Real desbanca os Correios
A moeda brasileira desbancou pela primeira vez os Correios como instituição mais confiável em pesquisa do Ibope com 1.500 leitores da revista "Seleções". A empresa estatal de serviços postais, que aparecia há dez anos no topo da lista, foi considerada muito confiável por 74% dos entrevistados em 2011, um ponto a menos do que os 75% que apontaram o real.
Apesar de ter avançado na lista, o real regrediu com relação aos 79% de 2010. Mas os Correios tiveram uma queda ainda mais significativa ante os 82% do ano passado.
Apesar do risco inflacionário, a credibilidade do real pode ter sido suportada pela valorização em relação ao dólar, segundo o Ibope. A situação relativamente confortável diante da crise financeira internacional também teria colaborado para o resultado.
Em seguida aos Correios aparecem as Forças armadas, o rádio e o casamento. Este último, perdeu quatro pontos percentuais de 2010 para 2011. Depois vêm os jornais, que ganharam 1 ponto percentual e são "muito confiáveis" para 58% dos entrevistados.
Pela primeira vez, o Ibope apurou a credibilidade da internet, que ficou em décimo lugar de uma lista de 14 instituições.
LS
NOTÍCIAS POLÍTICAS, ECONÔMICAS E INTERNACIONAIS
POLÍTICA
Dilma age para evitar que centrais aglutinem resistência
Por Fernando Exman | De Brasília
A presidente Dilma Rousseff aproveitou ontem o anúncio de mais uma medida do governo para combater os efeitos da crise financeira global para reforçar a articulação de sua administração com a base aliada e as centrais sindicais. Nos dois encontros mantidos pela presidente, o recado do Palácio do Planalto foi claro: o governo mantém a disposição de evitar maiores gastos com o custeio da máquina pública, apesar do aumento da arrecadação.
A sinalização teve como finalidade rechaçar as expectativas de que o governo aliviaria o ajuste fiscal. O Executivo detectou que circulava no meio político conversas no sentido de que, diante do crescimento da arrecadação, o governo poderia relativizar ordem anterior de aumentar a economia do setor público.
Em algumas dessas conversas, nas quais deputados e senadores apontavam um maior espaço para o governo liberar as emendas ao Orçamento, o corte de R$ 50 bilhões anunciado pelo Executivo começou inclusive a ser chamado de "contingenciamento". Ou seja, no meio político, tentava-se criar ambiente propício à flexibilização do ajuste fiscal.
No primeiro encontro, no início da manhã, Dilma anunciou em primeira mão às centrais sindicais o que o ministro da Fazenda, Guido Mantega, tornaria público em seguida: a elevação de R$ 10 bilhões na meta de superávit primário deste ano, para R$ 91,76 bilhões. Com o gesto, Dilma tentou melhorar suas relações com os sindicalistas, que reclamavam da falta de diálogo.
No início do mês, as centrais chegaram a boicotar o lançamento da nova política industrial do governo por não terem sido convidadas a participar dos debates sobre as medidas anunciadas, como a desoneração da folha de pagamento de segmentos da indústria. Desta vez, Dilma fez questão de lembrar aos sindicalistas de que cumprira sua parte no acordo de incorporar os representantes dos trabalhadores nos debates em curso no Planalto.
As centrais também têm criticado os planos de conceder à iniciativa privada os aeroportos de Guarulhos, Viracopos e Brasília. Ciente do descontentamento do setor e da capacidade de mobilização política das centrais, a oposição vem tentando estreitar laços com os sindicatos.
Ontem, Dilma tratou ainda de dar continuidade ao esforço de aproximar-se dos líderes e presidentes dos partidos aliados, os quais também lamentam a falta de interlocução. Em mais uma reunião do Conselho Político, a segunda em 20 dias, Dilma reforçou o pedido já feito no dia 10 para que o Congresso não aprove projetos que aumentem despesas. Na mira do Executivo estão, por exemplo, a proposta de emenda constitucional que garante reajustes salariais a policiais militares (PEC 300) e a Emenda 29, que aumenta os gastos da saúde pública.
