, ele será responsável por uma operação composta por quatro fábricas, que produzem anualmente 2,05 milhões de veículos. Seguindo a vocação local, a GM coreana exporta quase tudo o que produz. Para o mercado local ficaram no ano passado apenas 140 mil unidades. Os 160 destinos externos incluem contratos que já pertenceram à filial brasileira, como México e todos os países andinos.
Além da exportação, a importância da Coreia para a maior montadora do mundo é a participação no desenvolvimento de produto. Ali fica um dos cinco centros de desenvolvimento da GM no mundo. Os demais estão no Brasil, Alemanha e Austrália, além dos EUA. A equipe coreana é responsável pela criação dos carros compactos que a GM venderá em todo o mundo.
Trabalhar na indústria automobilística sempre foi o sonho de Rocha, que nasceu em São Caetano do Sul, onde está a sede da General Motors. Já aos 15 anos de idade, ele conseguiu uma vaga de formação de jovens na Volkswagen. Ali ficou até os 18, quando foi, então, contratado pela GM para trabalhar no desenvolvimento de carrocerias. Para poder estudar engenharia e conseguir continuar trabalhando, conseguiu um curso em meio período em Mogi das Cruzes.
Deslocado para o setor de engenharia experimental, ele começou, então, a vivenciar, de fato, a rotina da concepção dos automóveis. A primeira experiência na área foi com o Monza. Dali, foi para a Alemanha para ser o que a companhia chamava de engenheiro residente. À época, Rocha já havia se casado com Neiva, a "santa", como ele diz, que largou o emprego em recursos humanos da GM para segui-lo mundo afora.
Sentado no sofá da casa que já serviu a uma antiga fazenda de café, no campo de provas que a montadora tem em Indaiatuba, interior de São Paulo, o executivo contou ontem ao Valor que sua missão, na Europa, entre 1993 e 1995, era servir de ponte entre os engenheiros que desenvolviam o modelo Vectra na Alemanha e a equipe brasileira, que devolvia as dúvidas sobre o projeto e pedia adaptações para o mercado e solo brasileiros.
O jeito pausado e calmo com que Sérgio Rocha conta a sua história é algo incomum entre executivos, principalmente os que atuam na área de desenvolvimento. Foi com os jornalistas argentinos que Rocha passou, ontem, boa parte do tempo, durante o evento que a GM organizou na sua pista de testes para o lançamento da nova versão da S-10 para a imprensa do Mercosul.
Foi uma espécie de despedida do povo de um país onde ele já passou duas vezes. Pouco depois de regressar da Alemanha, o engenheiro foi escalado para ajudar na instalação da fábrica de Rosário. "Foi uma época em que vivi a expansão e, logo em seguida, a recessão na Argentina", conta.
Mas aí, ele foi chamado de volta ao Brasil para assumir a direção de planejamento de produto. E dali, então, surgiu a primeira oportunidade para trabalhar na Coreia.
Rocha se emociona ao contar que a maior diferença entre 2006, sua primeira passagem pela Coreia, e agora, é que desta vez ele e Neiva seguem sem as duas filhas. Formada em economia, Lulica, de 23 anos, fica em São Paulo, onde arrumou emprego num grande banco. Já Estela, com 19, preferiu Buenos Aires, onde estuda engenharia civil.
Mas foi depois da primeira passagem pela Argentina que Rocha viveu o que ele chama de "pior momento nos 32 anos de GM". O executivo havia sido deslocado para o centro de desenvolvimento global de produto nos Estados Unidos. Mas a transferência coincidiu com a crise da montadora, que quase foi à falência e a obrigou a pedir dinheiro emprestado ao governo americano e fechar fábricas. "Era muito triste viver num lugar onde as casas iam ficando vazias e as lojas fechavam dia após dia", conta.
Diante das constantes ameaças de encerramento das atividades da GM, aparecia a sua angustia: "Eu não saberia o que fazer porque eu em toda a vida eu só aprendi a trabalhar numa montadora", diz.
Tempos melhores vieram, para a GM, e para Rocha, que voltou para a Argentina em tempos de crescimento da economia, ao fim de 2009.
Mas chegou a hora de arrumar as malas mais uma vez. A família, apesar da dor da separação, sente-se "contente pelo resultado do investimento feito numa carreira". Além das filhas, o executivo deixará outra paixão no Brasil e Argentina: o futebol. Ele gosta de comparar o esporte com o trabalho. Diz que é preciso sempre vestir a camisa de onde estamos. A paixão é tanta que chegou, em dezembro, a fazer a viagem de ida e volta Buenos Aires-São Paulo no mesmo dia só para ver o Corinthians ser campeão. Na Argentina, Rocha se separa da torcida pelo Newell"s Old Boys, o time de Rosário. Como ele mesmo diz, é preciso vestir a camisa de onde se está.