Ao reiterar que é para valer o controle fiscal, Dilma também quis subsidiar seus líderes com argumentos. O Palácio do Planalto sustenta que, em meio à crise financeira global, a medida possibilitará a redução da taxa básica de juros e ajudará o governo na guerra cambial.
Para Dilma, juro baixo depende de ajuste
Por Cristiano Romero | De Brasília
A decisão de aumentar o superávit primário das contas públicas este ano partiu de uma convicção da presidente Dilma Rousseff, revelada em conversas que ela vem tendo com economistas de dentro e fora do governo nas últimas semanas. Nessas conversas, Dilma tem afirmado que, "se a política fiscal permitir, os juros vão cair".
Trata-se de uma visão nova do governo sobre a relação entre as políticas fiscal e monetária, em que a definição da segunda depende em grande medida do desempenho da primeira. Por esse raciocínio, para que o Banco Central (BC) possa baixar a taxa de juros (Selic), o governo tem que contribuir para a redução da demanda agregada da economia, contendo gastos públicos.
Na nova fase da gestão econômica, não deve haver dúvida: o Copom do BC baixará os juros quando a conjuntura permitir. A presidente afinou o discurso de sua equipe. "Reina a paz na equipe econômica, como há muito não ocorria", assegurou uma fonte.
O presidente do BC, Alexandre Tombini, soube da disposição do governo em reforçar o superávit primário há pouco menos de duas semanas, numa reunião no Palácio do Planalto, à qual foi convocado pela presidente fora da agenda. Aliás, é raro o presidente do BC ir ao palácio para reuniões previamente agendadas. Os encontros são sempre reservados. Dilma gosta de ouvi-lo.
A presidente respeita a autonomia do BC e não obrigaria Tombini a baixar os juros a qualquer preço. Dilma tem confiança no presidente do BC, porque compartilha com ele opiniões sobre o funcionamento da economia, ao contrário da experiência do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que, mesmo dando relativa autonomia ao BC, nutria desconfianças, criticava suas decisões e o pressionava a agir de forma diferente.
Dilma definiu a nova agenda fiscal com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, que está cada vez mais próxima dela. A agenda, cujo objetivo principal é criar condições para o BC reduzir a taxa Selic, vai além de 2011. A ideia é gerar superávits primários anuais, em torno de 3% do Produto Interno Bruto (PIB), até 2014. A presidente e sua equipe acreditam que, se fizer isso, o governo conseguirá zerar o déficit público em 2014 ou, no mais tardar, em 2015.
O acerto de Dilma com Mantega foi importante, porque o ministro comandou, na gestão anterior, o expansionismo da política fiscal. Mantega é, agora, o primeiro a defender a austeridade. Ele fez isso na reunião convocada por Dilma, há três semanas, para avaliar o impacto, no Brasil, do recrudescimento da crise financeira mundial.
O ministro da Fazenda é, hoje, o único ministro do governo autorizado a falar em nome da presidente Dilma. "Ele mudou de patamar", diz uma fonte. Fala várias vezes por dia com a presidente, está totalmente afinado com ela e mudou, inclusive, atesta-se dentro do governo, a sua comunicação com a sociedade. A razão é que, agora, ele não verbaliza nada que não tenha sido acertado com a chefe.
No começo da gestão Dilma, a presença de Antônio Palocci na Casa Civil representava um contraponto ao ministro da Fazenda. Num dado momento, Mantega chegou a atribuir a Palocci movimento nos bastidores para desgastá-lo no cargo. O ministro da Fazenda também temia possível aproximação de Tombini com Palocci.
Curiosamente, Palocci deixou o governo em junho, desgastado por suspeita de enriquecimento injustificado, Mantega ganhou força internamente, mas, agora, estão prevalecendo na gestão da economia ideias defendidas pelo ex-ministro da Casa Civil. Palocci, desde a campanha eleitoral, propunha a adoção de medidas fiscais fortes para facilitar o combate à inflação e a redução da taxa Selic.
Além de Mantega e Tombini, a presidente Dilma tem ouvido, com frequência, um seleto grupo de pessoas. São elas: o ex-ministro Delfim Netto, os professores Luiz Gonzaga Belluzzo e João Manuel Cardoso de Mello, o empresário Jorge Gerdau e o presidente do BNDES, Luciano Coutinho.
ECONOMIA
Lucro de companhias cresce 49% em 2010
Sete empresas do setor de construção e engenharia estão entre as 20 companhias que registraram o maior crescimento da receita líquida em 2010, resultado do grande volume de investimentos em infraestrutura e na expansão do mercado imobiliário. O número de companhias do setor de construção e engenharia subiu de 62 para 88 no ranking das cem maiores empresas do país, publicado pelo anuário "Valor 1000", que circula a partir de hoje, para assinantes do Valor e venda em bancas. Para sustentar esse crescimento, as empresas do setor de construção e engenharia aumentaram em 33% seu nível de endividamento, ficando atrás apenas do setor de comércio varejista (37,8%), que registrou a maior expansão.
O lucro operacional das mil maiores empresas que atuam no Brasil cresceu 49,1%, em 2010, compensando com folga a variação negativa de 21,6% registrada em 2009. O indicador mede o grau de eficiência das companhias em sua atividade fim. As empresas campeãs em 25 setores de atividade analisados pelo "Valor 1000" registraram aumento de 27,7% no lucro líquido, superando as demais companhias do ranking, cujo lucro subiu 20,3% na média total.
As empresas mais eficientes foram premiadas ontem, em São Paulo, durante evento que teve o ministro da Fazenda, Guido Mantega como principal orador. Ele entregou o prêmio Empresa de Valor 2011 à Totvs, por ter se destacado no conjunto das melhores em cada setor.
A expansão do lucro das mil maiores empresas superou o crescimento de 18,8% na receita líquida de 2010. De R$ 158 bilhões em 2009, os ganhos subiram para R$ 190 bilhões no ano passado. A receita líquida somada das empresas no ranking Valor 1000 passou de R$ 1,7 trilhão para R$ 2,06 trilhões.
"A rentabilidade em 2010 só não foi maior, porque aumentou o nível de endividamento das companhias, que precisaram investir para fazer frente à demanda aquecida do mercado interno", explica Marcio Torres, responsável pela área de crédito e de avaliação de risco de grandes empresas da Serasa Experian.
O cenário econômico favorável de 2010 fez com que as empresas da região Sudeste aumentassem de 75,3% para 79,6% sua participação no total da receita líquida das mil maiores companhias que atuam no país. A região Sudeste concentra 65,4% das mil maiores empresas do ranking de Valor 1000. As companhias localizadas em São Paulo registraram faturamento líquido de R$ 938,3 bilhões, representando 57,3% da receita da região Sudeste e 45,59% da receita do ranking.
As mudanças nos hábitos de consumo provocadas pelo aumento da renda beneficiaram as empresas de alimentos da região. Apesar do forte crescimento da produção e das vendas de automóveis, o setor de veículos e peças teve sua fatia reduzida de 15,25% para 10,1%.
No ranking das 50 maiores empresas da região Nordeste, o número de representantes do comércio varejista subiu de cinco para dez. As empresas do varejo na região registraram receita líquida de R$ 11,5 bilhões. Esse crescimento é resultado do impacto da entrada da classe C no mercado, beneficiando também o setor de serviços - cuidados pessoais, higiene e beleza - além da construção civil.
Para a maioria das empresas campeãs de Valor 1000, o momento é de cautela, mas não de paralisia. "Numa hora como essa, acompanhamos mais de perto o desempenho das vendas, o controle de estoques e avaliamos com mais rigor os investimentos. Mas não mudamos os planos de abrir 33 lojas em 2011", diz o diretor-presidente da Lojas Renner, José Galló.
A principal medida de gestão apontada pelas empresas para enfrentar o quadro ainda agudo de crise é melhorar o perfil de endividamento. A JBS, depois de registrar prejuízo de R$ 180,8 milhões no primeiro trimestre de 2011, vai cortar pela metade os investimentos previstos para 2012 e reduzir o grau de alavancagem. Para evitar riscos com a variação cambial, a Diagnósticos da América (Dasa) transformou em reais a dívida líquida de US$ 250 milhões, reduzindo o prazo de vencimento de 2018 para 2016. "Nossa receita não é em moeda estrangeira", explica Marcelo Barboza, presidente da empresa.