Isela substitui Rocha na Argentina

Por De Indaiatuba

Certo dia, quando acabara de assumir a direção de planejamento de produto no Brasil, Sérgio Rocha decidiu fazer uma pesquisa no chamado banco de talentos da montadora. Encontrou uma estrela que destacava o currículo de Isela Costantini.
O histórico da curitibana chamou sua atenção. A moça era formada em publicidade, mas estava trabalhando na área de manufatura em uma fábrica da GM nos Estados Unidos. "Pareceu-me uma pessoa eclética e com vivência internacional, algo necessário para conviver numa equipe de planejamento", conta Rocha.
Os dois próximos embarques de executivos que deixam a filial brasileira - Isela para Buenos Aires e Rocha para Seul - foram, de certa forma, orquestrados pelo colombiano Jaime Ardila, presidente da montadora na América do Sul. Ardila usou o peso de sua participação no conselho mundial da companhia e o poder na região para indicar os dois para os cargos.
Aos 40 anos de idade, Isela segue para Buenos Aires com Lorena, a filha de sete anos de idade, Luca, o filho, com cinco, e a "super" babá Zenilda. O marido, Samuel Russell, que ela conheceu na GM e que trabalha na área de marketing e vendas da montadora, fica no Brasil.
O casal já está habituado a passar vários dias do mês longe um do outro. Daqui para a frente não será pior. Buenos Aires é até mais próxima de São Caetano do Sul do que as cidades do Norte e Nordeste do Brasil, para onde Samuel tem ido com frequência ultimamente.
"Esse é o melhor modelo de família? Não. Mas já sabemos conviver com ele", diz a executiva, que completou 13 anos e meio de GM. A Argentina tem seus atrativos. Os pais de Isela nasceram em San Juan, cidade próxima de Mendoza e foi depois de uma lua de mel encaixada no processo de residência no Hospital das Clínicas, em São Paulo, que o pai, médico cardiologista, decidiu ficar no Brasil.
Isela nasceu brasileira, mas viveu na Argentina também. Foi, no entanto, nos tempos que foi para os Estados Unidos fazer um curso de especialização em marketing que seus trabalhos de pesquisa chamaram a atenção da direção da GM do Brasil pela primeira vez.
Ela estava apresentando um desses trabalhos numa feira quando caçadores de talentos da GM do Brasil apareceram, em busca, justamente, dos jovens que costumavam se formar no Brasil e fazer especialização nos Estados Unidos.
Ela aceitou o primeiro trabalho na área de marketing, no Brasil, mas, em pouco tempo, diante da grandiosidade e complexidade da fabricante de veículos, percebeu que tinha mais a aprender e desenvolver no trabalho com carros. Um dos primeiros desafios que apareceram foi montar a estratégia da primeira venda de automóvel brasileiro pela internet - o Celta.
Quando Samuel, então seu namorado, decidiu fazer seu MBA nos Estados Unidos, Isela seguiu junto, conseguindo uma transferência para um programa de treinamento na área de funilaria, pintura e robôs numa fábrica da GM.
A publicitária brilhou no chão de fábrica no dia em que lhe entregaram um projeto de torque de pressão de parafuso. "Meu projeto virou destaque", conta. Mas o momento mais inusitado, que a faz rir muito até hoje, foi quando uma supervisora a apresentou à equipe da fábrica como engenheira mecânica. O engenheiro da casa é Samuelsson. Mas, ironicamente, é ele que "virou marqueteiro" na GM.
Isela, de fato, fala sobre muitas coisas como se fosse engenheira. Mas sabe contar com precisão tudo sobre planejamento, que ela aprendeu com Rocha. A habilidade para fuçar o trabalho de uma suposta engenheira somada ao conhecimento de pesquisa e planejamento e ainda um toque de marketing fazem da executiva uma profissional apta para ser presidente de uma filial da montadora.
Simpática e carismática, a risonha Isela é respeitada por toda a equipe da GM, incluindo Grace Lieblein, escolhida por Ardila para assumir, há oito meses, a GM do Brasil. "Estamos respondendo ao desejo da GM de trabalhar com a diversidade de culturas e de colocar mais mulheres em posições de comando", diz Ardila. "Desde que estejam preparadas daremos preferência às mulheres." (MO)

MP barra projeto da Triunfo

Por Fernanda Pires | Para o Valor, de Santos

O procurador da República em Santos (SP), Luís Marrocos de Araújo, acredita na ocorrência de "falha" do Ibama no licenciamento para construção de um terminal portuário no Largo de Santa Rita, no estuário de Santos. Na semana passada, o Ministério Público Federal (MPF) entrou com uma ação civil pública para impedir qualquer intervenção na área, classificada como um dos mais importantes "santuários ecológicos" do país. Na ação, o procurador pede o cancelamento da licença prévia emitida pelo órgão em abril de 2011.
A autorização do Ibama foi concedida à Triunfo Participações e Investimentos, cujo projeto é construir um complexo multiuso privativo para contêineres, granéis líquidos e sólidos.
"Acredito que pode ter ocorrido falha no processo de licenciamento ambiental. E também um entendimento jurídico equivocado do Ibama em relação à Lei de Mata Atlântica", disse Araújo em entrevista ao Valor.
Segundo o procurador, a região diferencia-se de todas as demais do estuário por suas "excepcionais funções ecológicas", o que inclui manguezais ainda preservados. O local é destino migratório de aves vindas de várias regiões do continente Americano. "No Largo de Santa Rita, a profundidade média é de dois metros. É ali que se reproduzem os peixes. Eles querem rebaixar para 15 metros", diz Araújo.
A Triunfo afirmou que o projeto teve licença prévia concedida pelo Ibama e que não foi notificada a respeito de ação movida pelo MPF.

FINANÇAS
Grécia atende a novas exigências

Por Agências internacionais

Em teleconferência com ministros das Finanças da zona do euro, Fundo Monetário Internacional e Banco Central Europeu, ontem, a Grécia se comprometeu a entregar um corte adicional de gastos de € 325 milhões neste ano. Evangelos Venizelos, ministro das Finanças da Grécia, afirmou que o país atendeu às exigências para receber o segundo resgate, de € 130 bilhões, avaliação confirmada pelo presidente do Eurogrupo, Jean Claude Juncker. "Atenas cumpriu todas as etapas para que o acordo seja fechado." Segundo ele, a decisão será tomada em encontro no dia 20.
Mais cedo, no entanto, circulou a informação de que alguns países examinavam formas de retardar partes ou até todo o segundo programa de socorro. O atraso no pacote poderia se estender até as eleições gregas em abril. A ideia, entretanto, não era defendida por todos os integrantes da união monetária. Adicionalmente, alguns países, Alemanha à frente, pressionam para que a Grécia adie as eleições e instale um governo de técnicos.
Um cronograma a que o "Financial Times" teve acesso indicava que os parlamentos europeus poderiam receber nos próximos dias uma proposta para aprovar ajuda de € 93,5 bilhões para iniciar a reestruturação da dívida, mas que o restante dos recursos ficaria para início de março. Antes da teleconferência, Venizelos acusou "forças na Europa" de estarem empurrando a Grécia para fora do euro.