A décima-primeira edição de Valor 1000 traz como principal inovação a análise dos balanços consolidados das empresas. Ao todo, do ranking das 1.000 maiores, 402 companhias estão classificadas de acordo com esse critério. A nova forma de análise dos balanços é coerente com a mudança em curso da legislação contábil brasileira, cujo objetivo é alcançar a convergência com o padrão IFRS (International Financial Reporting Standards), adotado pela Comunidade Europeia e um conjunto importante de países, entre eles Japão, China e Índia.
"No caso das empresas de capital aberto, o balanço consolidado reflete de forma mais clara as demonstrações financeiras e a adesão ao padrão internacional", diz William Volpato, coordenador do Valor Data. Para as companhias de capital fechado, a análise do balanço consolidado permite acompanhar passo a passo o estágio de aderência às novas normas.
Essa transição começa a ser acompanhada pelo leitor, a partir de agora e torna realístico o cotejo entre o universo empresarial brasileiro e o internacional. "Numa economia globalizada, que ganha complexidade e dinamismo a cada dia e, volta e meia, é surpreendida por crises, o acesso a balanços mais transparentes e informativos é cada vez mais decisivo para todos os agentes do mercado", afirma Amador Rodriguez, diretor de captação de dados da Serasa Experian.
O anuário "Valor 1000" também traz um panorama completo do setor financeiro, com a classificação dos cem maiores bancos. Os números mostram que as instituições financeiras souberam aproveitar o crescimento do crédito para conseguir ganhos substanciais. A alteração mais destacada no quadro classificatório é o salto do BTG Pactual da 11ª para a 8ª posição. A instituição incorporou, no ano passado, a sua controladora, a BTG Pactual Investimentos, e finalizou a aquisição da Coomex, a maior comercializadora de energia do país.
Cenário passa a ser benigno para queda de juros, diz Mantega
Por João Villaverde | De Brasília
O ministro da Fazenda, Guido Mantega, aproveitou o anúncio da expansão do superávit primário de 2011, ontem, para passar três mensagens. Ao Banco Central (BC), Mantega afirmou que a melhora do quadro fiscal brasileiro decorrente da ampliação do primário "vem para abrir espaço para a redução da taxa de juros, o que, por sua vez, reduziria os gastos do governo com juros". Aos parlamentares, o ministro da Fazenda afirmou que o aperto promovido pelo governo "caminha no sentido de impedir que haja elevação de gastos correntes que eventualmente poderiam ser aprovados no Congresso". Finalmente, aos sindicalistas, Mantega afirmou que a medida não representa corte de gastos. "Trata-se de um ajuste para garantir a geração de empregos, não estamos cortando investimentos ou programas sociais", disse.
O governo está se preparando para uma recessão mundial que durará de dois a três anos, afirmou Mantega. "Os países ricos, infelizmente, vão crescer pouco. É para neutralizar os problemas que eles vão nos remeter que estamos adotando essas medidas cautelares", afirmou o ministro, para quem o BC tem, a partir de hoje, um cenário mais benigno para cobrar juros inferiores à atual taxa de 12,5% ao ano.
Segundo Mantega, a meta "atualizada" do superávit primário deste ano, de R$ 127,9 bilhões, deve ajudar o BC a reduzir as taxas de juros, "ainda muito altas" no Brasil. "Mas o BC vai reduzir os juros no médio prazo, quando ele achar que for oportuno, tendo a inflação controlada", disse. Cauteloso, não quis dimensionar o que considera médio prazo - " o que considero médio prazo é o que o BC considera médio prazo" - disse o ministro, numa demonstração de sintonia com o BC.
A ampliação em R$ 10 bilhões da meta de superávit primário do governo central (Tesouro, Banco Central e Previdência) foi definida entre o ministro da Fazenda e a presidente Dilma Rousseff na noite do domingo, em conversa por telefone. Ficou acertado que a medida, que circulara na Fazenda na semana passada, seria apresentada aos dirigentes das seis maiores centrais sindicais e aos parlamentares da base aliada, em duas reuniões no Palácio do Planalto. Sindicalistas e parlamentares reuniram-se ontem pela manhã com Dilma, Mantega, e os ministros da Casa Civil, Gleisi Hoffmann, Relações Institucionais, Ideli Salvatti, e Secretaria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho.
De acordo com um dirigente sindical, Dilma abriu a reunião com a previsão de que a crise internacional se estenderá por mais dois anos. Assim, a resposta do governo deve se concentrar, agora, na política monetária, e não na expansão fiscal. "Trata-se de uma crise totalmente diferente daquela que vivemos e enfrentamos em 2008, por isso temos de atuar de maneira distinta, alterando os paradigmas de nossa política econômica", afirmou.
Os sindicalistas receberam as medidas com ceticismo. "O governo está tentando encontrar uma alternativa ao grande câncer da economia, que é a elevada taxa de juros", afirmou Antônio Neto, presidente da Central Geral dos Trabalhadores do Brasil (CGTB). Outro dirigente sindical criticou a opção pelo aperto fiscal. "Se para enfrentar a crise de 2008 e 2009 o governo expandiu os gastos e fez desonerações, o que produziu o forte crescimento de 2010, porque agora o expediente mudou?", disse.
Na reunião com Dilma, o presidente da Central Única dos Trabalhadores (CUT), Artur Henrique, afirmou que o governo "pode manter uma política fiscal ativa [não rigorosa] e ao mesmo tempo reduzir os juros".
Hoje, as centrais realizarão atos em frente a sede do Banco Central em Brasília pela redução dos juros. A CUT fará uma manifestação ao meio-dia. As demais, capitaneadas pela Força Sindical, presidida pelo deputado Paulo Pereira da Silva (PDT-SP), farão uma "sardinhada" às 15h.
NOVAS CONCESSÕES
CCR reunirá ativos aeroportuários de construtoras e mira leilões no Brasil
CCR reúne ativo aeroportuário da Andrade e Camargo Corrêa
Por Fábio Pupo | De São Paulo
Uma semana depois do resultado da primeira concessão federal de aeroportos, a iniciativa privada já protagoniza uma corrida para as novas concessões. Até então assistindo as manifestações das empresas em silêncio, além de se ausentarem da primeira disputa (o leilão do Aeroporto de São Gonçalo do Amarante, no RN), as grandes empreiteiras assumiram o interesse pelos terminais. Duas dentre as cinco maiores, a Andrade Gutierrez e a Camargo Corrêa anunciaram ontem o interesse pelos projetos - que ficarão sob a responsabilidade do grupo CCR, do qual ambas são as acionistas principais.
O primeiro passo para a CCR diversificar seu escopo de negócios é a mudança do estatuto social, que depende de assembleia de acionistas, para permitir a atuação no setor aeroportuário. Aprovada essa mudança, a nova área de negócios já nascerá com três ativos principais - já que o grupo comprará os ativos da Andrade e da Camargo em três aeroportos da América Latina, caso um comitê independente aprove a aquisição. "Os acionistas não querem se desfazer desses ativos. Eles querem administrar esses ativos por meio da CCR", diz Arthur Piotto, diretor de relações com os investidores da CCR.
A Camargo Corrêa venderá a participação de 40,8% da empreiteira no Hato Aeroporto Internacional, em Curaçao, que teve R$ 800 mil de lucro líquido em 2010. A Camargo atua no terminal por meio da A-port, joint venture com a suíça Unique (Flughafen Zurich AG) e com a IDC. A A-port, por sua vez, tem participação majoritária (51%) na concessionária do aeroporto. Conforme adiantou o Valor em junho, a Camargo estudava a possibilidade de disputar os projetos aeroportuários no Brasil, mas ainda não havia definido se iria atuar por meio do grupo CCR ou da A-port. Na época, um dos executivos do grupo adiantou ao jornal, inclusive, a possível incorporação da A-port à CCR.
Já os ativos da Andrade Gutierrez incluem a participação de 48,75% no Aeroporto de San José, na Costa Rica (lucro de R$ 2,2 milhões em 2010); além de 45,5% no Aeroporto Internacional de Quito, no Equador. Neste último, o mais lucrativo dos três (R$ 45,6 milhões em 2010), a Andrade possui participação por meio da Quiport - onde a empresa brasileira tem outros sócios, como a canadense Aecon. Piotto, diz não haver ainda um valor para as transações. "Estamos começando essa análise. Se tudo for aprovado, em cerca de três meses teremos o processo concluído."