Governo quer monitorar derivativos

Por Thiago Resende e Lucas Marchesini | De Brasília

O governo criou grupo técnico para avaliar medidas que aumentam o monitoramento do mercado de derivativos no país. A equipe, composta por representantes do Ministério da Fazenda, do Banco Central e da Comissão de Valores Mobiliários (CVM), tem o objetivo de "monitorar a evolução das exposições financeiras das empresas e instituições participantes" nesses tipos de operação, segundo portaria interministerial publicada ontem no Diário Oficial da União.
O secretário-executivo adjunto do Ministério da Fazenda, Dyogo Oliveira, disse o grupo de trabalho vai "estudar e propor medidas que visam o crescimento" do mercado de derivativos. Esses tipos de operações "são fundamentais para o funcionamento do mercado financeiro, mas eles têm que funcionar com segurança e transparência", completou.
A ideia, portanto, é concentrar os dados que os integrantes do grupo, outros órgãos do governo e entes privados, como a BM&FBovespa, detêm. "Nós entendemos que há uma dispersão dessa informação. Os órgãos precisam se coordenar e trocar informações rotineiramente", explicou.
Na comparação com Estados Unidos e Europa, o Brasil tem maior nível de exigência de informações sobre o mercado derivativo. Atualmente, a coleta de dados "já é bastante satisfatória", disse. Além disso, ele explicou que a decisão "é coerente com o que há em discussão internacionalmente, mas não é derivado de nenhuma determinação".
A decisão de criar o grupo "não está associada a nenhum comportamento dos agentes do mercado", reforçou. "Não sei se há outros membros do governo que consideram que há uma ação especulativa hoje no mercado financeiro", disse.
As medidas tomadas no ano passado, segundo Oliveira, como elevação do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em operações de derivativos cambiais, resultaram em uma redução "substancial" das exposições. Ele afirmou ainda que a intenção do governo em criar um grupo de trabalho para estudar o mercado de derivativos não é aumentar a regulação do setor. "Agência reguladora não é necessário", afirmou.
Em consequência da crise de 2008, empresas como Sadia, Aracruz e Votorantim registraram perdas por causa de operações com derivativos cambiais. Sem citar nome dos envolvidos, Oliveira considerou: "houve um grupo de empresas que estavam expostas aos derivativos tóxicos, mas não causou nenhum problema grave à economia brasileira".
Questionado sobre a possibilidade de criação de uma bolsa de derivativos agrícolas, o secretário-executivo adjunto disse que não tem conhecimento da proposta e, portanto, limitou-se a comentar que a ideia pode estar em debate em outras partes do governo. No início do mês, o Valor informou que a preocupação com o desempenho das exportações de commodities e com a volatilidade de preços fez o governo acelerar estudos para a criação de uma bolsa de negociação de contratos futuros dessas mercadorias.
No mercado, a iniciativa foi vista com cautela, em razão da amplitude da portaria. Para um executivo, a medida pode representar desde uma intenção do governo de estimular esse mercado até a de ampliar os mecanismos de controle, a exemplo da cobrança do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) em derivativos cambiais.
Durante entrevista para comentar os resultados de 2011, o presidente da BM&FBovespa, Edemir Pinto, elogiou a portaria, e defendeu também a adoção de políticas públicas para estimular o mercado de derivativos agrícolas no Brasil. Embora esteja entre os maiores produtores de vários insumos como açúcar e soja, a negociação de contratos ligados a commodities no mercado financeiro é concentrada no exterior.
Para Edemir, não é simples transferir a liquidez de centros de negociações já estabelecidos. "No caso da soja, estamos falando de um mercado com mais de 300 anos nas bolsas americanas", afirmou. Além do incentivo do governo, o presidente da bolsa defendeu a maior participação dos bancos nesse mercado. (colaborou Vinícius Pinheiro)

Zoellick deixará Banco Mundial

Por Alex Ribeiro | De Washington

O presidente do Banco Mundial, Robert Zoellick, anunciou ontem que vai deixar o cargo em junho, reabrindo a discussão sobre o monopólio europeu e americano no comando das duas instituições criadas pelo acordo de Bretton Woods. Fontes de organismos multilaterias ouvidas pelo Valor afirmam que são remotas as chances de os Estados Unidos abrirem mão de indicar o sucessor. Os candidatos mais citados em Washington são o ex-conselheiro econômico da Casa Branca, Larry Summers, e a secretária de Estado, Hillary Clinton.
Também integra a bolsa de aposta a subsecretária para assuntos internacionais do Tesouro americano, Lael Brainard, que teoricamente é quem vai conduzir dentro do governo americano o processo de escolha do novo presidente do Banco Mundial.
Por um acordo não escrito, a Europa sempre fez o diretor gerente do FMI, enquanto que aos EUA cabe indicar o presidente do Banco Mundial, além do segundo cargo mais importante na administração do fundo. Juntos, Europa e EUA têm votos suficientes para escolher sozinhos os postos-chave nesses organismos.
O arranjo passou a ser questionado nos últimos anos, depois que Europa e EUA foram atingidos por uma grave crise financeira e economias emergentes se tornaram motores do crescimento mundial. Isso não impediu, porém, que no ano passado a Europa voltasse a fazer valer o contrato informal com os americanos, colocando a ex-ministra de finanças da França, Christine Lagarde, no topo do FMI, substituindo o também francês Dominique Strass-Kahn. Os EUA escolheram o ex-assessor da Casa Branca, David Lipton, para o segundo posto mais importante, substituindo John Lipsky.
A saída de Zoellick, que encerrará seu mandato de cinco anos, já era amplamente esperada. Ele subiu ao cargo em 2007, no governo republicano George W. Bush, partido com qual tem vínculos históricos, e tinha poucas chances de ser apontado a um segundo mandato pelo presidente Barack Obama.
Em carta aberta divulgada no ano passado, países emergentes que compõem os Bric (Brasil, Rússia, Índia e China) questionaram o monopólio europeu e americano no comando das instituições de Bretton Woods e demandaram um processo baseado no mérito, sem vínculo de nacionalidade.
Obama tem poucos incentivos para abrir mão do controle do Banco Mundial, depois de os europeus terem garantido Lagarde no FMI. Congressistas americanos, sobretudo republicanos, têm insistido na tese de que os EUA devem manter seu poder nos organismos de Bretton Woods. Obama, que disputa a reeleição neste ano, tem sido acusado pelos oponentes republicanos de ceder poder aos organismos multilaterais e de adotar a filosofia de "liderar de trás".
A sucessão, porém, deverá ser um pouco mais transparente do que nas vezes anteriores. Ontem, ao comunicar a saída de Zoellick, o organismo se comprometeu a conduzir um processo de seleção "aberto, transparente e baseado no mérito". Se a eleição de Lagarde serve como exemplo, o candidato americano vai fazer visitas a sócios importantes do Banco Mundial, sobretudo emergentes como Brasil e China. Também é possível que surjam outros pretendentes. O presidente do Banco Central do México, Agustín Carsten, disputou o comando do FMI com Lagarde.
A decisão fará com que o governo aproveite para articular uma candidatura comum aos países emergentes no fim do mês. "Queremos que os países emergentes tenham as mesmas condições de pleitear (a presidência do Banco Mundial", comentou o ministro da Fazenda, Guido Mantega.
"Encorajamos o conselho [do Banco Mundial] a seguir adiante com um processo aberto e rápido", declarou o secretário do americano Tesouro, Timothy Geithner. "Nas próximas semanas, planejamos apresentar um candidato com a experiência e as qualidades requeridas para levar essa instituição adiante."
Divididos em interesses conflitantes, porém, os países preferiram negociar pontos programáticos e cargos com Lagarde a apoiar Carstens. A China, por exemplo, emplacou Zhu Min para o terceiro posto na hierarquia do Fundo, sucedendo o brasileiro Murilo Portugal.
(Colaboraram Sergio Leo e João Villaverde, de Brasília)