Focada em rodovias, com 90% do faturamento oriundo desse setor, a nova atuação da CCR repetiria a fórmula usada nas estradas - quando houve a concentração na CCR de concessões de rodovias então sob controle dos acionistas. "É natural que esse processo se repita no setor aeroportuário", diz Piotto. Segundo os executivos, os projetos no setor podem se estender a todo o mundo, mas se concentrarão na América Latina inicialmente. A ampliação dos negócios, se aprovada, pode reunir o know-how para a entrada do grupo na disputa por aeroportos brasileiros. Os executivos confirmam o interesse nas concessões já divulgadas pelo governo federal (Viracopos, Guarulhos e Brasília), mas há o projeto de construir um terminal, privativo. Trata-se do chamado Novo Aeroporto de São Paulo, um estudo em conjunto de Andrade e Camargo que já foi alvo de conversas com o governo do Estado.
Os executivos também não descartam a futura participação da empresa em outros projetos de infraestrutura, como o projeto do trem de alta-velocidade. Os três acionistas principais da CCR são grupo Soares Penido (17,2% de participação), Camargo Corrêa (17%) e Andrade Gutierrez (17%). Outras 48,78% das ações são negociadas em bolsa.
Além da Andrade e da Camargo, outras empreiteiras já se prepararam para disputar os aeroportos mais atrativos para o capital privado - já que têm grande movimentação de passageiros e estimativas de crescimento para os próximos anos. É o caso da CR Almeida que, numa operação parecida com a da CCR, delegará a responsabilidade para a EcoRodovias - empresa de concessões rodoviárias e de logística com participação da empreiteira. A Odebrecht declarou em abril o interesse pelos projetos.
JUSTIÇA
Juizados Federais levam quase três anos para julgar
Por Laura Ignacio | De São Paulo
Há cinco anos, uma enfermeira de 56 anos discute nos Juizados Especiais Federais (JEF) de São Paulo o direito de receber pensão pela morte do marido, que atuou como metroviário por 25 anos. Ela era dona de casa. Mas sem o benefício, foi obrigada a trabalhar de madrugada como acompanhante de idosos. "É uma tristeza depender da Justiça neste país. Disseram que aqui ia ser mais rápido", lamentou enquanto aguardava em uma fila uma cópia de seu processo.
Criados para simplificar o acesso à Justiça, os Juizados Especiais Federais ficaram sobrecarregados com o passar dos anos. O que se resolvia em 30 dias, hoje pode levar anos. Em 2002, quando começaram a funcionar, receberam, em todo o país, um total de 348 mil processos, No ano passado, foram 1,36 milhão - um crescimento de quase 300% -, de acordo com a pesquisa Justiça em Números, feita pelo Conselho Nacional de Justiça (CNJ). Com isso, ficou longa a espera por uma audiência. Na cidade de São Paulo, são marcadas somente para 2013. Na 1ª Região, que engloba 13 Estados do país, além do Distrito Federal, para 2012.
Dez anos depois da entrada em vigor da Lei nº 10.259, de 2001, que criou os JEFs, a estrutura montada já não dá conta de tantos processos. Na 3ª Região - que engloba os Estados de São Paulo e Mato Grosso do Sul -, cada servidor lida com 449 ações. Nas varas comuns, 124. Na 4ª Região, no sul do país, resolvia-se um caso em seis meses. Hoje, pode-se levar dois anos e meio. Na 2ª Região - Rio de Janeiro e Espírito Santo -, o desfecho é um pouco mais rápido: 335 dias.
Nos Juizados Especiais Federais, o procedimento é mais simples em relação às varas comuns, porém, não tão mais rápido. Não é preciso contratar advogado. Pode-se ir sozinho ao setor de atendimento, que vai formular o pedido em linguagem jurídica. Imediatamente é marcada uma audiência para uma tentativa de acordo. Se as partes não chegarem a um consenso, o juiz profere ali mesmo a sentença. Se uma das partes não se conformar, também pode recorrer. Há cinco tipos de recurso que podem ser apresentados nos JEFs. Hoje, o índice de reforma de decisões é de 9,8%.
Com as facilidades oferecidas, os Juizados Federais ficaram sobrecarregados, principalmente de causas contra o Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) - responsável por 80% dos processos em trâmite no país. Na 3ª região, dos cerca de 200 mil processos distribuídos por ano, aproximadamente 160 mil são contra a Previdência Social. Em 2010, por exemplo, foram proferidas 221 mil sentenças e firmados dez mil acordos. Mas, segundo a desembargadora e coordenadora do JEF na região, Therezinha Cazerta, os números de acordos poderiam ser maiores com a colaboração do INSS. "O grande problema nesses casos é o cálculo do benefício", afirma.
Segundo a lei dos juizados, quando o magistrado vai proferir uma sentença, o cálculo do valor em discussão deve estar pronto. O objetivo é acelerar o pagamento do montante devido. Mas, conforme a desembargadora, não há estrutura que permita aos juízes dar esse tipo de sentença. Isso porque existem apenas 62 servidores na 3ª região para fazer esses cálculos - geralmente muito complexos por envolverem matéria previdenciária. Para Therezinha, se os técnicos do INSS dividissem essa tarefa, a demora seria menor. "Há mais de um ano pedimos ao INSS a comunicação entre os sistemas dos juizados e o do órgão para facilitar os cálculos. Porém, até hoje não recebemos resposta."
O impacto desse problema é tamanho que a Advocacia-Geral da União (AGU) entrou com uma Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) no Supremo Tribunal Federal (STF) contra decisões dos juizados especiais do Rio de Janeiro que obrigam a União a realizar esses cálculos. O entendimento sobre a questão valerá para todo o país.
De acordo com o presidente do INSS, Mauro Hauschild, o órgão tem tentado contribuir. "Se eu tiver que destacar servidores da minha linha de frente para ajudar o Judiciário, vou piorar meu atendimento e haverá mais demandas."
O atendimento ao INSS é um dos motivos do elevado número de ações nos juizados, segundo o coordenador dos JEFs no Paraná, Antônio Savares. "Os segurados não se conformam com uma perícia de 15 minutos realizada pelos médicos do INSS e recorrem ao Judiciário", diz, acrescentando que é preciso qualificar melhor o servidor que atende diretamente o cidadão. "Não dá para lidar com Previdência olhando só no computador. É preciso saber se relacionar com o cidadão ou as pessoas vão buscar a resposta na Justiça."
Segundo a presidência do INSS, a maior parte dos investimentos do órgão em pessoal é para a capacitação daqueles que lidam diretamente com o público. A Previdência Social atende quatro milhões de pessoas e realiza 700 mil perícias por mês. Sua estrutura atual é de 1.196 agências, mas deve aumentar. "Do projeto de abertura de 720 novas agências, 71 já foram inauguradas e 149 só esperam a realização de concurso para a contratação de servidores", diz Hauschild.
Além do INSS, o Supremo Tribunal Federal (STF) tem colaborado para o elevado volume de processos em tramitação nos juizados. "Hoje há um enorme estoque de processos parados em razão da Lei da Repercussão Geral", diz a juíza auxiliar da coordenadoria dos JEFs da 2ª Região (Rio de Janeiro e Espírito Santo), Marcella Nova Brandão.
Com tantos processos, faltam juízes e unidades de atendimento. A quantidade de varas já foi parcialmente resolvida pela Lei nº 12.011, de 2009, segundo o juiz-corregedor do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) Erivaldo Ribeiro dos Santos. A norma criou 230 varas para a interiorização da Justiça Federal e a implementação dos juizados especiais. Mas serão criadas mais varas comuns que unidades dos JEFs. Na 3ª região, por exemplo, serão mais 20 varas para os JEFs e 42 para a Justiça Federal.
Quanto aos juízes, o problema está concentrado na falta de candidatos capacitados. Ou são reprovados nas rigorosas provas, ou não têm perfil para o trabalho. No Estado de São Paulo, por exemplo, existem cinco cargos vagos. Nos juizados de Andradina, Avaré, Caraguatatuba e Registro, não há juiz titular, nem substituto. Magistrados de cidades vizinhas respondem pela comarca. Para o coordenador dos juizados da 1ª região, desembargador Tourinho Neto, um juiz do JEF deve ter um perfil diferente daquele de vara comum. "Não pode ser presunçoso, nem prepotente e deve tolerar as culturas e os modos como as pessoas mais pobres se dirigem ao magistrado", diz.