Armadores, políticos e padres mantêm privilégio

Por De Genebra

Em outubro do ano passado, o jornal popular alemão "Bild" publicou em manchete que os gregos tinham € 200 bilhões escondidos nos bancos suíços, sugerindo assim que Atenas não precisava de ajuda europeia. Autoridades gregas dizem que a cifra é exagerada, mas admitem que a fuga de capital só cresce. Segundo o ministro de Finanças, Evangelos Venizelos, o valor era de € 5,4 bilhões em 2009 e acelerou com a crise. Em 2010, mais de € 33 bilhões teriam sido retirado das contas de bancos gregos, segundo o banco central.
Também a manutenção de privilégios para alguns setores do país ajuda a explicar a reação de parte da Europa a mais ajuda. Em meio às revoltas de rua em Atenas contra a austeridade, uma instituição ficou totalmente calada: a poderosa igreja ortodoxa.
Isso se explica pelo fato de a igreja ter escapado até agora de maior rigor. Uma nova taxa sobre a terra afeta todos os gregos, mas isenta a igreja ortodoxa, que é, porém, a segunda maior proprietária de terras do país, com um patrimônio avaliado em mais de € 1 bilhão.
Os padres são funcionários públicos e o salário, mesmo reduzido agora, ainda é de causar inveja. A lista de privilegiados inclui os armadores gregos. A navegação marítima contribui com 6,7% do PIB do país, mas as atividades dos armadores são isentas de impostos. Seus acionistas tampouco pagam taxa sobre o dividendo.
Médicos, advogados, Exército - todo mundo tem algum privilégio adicional sobre o resto da população. Mas os políticos ganham de todo mundo. O salário de um deputado grego alcançaria € 18 mil por mês, quase duas vezes o que ganha um deputado alemão, incluindo a montanha de ajudas que recebem. Seus privilégios chegam a ganhar dos parlamentares brasileiros. Eles têm, inclusive, direito a empréstimos bancários livres de juros.
A impaciência europeia se explica também pelo número extravagante de funcionários públicos - são quase 1 milhão num país de 11 milhões de habitantes. Uma fonte em Atenas conta que um ministro chega a ter até 15 motoristas à sua disposição. É que cada ministro que assume nomeia um novo motorista, mas não demite o anterior.
Constrangido, na defesa do novo pacote de austeridade, Venizelos, que também é líder do partido socialista, fez um gesto quase heroico esta semana: propôs abandonar seu salário como gesto simbólico. A estimativa é de que um ministro ganhe € 280 mil por ano, coisa de país rico. (AM)

INVESTIMENTOS
Dividendo na bolsa local é o mais atrativo entre os Bric

Por Luciana Monteiro e Beatriz Cutait | De São Paulo

Mesmo após a valorização superior a 14% do Índice Bovespa no ano, a bolsa brasileira ainda se mostra atrativa ao investidor em relação a outros mercados emergentes. Entre os países que compõem o grupo dos Bric (sigla para Brasil, Rússia, Índia e China), o Ibovespa é aquele que apresenta o maior retorno médio com dividendos para os investidores. Além disso, o mercado acionário local está mais barato que a média de outros emergentes. Isso quer dizer que o investidor pode sair comprando tudo, sem realizar muita análise? Não é bem assim.
Estimativas da Ágora Corretora mostram que o retorno apenas com dividendos - o chamado "dividend yield" - projetado para o Índice Bovespa neste ano é de 3,6%, em média. O valor está acima dos 2% registrados pela Rússia, enquanto a bolsa da China apresenta "dividend yield" médio de 1,6% e a da Índia, de 1,5%.
O estudo elaborado por José Francisco Cataldo, estrategista do segmento de varejo da Ágora, comparou o retorno com dividendos de 11 países e avaliou principalmente a atratividade do Brasil ante os mercados emergentes mais relevantes. O analista, no entanto, incluiu as bolsas de Portugal e Grécia no levantamento, dada as fortes quedas registradas no ano passado e por conta da situação de alto endividamento dos dois países.
O retorno apenas com dividendos estimado para o mercado brasileiro só perde para os "dividend yields" projetados para as bolsas da Tailândia (3,9%) e Portugal (5,7%). Mesmo após a valorização do Ibovespa, as empresas brasileiras ainda pagam proventos maiores que as companhias dos principais emergentes, ressalta Cataldo.
Pelas estimativas do BofA Merrill Lynch, o "dividend yield" para o Ibovespa é de 3,7% ante 2,8% dos emergentes. É possível, no entanto, que o investidor consiga retornos com dividendos ainda maiores em casos específicos, próximos de 5% e 6%, afirma Pedro Martins, estrategista de renda variável para América Latina da instituição.
Quando se fala em Preço/Lucro (P/L, indicador que dá uma ideia do prazo para o investidor ter retorno dos papéis), o Ibovespa também se mostra ainda bastante atraente. Quanto menor essa relação, melhor. Esse indicador da bolsa brasileira se mostra mais alto apenas que os das bolsas da Rússia e de Hong Kong. O P/L do mercado acionário brasileiro é de 10,8 vezes, enquanto o russo está em 5,8 vezes e o de Hong Kong, em 9,4.
"Mesmo após vários pregões de alta, o Brasil ainda se mostra mais atrativo e abaixo da média dos outros países", ressalta Cataldo, da Ágora. Entre os emergentes analisados, a bolsa da Índia é a que se mostra mais cara, com P/L de 17,6 vezes.
À primeira vista, apesar de o Ibovespa ter apresentado uma das maiores valorizações entre os mercados acionários mundiais neste ano, a bolsa brasileira ainda não está cara, afirma Martins, do BofA. O investidor, no entanto, deve manter uma certa cautela, pois o fluxo de recursos para o Brasil ocorreu de maneira muito forte e rápida, abrindo espaço para a realização de lucros. Só para se ter ideia, no acumulado do ano, o saldo (aplicações menos resgates) de investimento estrangeiro na bolsa estava positivo em R$ 7,644 bilhões até o dia 13 de fevereiro.
Pelos cálculos do BofA, o P/L da bolsa local projetado para os próximos 12 meses é de 9,9 vezes ante 10,4 dos emergentes e de 11,5 vezes no mundo. Observando-se o P/L histórico do Ibovespa, é possível perceber também que não há sobrevalorização, diz Martins, lembrando que a média histórica do indicador é de 11 vezes.
Embora a bolsa brasileira ainda se mostre atrativa, isso não quer dizer que o investidor deva aplicar em ações de "olhos fechados", sem fazer uma seleção, avalia Martins. Para o estrategista do BofA, alguns segmentos se mostram particularmente interessantes na bolsa. O primeiro é o daqueles beneficiados pelo movimento de queda da taxa básica de juros, como os bancos e construtoras. O segundo, dos setores que pegam carona no crescimento da economia brasileira, como infraestrutura e consumo básico. "Mantemos uma visão positiva para a bolsa, embora no curto prazo a postura seja de cautela dado o movimento forte e intenso dos estrangeiros, sobretudo em janeiro", afirma.
Para parte do mercado, os papéis que não estão na linha de frente podem ser ainda mais interessantes. "Se o objetivo é montar uma carteira, o investidor deve aumentar sua exposição nas ações de segunda linha "nobres", pertencentes a empresas fortes, que, por uma conjuntura adversa do cenário externo, foram muito castigadas", diz Alexandre Espirito Santo, economista da Way Investimentos e professor do Ibmec-RJ.
Neste campo, destaque para setores como construção civil, siderurgia, aviação e educação. Apesar do espaço de alta da bolsa brasileira, Espírito Santo ressalta que o mercado realmente já registrou P/Ls mais altos, porém em contextos diferentes. "A situação atual não permite desafios; ainda falta muito para termos conforto total para comprar bolsa e abraçar", diz o economista. "Mas poderemos ter ao longo do ano uma alta para levar o Ibovespa a buscar os 75 mil ou 80 mil pontos, se nada trágico vier da Europa. E, com o juro caindo mais, as pessoas vão querer correr um pouco mais de risco e colocar recursos na bolsa."
Para o economista da Way, o portfólio ideal atual teria 35% dos investimentos alocados em renda variável e 65% em títulos prefixados, de olho no ciclo de queda da taxa básica de juros.
O mercado acionário brasileiro teve a disparada de início de ano principalmente por conta do desempenho das empresas com beta - coeficiente que mede a relação do retorno de uma ação comparado ao de um índice de mercado - elevado, o que abrange as ligadas às commodities. Agora o cenário é outro, ressalta Mohamed Mourabet, diretor da Victoire Brasil Investimentos.
"Atualmente, quem quer investir na bolsa precisa entender muito bem o que ocorre operacionalmente na empresa, conhecer o setor e identificar seu potencial de alta", diz Mourabet.
Na avaliação da Victoire, é interessante para o investidor neste momento buscar empresas com crescimento orgânico e certa resiliência de margem ou ainda companhias com boa administração, que conseguem crescer por meio de aquisições. Ações como Santos Brasil, Iochpe-Maxion e Marcopolo estão entre as preferidas da asset.
Mourabet lembra, no entanto, que a comparação do Ibovespa com o mercado acionário da Rússia pode trazer distorções. Isso porque as companhias de petróleo e gás respondem por quase 70% da bolsa russa. "As empresas de commodities são negociadas com múltiplos [parâmetros usados para avaliar se uma ação está cara ou barata] baixos historicamente". Segundo ele, para analisar o universo brasileiro e compará-lo ao resto do mundo, é preciso excluir essas empresas, que têm uma dinâmica própria. Desta forma, o Ibovespa em si está num preço justo. "Há um potencial de alta baixo, mas, mais do que nunca, temos a convicção de que empresas específicas contam com um potencial de valorização muito maior", ressalta.