INTERNACIONAL
Com novo assessor, Obama reforça foco em criar empregos
Por Alex Ribeiro | De Washington
Com sua a popularidade corroída pelos altos índices de desemprego, o presidente americano, Barack Obama, anunciou ontem a nomeação de um especialista em economia do trabalho, o professor da Universidade de Princeton Alan Krueger, para chefiar o conselho de assessores econômicos da Casa Branca.
O governo Obama pretende divulgar um pacote de medidas de estímulo ao emprego na próxima semana, quando o dia do trabalho é comemorado nos Estados Unidos. A taxa de desemprego chega a 9,1%, cerca do dobro dos percentuais de antes da crise financeira, o que dificulta os planos de reeleição de Obama da disputa do próximo ano.
Krueger é tido como um economista da esquerda moderada que, em virtude de seu rigor científico, é respeitado pelos colegas mais conservadores. Ele conhece bem o funcionamento da burocracia de Washington. Foi economista-chefe do Departamento do Trabalho nos anos 90, durante a Presidência de Bill Clinton, e mais recentemente economista-chefe do Departamento do Tesouro, no próprio governo Obama.
Para estimular o emprego, o governo americano estuda prorrogar cortes de impostos sobre folha de pagamento que vencem no fim do ano, criar um banco para financiamento de infraestrutura e conceder isenções de tributos para empresas que criam novos empregos.
É pouco provável que o pacote tenha efeitos significativos na taxa de desemprego, que, para muitos, é causado pela fraca demanda agregada. Endividadas, as famílias e as empresas americanas cortaram consumo e investimento, dificultando a recuperação econômica. A projeção do Federal Reserve, o banco central americano, é que o desemprego vai cair lentamente. Ficará entre 7,6% e 8,2%, em fins de 2012, quando Obama tentará a sua reeleição.
Com a escolha de Krueger e o anúncio do pacote, pelo menos Obama sinaliza aos eleitores americanos que a criação de empregos será sua principal prioridade. "Essa é nossa missão mais urgente", disse ontem, ao anunciar o novo assessor. "Alan [Krueger] entende os difíceis desafios que o país tem pela frente."
Na semana passada, o Partido Republicano, de oposição, divulgou o seu próprio plano para criar postos de trabalho, que inclui o controle do gasto público para aumentar a confiança entre empresas e consumidores, o relaxamento de regulações que impõem custos aos negócios e aprovação de tratados de livre comércio assinados com Coreia do Sul, Panamá e Colômbia.
Um dos estudos acadêmicos mais conhecidos de Krueger, feito em 1992 em parceria com o economista David Card, mostra que um aumento no salário mínimo não leva, necessariamente, a uma redução dos níveis de emprego.
No começo desse ano, ele escreveu um artigo para a agência de notícias Bloomberg afirmando que o desemprego iria cair com o fim do período de seguro desemprego. Segundo ele, muitos trabalhadores só seguem procurando emprego - e por isso são contabilizados nas estatísticas de desemprego - porque esse é um pré-requisito para receber o benefício do governo. Sua pesquisa acadêmica também inclui outros temas econômicos, como educação, felicidade, distribuição de renda, regulação e terrorismo.
Ele será o terceiro presidente do conselho de assessores econômicos da Casa Branca, criado em 1946 para dar conselhos independentes aos presidentes americanos. Christina Romer deixou o cargo há um ano para retornar à Universidade da Califórnia, em Berkeley, e o atual titular, Austan Goolsbee, também anunciou a partida para retomar a carreira acadêmica na Universidade de Chicago. O conselho é formado por outros dois economistas, Katharine Abraham (Universidade de Maryland) e Carl Shapiro (Berkeley).
Krueger é mais um numa crescente lista de ex-auxiliares de Clinton que entraram recentemente no governo Obama. O presidente do conselho econômico nacional, Gene Sperling, e o chefe de gabinete da Casa Branca, William Daley, também tiveram cargos no governo Clinton.
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