AGRONEGÓCIOS
Abertura de capital da Embrapa ganha impulso

Por Tarso Veloso | De Brasília

O projeto de lei que pretende abrir o capital da estatal Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa) e transformá-la em uma sociedade de economia mista recebeu voto favorável do senador Gim Argello (PTB-DF), relator do projeto na Comissão de Assuntos Econômicos (CAE) do Senado, no dia 1º de fevereiro. Depois de apreciado pelo plenário da CAE, o texto seguirá para a Comissão de Constituição e Justiça (CCJ), onde será votado em caráter terminativo. Se for aprovado na CCJ, seguirá diretamente para a Câmara.
Mesmo que a transformação da Embrapa receba sinal verde definitivo no Congresso, o Projeto de Lei 222/2008, de autoria do Senador Delcídio Amaral (PT-MS), prevê a manutenção de seu controle nas mãos da União, que preservaria mais de 50% das ações com direito a voto. Para Amaral, a capacidade de investimento da estatal foi sendo reduzida nos últimos anos e uma injeção de recursos privados pode viabilizar o aumento de suas pesquisas. Atualmente, a Embrapa usa mais de 70% de seu orçamento para cobrir custos de pessoal e encargos.
A discussão se arrasta há anos. Em agosto de 2009, a Comissão de Agricultura e Reforma Agrária (CRA) votou pela rejeição do projeto. Após a decisão da CRA, o PL foi submetido à Comissão de Assuntos Econômicos (CAE), em setembro de 2009. Ficou parado e, em 17 de março de 2011, o presidente da comissão, Delcídio Amaral designou o colega Gim Argello para a relatoria.
O parecer da CRA, com relatoria do ex-senador Expedito Júnior (PSDB-RO), afirmou que a abertura de capital da Embrapa à iniciativa privada diminuiria da atuação da estatal em projetos de caráter social, e que tal medida poderia colocar em risco o grau de desenvolvimento da pesquisa agropecuária nacional. A CRA não constava no despacho inicial de distribuição do PL e só tramitou por ela após requerimento.
Em seu voto, o relator Gim Argello discorda do argumento e diz que "a alocação de recursos para pesquisa agropecuária tem sido muito prejudicada e tende a continuar assim. Portanto, novas soluções para o financiamento da pesquisa devem ser encontradas". Segundo o relator, com a mudança serão feitos mais investimentos "Não se muda time que está ganhando. Vamos manter as coisas boas e melhorar as que precisam ser melhoradas", disse.
O próprio Amaral reconhece que o projeto é polêmico. "É polêmico e prudente. Vamos abrir para dinheiro privado, mas com o controle do governo", afirmou. O senador cita a Petrobras como exemplo e disse que ainda vai se reunir com a Embrapa para discutir mudanças no texto. "Vamos permitir uma valorização dos servidores da Embrapa e vamos nos reunir com membros da estatal para fazer ajustes no texto".
O relator afastou a hipótese de que multinacionais que eventualmente comprem muitas ações possam colocar pressão para que sejam realizadas pesquisas somente em áreas de interesse comercial. "As empresas não têm interesse em investir na Embrapa. Elas já possuem grandes laboratórios e equipes de cientistas", disse Argello.
O relator também deixou claro que os recursos genéticos depositados nos bancos de pesquisas da Embrapa distribuídos pelo país terão seu valor calculado pelos técnicos da instituição. "Eu acredito que isso vale tanto quanto diamante e não tem como mensurar", afirmou ele.

Padrão do biodiesel em fase final de discussão

Por Luiz Henrique Mendes | De São Paulo

A Agência Nacional de Petróleo (ANP) realiza hoje a última audiência pública sobre o novo padrão de qualidade do biodiesel brasileiro. Prevista para entrar em vigor no próximo mês de março, as especificações ainda encontram divergências entre os produtores, que trabalham por alterações no texto apresentado pela ANP no fim de 2011.
"Concordamos com a proposta de avançar em novas especificações, mas achamos o padrão exigido muito rígido", afirmou ao Valor o presidente da Associação dos Produtores de Biodiesel do Brasil (Aprobio), Erasmo Battistella, que apresentou as reivindicações do setor ao presidente da ANP, Helder Queiroz, em reunião realizada em janeiro.
Fundamentalmente, a Aprobio discorda dos níveis de umidade e temperatura propostos pela agência reguladora, afirmou Battistella. No caso do primeiro, a ANP pretende reduzir a concentração de água no biodiesel dos atuais 500 ppm (partes por bilhão) para 200 ppm. "Nós conseguimos produzir nesse patamar, mas é impossível manter esse teor de água ao longo da cadeia", argumentou ele.
O biodiesel, explicou o presidente de Aprobio, é um combustível higroscópico, que absorve a umidade do ar. "No momento que você faz o transporte do produto, ele pode absorver um pouco de água", justificou o dirigente. Diante disso, a associação sugeriu um nível intermediário de 350 ppm, o que "já colocaria o Brasil como o biodiesel com menor teor de água do mundo", disse Battistella.
A Aprobio também considerou o novo padrão de temperatura do combustível "demasiadamente baixo". "As temperaturas colocadas pela ANP inviabilizaram o uso de gordura animal na mistura do biodiesel", afirmou o representante. Segundo ele, a atual resolução trabalha com um ponto de entupimento (congelamento) de 19º Celsius. No novo padrão, que contém uma tabela de temperatura que varia de acordo com a região e o período do ano, pode chegar a 0º Celsius.
"Se a regra for levada ao pé da letra, a região Sul não utilizaria mais gordura animal durante todo o período do inverno e parte de outono, aumentando os custos do produtores", disse Battistella, explicando que a gordura animal (sebo bovino) - matéria-prima usada em 15% da produção total do biodiesel -, tem preços entre 10% e 12% mais baixos do que o óleo de soja, insumo responsável pela maior parte da produção do combustível. "A Europa trabalha com temperaturas superiores até no verão", disse.
Apesar da críticas, Battistella se disse favorável à proposta de uma tabela de temperatura variável. "Mas sugerimos que ela fique em torno de 20% acima do proposto pela ANP", revelou.
Além das discussões sobre o padrão de qualidade, a Aprobio trabalha junto à Frente Parlamentar em Defesa do Biodiesel na criação de um novo marco regulatório para o segmento, que elevaria a participação do biodiesel no diesel comum dos atuais 5% para 10% em 2014 e para 20% até 2020.
Ontem, o presidente da frente parlamentar, deputado Jerônimo Goergen (PP-RS), foi informado por técnicos da Casa Civil que o novo marco regulatório será enviado ao Congresso Nacional no início de março. (Colaborou Tarso Veloso, de Brasília)
JBS arrenda quatro unidades e eleva em 10% sua capacidade total no país

Por Gerson Freitas Jr. | De São Paulo

A processadora de carnes JBS acertou nesta semana o arrendamento de quatro frigoríficos, com capacidade de abate total de 3.050 cabeças por dia, junto ao grupo Guaporé Carne, de Mato Grosso. Com o negócio, a empresa amplia em 10% sua capacidade diária de abate bovino no Brasil, atualmente estimada em cerca de 30,7 mil cabeças.
Procurada, a processadora declarou que não iria comentar a informação. Os representantes do Guaporé também foram procurados, mas não atenderam à reportagem. Os valores da transação ainda são desconhecidos.
As unidades arrendadas estão localizadas nos municípios de Confresa, Juína, Colíder, todos no norte de Mato Grosso, e em São Miguel do Guaporé, em Rondônia. Segundo o Valor apurou, as plantas mato-grossenses eram operadas pelo frigorífico Independência até 2009, quando foram devolvidas aos controladores do Guaporé. O Independência está em recuperação judicial há dois anos.
A transação indica uma mudança de postura da JBS. Após um ano dedicado a "arrumar a casa", cortar custos e integrar as empresas adquiridas nos anos anteriores, a processadora está definitivamente de volta ao mercado.
Na semana passada, o presidente da JBS, Wesley Batista, disse ao Valor que o grupo estaria "aberto a oportunidades" em 2012. "No ano passado, nossa posição era "não quero nem ouvir". Agora mudamos para "podemos conversar, mas continuamos focados no nosso negócio"", afirmou o executivo.
Especulações sobre a movimentação da companhia têm ganhado força, especialmente após o anúncio oficial da separação e abertura de capital de sua unidade de lácteos, a Vigor Alimentos, na semana passada.
Atualmente, a JBS opera 11 frigoríficos em Mato Grosso e mais dois em Rondônia. Com os novos ativos, a companhia passa a ter 39 unidades de abate no Brasil. Nos seis países em que atua, são 62 plantas, com capacidade de abate total estimada em 87,2 mil cabeças por dia.
Já o Guaporé Carne, até então o maior frigorífico da região, fica com apenas uma unidade em Mato Grosso, no município de Pontes e Lacerda, uma em Rondônia (Extrema) e uma no Pará (Castelo dos Sonhos). Segundo fontes de Mato Grosso, não havia sinais de que a empresa passava por problemas financeiros e precisasse arrendar ativos. "O Guaporé tem a fama de só pagar à vista. Para o pecuarista, isso é um sinal de segurança", afirma uma delas.
Em contrapartida, o frigorífico sofre com problemas de ordem trabalhista. Em agosto passado, a Justiça do Trabalho de Mato Grosso determinou a interdição temporária do setor de embalagens da unidade de Confresa devido à falta de segurança.
Três meses antes, dois trabalhadores morreram e três ficarem feridos na unidade de Colíder em um acidente no tanque de resíduos de animais.
No fim do ano passado, o Ministério Público do Trabalho de Rondônia pediu à Justiça do Trabalho a condenação do frigorífico por dano moral coletivo, em meio a denúncias de jornadas de trabalho excessivas, adulteração de registros de ponto e coação dos empregados.

Doux Frangosul reduz abates e suspende parte da produção

Por Sérgio Ruck Bueno | De Porto Alegre

A combinação dos atrasos dos pagamentos aos criadores integrados - que se arrastam há três anos e geraram um débito estimado pelos produtores em até R$ 50 milhões - com a redução da demanda doméstica por carnes, no início do ano, afetou as operações da Doux Frangosul, no Rio Grande do Sul. A empresa suspendeu a produção de embutidos e empanados, reduziu abates de suínos e aves e colocou parte dos funcionários em férias coletivas no Estado.
Conforme o presidente do Sindicato dos Trabalhadores na Indústria da Alimentação de Montenegro, João Marcelino da Rosa, as linhas de embutidos e empanados da Doux permanecerão paradas entre os dias 13 e 26 deste mês. Na mesma cidade, sede da empresa, o abate de frangos caiu 30% ante a média normal de 450 mil cabeças, por dia, desde 23 de janeiro, e deve se manter reduzida pelo menos até o fim de março.
"Com os atrasos dos pagamentos os integrados não alojam pintos e faltam aves para abate", explicou o sindicalista. Segundo ele, 340 funcionários do terceiro turno do frigorífico de frangos entraram em férias coletivas no fim de janeiro e um contingente semelhante, que trabalha no segundo turno, deve parar no fim deste mês. Nas linhas de empanados e embutidos, quase 300 empregados foram colocados em licença remunerada.
De acordo com Marcelino da Rosa, Montenegro concentra 2,2 mil dos 9 mil funcionários da Doux no país. Em Caxias do Sul, onde trabalham 700 pessoas, o abate de suínos, que nas últimas semanas caiu de 3,2 mil para 2,8 mil cabeças, por dia, já parou parcial ou totalmente durante quatro dias ao longo desta semana e da passada, informou o diretor do sindicato dos trabalhadores da cidade, Nereu Zenato. Em Passo Fundo, a planta que emprega 1,2 mil pessoas segue abatendo 400 mil aves/dia, disse o presidente do sindicato local, Miguel dos Santos.
Em 25 de janeiro, 13 dos 42 donos de unidades produtoras de leitões (UPLs) que trabalham para a empresa no Estado também obtiveram liminar na Justiça que permite a retenção de matrizes de suínos da Doux como garantia para créditos atrasados estimados em R$ 2 milhões. O presidente da Associação dos Criadores de Suínos do Rio Grande do Sul (Acsurs), Valdecir Folador, calcula que esses produtores reúnem de 13 mil a 15 mil matrizes, de um total de 34 mil no Estado.
Agora, os criadores estudam ingressar com uma ação de cobrança contra a empresa. Segundo ele, a Doux está pagando os integrados cinco meses após receber os animais para abate, ante os 30 dias previstos em contrato. Folador estima que as dívidas da multinacional francesa com os 2 mil integrados no Estado somem entre R$ 40 milhões e R$ 50 milhões.
"A situação está insustentável", afirma o assessor de política agrícola da Federação dos Trabalhadores na Agricultura do Estado (Fetag-RS), Airton Hochscheid. De acordo com ele, os pagamentos da Doux aos criadores de frangos já estão demorando mais de 160 dias depois da entrega dos lotes de animais e 50% dos produtores integrados de aves já suspenderam os alojamentos para a empresa.
Mas a redução das atividades da Doux Frangosul não está relacionada apenas aos problemas com os criadores. De acordo com o diretor executivo do Sindicato das Indústrias de Produtos Suínos no Estado (Sips), Rogério Kerber, a demanda doméstica por carne suína e de aves tradicionalmente cai 25% no primeiro trimestre em comparação com a média anual, depois do pico de consumo dos três últimos meses de 2011. Em São Paulo, os preços pagos aos produtores na primeira quadrissemana de fevereiro caíram 27% no caso dos frangos e 10,8% no caso dos suínos, conforme o Instituto de Economia Agrícola (IEA) da Secretaria da Agricultura do Estado.
Em janeiro, o governo gaúcho chegou a fazer uma representação ao Ministério Público Estadual (MPE) pedindo a apuração de eventuais irregularidades cometidas pela Doux, incluindo, além dos pagamentos atrasados, a remessa de recursos para a matriz, na França. O MPE, que já fez uma reunião preliminar com a empresa, aguarda um cronograma de pagamento aos integrados e estuda a própria competência para atuar no caso. Procurada, a Doux não se manifestou até o fechamento desta edição.

LEGISLAÇÃO & TRIBUTOS
Empregado que adere a PDV não recebe seguro-desemprego

Por Maíra Magro | De Brasília

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) concluiu que o trabalhador que aderir a um plano demissão voluntária (PDV) não tem direito ao seguro-desemprego. A decisão foi tomada na semana passada durante o julgamento de um processo contra o antigo Banespa, pela Subsessão 1 Especializada em Dissídios Individuais (SDI-1), responsável por uniformizar o posicionamento das turmas do TST.
Depois de uma onda de PDVs na década de 90 - quando empresas públicas reduziam seus quadros para ser privatizadas e grandes companhias diminuíam gastos para se tornar mais competitivas - ex-empregados começaram a entrar na Justiça do Trabalho questionando aspectos relacionados a esses planos.
Um deles é a recusa das empresas em fornecer as guias de seguro desemprego, exigidas pelo governo para pagar assistência temporária a quem é demitido. O seguro desemprego é custeado com recursos do Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT). Diversos trabalhadores processaram seus antigos empregadores pedindo indenização em valor igual ao do seguro, já que as empresas se recusaram a fornecer as guias.
A visão de que os PDVs não geram direito ao seguro desemprego já era majoritária nas turmas do TST. Mas a questão ainda não havia sido analisada pela SDI-1. Parte da discussão é se o PDV caracteriza ou não demissão sem justa causa - situação que acarreta o pagamento do seguro desemprego.
Na defesa do Banespa, o advogado trabalhista Victor Russomano Júnior argumentou que, nos programas de demissão voluntária, a rescisão contratual não é uma iniciativa exclusiva do empregador. Portanto, não poderia ser classificada como demissão sem justa causa para acarretar o direito ao seguro. "Há uma confluência de vontades visando ao fim do vínculo de emprego, então não se pode cogitar de rescisão sem justa causa", diz Russomano. "Como não é o empregador que põe fim ao contrato sozinho, o seguro desemprego não é devido."
A SDI-1 aceitou os argumentos do banco por maioria, vencido o ministro José Roberto Freire Pimenta. Para o advogado Daniel Chiode, do Fleury Malheiros, Gasparini, De Cresci e Nogueira de Lima Advogados, a decisão garante maior segurança jurídica às empresas e evita o uso, para outros fins, de recursos destinados a cumprir uma função social - amparar trabalhadores desempregados até que se restabeleçam no mercado de trabalho.
"Seria incoerente dar mais dinheiro a quem aderiu a esses planos e recebeu pacotes atraentes", diz Chiode. "O seguro-desemprego é feito para cobrir um risco, nas hipóteses de desligamento involuntário", diz. Segundo ele, o PDV envolve a manifestação da vontade do empregado de ser demitido, recebendo para isso um plano de benefícios.
Outro questionamento comum na Justiça em torno dos planos de demissão voluntária envolve as cláusulas de quitação integral do contrato de trabalho - pelas quais o ex-empregado concorda em não questionar a relação de emprego no Judiciário. O TST já editou a Orientação Jurisprudencial nº 270, segundo a qual a quitação vale somente para parcelas e valores mencionados expressamente na rescisão. Ou seja, o trabalhador ainda pode discutir outras diferenças na Justiça.

Projeto suspende exigência do ponto eletrônico

Por Folhapress, de Brasília

A Comissão de Assuntos Sociais do Senado aprovou ontem um projeto de decreto legislativo que susta os efeitos de uma portaria do Ministério do Trabalho sobre o registro eletrônico de ponto e a utilização do Sistema de Registro Eletrônico de Ponto.
O texto segue para análise da Comissão de Direitos Humanos antes de ser submetido ao plenário. Pela portaria nº 1.510, de 2009, todas as empresas que já usam equipamento eletrônico para o registro da jornada de trabalho dos empregados devem adotar o novo sistema, que tem como novidade a memória protegida e a impressão de comprovantes do horário da entrada e saída dos funcionários.
O Ministério do Trabalho, no fim do ano passado, adiou a entrada em vigor de parte da portaria que permite ao empregado a possibilidade de imprimir o comprovante de entrada e de saída do trabalho. A medida começa a valer em abril para algumas empresas.
Desde a edição da portaria, em 2009, foram inúmeras divergências entre os setores sindicais e as confederações patronais. Para os sindicatos, a portaria vai evitar que os trabalhadores façam horas extras e não recebam por elas.
As entidades sindicais patronais argumentam que a adoção do ponto eletrônico impresso pode gerar altos custos, principalmente para as pequenas empresas, que teriam de comprar novos equipamentos ou adaptar os antigos.
O Ministério da Trabalho afirma que a regra está sendo adotada para evitar fraudes na marcação das horas trabalhadas. O controle eletrônico já é previsto na CLT, mas faltava uma regra que impedisse alterações do registro da presença dos funcionários por recursos tecnológicos.

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